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Pastor Ricardo Gondim diz que crescimento evangélico pode fazer o movimento “descambar para um fanatismo reacionário e intolerante”.

 

 

O pastor e escritor Ricardo Gondim, líder da Igreja Betesda, publicou um artigo comentando as características e efeitos colaterais do crescimento evangélico.

Citando um sermão do padre Antônio Vieira, proferido em 1640, Gondim critica a forma como as igrejas tem priorizado o crescimento quantitativo, ao invés do conteúdo.

Em seu sermão, o padre Vieira previa que os holandeses – de orientação protestante – baniriam as tradições e costumes católicos, trazidos ao Brasil pelos portugueses. Na época, os holandeses ocupavam a região de Pernambuco, e com a ocupação, disseminavam costumes, culturas e sua visão protestante do cristianismo.

“O crescimento protestante – por meio do segmento pentecostal – ganhou velocidade, como ele [padre Antônio Vieira] bem previu e temeu. As igrejas se multiplicam nas periferias das grandes cidades, os templos estão lotados. A agressividade proselitista do movimento parece longe de arrefecer”, constatou Gondim, que menciona o destaque social para esse aumento dos evangélicos: “A presença evangélica se tornou tão evidente que os intelectuais dissertam sobre ela nas universidades; faz a pauta de jornais e revistas; e incomoda a cúria do Vaticano”, pontuou.

O polêmico pastor, que anunciou há um ano seu “rompimento com o movimento evangélico”, afirmou que o crescimento notado e analisado pela sociedade possui defeitos, naturais a instituições humanas, e críticos que buscam corrigi-los: “O movimento evangélico não se multiplica isento de problemas e dificuldades. Onde há pessoas, há idiossincrasias e virtudes, beleza e vício. Por estarem situados historicamente no tempo e na cultura, os evangélicos copiam acertos e erros da época. Daí ser mister que no frenesi do crescimento, vozes se levantem para alertá-los de que, embora numerosos, nunca devem pretender dominar o Brasil, como no pesadelo de Vieira”, sugere Ricardo Gondim.

Objetivo de muitos dos líderes evangélicos, o pastor afirma que a ideia de ter um país completamente evangélico é perigosa e pode resultar em intolerância: “A idéia de que o movimento tem a obrigação de converter o Brasil é tão anacrônica como a fala de Vieira. É perigosíssimo acreditar que repousa sobre os ombros do movimento o dever de suprimir expressões não evangélicas da cultura. Esse discurso não é mera coreografia religiosa e não impressiona apenas na liturgia interna. Não só empolga o coral. Caso tal pretensão realmente for levada a sério, o movimento vai descambar (se já não descambou) para um fanatismo reacionário e intolerante”, alertou.

Afirmando serem “rasos de teologia”, os líderes do crescente movimento parecem ter esquecido dos exemplos de Jesus na sua busca por mais, diz Ricardo Gondim: “Por mais bem intencionados que estejam, parecem menos interessados em lidar com valores espirituais do que gerenciais. Muitos perderam a noção de que o objetivo do Nazareno nunca foi lotar auditório, apenas inspirar corações a amar a Deus na relação com o próximo”.

A teologia da prosperidade, comum às igrejas neopentecostais, é criticada indiretamente pelo pastor: “Fundamentalistas já acusaram – injustamente – pentecostais de valorizarem as emoções acima da verdade. Hoje vale questionar se o neopentecostalismo não hierarquiza o útil acima da verdade; e se não cria uma nova cultura de eficiência como manifestação da fé. Fica a esperança de que a graça de Deus se revele nesses tempos dificultosos e que um remanescente talvez com outro nome sobreviva à loucura que acompanha a vitalidade do movimento”.

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