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Índice

Tributo Biográfico

1. Propósito, Tema e Autoria do Apocalipse

2. Análise Geral

3. Unidade do Livro

4. Ensino Progressivo Relativo ao Juízo Final

5. Simbolismo no Livro

6. Pano de Fundo e Base para Interpretação

7. Apocalipse 1: O Filho do Homem

8. Apocalipse 2, 3: Os Sete Candeeiros

9. Apocalipse 4-7: Os Sete Selos

10. Apocalipse 8-11: As Sete Trombetas

11. Apocalipse 12-14: Cristo versus o Dragão e Seus Aliados

12. Apocalipse 15, 16: As Sete Taças

13. Apocalipse 17-19: A Queda dos Aliados do Dragão

14. Apocalipse 20-22: Vitória Mediante Cristo

 

Capítulo 1 - Propósito, Tema e Autoria do Apocalipse

 

Em forma, simbolismo, propósito e significado, o livro do Apocalipse é de uma beleza que as palavras não podem descre­ver. Onde, em toda a literatura, encontraríamos qualquer coisa que possa superar a majestosa descrição do Filho do homem andando no meio dos sete candeeiros (Ap 1.12-20), ou do vívi­do retrato de Cristo, Fiel e Verdadeiro, avançando até a vitória, montado num cavalo branco, com uma vestimenta respingada de sangue, seguido dos exércitos celestiais (19.11-16)? Onde, além do mais, encontraríamos contraste mais marcante do que este entre o juízo da Babilônia, de um lado, e o regozijo da Jerusalém de Ouro, de outro (18.19; 21.22)? E onde mais o trono celeste e a bênção da vida celestial são retratados de maneira mais serenamente simples e, ainda assim, mais bela em sua sim­plicidade (4.2-5.14; 7.13-17)? Que riqueza de consolação; que vi­são e entendimento do futuro; sobretudo, que revelação do amor de Deus estão contidos nas palavras da profecia desse livro!

I. O Propósito do Livro

No geral, o propósito do livro do Apocalipse é confortar a Igreja militante nas lutas contra as forças do mal. E cheio de auxílio e de consolação para os cristãos sofredores perseguidos. A esses é dada a segurança de que Deus vê suas lágrimas (7.17; 21.4); suas orações são influentes nos negócios do mundo (8.3, 4) e sua morte é preciosa aos olhos do Senhor. A vitória final lhes é assegurada (15.2); seu sangue será vingado (19.2); seu Cristo vive e reina para sempre e sempre. Ele governa o mundo e os interesses da sua Igreja (5.7, 8). Ele está voltando de novo para tomar seu povo para si mesmo na "festa das bodas do Cor­deiro" e para viver para sempre com ele num universo rejuve­nescido (21.22).

Quando pensamos na esperança gloriosa da segunda vin­da, nosso coração se enche de alegria; nossa alma se consome com tal impaciência que nos tira o fôlego; nossos olhos tentam penetrar as negras nuvens que velam o futuro, esperando que a descida gloriosa do Filho do homem irrompa à nossa vista. É um anseio profundo que explode em palavras: "o Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele que ouve diga: Vem!" (22.17).

Quando, porém, consideramos essas verdades, descobri­mos que eleja está conosco - conosco no Espírito, andando no meio dos sete candeeiros (1.12-20). "...Porém, ele pôs sobre mim a mão direita, dizendo: Não temas; eu sou o primeiro e o último, e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos, e tenho as chaves da morte e do inferno". Somos, verdadeiramente, mais do que vencedores por meio daquele que nos amou.

II. O Tema do Livro

O tema é a vitória de Cristo e de sua Igreja sobre o dragão (Satanás) e seus seguidores. O Apocalipse tem o objetivo de nos mostrar que as coisas não são como parecem ser. A besta que sobe do abismo parece ser vitoriosa. Ele "pelejará contra elas e as vencerá e as matará, e o seu cadáver ficará estirado na praça da grande cidade que, espiritualmente, se chama Sodoma e Egito, onde também o seu Senhor foi crucificado. Então, mui­tos dentre os povos, tribos, línguas e nações contemplam os cadáveres das duas testemunhas, por três dias e meio, e não permitem que esses cadáveres sejam sepultados. Os que habi­tam sobre a terra se alegram por causa deles, realizarão festas e enviarão presentes uns aos outros, porquanto esses dois profe­tas atormentaram os que habitam sobre a terra". (11.7-10). Esse regozijo, porém, é prematuro. Na realidade, o crente é quem triunfa. "Mas, depois dos três dias e meio, um espírito de vida, vindo da parte de Deus, neles penetrou, e eles se ergueram so­bre os pés, e àqueles que os viram sobreveio grande medo... O sétimo anjo tocou a trombeta, e houve no céu grandes vozes, dizendo: o reino do mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo" (11.11, 15).

Em todas as profecias desse livro maravilhoso, Cristo é retratado como o Vitorioso, o Conquistador (1.18; 2.8; 5.9ss.; 6.2; 11.15; 12.9ss.; 14.1, 14; 15.2ss.; 19.16; 20.4; 22.3). Ele conquista a morte, o Hades, o dragão, a besta, o falso profeta e os homens que adoram a besta. Ele é vitorioso; como resultado, nós também o somos, mesmo quando parecemos tão desespera­damente vencidos.

Olhemos, por exemplo, a grande companhia de crentes descritos no capítulo 7. Suas vestes estavam imundas, mas fo­ram lavadas no sangue do Cordeiro e tornadas brancas.

Estavam em "grande tribulação", mas saíram dela (7.14). Foram mortos, mas ergueram-se nos seus pés (11.11). Foram perseguidos pelo dragão, pela besta e pelo falso profeta, mas, no final, os vemos postados vitoriosos no Monte Sião. Vemos o Cordeiro, e com ele os cento e quarenta e quatro mil que têm o seu nome e o nome de seu Pai escritos na fronte (14.1). Eles triunfam sobre a besta (15.2).

Parece-nos que suas orações não foram ouvidas (6.10)? Os juízos lançados contra a terra são respostas de Deus aos seus pedidos (8.3-5). Essas mesmas orações são a chave que solverá os mistérios da filosofia da História.

Parece que os crentes foram vencidos? Na verdade, eles reinam! Sim, eles reinam sobre a terra (5.10), no céu, com Cristo, por mil anos (20.4), e no novo céu e nova terra para todo o sempre (22.5).

O que, então, acontece àqueles que parecem ter vencido, o dragão (12.3), a besta (13.1), o falso profeta (13.11) e a Babilônia (14.8)? Eles são vencidos - e exatamente na ordem reversa. A Babilônia cai em 18.2, a besta e o falso profeta são horrivelmente punidos em 19.20, e o dragão é confinado a um tormento sem-fim em 20.10.

Resumindo, o tema desse livro é colocado mais gloriosa e completamente nestas palavras: "Pelejarão eles contra o Cor­deiro, e o Cordeiro os vencerá, pois é o Senhor dos senhores e o Rei dos reis; vencerão também os chamados, eleitos e fiéis que se acham com ele" (17.14).

III. As Pessoas às Quais o Livro é Endereçado

Sobre a minha escrivaninha repousa um comentário sobre o Apocalipse recentemente publicado. É um livro muito "inte­ressante". Vê o Apocalipse como um tipo de História escrita de antemão. Descobre nesse último livro da Bíblia copiosas e de­talhadas referências a Napoleão, guerras nos Bálcãs, a grande Guerra Européia de 1914-1918, o ex-i mperador alemão Wilhelm, Hitler e Mussolini e daí por diante. Esses tipos de explicações, porém, e outros como esses, devem ser postos totalmente de lado.[1] Pois que benefício os cristãos sofredores e severamente perseguidos dos dias de João poderiam derivar de predições específicas e detalhadas em relação às condições européias que prevaleceriam perto de dois mil anos depois?

Uma interpretação sadia do Apocalipse deve ter seu ponto de partida colocado na posição de que o livro foi escrito para os crentes que viviam nos dias e época de João. O livro deve sua origem, ao menos em parte, às condições contemporâneas. É a resposta de Deus às orações e lágrimas dos cristãos severamen­te perseguidos e espalhados pelas cidades da Ásia Menor.[2]

Não obstante, embora seja verdadeiro que devemos partir da posição de que o livro do Apocalipse foi escrito para os crentes dos dias e época em que João viveu, e que devemos até mesmo enfatizar o fato de que as condições que realmente pre­valeceram durante as últimas décadas do século \- A.D. forne­ceram a ocasião imediata para essa profecia, deveríamos, igual­mente, dar a mesma proeminência ao fato de que esse livro foi escrito não só para os crentes que primeiro o leram, mas para todos os crentes através desta dispensação toda.

Oferecemos os seguintes argumentos em defesa desta posição.

Primeiro, a aflição a que a Igreja estava sujeita nos dias do apóstolo João é típica da perseguição que os verdadeiros cren­tes têm de suportar através de toda a presente dispensação (1 Tm 3.12), e especialmente logo antes da segunda vinda de Cristo (Mt 24.29, 30).

Segundo, muitas das predições abundantes no livro (por exemplo, "selos", "trombetas" e "taças") dizem respeito a princí­pios e acontecimentos tão largos em seu escopo que não podem ser confinados a um ano específico ou a um período de anos, mas que atravessam os séculos, alcançando a grande consumação.

Terceiro, as cartas nos capítulos 2 e 3 são endereçadas às sete igrejas. Sete é o número que simboliza algo acabado e per­feito. Seu uso aqui indica que a Igreja como um todo está na mente do autor e que as admoestações e consolações do livro foram dirigidas aos cristãos crentes ao longo dos séculos.

Finalmente, todos aqueles que lêem e estudam esse livro, em qualquer época, são abençoados (1.3). Tanto no início como na conclusão do livro, o autor se dirige não somente a um grupo de homens que vivem numa década, mas a "todo aquele que ouve as palavras da profecia deste livro" (22.18).

IV 0 Autor do Livro

O autor nos diz que seu nome é João (1.1, 4, 9; 22.8). A questão, porém, é: que João? Alguns negam que João, o discí­pulo amado, tenha escrito o Apocalipse. Isso é, em parte, devi­do ao fato de que enquanto o autor do Quarto Evangelho e das três Epístolas do amor jamais menciona neles o seu nome, o autor do Apocalipse diz que o seu nome é João.

Novamente, é dito que há uma grande diferença entre o estilo e tom geral do Evangelho e das Epístolas, por um lado, e do Apocalipse, de outro. Mas leia o Evangelho de João e, de­pois, leia o Apocalipse. E possível notar a diferença? No pri­meiro, as idéias fluem correntemente; no último, elas são apresen­tadas de modo abrupto - nunca se sabe o que o autor dirá a seguir. O primeiro enfatiza o amor de Deus; o último - assim se diz -enfatiza sua severa justiça. O primeiro descreve a condição in­terior do coração; o último se posta no curso externo dos even­tos. O primeiro é escrito em grego belo e idiomático; o último é escrito no assim chamado "grego rude, hebraísta e bárbaro".[3]

E dito também que há uma diferença marcante entre a dou­trina do Evangelho e a do Apocalipse. O primeiro é de mente aberta, universalista; prega o evangelho "para todos" e a doutri­na da salvação pela graça. O último, diz-se, é de mente fechada, particularista; é judaico em sua doutrina da salvação e enfatiza a necessidade de boas obras.[4]

Finalmente, é observado que, logo no século 32 A.D., Dionísio de Alexandria atribuiu o livro do Apocalipse a "outro João", uma visão que foi adotada por Eusébio, o historiador eclesiástico.

Alguns estão convencidos por esses argumentos que algum outro João, que não o discípulo amado, foi o escritor do Apocalipse.[5] Crêem ainda que João, o apóstolo tenha sido o responsável pelo Quarto Evangelho, Outros aceitam a autoria joanina do Apocalipse, mas propõem alguma outra pessoa -talvez outro João, ou nem mesmo um João - para a autoria do Evangelho.[6] E, é claro, há aqueles radicais que negam que o apóstolo João tenha escrito quer o Evangelho quer o Apocalipse.[7]

Examinemos, porém, por alguns instantes, os argumentos. O primeiro impressiona pela sua fraqueza. Certamente o pró­prio fato de que o autor do Apocalipse simplesmente se chama de João, indica que ele era bastante conhecido, não só numa localidade em particular, mas por todas as igrejas da Ásia. Quando ele simplesmente se chama de João, sem qualquer designação adicional, todos sabiam exatamente de quem se tratava. Não parece certo que essa pessoa bastante conhecida tenha sido o apóstolo João? Suponha que o autor deste livro que você está lendo se apresente simplesmente como William; poder-se~ia pensar por um minuto que todos, imediatamente, tivessem idéia de quem o escreveu? Estamos plenamente convencidos não so­mente de que havia um só João que não precisa acrescentar "o apóstolo" ao seu nome, pela simples razão de que era suficien­temente conhecido como o apóstolo! Além disso, o autor não se chama de apóstolo porque ele escreveu o livro na posição do observador a quem as visões foram reveladas (cf. Jo 15.27; At 1.22, 23; I Co 9.1).

A diferença na gramática, no estilo e no tom geral tem de ser admitida. Mas isso significa que João, o apóstolo, não possa ter escrito o Apocalipse? Em nossa opinião, não. Como, então, explicaremos a diferença? Alguns defendem a idéia de que, quando João escreveu o Evangelho, teve assistentes, talvez os presbíteros de Éfeso; e que a ausência desses assistentes quan­do estava em Patmos seja responsável pela gramática e pelo estilo peculiares do Apocalipse.[8]

Outros elementos podem entrar nessa explicação. Primeiro, não deveríamos exagerar as diferenças em estilo e linguagem. Entre o Evangelho e o Apocalipse há também um corpo forte de semelhanças - um fato que, muito tarde, alguns estão come­çando a enfatizar. As semelhanças são marcantes. São en­contradas até em construções gramaticais peculiares e em expressões características {cf. Jo 3.36 com Ap 22.17; Jo 10.18 com Ap 2.27; Jo 20.12 com Ap 3.4; Jo 1.1 com Ap 19.13; e Jo 1.29 com Ap5.6).[9]

De novo, com referência ao estilo, deveríamos nós esperar que encontraríamos o mesmo estilo numa série de eventos his­tóricos (o Evangelho), numa carta pessoal (as Epístolas) e numa revelação (o Apocalipse)? Nessa correlação, não nos esqueça­mos que, quando João escreveu o último livro da Bíblia, sua alma estava em tal condição de profunda emoção interior, sur­presa e êxtase (pois ele estava "no Espírito") que sua formação judaica deve ter exercido maior pressão, podendo até ter influen­ciado seu estilo e linguagem.

Temos por certo que a natureza transcendente do objeto em questão, do profundo estado emocional do autor quando re­cebeu e registrou essas visões, e seu abundante uso do Antigo

Testamento - hebraico e grego[10] - são, em grande parte, res­ponsáveis pelas diferenças em estilo que permanecem depois das marcantes semelhanças já levantadas.

Devemos não nos demorar tanto na assim chamada dife­rença de ênfase doutrinária. O fato é, simplesmente, que o Quarto Evangelho e o Apocalipse não se chocam em um único ponto. Na verdade, a concordância na doutrina é extraordinária." O Evangelho chama Jesus de Cordeiro de Deus (amnos) em João 1.29; o mesmo faz o Apocalipse (arnion), 29 vezes. As Epístolas e o Evangelho usam o título "o Verbo" em relação ao Senhor (Jo l.lss.; 1 Jo 1.1); o mesmo faz o Apocalipse (19.13). O Evan­gelho representa Cristo como ser pré-temporal e eterno (l.lss.); o mesmo faz o Apocalipse (22.13; cf. 5.12, 13). O Evangelho de João atribui a salvação do homem à soberana graça de Deus e ao sangue de Jesus Cristo (1.29; 3.3; 5.24; 10.10,11); o mesmo faz o Apocalipse (7.14; 12.11; 21.6; 22.17) - muito enfatica­mente. E a doutrina do "todo aquele que" é encontrada em am­bos os livros (Jo 3.36; Ap 7.9; 22.17).

Não há diferenças doutrinárias!

Finalmente, em relação à opinião de Dionísio, já citado, deveria estar claro que sua visão se baseia sobre um mal enten­dimento da leitura de uma cuidadosa declaração de Papi as[11], e foi influenciada, provavelmente, pela oposição ao quiliasmo[12], que buscava justificar-se apelando ao livro do Apocalipse.[13]

A Igreja primitiva é quase unânime em atribuir o livro do Apocalipse ao apóstolo João. Essa era a opinião de Justino Mártir (c. 140 A.D.), de Irineu (c. 180 A.D.), que foi um discípulo de um discípulo de João, do Cânon Muratório (c. 200 A.D.), de Clemente de Alexandria (c. 200 A.D.), de Tertuliano de Cartago (c. de 220 A.D.), de Orígenes de Alexandria (c. 223 A.D.) e de Hipólito (c. 240 A.D.).15

Quando somamos a isso tudo que, segundo uma tradição muito forte, o apóstolo João foi banido para a ilha de Patmos (cf. 1.9), e que ele passou os últimos anos de sua vida em Efeso, a quem a primeira das cartas do Apocalipse foi dirigida (2.1), a conclusão de que o último livro da Bíblia foi escrito pelo "discí­pulo a quem Jesus amava" é inevitável.

V A Data do Livro

Levanta-se agora a questão: Quando João escreveu o Apocalipse? No ano 69 (ou antes), ou devemos inverter os núme­ros e considerar 96 (ou 95)? Ninguém pode encontrar um único argumento realmente coerente para apoiar uma data mais antiga. Todos os argumentos apresentados baseiam-se em testemunhos distantes e não-confiáveis, sobre a idéia totalmente imaginária de que João não tivesse ainda aprendido seu grego quando escreveu o Apocalipse, e sobre uma questionável interpretação literal de certas passagens que, muito certamente, têm significado simbó­lico. Assim, por exemplo, é-nos dito que o Templo de Jerusalém estava ainda em pé quando o Apocalipse foi escrito, pois em 11.1 está escrito: "Dispõe-te e mede o santuário de Deus".

A data mais recente tem grande apoio. Irineu diz: "Pois que (a visão apocalíptica) era vista não muito tempo antes, mas quase nos nossos próprios dias, mais próximo do fim do reinado de Domiciano." E além disso ele diz: "...a Igreja em Efeso, fundada por Paulo, e residência de João até o tempo de Trajano (98-117 A.D.), é verdadeiro testemunho da tradição dos apóstolos".16

Quando, em conexão com essas fortes e definitivas evi­dências, nos lembramos de que o Apocalipse reflete uma época em que Efeso já havia realmente perdido o seu primeiro amor; em que Sardes já estava "morta"; em que Laodicéia - que foi destruída por um terremoto durante o reinado de Nero - já havia sido reconstruída e se vangloriava de sua riqueza espiritual (3.17); em que João já havia sido "banido" - uma forma muito comum de perseguição durante o reinado de Domiciano; em que a Igreja já havia suportado perseguições no passado (20.4); e em que o Império Romano, como tal, já havia se tornado o grande opositor da Igreja (17.9); quando nos lembramos de to­dos esses fatos, somos forçados a concluir que uma data mais recente (A.D. 95 ou 96) é a correta.[14] O Apocalipse foi escrito próximo do final do reinado de Domiciano, pelo apóstolo João.

Ainda assim, o verdadeiro autor não é João, mas o próprio Todo-poderoso, Deus. "Revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu para mostrar aos seus servos as coisas que em breve devem acontecer, e que ele ... notificou ao seu servo João..." (1.1). Certamente João, o apóstolo, escreveu o livro do Apocalipse. Mas Deus, por meio de Cristo, foi o verdadeiro Autor. Portanto, o que esse livro prediz não é produto de gênio humano, tendente ao erro, mas a revelação da mente e do propósito de Deus com respeito à História da Igreja.

Em Copenhague, entre as muitas nobres esculturas de Thorwaldsen, há uma do apóstolo João. Seu semblante irradia uma serenidade celestial. Ele está olhando para o céu. Seu bloco de papel está diante dele. Na sua mão há uma pena de escrever. Mas a pena não toca o papel. Ele não se aventurará a escrever uma só palavra até que do céu ela lhe seja concedida.'8

 

Capítulo 5 - Análise Geral

 

I. As Sete Seções Paralelas

1. Cristo no meio dos candeeiros (1.1-3.22)

A figura interna central dos três primeiros capítulos do Apocalipse parece ser Cristo no meio dos sete candeeiros de ouro. Esses candeeiros representam as sete Igrejas (1.20). A cada Igreja João é levado a escrever uma carta (ver capítulos 2 e 3). Como esse número sete ocorre muitas vezes no Apocalipse, e é em todo lugar um símbolo daquilo que é completo, podemos ter como certo, com segurança, que esse é o caso aqui, e que ele indica a Igreja toda através de todo o espectro de sua existência até o próprio fim do mundo. Assim interpretada cada Igreja em particular é, por assim dizer, um tipo, não indicando um perío­do definido da História, mas descrevendo condições que são constantemente repetidas na vida de diversas congregações.[15]Assim, essa seção parece perpassar toda a dispensação, da

primeira vinda de Cristo para salvar seu povo (1.5) à sua se­gunda vinda para julgar todas as nações (1.7). A última das sete cartas é escrita à Igreja em Laodicéia. E evidente que o capítulo 4 introduz um novo assunto - ainda que intimamente relacionado.

2. A visão do céu e dos selos (4.1-7,17)

Os capítulos 4-7 constituem a próxima divisão natural do livro. O capítulo 4 descreve aquele que está sentado no trono e a adoração daqueles que o cercam. Na mão direita do Senhor há um livro selado com sete selos (5.1). O Cordeiro toma esse livro e recebe adoração. Do capítulo 6 aprendemos que o Cor­deiro abre os selos um a um. Entre o sexto e o sétimo selo temos a visão dos cento e quarenta e quatro mil que foram selados e da incontável multidão postada ante o trono.

Deve-se notar cuidadosamente que essa seção também co­bre toda a dispensação, da primeira à segunda vinda de Cristo. A primeira referência a Cristo retrata-o como tendo sido imola­do, e, agora, como governando dos céus (5.5, 6). Próximo do fim dessa seção é apresentado o juízo final. Observe a impressão da segunda vinda sobre os não-crentes: "...e disseram aos mon­tes e aos rochedos: Caí sobre nós, e escondei-nos da face da­quele que se assenta no trono, e da ira do Cordeiro, porque che­gou o grande dia da ira deles; e quem é que pode suster-se?" (6.16,17). Agora, observe a bem-aventurança dos crentes: "Ja­mais terão fome, nunca mais terão sede, não cairá sobre eles o sol nem ardor algum, pois o Cordeiro que se encontra no meio do trono os apascentará e os guiará para as fontes da água da vida. E Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima" (7.16, 17). Esse é um retrato da Igreja triunfante toda, ajuntada de todas as nações e assim, em sua inteireza, postada diante do trono e diante do Cordeiro - um ideal que não é entendido até o dia da grande consumação. Temos, assim, perpassado toda a era do evangelho.

3. As sete trombetas (8.1-11.19)

A seção seguinte consiste dos capítulos 8-11. Seu tema central é: as sete trombetas que afetam o mundo. O que acontece com a Igreja é descrito nos capítulos 10 e 11 (o anjo com um pequeno livro, as duas testemunhas). Também, no fechamento dessa seção há uma clara referência ao juízo final. "O sétimo anjo tocou a trombeta e houve no céu grandes vozes, dizendo: O reino do mundo tornou-se de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos séculos dos séculos... Na verdade, as nações se enfureceram; chegou, porém, a tua ira, e o tempo determinado para serem julgados os mortos, para se dar o galardão aos teus servos, os profetas, aos santos e aos que temem o teu nome, assim aos pequenos como aos grandes, e para destruíres os que destroem a terra" (11.15, 18). Tendo alcançado o fim da dispensação, termina a visão.

4. O dragão perseguidor (12.1-14.20)

Tudo isso nos leva aos capítulos 12-14: a mulher e o "filho varão" perseguidos pelo dragão e seus auxiliares. Essa seção também cobre toda a dispensação. Começa com uma clara re­ferência ao nascimento do Salvador (12.5). O dragão ameaça devorar o filho varão. O filho é carregado para Deus e para o seu trono. O dragão, agora, persegue a mulher (12.13). Como seus agentes, ele emprega a besta que vem do mar (13.1), a besta que vem da terra (13.11,12) ea grande meretriz, Babilônia (14.8). Essa seção, também, termina com uma inspiradora des­crição da segunda vinda de Cristo, para julgamento: "Olhei, e eis uma nuvem branca, e sentado sobre a nuvem um semelhan­te a filho de homem, tendo na cabeça uma coroa de ouro e na mão uma espada afiada ... E aquele que estava sentado sobre a nuvem passou a sua foice sobre a terra, e a terra foi ceifada" (14.14,16).

5. As sete taças (15.1-16.21)

A seção seguinte compreende os capítulos 15 e 16, e des­creve as taças de ira. Aqui, também, temos uma referência clara ao juízo final e aos eventos que ocorrerão em conexão com ele. Assim, lemos em 16.20: "Toda a ilha fugiu e os montes não foram achados".

6. A queda da Babilônia (17.1-19.21)

A seguir vem uma descrição vívida da queda da Babilônia e a punição infligida sobre a besta e o falso profeta. Observe a figura de Cristo vindo para julgar (19.11ss.). "Vi o céu aberto, e eis um cavalo branco. O seu cavaleiro se chama Fiel e Verdadeiro, e julga e peleja com justiça".

7. A grande consumação (20.1-22.21)

Isso nos leva à seção final, capítulos 20-22, pois Apocalipse 20.1 definitivamente começa uma nova seção e introduz um novo assunto.[16] Esse novo assunto é a condenação do diabo. Uma com­paração, sobretudo, com o capítulo 12 revela o fato de que, ao início do capítulo 20, estamos mais uma vez no limiar da nova dispensação. Enquanto em 12.9 nos é dito que, em conexão com a ascensão e a coroação de Cristo, o diabo é lançado à terra, aqui em 20.2, 3, lemos que ele é preso por mil anos, sendo depois lançado no abismo. Os mil anos são seguidos por um tempo curto durante o qual Satanás é solto de sua prisão (20.7). Isso, por sua vez, é seguido da descrição da derrota final de Satanás em cone­xão com a vinda de Cristo para julgamento (20.10, llss.). Nessa vinda, o presente universo, passando, deixa lugar para os novos céus e a nova terra, a nova Jerusalém (20.llss.).

Uma leitura cuidadosa do livro do Apocalipse mostra clara­mente que o livro consiste de sete seções, e que essas sete seções correm paralelas umas às outras. Cada uma delas abarca toda a dispensação, da primeira à segunda volta de Cristo. Esse período é visto ora de uma perspectiva, ora de outra.[17]

II. Outros Argumentos em Favor do Paralelismo

Há uma outra linha de raciocínio que confirma nossa po­sição de que cada uma das sete seções se estende do começo ao fim da nova dispensação e de que as sete correm paralelas umas às outras.[18] Diferentes seções atribuem a mesma duração ao período descrito. De acordo com o terceiro ciclo (capítulos 8-11), o maior período aqui descrito é de quarenta e dois me­ses (11.2), ou mil duzentos e sessenta dias (11.3). Agora, é um fato admirável que encontremos esse mesmo período de tem­po na seção seguinte (capítulos 12-14), a saber, mil duzentos e sessenta dias (12.6), ou um tempo, dois tempos e metade de um tempo (3 Vi anos) (12.14). As três designações - quarenta e dois meses, mil duzentos e sessenta dias e um tempo, dois tempos e metade de um tempo - são equivalentes exatos. Assim, a seção das trombetas (capítulos 8-11) deve correr pa­ralela à que descreve a batalha entre Cristo e o dragão (capítu­los 12-14).

Um estudo cuidadoso do capítulo 20 revela que ele des­creve um período sincrônico com o capítulo 12. Dessa forma, mediante esse modo de raciocínio, fica demonstrado o paralelismo.

Cada seção oferece-nos uma descrição de toda a era do evangelho, da primeira à segunda vinda de Cristo, e é funda­da na História de Israel sob a antiga dispensação, à qual faz freqüentes referências.

Temos dito que a seção sobre as trombetas (capítulos 8-11) é paralela à seção sobre a mulher e o dragão (12-14) e à seção final (20-22), que também se estende além dela (21, 22). Pro­varemos, agora, que essa mesma seção (capítulos 8-11) tem toda a aparência de ser paralela à das taças de ira (capítulos 15, 16). Observe, portanto, que a primeira trombeta (8.7) afeta a terra; o mesmo que a primeira taça (16.2). A segunda trombeta afeta o mar; o mesmo que a segunda taça. A terceira trombeta se refere aos rios; o mesmo com respeito à terceira taça. A quarta, em ambos os casos, se refere ao sol. A quinta se refere ao grande abismo ou ao trono das bestas, a sexta ao Eufrates, e a sétima à segunda vinda para juízo.[19]

Novamente, observe que a quarta seção (capítulos 12-14) apresenta, como os inimigos de Cristo e da sua Igreja, o dragão, as duas bestas e a grande prostituta (Babilônia). Esses quatro surgem juntos. É natural, portanto, inferir que eles caiam jun­tos. Isso se torna claro quando entendemos que o significado da besta e da grande prostituta, Babilônia, é o seguinte: A besta que sobe do mar é a perseguição que o dragão promove contra os cristãos, corporificada nos governos mundiais e dirigida contra o corpo dos crentes. Nos dias de João isso era feito pelo gover­no romano.

A besta que surge da terra é a religião anticristã de Satanás que objetiva enganar a mente e escravizar a vontade dos cren­tes. No tempo em que essas visões apareceram a João, essa bes­ta estava incorporada na religião pagã e no culto ao imperador de Roma.

A grande prostituta, Babilônia, é a sedução anticristã que tentou roubar o coração e perverter a moral dos crentes. Nesse tempo a prostituta se revelava como a cidade de Roma. Assim, quando Satanás cai, as bestas e a prostituta também caem. Eles sobem juntos; eles também caem juntos. A sexta seção (capítu­los 17-19) descreve a queda da grande prostituta, Babilônia (ca­pítulos 17, 18) e das bestas (19.20), enquanto o sétimo ciclo descreve a queda de Satanás (20.10) e sua derrota final no dia do juízo. O juízo final sobre os quatro inimigos - o dragão, a besta que vem do mar, a besta que vem da terra e a grande pros­tituta - é descrito em duas seções separadas. Assim, essas duas devem ser paralelas. Cada uma descreve um período que se es­tende até o conflito final, o mesmo último julgamento quando os inimigos de Cristo e de sua Igreja receberão sua final e eterna punição.[20]

Nessa mesma relação há outro forte argumento que defen­de a posição de que as seções correm paralelas, assim como cada uma delas termina com a vinda do Senhor para juízo. A evidência a que nos referimos agora é obscurecida pela tradu­ção. A seção sobre as taças de ira (15, 16) termina com uma referência a uma batalha. (Ver 16.14, onde o conflito é chama­do a batalha do grande dia de Deus, o Todo-poderoso.) A seção seguinte (capítulos 17-19), de novo, termina com a mesma cena de batalha. (Ver 19.19.) Conforme o original, essa é a mesma batalha mencionada em 16.14, pois ali lemos: "congregaram-se para pelejar contra ele". Finalmente, no fechamento da seção (capítulos 20-22), lemos mais uma vez: "a fim de reuni-los para a peleja". (Ver 20.8.) Todas as três seções, portanto, descrevem eventos que se dirigem à mesma grande batalha de Jeová. Elas são paralelas.

As sete seções são paralelas. Nosso argumento final para apoiar a posição paralelística é o fato de que encontramos exata­mente a mesma coisa nas profecias de Daniel, que têm sido chamadas de Apocalipse do Antigo Testamento. Desse modo, as partes do sonho de Nabucodonosor (capítulo 2) correspondem exatamente às quatro bestas do sonho de Daniel (capítulo 7).[21] O mesmo período é coberto duas vezes, e visto de diversas perspectivas.

A divisão do Apocalipse em sete seções[22] é preferida por muitos autores, embora não haja unanimidade com respeito aos limites exatos de cada seção.[23] Nós preferimos a divisão dada, com pequenas variações, por L. Berkhof, S. L. Morris, B. B. Warfield e outros. É a mais natural. É claramente provida pelo próprio livro, cada seção findando, como temos demonstrado, no mínimo com uma referência à vinda de Cristo para juízo. Isso é verdadeiro mesmo com respeito à seção final (capítulos 20-22; ver 22.20), embora vá além do juízo final, descrevendo o novo céu e a nova terra (cf. 7.9ss.). Sobretudo, se interpretada dessa forma, cada seção incorpora um tema que pode ser facil­mente distinguido dos outros. Nossa divisão é a seguinte:

1. Cristo no meio dos sete candeeiros de ouro (1-3).

2. O livro com os sete selos (4-7).

3. As sete trombetas de juízo (8-11).

4. A mulher e o filho perseguidos pelo dragão e seus auxi­liares (a besta e a prostituta) (12-14).

5. As sete taças de ira (15, 16).

6. A queda da grande prostituta e das bestas (17-19).

7. O julgamento do dragão (Satanás) seguido pelo novo céu e nova terra, a Nova Jerusalém (20-22).

Estamos, agora, prontos para formular a primeira proposição.

Proposição I. O livro do Apocalipse consiste de sete seções. Elas são paralelas e cada uma cobre toda a nova dispensação, da primeira à segunda vinda de Cristo.

 

III. As Duas Maiores Divisões

Segundo a opinião de muitos comentaristas, as sete seções se encaixam em dois grupos.[24] O capítulo 12.1 (ou 11.15) pare­ce mostrar onde o primeiro grupo ou série de visões termina e começa o segundo." No primeiro grupo (capítulos 1-11) ve­mos a luta entre os homens, isto é, entre crentes e incrédulos. O mundo ataca a Igreja, mas a Igreja é vingada, protegida e vitori­osa. No segundo grupo de visões (capítulos 12-22) é-nos mos­trado que essa luta na terra tem um pano de fundo mais denso. É a manifestação visível do ataque do diabo ao filho nascido. O dragão ataca o Cristo. Repelido, ele dirige sua fúria contra a Igreja. Como seus inimigos, ele emprega as duas bestas e a gran­de meretriz, mas todos esses inimigos da Igreja são derrotados no final. É evidente que as seções que compõem esse segundo grupo (capítulos 12-22), ainda que sincrônicas, apresentam uma história seqüencial. O dragão, as bestas, a meretriz (observe a ordem) assaltam a Igreja. A grande prostituta, as bestas e o dra­gão (outra vez, observe a ordem) são derrotados.

Observar-se-á que a primeira dessas duas maiores divisões contém três seções: capítulos 1-3; 4-7; e 8-11. A segunda contém quatro: capítulos 12-14; 15, 16; 17-19; e 20-22. Na primeira dessas divisões maiores (1-11) vemos a superfície: a Igreja perse­guida pelo mundo. Na segunda vemos o conflito subjacente entre

Crist11. Ver J. P. Lange, op. cit., p. 83; A. Pieters, op. cit., p. 159; A. T. Robertson, Syllabusfor New Testament Study, p. 260; H. B. Swete, op. cit., pp. xl, Ixii.

o e o dragão (Satanás). O livro do Apocalipse, portanto, revela um progresso em profundidade ou intensidade do conflito espiritual.

Alguns poderão dizer que essa divisão do livro em duas partes maiores é artificial,[25] mas, claramente, a divisão é sugerida pelo pró­prio livro. Candeeiros, selos, trombetas, taças, etc. constituem se­ções distintas do livro, quer gostemos disso, quer não. É um agru­pamento do próprio apóstolo.

Em relação a isso, sobretudo, há um outro fato digno de especial consideração. O autor do Apocalipse está constante­mente falando em termos de sete. Esse número ocorre 54 vezes. O que é mais impressionante é o fato de que ele, repetidas vezes, organiza esses setes em grupos de três e quatro ou quatro e três.[26]Nossa organização, em vez de ser artificial, está exatamente em harmonia com o caráter do livro.

Podemos, agora, apresentar o seguinte esboço completo do Apocalipse, cujo tema é a vitória de Cristo e de sua Igreja sobre Satanás e seus auxiliares.

a. O conflito na terra. A Igreja perseguida pelo mundo. A Igreja é desagravada, protegida e vitoriosa (Ap 1-11).

1. Cristo no meio dos sete candeeiros de ouro (1-3).

2. O livro com sete selos (4-7).

3. As sete trombetas do juízo (8-11).

b. O cenário espiritual mais profundo. Cristo (e sua Igreja) perseguido pelo dragão (Satanás) e seus auxiliares. Cristo e sua Igreja são vitoriosos (Ap 12-22).

4. A mulher e o "filho varão" perseguidos pelo dragão e seus auxiliares (as bestas e a grande prostituta) (12-14).

5. As sete taças de ira (15, 16).

6. A queda da grande prostituta e das bestas (17-19).

7. O juízo sobre o dragão (Satanás) seguido do novo céu e nova terra, a Nova Jerusalém (20-22).

Um comentário mais. Temos concentrado nossa atenção na divisão do livro. Ainda assim, não é a divisão, mas a unidade do livro, a própria íntima relação entre as partes, que deve ser enfatizada. Isso é, geralmente, esquecido; assim, dedicaremos o próximo capítulo a esse assunto.

 

Proposição II. As sete seções podem ser agrupadas em duas divisões maiores. A primeira divisão maior (capítulos 1 – 11) consiste de três seções. A segunda divisão maior (capítulos 12 -22) consiste de quatro seções. Essas duas divisões maiores revelam um progresso em profundidade ou intensidade do conflito espiritural. A primeira divisão maior (1 -11) revela a Igreja, habitada por Cristo, perseguida pelo mundo. Mas a Igreja é vingada, protegida e vitoriosa. A segunda divisão maior (12 – 22) revela o cenário mais profundo do conflito. É um conflito entre Cristo e o dragão, em que Cristo e, portanto, sua Igreja, são vitoriosos.

 

 

Capítulo 7 - A Unidade do Livro

 

Depois de haver feito nossa análise do livro do Apocalipse, passaremos a responder aos autores que dizem que esse livro é um ajuntamento de fantasias sem base; que, na verdade, o Apocalipse não é sequer um único livro, mas uma compilação de diversos fragmentos de outros livros.[27]

Essas visões são, em última instância, inaceitáveis. Longe de ser um ajuntamento confuso, esse livro revela a mais orgâni­ca e sistemática organização. As duas divisões maiores complementam uma a outra. Elas se encaixam. As sete seções revelam a mais gloriosa unidade. Há uma fácil transição de uma visão a outra. Ver isso é entender o livro. Não ver isso é perder seu mais profundo significado.

Mantendo nossa Bíblia aberta diante de nós, procedamos a outra pesquisa do Apocalipse. Desta vez não perguntaremos como o livro se divide. Isso já foi respondido. Perguntaremos agora: Qual o sentido do livro, tomado como um todo? Como suas partes estão relacionadas entre si?

L Cristo no Meio de sua Igreja

Com essa pergunta em mente, tornemos uma vez mais para a primeira seção (capítulos 1-3). Primeiro, a visão de Cristo no meio dos sete candeeiros de ouro se apresenta à nossa vista (1.12ss.). Vemos o Filho do homem com seus olhos chamejan­do de fogo, com uma afiada espada de dois gumes saindo de sua boca, vindo julgar aqueles que ferozmente perseguiram a Igreja e aqueles que tentam desviar os verdadeiros crentes.

Ao considerar o capítulo 2, deve-se tomar cuidado para não erguer uma barreira entre os capítulos 1 e 2. Eles são uma unida­de. A Igreja habitada por Cristo é revelada nessa seção (capítulos 1-3). Seu tema é a presença residencial e constante de Cristo em sua Igreja. O exaltado Filho do homem, que foi morto, mas vive para sempre, está ali, confortando a Igreja com sua presença (1.13), revelando coisas ocultas (3.1), reprovando o erro (2.4), ameaçan­do punir os que se opõem à verdade e à justiça e que tentam desviar outros (2.16), aprovando o que quer que seja recomendá­vel (2.2, 3), prometendo a recompensa (2.7) e seriamente insis­tindo com seus discípulos para que se arrependam (3.18, 19). Parece-nos ouvi-lo sussurrar à medida que lemos essa seção (ca­pítulos 1-3): "Estarei convosco até a consumação dos tempos".

Observe a íntima conexão entre o capítulo 1 e os dois capí­tulos seguintes. No capítulo 1 temos a visão de Cristo. Os dois capítulos seguintes revelam esse mesmo Cristo e até o descre­vem em termos quase idênticos aos encontrados no capítulo 1. A fim de estabelecer esse ponto claramente, coloquemos as duas descrições em colunas paralelas:

Descrição de Cristo no capítulo 1

Descrição de Cristo nos Capítulos 2 e 3

"Tinha na mão direita sete estrelas e, no meio dos candeeiros, um semelhante a filho de homem..." 1.16, 13.

"...aquele que conserva na mão direita as sete.estrelas e anda no meio dos candeeiros de ouro,2.. 1

"...eu sou o primeiro e o último, e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos” 1:17,18

o primeiro e o últimos que esteve morto e tornou a viver 2:8          

"...e da boca saía-lhe uma. afiada  espada de dois gumes..."1.16.     

"...aquele, que tem a espada afiada de dois gumes..." 2,12.

"...os olhos como chamas de fogo; os pés, semelhantes ao bronze polido ...".1.14,15

o Filho de Deus, que:tem os olhos como chamas de fogo e os pés semelhantes ao bronze polido..." 2:18

"...da parte dos sete Espíri­tos que se acham diante do seu : trono.,. Tinha na mão direita sete estrelas.,.". 1.4, 16.

aquele que tem' os sete espíritos de Deus: e as sete es­trelas...' 3:1

"a fiel testemunha...e tenho as chaves da morte e do inferno". 1.5, 18.                   

 'o santo e verdadeiro,  aquele que tem a chave de Davi, 3:7

"...Jesus Cristo, a fiel testemunha, o primogênito" dos mortos é o Soberano dos reis da terra:" 1.5

O Amém, a testemunha fiel e verdadeira,  o princípio da criação de Deus..."'. 3.14.

 

II. O Conflito Entre a Igreja e o Mundo

Desse modo, a primeira seção (capítulos 1-3) revela a Igreja habitada por Cristo representada pelo simbolismo dos sete can­deeiros de ouro, com o Filho do homem andando no meio de­les. A Igreja revela a luz dos céus ao mundo que jaz em trevas.

A Igreja e o mundo - um conflito é inevitável. As trevas odeiam a luz. Conseqüentemente, perseguições estão reservadas para a Igreja. De conformidade, na visão dos selos (capítulos 4-7) vemos a Igreja opressa pelo mundo. A luz brilha nas trevas

(capítulos 1-3) e as trevas odeiam a luz (capítulos 4-7) - estas sempre se seguem uma à outra, nessa ordem.

Porém, mesmo antes que essas tribulações sejam des­critas, recebemos o apoio confortante de que elas estão in­cluídas do decreto de Deus. Constituem parte do seu plano. A Igreja precisa dessas aflições a fim de ser purgada. A Igre­ja revela a luz dos céus ao mundo que jaz em trevas, mas um estudo acurado de Apocalipse 2 e 3 mostra que a luz brilha com diferentes graus de pureza e de luminescência. Em Esmirna, a glória do eterno Cristo brilha em toda a sua pure­za, mas Sardes tem apenas uns poucos que não mancharam suas vestes: ali a luz apenas bruxuleia. Filadélfia está radiante com o esplendor de seu maravilhoso Salvador e recebe uma porta aberta; mas Laodicéia é morna. Repetimos, a Igreja precisa dessas provações para que seja lavada e purificada, a fim de que os verdadeiros crentes sejam levados para mais perto de Deus. Por meio da aflição e do carregar a cruz os filhos de Deus progridem na santificação. O Cristo no trono faz prevalecer o bem sobre o mal. Por essa razão é que essa seção se abre com a visão gloriosa do trono colocado nos céus (capítulo 4), e com o rolo na mão direita do Senhor (capítulo 5). É Cristo quem toma esse rolo e abre os seus selos (5.7ss.). O Filho do homem, exaltado em glória, governa o mundo em favor da Igreja. Somos mais do que vencedores! Que venham os julgamentos!

No capítulo 6, esses julgamentos são descritos: perseguição e tribulação de toda sorte. Cristo traz sempre a espada. Observe a marcante conexão entre os capítulos 5 e 6:

O cavaleiro no cavalo branco é Cristo.[28]

Os julgamentos estão em evidência durante todas esta era, da primeira à segunda volta de Cristo. Repetidas vezes Cristo entra no cenário da História, na plenitude de seu poder salvador, onde quer que a espada deva ser mostrada. Os discípulos de Cristo se tornam carregadores da cruz. A paz é retirada da terra. A terra fica ensopa­da com o sangue dos seguidores do Cordeiro.[29] Observe a íntima conexão entre Apocalipse 6.2,4 e Mateus 10.34ss.:

"...a Raiz de Davi venceu." 5.5.

"Vi, então, e eis um cavalo branco e o seu cavaleiro com um arco; e foi-lhe dada uma coroa; e ele saiu vencendo e para vencer." 6.2.

Apocalipse 6.2,4. "...e eis um cavalo branco e o seu cavaleiro com um arco .... e ele saiu vencendo e para vencer... e saiu outro cavalo, vermelho, e ao seu cavaleiro foi-lhe dado tirar a paz da terra para que os homens se matassem uns aos outros; também lhe foi dada uma grande espada."

Mateus 10.34ss. "Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada .... e quem não toma a sua cruz e vem após mim, não é digno de mim"

Essa passagem de Mateus 10.34ss. esta, constantemente, na mente daquele que tem a visão.[30] Não só aqui, em Apocalipse6.2, 4, ele, definitivamente, se refere a isso, mas também em 3.5, que é um marcante paralelo de Mateus 10.32.

Contudo, a seção dos selos não descreve apenas perse­guições. E muito mais abrangente. Todos os ais e juízos da Igreja estão incluídos na visão, assim como, também, tudo o que a Igreja sofre com o mundo. A grande questão, entretanto, é: Como esses juízos afetam a Igreja? {Cf. Ez 14.21ss.; 16.20ss.; Mt 24.13.)

Em completa harmonia com essa interpretação e com a unidade de todo o livro, o quinto selo revela a alma daqueles que foram mortos pela Palavra de Deus e pelo testemunho que deram (6.9). Muitos comentaristas imaginam que "uma visão totalmente nova" se inicia aqui, tendo pouca ou nenhuma conexão com o que se passou. Nossa interpretação - que repousa sobre a base sólida da comparação pertinente aos paralelos - não encontra qualquer dificuldade. Os selos precedentes simbolizaram os juízos e as perseguições que afetam a Igreja. Entre outras coisas, os crentes foram perseguidos e mortos. O que pode ser mais natural do que ver a alma desses que foram mortos, agora, sob o altar? Com a abertura do sexto selo temos chegado ao fim, o dia do juízo final.

Esses selos de juízo e perseguição são evidentes através de toda a dispensação; num certo sentido, através da história do mundo. Os santos, entretanto, não devem temer. Os julga­mentos que estão prestes a cair sobre o mundo não causarão dano aos verdadeiros crentes sobre a terra (7.1-8). Sobretudo, de alguma forma, a Igreja sairá "da tribulação, a grande tri­bulação", a soma total de todas as tribulações. Nos céus, a Igreja triunfante, a multidão sem conta portando palmas, re­tirada de todas as nações e representativa de todas as tribos e povos e línguas, celebrará sua vitória no grande dia da con­sumação de todas as coisas (7.9-17). Somos mais do que vencedores!

III, Os Juízos sobre os Perseguidores

O que dizer, porém, sobre os perseguidores? Sairão livres? A Igreja não será desagravada? Nosso Senhor vê as lágrimas de seus filhos perseguidos. Suas orações, aromatizadas pela inter­cessão de Cristo, sobem aos céus. O Senhor responde. O incensório é cheio com o fogo do altar, que é lançado sobre a terra (8.5). "E houve trovões, vozes, relâmpagos e terremoto." Em outras palavras, Deus está, constantemente, enviando seus julgamentos sobre a terra em resposta às orações dos seus fi­lhos perseguidos. Por essa razão é que o sétimo selo introduz, imediatamente, as trombetas do juízo; os selos da tribulação e perseguição dão lugar, necessariamente, às trombetas do juízo.[31]O erro precisa ser vingado.

Dessa forma, essa seção sobre as trombetas de juízo ensina que, por meio de pragas sobre a terra (8.7), sobre o mar (8.8), rios (8.10), sol e as estrelas (8.12), má influência dos demônios (9.3, 11), campo de batalha (9.16) e a ameaçadora expectação do juízo final (11.15) nosso Redentor exaltado e ressurreto, cons­tantemente, vinga a Igreja e envia juízos sobre seus perseguido­res. Contudo, até esses mais severos julgamentos são enviados como uma advertência. Eles não são finais. Destroem a terça parte. Por meio deles Deus ainda chama o homem ao arrependi­mento. A função das trombetas é advertir.

Mas resultam eles, realmente, em arrependimento? No geral, e à parte da operação salvadora do Espírito Santo, não!

"...Nem ainda se arrependeram dos seus assassinatos, nem das suas feitiçarias, nem da sua prostituição, nem dos seus furtos" (9.21). Isso foi verdadeiro, também, nos dias de João e tem sido verdadeiro desde então, e sempre o será. 0 Apocalipse é um livro para todas as épocas. É sempre atual.

Enquanto esses julgamentos estão caindo sobre o mundo, o que estará acontecendo à Igreja? Sua segurança, testemunho, poder, seu carregar a cruz e sua vitória final estão descritos nos capítulos 10 e 11.

IV Vitória Mediante Cristo

A seção finda com um marco de vitória, um hino de triunfo. "O reino deste mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos séculos dos séculos" (11.15). Os santos rece­bem sua recompensa. Deus destrói o destruidor (11.18). Somos mais do que vencedores!

Aqui, a primeira divisão do livro (capítulos 1-11) termi­na.[32] O livro, contudo, não termina aqui. Nem é verdade que ele deveria terminar aqui. Há ainda duas questões que clamam por resposta: 1. Qual a causa subjacente da perseguição da Igreja promovida pelo mundo? Noutras palavras, por que os incrédu­los odeiam tão veementemente os crentes? O que há por traz disso? 2.0 que acontecerá a esses indivíduos impenitentes (9.21) que não ouviram a advertência da voz de Deus revelada nas trombetas de juízo?

Essas duas questões são respondidas na segunda divisão do livro (capítulos 12-22). Os capítulos 1-11 mostram a super­fície: A Igreja plena de Cristo brilha nas trevas deste mundo (capítulos 1-3). O mundo odeia a luz e persegue a Igreja de modo que a alma dos santos mortos apareçam sob o altar (capí­tulos 4-7). O sangue dos santos é vingado; suas orações são

respondidas; julgamentos, de todos tipos, caem sobre o mundo enquanto a Igreja triunfa (capítulos 8-11). Os capítulos 12-14 ensinam que a luta entre a Igreja e o mundo é apenas a manifes­tação de um conflito entre Cristo e Satanás. Cristo é, aqui, cha­mado de "filho varão".[33] Satanás é chamado de "dragão".[34] O propósito do dragão é o de devorar o Filho (12.4). Falhando nisso, ele persegue a mulher, a qual é a Igreja (12.13). Como seus auxiliares, o dragão emprega a besta que sai do mar (13.1-10), isto é, a perseguição anticristã (nos dias de João, concen­trada no império e no governo de Roma); a besta que sai da terra, isto é, a propaganda religiosa anticristã (nos dias de João, centrada na religião pagã e no culto ao imperador de Roma); e a grande meretriz, Babilônia, isto é, a sedução anticristã (nos dias de João, se espalhando a partir da cidade de Roma, que tentava satisfazer a luxúria da carne).[35] Seu propósito é o de destruir a Igreja. Mas será que essas forças do mal serão bem-sucedidas? Quem será o vitorioso, o dragão ou o Cordeiro? O capítulo 14 fornece a resposta: o Cordeiro se posta vitorioso sobre o Monte Sião, e com ele 144.000 santos! A dupla co­lheita, dos crentes e dos incrédulos (14.14ss.), nos leva de novo ao juízo final.

É de grande conforto para nós ler sobre a vitória de Cristo e de sua Igreja. Mas nós, naturalmente, nos perguntamos: o que acontece com o inimigo? Os capítulos 12-14 apresentam cinco inimigos da Igreja. Eles são os seguintes: 1. O próprio dragão; 2. A besta que surge do mar; 3. A besta que surge da terra, tam­bém chamada de o falso profeta; 4. A grande meretriz, Babilônia; 5. Os homens que têm a marca da besta (13.16; 16.2). Todos esses são juntamente derrotados. Quando Satanás é lançado no lago de fogo e enxofre, seus aliados são também ali lançados. Isso ocorrerá no dia do juízo final. Ainda assim, o fim de cada um desses cinco é descrito separadamente, exceto que as duas bestas são tomadas em conjunto (19.20).

Primeiro, o que recebe a visão nos mostra o que acontece àqueles que têm a marca da besta (capítulos 15, 16, especial­mente 16.2). Esses são os impenitentes de 9.21. (Para uma pro­va disso, ver capítulo 16.9, 11.)

Deve-se lembrar que a segunda questão deixada sem res­posta pela primeira divisão do livro é esta: o que acontecerá aos indivíduos impenitentes? Temos já observado a íntima conexão entre a seção sobre as taças de ira (capítulos 15, 16) e a seção sobre as trombetas de juízo (capítulos 8-11). As duas seções são exatamente paralelas, como demonstrado no capítulo 2.10 Ao mesmo tempo, essa seção sobre as taças de ira (capítulos 15, 16) é uma continuação direta daquela que imediatamente a precede; são aí apresentados os homens que têm a marca da besta e nos é dito o que acontece com eles.

Isso levanta a questão do que acontece quando as trombe­tas de julgamento de Cristo não resultam em penitência e em conversão. Permitirá, o Senhor do universo, que tal dureza de coração permaneça sem punição? A resposta, segundo os capí­tulos 15 e 16, é que, onde quer que seja na História do mundo, qualquer indivíduo que permaneça impenitente e se endureça contra as manifestações da manifestação inicial do desprazer de Deus por meio de juízos receberá, cedo ou tarde, o resultado final da ira divina. Quando as dez pragas não provocaram em Faraó a voluntária e alegre obediência, mas revelaram a sua dureza de coração, todo o exército do Egito foi afogado no Mar Vermelho {cf 15.2, 3). Porque estes da nova dispensação se endureceram a despeito de seus grandes privilégios e oportuni­dades, esse princípio do governo moral divino se faz evidente até sua manifestação culminante, alcançada no dia do juízo fi­nal. Esse é, em resumo, o significado das taças de ira (capítulos 15, 16). Tenha sempre em mente que trombetas advertem e que taças são derramadas.

O que dizer sobre os outros inimigos de Cristo e de sua Igreja? O dragão, as duas bestas e a grande meretriz são intro­duzidos nessa ordem (capítulos 12-14). A grande meretriz, as duas bestas e o dragão encontram sua condenação nessa ordem. Lembre-se, entretanto, o que já foi dito: eles são todos derro­tados ao mesmo tempo. Através da História do mundo, sem­pre que um cai, necessariamente todos caem. Sua derrota final tem lugar no dia do juízo. O assunto é, entretanto, tão vasto, os conceitos tão fortes e abrangentes, que aquele que tem a visão, em sua descrição do que acontece, mostra primeiro a queda da grande meretriz, depois a das duas bestas e, final­mente, a do dragão.

Assim, Apocalipse 17-19 descrevem a queda da Babilônia, a grande meretriz. É nos mostrado o inevitável, completo e terrí­vel caráter da queda de Babilônia, a resultante alegria nos céus e, finalmente, o autor dessa vitória sobre o mundo como centro de sedução. Cristo venceu (19.1 lss.).

A mesma seção também nos mostra a ruína das duas bes­tas (19.20). Agora resta apenas um inimigo cuja derrota final ainda não foi descrita, a saber, o dragão, o maior deles todos, seu líder e comandante, que foi apresentado primeiro. A seção final do livro (capítulos 20-22) descreve sua completa derrota. O dragão já está preso (20.2). Finalmente, no dia do juízo, ele será lançado no lago de fogo e enxofre para ser atormentado para todo o sempre.

E sobre os santos? As almas dos mártires já vivem e reinam com Cristo, o Vencedor, em tronos celestes. Depois do juízo final (20.11-15) esses santos reinarão para sempre (22.5) nos novos céus e na nova terra (21.1). O Cordeiro ocupa o trono (22.1, 3). Ele é vitorioso. Nós mesmos somos mais que vencedores.

V. O Todo Orgânico do Livro

Temos visto que esse livro é ura todo singular, belo e gra­dualmente desenvolvido. Cada seção do livro é exatamente o que deveria ser. O livro, sobretudo, descreve princípios de con­duta humana e de governo divino que são sempre operantes, e nessa mesma ordem. A Igreja funciona sempre como portadora da luz, brilhando no meio das trevas deste mundo (capítulos 1-3). Ela resplandece porque Cristo habita nela e, conseqüentemen­te, o mundo a persegue (capítulos 4-7) com o resultado inevitá­vel de juízos divinos de toda sorte sempre caindo sobre o mun­do, enquanto a Igreja se sai vitoriosa (capítulos 8-11). Esse con­flito entre a Igreja e o mundo revela sempre um conflito mais profundo entre Cristo e Satanás. Satanás sempre emprega os aliados mencionados nos capítulos 12-14. Eles sempre - e especialmente no dia do juízo - cairão derrotados. A vitória é sempre nossa! Nada há de mecânico, é claro, sobre essas sete seções. Elas não são sete "blocos de pensamento". Não se cons­tituem de sete compartimentos estanques. O livro é um organis­mo, cada parte vitalmente relacionada às outras. Assim, por exemplo, a queda de Babilônia é já anunciada em 14.8. Mas ela não é descrita até que alcancemos os capítulos 17-19. Do mesmo modo, a perseguição da Igreja pelo mundo e mesmo o julga­mento do mundo são pressupostos e apresentados na primeira seção (1.9, 13ss.). Mas o tema maior dessa seção é a Igreja habitada por Cristo brilhando no meio do mundo.

Os ensinos dessas sete seções, que revelam tal unidade glo­riosa e gradual desabrochar de pensamento, concordam com a Bíblia toda.

1. Capítulos 1-3. Cf. Mateus 28.20: "E eis que estou convosco todos os dias até a consumação do século". Mateus 5.14: "Vós sois a luz do mundo".

2. Capítulos 4-7. Cf João 16.33: "No mundo passais por aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o mundo".

3. Capítulos 8-11. Cf Lucas 18.7: "Não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite...?"

4. Capítulos 12-14. Cf Gênesis 3.15: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar".

5. Capítulos 1.5,16: Cf Romanos 2.5: "Mas, segundo atua dureza e coração impenitente, acumulas contra ti mesmo ira para o dia da ira e da revelação do justo juízo de Deus". Cf Êxodo 14.15.

6. Capítulos 17-19. Cf I João 2.17: "Ora, o mundo passa bem como a sua concupiscência..."

7. Capítulos 20-22. Cf Romanos 8.37: "Em todas estas coisas, porém, somos mais do que vencedores, por meio daquele que nos amou". Cf Judas 6.

 

Proposição III. O livro é uma unidade. Os princípios de conduta humana e de governo moral divino são progressivamente revelados; os candeeiros dão lugar aos selos, os selos às trombetas, etc.

 

 

Capítulo 7 - Ensino Progressivo em Relação ao Juízo Final

 

O livro do Apocalipse revela uma unidade orgânica interna. Ela nos informa sobre os princípios da conduta humana e do governo moral divino. Esses princípios são sempre evidentes em toda parte. O livro é plenamente atual hoje como foi no ano 100 A.D. Daqui a cinqüenta ou cem anos ele ainda será atual. E aplicável às condições das igrejas da Europa, da América, da Ásia, de cada continente.

Onde quer que haja uma Igreja, ela é um candeeiro, ou candelabro, a fim de que a luz de Cristo possa ser vista brilhan­do no meio das trevas (capítulos 1-3). Sempre que isso ocorre, o mundo odeia a Igreja; as trevas se recusam a se deixar vencer pela luz. Seguem-se perseguições; também provações de toda espécie (capítulos 4-7). Essas provações, entretanto, são deter­minadas para o bem da Igreja. O trono está sempre no céu, não na terra. Os crentes são sempre vitoriosos. Eles escapam da gran­de tribulação.

Onde e quando a Igreja é perseguida, o Senhor ouve as orações de seus filhos perseguidos e responde a eles. Ele vê o sangue dos santos mártires, e trombetas de julgamento adver­tem os iníquos (capítulos 8-11).

Esse conflito na superfície - entre a Igreja e o mundo -sempre indica um conflito mais profundo entre Cristo e o dra­gão (capítulos 12-14). Para o impenitente, taças de ira final sempre se seguem às trombetas de juízo (capítulos 15,16). Isso é verdade hoje, foi verdade ontem e será verdade amanhã, quer na África, Europa ou América. Satanás e seus auxiliares sem­pre, por enquanto, parecerão vitoriosos, mas na realidade, serão sempre derrotados (capítulos 17-19; também 20-22).

Assim interpretado - e estamos convencidos de que esta é a única explicação defensável - o Apocalipse é realmente muito simples. É simples e, ainda assim, profundo. Oferece-nos a real filosofia da História. Mostra-nos os princípios da conduta humana e da satânica, e do governo moral divino tal como constantemente revelam-se a si mesmos. Indica como devemos interpretar as notícias dos jornais e os eventos que estudamos nos livros de História.

Vimos que, através da História do mundo, taças de ira sem­pre se seguiram a trombetas de juízo ainda que estas passassem despercebidas. A ordem nunca é reversa.[36] Trombetas advertem. Taças são derramadas. No juízo final, sobretudo, essas taças de ira serão completamente esvaziadas sobre os pecadores impe­nitentes e endurecidos. Igualmente, a "Babilônia" cairá sempre que os reinos deste mundo - quer Babilônia, quer Assíria ou Roma - colapsem. A grande queda final de Babilônia ocorrerá em conexão com a segunda vinda de Cristo para julgar o mundo.

Visto isso, observamos que as seções finais do Apocalipse, ainda que sincrônicas com as demais seções e aplicáveis a todo o curso da História, descrevem, especialmente, o que acontecerá em conexão com o juízo final.

Assim, ainda que todas as seções do Apocalipse corram paralelas e cubram o período entre a primeira e a segunda vinda de Cristo, e estejam fundadas no solo da antiga dispensação, ainda assim há um grau de progresso. Quanto mais nos aproxi­mamos do fim do livro, mais nossa atenção é dirigida para o juízo final e para o que está além dele. As sete seções são arran­jadas em ordem crescente e climática. O livro revela um pro­gresso gradual na ênfase escatológica.[37]

Um exame cuidadoso do Apocalipse tornará isso claro. Na primeira série - Cristo no meio dos sete candeeiros de ouro -não temos mais do que um simples anúncio da volta de Cristo para juízo (1.7). Não há descrição do juízo. Na segunda seção (capítulos 4-7), o juízo final não é só mencionado, mas defini­tivamente apresentado; captamos um instante do horror que enche os ímpios quando vêem o Juiz que se aproxima deles (6.12ss.). Mas isso é tudo. Não há descrição aí. Uns poucos ver­sos são dedicados à descrição da Igreja triunfante depois do juízo final (7.9ss.). A visão seguinte, igualmente (capítulos 8-11), apresenta o juízo final e a glória dos redimidos (11.15ss.).

Nessas três seções que compreendem a primeira divisão principal do livro (capítulos 1-11), não encontramos mais do que um simples anúncio ou introdução do juízo final. Mas, tão logo entramos na segunda divisão principal do livro, há uma mudança. Na primeira seção dessa divisão principal temos uma descrição real do juízo final (14.14ss.). E, contudo, uma repre­sentação simbólica. Sob o simbolismo de uma dupla colheita o juízo final nos é retratado. A visão seguinte (capítulos 15, 16) descreve o derramamento final da ira de Deus, de modo que essa seção, ainda que sincrônica com as demais, é, num senti­do especial, uma descrição do juízo final. Na divisão menor seguinte, a queda da Babilônia (capítulos 17-19), essa ênfase sobre a segunda volta de Cristo para juízo e seu significado para o mundo e para a Igreja, tanto militante quanto triunfante, é ainda maior. (Ver, especialmente, 19.11, 12.) A sétima seção, a final (capítulos 20-22) não apenas descreve o juízo final, como, nessa descrição, abandona muito do simbolismo das primeiras visões. Nada é vago ou indefinido e pouco é revestido de sim­bolismo (20.12ss.). A alegria dos redimidos no novo céu e na nova terra é descrita mais circunstancialmente do que, por exem­plo, em 7.9ss. O livro chega ao seu glorioso clímax.

A essa concepção do livro demos o nome de "paralelismo progressivo".

 

Proposição IV. As sete seções do Apocalipse são organizadas em ordem climática crescente. Há progresso na ênfase escatológica. O juízo final é, primeiramente, anunciado, depois, apresentado e, finalmente, descrito. Igualmente, o novo céu e a nova terra são descritos mais plenamente na seção final do que nas precedentes.

 

 

Capítulo 7  - Simbolismo no Livro

 

O livro do Apocalipse é uma série de figuras. As figuras se movem. São cheias de ação. Tudo é constantemente ativo. Uma figura dá lugar à outra; e depois à outra, e à outra mais. Obser­vemos essas cenas em constante movimento.

Aqui temos sete candeeiros de ouro com alguém andando no meio deles. Ele veste uma túnica com um cinto dourado so­bre o peito. Seu cabelo é branco como a neve, e seus olhos fla­mejam como fogo. Segura em sua mão direita sete estrelas, e de sua boca sai uma espada afiada de dois gumes. A cena muda. Vemos um trono circundado de glória. Do trono saem relâmpa­gos como de raio, estrondos e estrépitos de trovões. Na mão direita do Senhor assentado no trono há um rolo, selado com sete selos. Agora alguém se aproxima do trono, o qual é apre­sentado como o Leão da tribo de Judá. Ele toma o rolo. Imediata­mente, quatro seres viventes cercam o trono, assim como tam­bém 24 anciãos que se prostram diante do Cordeiro. Cada um tem uma harpa e taças de ouro cheias de incenso, e cantam um cântico novo. Quando cessa a música, vemos quatro cavalos: branco, vermelho, negro e amarelo. A medida que os cavalos e seus cavaleiros saem afora, vemos pessoas se matando umas às outras. Alguns parecem famintos; na verdade, morrendo de fome.

Outros são lançados às feras. Vemos, agora, a alma de pessoas que foram mortas. Em alta voz elas choram aos pés do altar. Mas, então, o sol se torna negro como um saco de carvão. A lua cheia se torna cor de sangue. As estrelas do céu caem sobre a terra. O céu se enrola como um pergaminho. Cada monte e cada ilha está sendo desalojada de seu lugar. Pessoas - incluindo reis, nobres, altos dignitários, ricos e pobres - se escondem em cavernas e sob pedras. Quatro anjos estão detendo os quatro ventos para que ainda não danifiquem qualquer coisa na terra ou no mar. Agora, 144.000 pessoas são marcadas com um selo, e uma grande multidão que ninguém pode contar, pessoas de cada nacionalidade e região da terra, com ramos de palmas nas mãos, aparecem e gritam com altas vozes: "Ao nosso Deus que se assenta no trono, e ao Cordeiro, pertence a salvação".

Sete anjos com sete trombetas aparecem agora. Outro anjo está ocupado com a tarefa de oferecer incenso. Então o incensário é cheio de fogo. É esvaziado sobre a terra. Isso é seguido por ribombar de trovões e relâmpagos e um terremoto.

O livro todo consiste de cenas que mudam como essas, de figuras em movimento e de símbolos ativos.[38] Além disso, há sons, vozes, músicas, responsos, coros (cf. 4.8, 11; 5.9, 10, 12, 13, 14; 11.15-18; 12.10; 15.3, 4; 19.1-8; 22.17).[39] É como uma magnífica apresentação cinematográfica com som estereofónico.

I. A Necessidade de Se Concentrar no Tema Central

Uma questão, porém, se apresenta: o que significam essas figuras? Como as interpretaremos? A fim de responder essa questão, façamos um pequeno rodeio.

Você deve se lembrar, sem dúvida, da parábola do Bom Samaritano, em Lucas 10. Há quem interprete essa bela história da seguinte maneira: "o homem que está indo de Jerusalém a Jericó representa Adão, o cabeça da raça humana. Ele deixou a cidade celestial e está indo para a cidade terrena, a cidade profana. Porém, havendo direcionado seus desejos para a terra, ele cai nas mãos de salteadores, isto é, ele é vencido por Satanás e seus anjos. Esses salteadores o despojam das vestes de sua retidão original. Também o agridem, deixando-o ferido, semi­morto (semimorto em pecados e transgressões!). O sacerdote e o levita representam a lei e os sacrifícios. Eles não podem sal­var o pecador. Não têm poder para salvar. Mas o Bom Samaritano, a saber, Jesus Cristo, está caminhando naquela di­reção e ajuda o pobre pecador. Esse Bom Samaritano unge suas feridas com o óleo do Espírito Santo e com vinho, isto é, com o sangue de sua paixão. Depois, coloca o pobre homem sobre sua mula, ou seja, sobre os méritos de sua própria justiça. Leva o pobre homem a uma estalagem, que é a Igreja. No dia seguinte, o Bom Samaritano dá ao hoteleiro dois dinheiros, quer dizer, a Palavra e os Sacramentos, para que com isso ele providenciasse para suprir as necessidades do pobre pecador. Então, parte o Bom Samaritano, mas promete retornar".

Agora, se o leitor tem esse tipo de mentalidade, que se agra­da de tais explicações espiritualizadas, poderá bem fechar este livro. Jamais entenderá realmente as parábolas do Senhor. Nem jamais se habilitará a entender o livro do Apocalipse. Devemos enfatizar o fato de que essas explicações dadas sobre o Bom Samaritano são erradas do começo ao fim. E totalmente errado perguntar o que significa o pobre homem caído nas mãos de salteadores, o que significam os salteadores, o sacerdote, o levita, o bom samaritano, o vinho, o óleo, a mula, a hospedaria e os dois dinheiros. Nenhuma dessas coisas tem qualquer signi­ficado "espiritual" profundo. Se a mula deve ser espiritualizada, quem iria determinar exatamente seu significado? E os doisdinheiros? Representam eles os dois sacramentos, os sacramen­tos e a Palavra, ou os dois testamentos? Quem determinaria isso? O contexto no qual a parábola ocorre nada diz sobre isso, e porque o contexto nada diz, também nós nada devemos dizer.

Certamente, todos esses elementos da parábola, o vinho, o óleo, o sacerdote, o levita, a hospedaria, os dois dinheiros, etc, têm seu valor, pois sem eles a parábola não estaria completa e não comunicaria um significado. Mas não podemos atribuir sig­nificados espirituais separados para cada um desses elementos. Eles servem, simplesmente, para tornar a parábola completa. Portanto, uma vez que se tenha lido a parábola toda, dever-se-ia perguntar: Qual o significado dessa parábola tomada em seu todo?[40] Cada parábola ensina um lição central. Um pequeno es­tudo do contexto geralmente torna essa lição central perfeita­mente clara. À luz de Lucas 10.25-29, e também dos versos 36, 37, vemos que o significado dessa bela história é que, em vez de perguntar: Quem é meu próximo?, deveríamos ser o próxi­mo de qualquer pessoa que Deus coloque em nosso caminho.

II. A Necessidade de Distinguir entre o Principal e o Detalhe

Algo semelhante confirma isso com respeito aos símbolos do Apocalipse. Não se pode iniciar enfatizando os detalhes. Não se pode perguntar, no símbolo dos gafanhotos que surgem do abismo (9.1-11), qual o significado separado de seus pêlos, dentes, peitorais, etc. Não se pode colocar o símbolo à parte e perder a unidade. Esses detalhes pertencem ao quadro, tal como a mula, o vinho, o óleo, etc. pertencem à parábola do Bom Samaritano. Dever-se-ia perguntar, primeiro: o que é o quadro tomado em seu todo? Segundo: Qual é o significado central do quadro?[41]

Como norma,[42] os detalhes pertencem à figura, ao símbolo. Não podemos tentar dar uma interpretação "mais profunda" aos detalhes, a menos que a interpretação desses detalhes seja ne­cessária para ressaltar o pleno sentido da idéia central do sím­bolo. Assim, no símbolo da nova Jerusalém (capítulos 21, 22), a idéia central é a comunhão perfeita com Deus. Os detalhes -muros, fundações, portões, rios, etc. - descrevem o caráter glo­rioso da sua comunhão. O que buscamos é a impressão geral, a idéia central, de cada símbolo completo. Como nas parábolas, assim aqui, o contexto ajuda a explicar o significado da figura, e um estudo exaustivo dos detalhes faz-se também necessário a fim de determinar o sentido do pensamento central.

Isso nos leva à seguinte proposição.

 

Proposição V. A estrutura do livro consiste de figuras móveis. Os detalhes que pertencem à figura deveriam ser interpretados em harmonia com o pensamento central. Deveríamos fazer duas perguntas. Primeiro: o que é a figura toda? Segundo: qual é a ideia predominante?

 

 

III. O Que Significam os Símbolos?

Tendo estabelecido isso, surge, imediatamente, outra ques­tão. Tendo como certo que devemos interpretar os símbolos em seu todo e os detalhes em harmonia com o todo, o que signifi­cam os símbolos? Referem-se a um evento específico na Histó­ria, um acontecimento em particular, um detalhe cronológico, uma data importante, ou o quê?

Nesse contexto, é bom distinguir entre dois tipos de sím­bolos. Há símbolos que descrevem o princípio ou o fim do cur­so da nova dispensação. Há símbolos, como fica evidente no contexto, que, geralmente, se referem a um evento específico. Assim, por exemplo, a radiante mulher dando à luz o Filho, um "filho varão", refere-se à Igreja produzindo o Cristo, sua natu­reza humana (12.1-5). Igualmente, a dupla colheita (14.15ss.) refere-se ao juízo final, àquele grande evento.

Há, porém, outros símbolos, a saber, aqueles que parecem estar intercalados entre a primeira e a segunda volta de Cristo. Estamos pensando em símbolos como os dos candeeiros, dos selos, das trombetas, das taças, etc. Referem-se, esses símbo­los, a eventos específicos, acontecimentos singulares, datas ou pessoas na História? Pois se é assim, então podemos admitir ser impossível para nós interpretá-los.[43]

Por que, quem está apto a selecionar a data, o evento, ou pessoa certa, previstos num dado símbolo, entre as milhares de datas, eventos e pessoas da História que portam alguma seme­lhança com o símbolo em questão? Isso resulta em confusão. Obtemos milhares de "interpretações", mas nenhuma certeza. E o Apocalipse permanece um livro fechado.

Não cremos, porém, que seja um livro fechado. Cremos, plenamente, que seja uma revelação, um desvendamento. Assim, devemos buscar uma outra norma de interpretação.

Mantemos que essa norma, longe de ser superposta aos sim-bolos, deriva-se deles. E com base nesses próprios símbolos, como descritos no Apocalipse, que chegamos à conclusão significante, isto é, que os selos, as trombetas, as taças e figuras semelhantes, não se referem a eventos específicos ou detalhes históricos, mas a princípios operantes através da História do mundo, especialmente ao longo da nova dispensação.

Submetamos algumas evidências em defesa dessa impor­tante regra de interpretação. Observe, antes de tudo, que a esfe­ra na qual esses selos, trombetas e taças operam é muito exten­sa. Esses símbolos afetam, respectivamente, a quarta parte da terra; a terça parte da terra, mar, árvores; toda a terra, o mar, etc. (Ver capítulos 6, 8 e 9, 16.) Dificilmente isso seria verdadeiro se cada selo, trombeta ou taça se referisse a um evento singular na História, um evento que tivesse lugar numa certa data espe­cífica, numa específica localidade. Mas se, por outro lado, con­siderarmos os símbolos como indicativos de toda uma série de acontecimentos, do começo ao fim da nova dispensação, essas descrições da esfera em que o símbolo opera começam a ter significado. Assim, como exemplo, podemos entender a ex­pressão "uma como que grande montanha ardendo em chamas foi atirada ao mar", como representando todos os desastres ma­rítimos ao longo da dispensação.

De novo, esses símbolos afetam não apenas um muito limi­tado grupo de pessoas, mas uma multidão que não pode ser con­tada. As trombetas, por exemplo, afetam a humanidade. Elas não se referem a apenas um grupo de pessoas que vivam na Europa que por acaso tenham uma querela com o Papa. Leia 9.20: "Os outros homens, que não foram mortos por esses flagelos...". A descrição é até mais geral do que isso, pois esses símbolos pare­cem afetar não só os não-regenerados de uma época, mas tam­bém de gerações passadas. Observe 16.6: "...porquanto derrama­ram o sangue de santos e de profetas...". Não podemos escapar à impressão, portanto, de que os símbolos se referem a séries de acontecimentos, a princípios de condutas humana e satânica, e do governo moral divino. Referem-se a coisas que acontecem repetidas vezes, de modo que o livro do Apocalipse é sempre atual. Os símbolos descrevem princípios de conduta e de gover­no moral divino em evidência tanto hoje como no século l9 A.D.

Prosseguindo nessa relação, não nos esqueçamos de que cada uma dessas séries - quer candeeiros, quer selos, quer trom­betas, quer taças - parecem perpassar o longo período que co­meça com a primeira vinda e termina com a segunda vinda de nosso Salvador.7 Isso parece se harmonizar melhor, também, com a idéia de que os símbolos indicam sempre princípios operativos, do que com a teoria de que significam aconteci­mentos isolados e singulares na Europa.

Não devemos falhar, também, em observar que os símbo­los, geralmente, vêm em grupos de sete. O número sete ocorre 54 vezes. O livro é dirigido às sete igrejas, representadas por sete candeeiros. Há sete estrelas simbolizando sete anjos das igrejas. Há sete espíritos de Deus representado pelas sete lâm­padas. Além disso, há sete selos e um Cordeiro com sete olhos e sete chifres. Sete anjos tocam sete trombetas. Outros sete an­jos derramam o conteúdo de sete taças cheias de sete pragas finais. Sete trovões rumorejam vozes. A besta que surge do mar tem sete cabeças. Há sete montanhas, sete reis e assim por diante.8 Esse número sete indica plenitude, algo completo, per­feito. Harmoniza-se muito bem com a idéia de que os símbolos se referem a princípios de conduta e de governo moral divino, sempre operantes, especialmente através de toda a dispensação.

Nossa palavra final sobre a evidência é, talvez, a mais con­clusiva. Devemos ter sempre em mente que o propósito de Deus e daquele que teve a visão é tornar o homem sábio para a salva­ção. O livro tem um propósito ético e um propósito espiritual. Se esses símbolos indicassem e predissessem, meramente, even­tos futuros e isolados, isso satisfaria a curiosidade de algumas pessoas, mas, dificilmente, poder-se-ia dizer que pessoas ti­vessem sido edificadas. Por outro lado, se cremos que o livro revela os princípios de governo moral divino, sempre operantes qualquer que seja a época em que vivamos, poderemos ver a mão de Deus na História, e seu braço poderoso protegendo-nos e dando-nos a vitória por meio de nosso Senhor Jesus Cristo - e assim, só assim, seremos edificados e consolados.9

Tudo isso pode ser resumido em nossa próxima proposição.

 

Proposição VI. Selos, trombetas, taças de ira e símbolos semelhantes referem-se não a eventos específicos, acontecimentos singulares, ou detalhes históricos, mas a princípios – de conduta e de governo moral divino – que são operantes através da História do mundo, especialmente ao longo da nova dispensação.

 

 

Capítulo 7 - Pano de Fundo e Base para Interpretação

O Apocalipse é baseado, nas Sagradas Escrituras, em aconte­cimentos contemporâneos, os quais João e seus leitores conhe­ciam bem, e em direta e especial revelação da mente e dos pro­pósitos de Deus. Tudo isso precisa ser cuidadosamente consi­derado e corretamente interpretado.

I. A Necessidade de Observar o Pano de Fundo Contemporâneo

 

Jamais conseguiremos entender o livro do Apocalipse a menos que o interpretemos à luz dos eventos contemporâneos à sua escrita. Devemos sempre perguntar: como os primeiros lei­tores entenderam o livro? Devemos fazer uma tentativa honesta de apreciar as condições e circunstâncias das quais surgiram as profecias. O Apocalipse tem o propósito imediato de fortalecer o coração hesitante dos crentes perseguidos no século l9 A.D.1 Portanto, cada parágrafo dessa gloriosa profecia está repleto de significado, instrução e conforto para as sete igrejas da Ásia proconsular. Esse livro é uma resposta à necessidade gritante de um dia especial, e devemos permitir que circunstâncias con­temporâneas lancem luz sobre seus símbolos e predições. Na verdade, esse livro tem uma mensagem para hoje, mas jamais seremos capazes de entender "o que o Espírito diz às igrejas" de hoje, a menos que, primeiro, estudemos as necessidades e circunstâncias específicas das sete igrejas da "Ásia" tal como elas existiam no século l9 A.D.

Descobrimos, então, que o Apocalipse está repleto de re­ferências a eventos e circunstâncias contemporâneas. Os cren­tes estavam sendo severa e duramente perseguidos. Seu sangue estava sendo derramado (6.10; 7.14; 16.6; 17.6; 19.2). Alguns estavam presos em sombrios calabouços, ou viviam sob essa ameaça (6.8; 7.16). Alguns foram lançados às feras (6.8). Muitos foram decapitados (20.4). Em Pérgamo, Antipas foi morto (2.13). João havia sido banido para a ilha de Patmos (1.9). O governo romano estimulava a perseguição; seu imperador cultuado inspirou uma falsa religião; sua capital era o centro de lascívia (13.7, 15; 17.18). Falsos mestres e seitas atribulavam as igrejas (2.2, 14, 20, 24). Não obstante, verdadeiros crentes faziam a luz de Cristo brilhar nas trevas da superstição e da descrença. Filadélfia mantinha uma "porta aberta" (3.8).

Todas essas coisas eram reais; eram fatos - muitos dos quais fatos duros - para a Igreja daqueles dias e época. Esses crentes não estavam, primariamente, interessados em grandes eventos nos séculos futuros, tanto quanto no conflito entre luz e trevas, entre a Igreja e o mundo, entre Cristo e o dragão, entre a verda­de e o erro, que eles combatiam em seu próprio tempo. O Apocalipse é uma resposta às necessidades gritantes dos cren­tes perseguidos, feridos e afligidos.[44]

Isso não significa que aquele que tinha a visão se limitava a coisas dentro de seu mesmo horizonte histórico. Devemos nos lembrar de que o real autor do livro não é o apóstolo João, mas o próprio Deus Onisciente. Como temos provado abundante­mente, esse livro perpassa toda a dispensação e se presta a nós assim como aos crentes do século l9 A.D. Mas foi ocasionado pelas necessidades e pelos sofrimentos dos cristãos no século l9 A.D. Está, definitivamente, fundado em eventos e circuns­tâncias contemporâneas e deve ser interpretado em harmonia com eles. De fato, ele fala de forças constantemente operantes na História do mundo - por exemplo, a besta -, mas discute isso em termos que são expressivos para a forma contemporânea nas quais essas forças se manifestavam - por exemplo, Roma. Podemos resumir isso como se segue:

Proposição VII. O apocalipse está fundado nos eventos e circunstâncias contemporâneos. Seus símbolos devem ser interpretados à luz das condições que prevaleciam  quando o livro foi escrito.

 

II. A Necessidade de Ter em Vista o Contexto Geral da Escritura

Devemos interpretar esse livro à luz do seu pano de fundo. É estranho, entretanto, que os mesmos intérpretes que insistem fortemente nisso, falham em fazer plena justiça a esse prin­cípio.[45] Eles, ao que parece, vêem apenas a superfície do solo: eventos e circunstâncias contemporâneos. Mas há também um subsolo. O Apocalipse está firmemente arraigado ao subsolo! Referimo-nos às Sagradas Escrituras. A mente daquele que tinha a visão estava imersa nessas Escrituras. Ele as conhecia de sobejo. Ele as Vivia. Estavam guardadas no seu coração. Afirmamos, assim, que o Apocalipse está fundado não apenas na superfície do solo dos eventos e circunstâncias contemporâ­neos, mas, também, e especialmente, no subsolo das Sagradas

Escrituras. Certamente, os eventos de específicos dias e época em que o apóstolo vivia determinaram, até certo ponto, o mol­de em que essa profecia foi fundida. Não obstante, eles não podem ser comparados com épocas da História com as quais o apóstolo não tinha familiaridade. Devemos explicar esse livro não somente à luz de eventos externos, mas também de toda a herança religiosa reverenciada por crentes que viviam quando essas visões estavam sendo grafadas.

Vejamos um exemplo marcante. Quando estudamos Apocalipse 13.1-10, notamos, imediatamente, que seu simbo­lismo estava baseado em Daniel 7.2-8. Em ambos os casos os mesmos animais são mencionados, ainda que em Daniel eles ocorram separadamente, enquanto, em Apocalipse, eles são com­binados. Assim, o último nos oferece uma figura composta da besta. E "como um leopardo, com pés como de urso, e boca como boca de leão...". Em Daniel, estas bestas - leão, urso, leopardo e "anônimo" - indicam não reis, mas reinos, impérios que surgem em oposição ao povo de Deus. Referem-se ao po­der mundial em quatro fases sucessivas de manifestação. As­sim, o que é mais lógico do que inferir que a besta composta do Apocalipse também não tenha o mesmo significado e se refira ao poder anticristão, aos movimentos de perseguição anticristã em sucessivas fases e incorporações? A respeito dessa besta, nós le­mos que cinco de suas cabeças estavam caídas quando o apóstolo recebeu a visão. Uma ergueu-se por si naquela hora, a saber, a sexta. A outra ainda não tinha chegado (17.10). Não fica claro, agora, na base de uma comparação com o livro de Daniel, que as cabeças da besta composta do Apocalipse devam indicar impérios nos quais o poder perseguidor da Igreja sucessivamente se in­corpora? Por exemplo, a antiga Babilônia, a Assíria, o império grego-macedônico e Roma. Ainda assim, muitos intérpretes, que insistem em explicar o Apocalipse à luz do pano de fundo con­temporâneo, consideram essas cabeças como representando governantes individuais, como Júlio César, Augusto, Tibério, Calígula, Cláudio e Nero. Esses intérpretes não levam em conta, suficientemente, a base veterotestamentária do Apocalipse. Vêem a superfície do solo da História contemporânea. Esquecem-se de que existe um subsolo, isto é, as Sagradas Escrituras.

Deixemos que a Escritura interprete a própria Escritura.

Primeiro, e antes de tudo, devemos fazer justiça ao contex­to imediato no qual a passagem ocorre. Isso é, geralmente, es­quecido. Mas, a menos que interpretemos os diversos símbolos em harmonia com o contexto no qual ele ocorre, jamais vere­mos a maravilhosa unidade orgânica que caracteriza o livro. Perderemos o "fio" da discussão.

Uma vez que o contexto tenha sido definitivamente deter­minado e recebido a atenção devida, as passagens paralelas devem ser consultadas. Primeiro, e mais importante, as parale­las que ocorrem no próprio Apocalipse. Quando, por exemplo, interpretamos Apocalipse 20 à luz do seu, em certos aspectos, paralelo, Apocalipse 12, o significado se torna muito mais claro. A questão referente à prisão do diabo não será tão difícil de se responder.4

Há passagens paralelas, também, que ocorrem em outros livros do Novo Testamento. Algumas delas, encontradas no Evangelho de João, já foram mencionadas.5 Outras estão nos Sinóticos. Entre as mais marcantes passagens paralelas do Novo Testamento estão as seguintes:

Ap 1.3

Mt 24.6; Lc21.9

Ap 12.9

Lc 10.18

Ap 1.5

Cl 1.18

Ap 13.8

IPe 1.19,20

Ap 1.7

Mt 24.30

Ap 16.19

1 Pe5.13

Ap 1.16

Mtl7.2

Ap 17.14

1 Tm 6.15

Ap 2.10

Tgl.12

Ap 18.4

2 Co 6.17;

Ap 2.20-24

At 15.28

 

Ef 5.11

Ap3.3

Mt 24.42

Ap 18.24

Lc 11.50

Ap3.5

Mt 10.32

Ap 21.4,5

2 Co 5.17

Ap6

Mt 24; Lc 21

Ap 22.21

Ef 6.24

Finalmente, o Apocalipse está imerso nos pensamentos e figuras do Antigo Testamento.6 Mencionemos apenas algumas passagens que, ao menos quanto à forma, seguem padrões e se baseiam no que encontramos no Antigo Testamento.

 

APOCALIPSE'

ANTIGO TESTAMENTO

Capítulo I

 A. descrição do Filho do homem                 

Dn7.9ss.; 10.5,6; Ez l.7,26ss.; 43.2

Capítulo 2

 

Note expressões como "árvore da vida", "paraíso de Deus", "Balaão" e "Balaque", "Jezabel", "vara de ferro".

Capítulo 3

0 livro da vida. A chave de Davi.

Êx 32.33; SI 69.28; Ml 3.16 Is 22.22

Capítulo 4

Um trono no céu.

Os:quatro seres viventes

Is 6.1; Ez 1.26,28

EzT.10; 10.14

Capítulo 5 '

O rolo.

0 Leão da tribo de Judá.

Ez 2.9; Zc 5.1-3.,

Gn 49.9; Is. 11.10

Capítulo 6 " .

Os cavalos e seus cavaleiros.

SI 45.3,4; Zc 1.8; 6.3

Capítulo 7".

Servos de Deus selados na

fronte.. .

A bênção dos redimidos.

Ez9,4      

 

Is49.10;25.8;Jr20.13;3L16; Ez 34.23  

Capítulos 8, 9

As trombetas de juízo.

Ex 7ss.: as pragas: ''

Capítulo10

0 testemunho juramentado do anjo

0 livro pequeno

Dn 12.7

Ez 2.9;33 1

Capítulo ll

Aivara de medida..

As duas testemunhas.

Iz40.3;Zc2.1ss.

Zc 4.2ss.

Capitulo 12 .

Amulher, o filho e o dragão,

O anjo Miguel   

Gn 3.15

Dn. 10.13, 21; 12.1

Capítulo 13

A besta que surge do mar.

Jn 2.31; 7.3

Capítulo 14   

A nuvem branca, o filho do homem

O lagar

Dt 7:13, 10:16

Iz 63:3

Capítulo 15    

O cântico da Moisés

Ex 15

Capítulo 16

Armagedom

Jz 5: 2 Cr 35

Capítulo 17-19

A queda da Babilônia

 

 

0 convite aos pássaros

Is 13; 14;21;46;47;48;Jr25; 50:51; Dn 2; 7; Hb 3; compare tambemEz 27, a queda deTiro:

 

Ez 39.17-20   

Capitulo 20

Gogue e Magogue

Os livros do juizo

Gn 10:2, Ez 38.39

Dn 7:10, 12:1, Sl 69:28

Capitulo 21

Novos ceu e nova terra

Nova jerusalem

Is 65:17ss, 66:22ss

Ez 48:30ss

Capítulo 22

O rio da águas da vida e a arvore da vida

Gn 2, Ez 47:1-12

       

           

Isso é apenas um começo. Westcott e Hort[46] oferecem cerca de quatrocentas referências ou alusões ao Antigo Testamento, e um estudo intensivo de cada capítulo do Apocalipse logo revela que essa lista de quatrocentas referências ainda é incompleta.

É sobre a base dessas Sagradas Escrituras que devemos interpretar o Apocalipse. Não obstante, devemos ser cuidado­sos: aquele que teve a visão não foi um copista. Ele recebeu visões. Certamente, essas visões são de tal caráter que podem ser recebidas por um apóstolo de Cristo cuja mente e consciên­cia moral estão saturadas com os ensinos do Antigo Testa­mento. João, no entanto, está registrando o que ele vê e ouve. Os ensinamentos do Antigo Testamento, sobretudo, são, fre­qüentemente, colocados em novos moldes e adquirem um sen­tido ligeiramente diferente no Apocalipse Se isso é verda­deiro ou não num certo caso, é determinado pelo contexto imediato.[47]

Ao enfatizar essa base das visões do Apocalipse no subsolo das Sagradas Escrituras, devemos sempre ter em mente que é

sábio começar do mais claro para o mais obscuro e nunca vice-versa.9 Isso tem sido, com freqüência, esquecido. Se uma passa­gem que é, em si mesma, obscura é assim apreendida, por exem­plo, Apocalipse 20.2, é-lhe dada uma interpretação mais literal. Então - para completar o clímax - todas as passagens nas mais didáticas porções da Escritura são distorcidas de tal modo que concordarão com o sentido que o "intérprete" dá à passagem obscura.

O resultado é que obtemos muitas boas novidades, isto é, dados de informação que não são claramente derivadas do corre­to ensino das Escrituras. Um método sadio de interpretação se esforçará por esclarecer tais novidades. O método histórico de interpretação fornece milhares de exemplos de advertência. Mesmo paralelistas que têm escrito excelentes comentários, nem sempre os têm evitado.10

Isso nos leva à nossa oitava proposição formulada como se segue:

 

 

 

 Proposição VIII. O Apocalipse é fundado nas Sagradas Escrituras. Deveria ser interpretado em harmonia com os ensinamentos de toda a Bíblia.

 

 

III. A Origem do Livro na Mente de Deus

O Apocalipse é baseado em circunstâncias contemporâneas e fundado nas Sagradas Escrituras. Numa análise final ele é enraizado na revelação especial e direta de Deus. Sua origem está na mente de Deus. Deus preparou e formou a alma do apóstolo João para que ele fosse capaz de receber essa gloriosa profecia. Deus lhe deu a visão. O Deus que inspirou todos os escritos sacros para que eles fossem todos "soprados por Deus", é também o autor do Apocalipse.

 

Proposição IX. O apocalipse é fundado na mente e na revelação de Deus. Deus em Cristo é o autor real e este livro tem o propósito de Deus concernente à História da Igreja.

.

 

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 1 O Filho do Homem

1. A introdução (versos 1-3)

O primeiro capítulo do Apocalipse consiste de sete partes facil­mente reconhecíveis. A introdução cobre os três primeiros versos. Contém o título do livro, uma declaração de sua origem, e a primeira bem-aventurança. O título do livro é: "O Apocalipse [revelação] de Jesus Cristo". E uma revelação ou desvendamento do plano de Deus para a História do mundo, especialmente da Igreja. É, portanto, uma comunicação direta de Deus e não pro­vinda de qualquer fonte humana.[48] E chamado de Apocalipse de Jesus Cristo porque Jesus Cristo mostrou-o a João e, por meio dele, à Igreja.

Observe as diversas ligações na cadeia de origem e comu­nicação. Primeiro, Deus. Lemos: "...que Deus lhe deu...".[49] Foi Deus, que tão altamente exaltou o Mediador e lhe entregou ogoverno do mundo no interesse da Igreja (1 Co 15.24-28; Fp 2.9). Deus deu, também, ao Mediador o plano para a História do mundo e da Igreja (Ap 5.1,7). Deu-lhe esse plano a fim de que ele pudesse fazê-lo conhecido, em seus princípios gerais, aos seus servos. Esse plano diz respeito às coisas que em breve devem acontecer. E elas, de pronto, começam a acontecer.[50]

Em segundo lugar, há Jesus Cristo. Essa não é uma revela­ção de João. É a Revelação de Jesus Cristo. Ele revela esse plano à sua Igreja e, como Mediador entronizado em glória, causa sua realização na História. Ele reina nas alturas.

Terceiro, há seu anjo. Jesus comissiona um anjo para guiar e para demonstrar a João, por meio de visões, os elementos do pla­no a ser revelado. Esse guia angélico mostra a João a visão do céu; depois, da terra, do deserto e do novo céu e da nova terra.

Quarto, existe seu servo, João. Refere-se ao apóstolo João.[51]João não encobre essas visões. Ele atesta "a palavra de Deus e o testemunho de Jesus Cristo, quanto a tudo o que viu".[52]

Quinto, há o ouvinte ou leitor: "Bem-aventurados aqueles que lêem". Os livros tinham de ser copiados à mão, sendo, por­tanto, poucos em número e bastante caros. Além disso, muitos cristãos não sabiam ler. Assim, um leitor era indicado para pro­ceder a leitura diante do povo reunido para o culto. O leitor que lia com coração confiante é declarado bem-aventurado. Essa é a primeira de sete bem-aventuranças.[53]

Sexto, há aqueles que lêem e guardam as palavras da pro­fecia. Todos os crentes que lêem e estudam esse livro com a atitude apropriada são declarados bem-aventurados. Lembre-se de que o tempo está próximo; a predição começa, imediata­mente, a ser cumprida.

2. A saudação e a adoração (versos 4-6)

O livro é endereçado às "sete igrejas que se encontram na Ásia". Essas igrejas são mencionadas no verso 11. Estavam lo-calizadas na província romana proconsular da Asia, isto é, na parte oriental da Ásia Menor. As sete, começando com Éfeso, a mais próxima - e, talvez, a mais amada - de João, em Patmos, depois, seguindo para o norte, para Esmirna e Pérgamo, então para o sudeste, para Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodicéia, for­mavam um círculo irregular. É de grande ajuda, a esta altura, consultar um mapa bíblico. Essas sete igrejas representam a totalidade da Igreja através desta presente dispensação.[54]

Observe a forma peculiar e bela da saudação: "Graça e paz a vós outros da parte daquele que é, que era e que há de vir". Graça é o favor de Deus dado àqueles que não o merecem, per­doando seus pecados e conferindo-lhes a vida eterna. Paz, o reflexo do sorriso de Deus no coração do crente reconciliado com Deus por meio de Jesus Cristo, é o resultado dessa graça. Graça e paz são providas pelo Pai, dispensadas pelo Espírito Santo e a nós atribuídas pelos méritos do Filho. Dessa forma, todos os três são mencionados na saudação. Literalmente, le­mos: "Graça e paz a vós, da parte daquele que é, que era e que está vindo". Esse é bom grego e bom português.[55] Isso mostra, maravilhosamente, o imutável Deus do pacto (cf Êx 3.14ss.). A expressão "sete espíritos" refere-se ao Espírito Santo na pleni­tude de suas operações e influências no mundo e na Igreja. Com respeito a Cristo, observamos que ele é descrito primeiro em relação ao seu ministério na terra, como fiel testemunha; depois, em conexão com sua morte e ressurreição, como o primogênito dentre os mortos; e, finalmente, em termos que expressam sua presente exaltação, como o governante dos reis da terra.

Nessa saudação temos a ordem de Pai, Espírito, Filho. A razão dessa ordem, provavelmente, é que Deus é visto como habitando em seu tabernáculo ou templo celeste (7.15). Graça e paz são apresentadas como procedentes do Pai, que habitava sobre a arca no santo dos santos; e do Espírito, representado pelo candelabro com suas sete lâmpadas, no lugar santo; e de Jesus Cristo, cuja expiação era simbolizada pelo sangue sob o altar de ofertas queimadas, no átrio.

A menção de Jesus Cristo na saudação resulta nesta adora­ção espontânea: "Àquele que nos ama... a ele a glória e o domí­nio pelos séculos dos séculos. Amém". Observe que ali diz que os crentes devem ser libertos, não apenas purificados, dos seus pecados. Só nessa observação há material para todo um ser­mão. Note, também, que a caracterização "reino... sacerdotes", que era antes aplicada a Israel (Ex 19.6), é agora aplicável aos crentes, coletivamente, isto é, à Igreja. Na Igreja, Israel sobre­vive. Pode alguém ler essas palavras e ainda afirmar que Cristo não é o Rei da Igreja?

Através desse livro a glória é atribuída não à criatura, mas a Deus em Cristo (1.6; 4.8, 11; 5.9, 13; 7.10, 12, etc).

3. O anúncio da segunda vinda de Cristo (verso 7)

Este não é o tema central do livro.[56] Ainda assim, constitui uma fonte real de conforto para os crentes em aflição. É a espe­rança dos crentes e a consternação dos inimigos da Igreja. Ele vem "com as nuvens", isto é, com glória (Dn 7.13; Mq 14.62; Ez 1.4-28; Ap 14.14), e com angústia, ira e juízo(Sf 1.15; SI 97.2). A Bíblia desconhece qualquer coisa sobre uma volta secreta ou invisível. Em nenhum lugar isso é ensinado. Ao contrário, "todo olho o verá". Aqueles que perfuraram seu lado também o verão. É possível que essa expressão "até quanto o traspassaram" também inclua todos os demais que o traspassaram mediante sua vida de desobediência. A expressão é tomada de Zacarias 12. lOss. (Cf Jo 19.34, 37; 20.25, 27).[57] Os judeus que o rejeita­ram verão que Jesus de Nazaré, a quem crucificaram, é, verda­deiramente, o Cristo!

"E todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele". Esse não é o lamento do arrependimento, mas da desesperança: "como quem chora amargamente pelo primogênito". (Ver Zc 12.10). A expressão se refere ao bater no peito em lamento e desespero. Os incrédulos se esconderão em cavernas e entre as rochas nas montanhas, e dirão: "Caí sobre nós, e escondei-nos da face daquele que se assenta no trono e da ira do Cordeiro..." (6.16).

4. A autodesignação de Cristo (verso 8)

Não há dúvida de que esse glorioso título se refere a Cristo. Tanto o contexto imediato anterior quanto o contexto imediato posterior fazem referência a Cristo (ver versos 7, 13). A expressão "Eu sou o Alfa e o Omega" é encontrada, em forma ligeiramente modificada, no verso 17 - "eu sou o primeiro e o último" - e se refere a Cristo, que estava morto e agora vive para sempre. Observe, também, as passagens paralelas, 21.6-8 e 22.13.

João ouve o próprio Senhor Jesus Cristo falando e dizen­do: "Eu sou o Alfa e o Omega". Alfa e Omega são a primeira e a última letra do alfabeto grego. Assim, Jesus, aqui, descreve a si mesmo como a completa, perfeita e eterna revelação de Deus. É como se ele dissesse: "Eu sou desde o princípio até o fim, isto é, o Eterno. Tome coragem; seu inimigo não pode destruir seu Cristo". Jesus mesmo nos diz que ele é plenamente igual ao Pai, pois acrescenta: "...diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-poderoso". Note que a mesma frase que no verso 4 descreveu o Pai, aqui identifica o Filho. "Eu e o Pai somos um" (Jo 10.30). Terá sido essa voz que levou João a estar "no Espírito"?

5. A comissão de João para escrever o Apocalipse (versos 9-11)

No verso 8 era Cristo quem falava. Aqui, no verso 9, o próprio João torna a falar. Ver a maneira amável com que o apóstolo se dirige aos seus companheiros cristãos a fim de ga­nhar sua plena confiança e fazê-los sentir que ele está pisando no mesmo solo que eles: "Eu, João, irmão vosso e companheiro na tribulação, no reino e na perseverança, em Jesus". Ele nos diz que estava na ilha chamada Patmos, por causa da Palavra de Deus e do testemunho de Jesus. Isso significa que o apóstolo estava sentenciado a trabalhos forçados porque havia se recusa­do a queimar incenso sobre o altar de um sacerdote pagão como símbolo de culto ao imperador?[58] Não estamos certos. Sabemos que, de uma forma ou de outra, sua lealdade a Cristo e ao seu evangelho havia resultado em exílio cruel.

É o dia do Senhor, isto é, o primeiro dia da semana, o dia em que comemoramos a ressurreição de Cristo.12 João está, prova­velmente, pensando sobre os efésios e outras igrejas da Ásia Menor. De repente, a terra parece fugir-lhe aos pés e sua alma liberada dos grilhões do tempo e do espaço. Ele é levado para fora do contacto com o mundo físico ao seu redor; ele está "no Espírito". Ele vê realmente, mas não com ouvidos físicos. Ele está em contacto espiritual direto com seu Salvador. Está só... com Deus! (C/Dn 8.2; Is 6.1; Ez 1.4; At 10.10; 11.5). Ele está totalmente desperto e cada avenida de sua alma totalmente aberta à comunicação direta de Deus.

Nessa condição, João ouve, vinda de trás de si, uma grande voz como de trombeta. Onde quer que Deus teve algo a dar ao seu povo na dispensação do Novo Testamento, ele os ajuntou ao som como de trombetas (Êx 19.16, 19; Lv 25.9; Js 6.5; Is 58.1, etc). Note bem: "como de trombeta".

A voz disse: "o que vês, escreve em livro e manda às sete igrejas...". A voz era a do próprio Jesus Cristo. Ele ordenou a João que escrevesse o que via e enviasse às igrejas cujo nome havia anotado. Cremos que João escreveu as visões enquanto as recebia (10.4) ou logo após (1.19).

6, A visão do Filho do Homem (versos 12-16)

"Voltei para ver quem falava comigo e, voltando, vi sete candeeiros de ouro...". E, entre esses candeeiros, João vê - que precipitação de memórias e que arrebatamento de surpresa! - o próprio Salvador em cujo peito ele se reclinara. É o mesmo Salvador, ainda que diferente dos dias de sua humilhação. João descreve essa visão do Filho do homem (versos 12-16).[59] Não destrói a unidade do símbolo. Por exemplo, não interpreta a afiada espada de dois gumes que sai da boca de Cristo como indicativa da influência doce e meiga em sua missão de conver­são. Note que, em 2.16, lemos: "...pelejarei com a espada da minha boca". Isso se dirige àqueles que se recusam ao arrepen­dimento. A descrição toda tem de ser tomada como um todo tal como sua interpretação.14

Observe que o Filho do homem é, aqui, retratado como vestido de poder e majestade e com espanto e terror. Esse longo manto real; esse cinto dourado abotoado no peito; esse cabelo branco resplendente como neve que cega com o reflexo do sol; esses olhos flamejantes, olhos que lêem cada coração e penetra cada canto escondido; esses pés incandescentes para pisar o iníquo; essa voz alta e reverberante, como ondas poderosas ba­tendo contra as praias rochosas de Patmos; essa espada de dois gumes longa e pesada; essa aparência toda "como o sol brilhando em todo seu fulgor, intenso demais para que olhos humanos o fitem - a figura toda é símbolo de Cristo, o Santo", chegando para purificar sua Igreja (2.16, 18, 23), e para punir aos que perseguiram seus eleitos (8.5ss.).

7. O efeito da visão em João (versos 17-20)

"Quando o vi, caí a seus pés como que morto" (Cf Gn 3.8; 17.3; Êx 3.6; Nm 22.31; Js 5.14; Is 6.5; Dn 7.15, etc). Ainda assim, o propósito real da visão não foi o de aterrorizar, mas de confortar João. Temos algo similar em Habacuque 3. Depois de uma descrição vívida da marca de espanto inspirador de Jeová, lemos: "Tu sais para salvamento do teu povo". Aqui, também, o ponto é o mesmo. "Não temas... Eu estou contigo, ó povo per­seguido". O Filho do homem, ternamente, põe sua mão direita sobre João, numa expressão de amor e fortalecimento, para que a estrutura decaída e exausta do apóstolo reviva e se levante.

Então o Salvador profere estas palavras de conforto: "Não temas; eu sou o primeiro e o último, e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos, e tenho as chaves da morte e do inferno [Hades]".

Cristo, também, sofreu a morte. Mas ele ressuscitou dos mortos; glorioso conforto para os que eram perseguidos até a morte. A alma viva deles se juntaria ao eterno Cristo. Ele tem as "chaves" da morte, isto é, autoridade e poder sobre a morte para que esta não cause dano ao crente, mas que seja, por ele, considerada como lucro para o reino; o Filho do homem tem não apenas as chaves da morte, mas também as do Hades. Não esteve ele próprio no Hades? (Ver At 2.27, 31.)

E evidente que o termo "Hades", como usado aqui, não pode significar inferno ou túmulo. Significa, sim, o estado de existência desincorporada.[60] Refere-se ao estado de morte re­sultante da cessação de vida quando alma e corpo se separam. Assim, o Hades sempre se segue à morte (Ap 6.8). Mas o Hades não pode reter o Filho do homem. Ele ressurgiu gloriosamente e, agora, tem autoridade sobre a morte e o Hades, e se fez apto a livrar os crentes de todos os seus horrores pelo poder da sua ressurreição (cf 20.13, 14). Porventura, não revela o Filho do homem que tem as chaves da morte ao receber no céu a alma dos crentes? E não prova ele que tem as chaves do Hades quan­do, em sua segunda vinda, reúne corpo e alma dos crentes, um corpo agora gloriosamente transformado? Que maravilhoso con­forto para os crentes perseguidos, alguns dos quais deveriam em breve entregar sua vida por causa do evangelho.

Cristo instrui João a escrever as coisas que viu, isto é, esta visão do Filho do homem; e as "coisas que são", isto é, a condição do seu tempo, das sete igrejas da Ásia Menor; e as coisas "que em breve hão de acontecer", isto é, os eventos que aconteceriam através de todo o futuro, segundo seus princípios mestres.

Em harmonia com o significado central de toda a visão, há dois detalhes que precisam de comentários adicionais. Cristo, aqui, dá-nos sua própria explicação. Ele diz a João que as sete estrelas que ele via na mão direita do Filho do homem identifi­cavam os anjos das sete igrejas. Anjos, aqui, devem ser toma­dos no sentido de pastores, ministros.[61] O Senhor os tem em sua mão direita; exerce poder absoluto sobre eles; são seus embaixa­dores. Ele os protege; eles estão em segurança quando o obede­cem e são fiéis em seu serviço. "...E os sete candeeiros são as sete igrejas." As igrejas são os candeeiros, isto é, as portadoras da luz. Ver Mateus 5.14: "Vós sois a luz do mundo" (cf. Êx 25.31; Zc 4.2). É interessante observar que a própria palavra "candeeiro" é usada em Mateus 5.15. Ver o contexto: "...Nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador {lychnia - a mesma palavra candeeiro usada no Apocalipse), e alumia a todos que se encontram na casa. Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus" (cf também Mc 4.21; Lc 8.16; 11.33; Hb 9.2.).

No Tabernáculo havia um candeeiro com sete lâmpadas; aqui no Apocalipse vemos sete candeeiros. A razão da diferença é que durante a antiga dispensação havia uma unidade visível, a Igreja-estado judaica, enquanto as igrejas da nova dispensação encon­tram sua unidade espiritual mediante seu Espírito. Portanto, eles não precisam ter medo, "Porque onde estiverem dois ou três reu­nidos em meu nome, ali estou no meio deles" (Mt 18.20).

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 2,3 Os Sete Candeeiros

O Apocalipse é uma obra de arte, arte maravilhosa, arte divi­na. Suas diversas partes são unidas por fios sutis. E impossível entender os capítulos 2 e 3 a menos que se tenha lido o capítulo 1. E os capítulos 2 e 3, por sua vez, formam o cenário para a última porção do livro. As promessas encontradas nesses dois capítulos são repetidas e explicadas, de modo mais completo, nessas últimas passagens.

Quer saber o que significam as palavras: "Ao vencedor dar-lhe-ei de comer da árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus"? Então vá a Apocalipse 22.2,14. E também, se você está procurando uma definição para "segunda morte" na visão da gloriosa promessa: "o vencedor de modo nenhum sofrerá dano da segunda morte", Apocalipse 20.14 oferece exatamente o que você está buscando. O "novo nome" que é prometido aos "ven­cedores" (2.17) reaparece diversas vezes: 3.12; 14.1; 22.4; cf 19.12,13,16. A autoridade sobre as nações de 2.26 é comentada em 12.5; 20.4. A estrela da manhã de 2.28 ocorre em 22.16; e assim acontece com todas as demais promessas.[62] As sete cartas pertencem à própria essência do livro. O livro é uma unidade.

Essas sete cartas, sobretudo, revelam - com pequenas mo­dificações - um único padrão. Esse padrão aparece, mais clara­mente, nas cartas a Efésios, Pérgamo, Tiatira e Sardes. As sete partes são como se segue:

1. A saudação ou destino; por exemplo: "Ao anjo da Igreja em Efeso..."

2. A autodesignação de Cristo; por exemplo: "aquele que conserva na mão direita as sete estrelas..."

3. A aprovação da parte de Cristo; por exemplo: "Conheço as tuas obras, assim o teu labor como a tua perseverança..."

4. A condenação da parte de Cristo; por exemplo: "Tenho, porém, contra ti..."

5. A advertência e a ameaça da parte de Cristo; por exemplo: "Lembra-te, pois, de onde caíste... se não..."

6. A exortação da parte de Cristo; por exemplo: "Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas".

7. A promessa de Cristo; por exemplo: "Ao vencedor dar-lhe-ei de comer da árvore da vida..."

Em cada igreja - com a exceção única de Laodicéia -Cristo encontra algo recomendável. Em cinco das sete, ele en­contra algo condenável. As exceções louváveis são Esmirna e Filadélfia.

Essas sete cartas estão divididas em dois grupos: um de três e outro de quatro.[63] Nas primeiras três cartas a exortação é seguida pela promessa. Nas últimas quatro, essa ordem é invertida.

A idéia de que essas sete igrejas descrevem sete sucessivos períodos da História da Igreja nem precisa de refutação.[64] Para não dizer nada sobre a quase humorística - se não deplorável ­exegese, que, por exemplo, torna a Igreja morta de Sardes uma referência à era gloriosa da Reforma; deveria estar claro para qualquer estudante da Bíblia que não há em todo o escrito sacro qualquer átomo de evidência que corrobore esse método total­mente arbitrário de dividir a História da Igreja e atribuir as par­tes resultantes às respectivas cartas de Apocalipse 2 e 3.

As cartas descrevem condições que não ocorrem em qual­quer época em particular da História, mas que se repetem muitas vezes.

1. A carta a Efeso (2.1-7)

Éfeso era rica, próspera, magnificente e famosa por seu templo de Diana. A cidade eslava localizada próxima à costa oeste da Ásia Menor, no mar Egeu, e próxima à foz do rio Caistro. Seu porto - nos dias de sua glória - acomodava os maiores na­vios. Sobretudo, era de fácil acesso por terra, pois Éfeso estava conectada por estradas com as mais importantes cidades da Asia Menor. Éfeso foi por muito tempo o centro comercial da Ásia. O templo de Diana era ao mesmo tempo uma casa do tesouro, um museu e um lugar de refúgio para criminosos. Fornecia emprego para muitos, incluindo os artesãos da prata que fabri­cavam miniaturas do templo de Diana.[65]

Paulo visitou essa cidade (At 18.19-21) em sua viagem de Corinto a Jerusalém. Isso ocorreu durante sua segunda viagem missionária, cerca de 52 A.D. Aí foi que ele deixou Priscila e Áquila (18.19); e aí foi que Apolo pregou com caloroso zelo (18.25). Em sua terceira viagem missionaria, Paulo passou três anos aí (At 20.31). Seu trabalho foi grandemente abençoado, não só em Éfeso propriamente, mas em toda a região vizinha. A loja de venda de miniaturas de prata do templo de Diana foi queimada em 262 A.D. e jamais foi reconstruída. Rumo à pátria, vindo de sua terceira viagem missionária, Paulo se despediu dos presbíteros da Igreja de Éfeso de uma maneira tocante (At 20.17-38). Isso ocorreu por volta do ano 57 A.D. Durante sua primeira prisão, 60-63, Paulo enviou, de Roma, sua carta aos efésios.[66] Após sua libertação, o apóstolo parece ter feito mais algumas breves visitas aos efésios, deixando Timóteo encarre­gado dessa Igreja (1 Tm 1.3). Poucos anos depois, possivelmente logo após o início da guerra judaica, digamos no ano 66 A.D., encontramos o apóstolo João em Éfeso.[67]

Foi durante o reinado de Domiciano (81-96 A.D.) que João foi banido para Patmos. Foi liberto e morreu durante o reinado de Trajano. A tradição relata que, bem velho e fraco demais para andar, João era carregado para a Igreja onde admoestava os irmãos: "Filhinhos, amai-vos uns aos outros".

Fica, assim, evidente que a Igreja de Éfeso tinha mais de quarenta anos quando Jesus ditou essa carta. Outra geração ha­via surgido. Os filhos não experimentavam aquele entusiasmo intenso, aquela espontaneidade e o ardor que haviam revelado os seus pais quando tiveram o primeiro contacto com o evange­lho. Não apenas isso, mas faltava à geração seguinte a devoção a Cristo. Uma situação semelhante ocorreu em Israel depois dos dias de Josué e os anciãos (Jz 2.7,10, ll).[68] A Igreja havia abandonado seu primeiro amor.

Observe a autodesignação de Cristo: "Aquele que conser­va na mão direita as sete estrelas e que anda no meio dos sete candeeiros". Qual é a razão dessa designação? Foi dada porque as sete estrelas apontam para os ministros das igrejas, verda­deiros embaixadores de Cristo, e a Igreja em Éfeso havia sido atribulada por "falsos apóstolos" (2.2), que tentaram se con­trapor à obra dos verdadeiros ministros. Assim, a essa Igreja é dada a segurança de que o Filho do homem, exaltado em glória, dirige os ministros e sabe o que acontece nas igrejas. Ele man­tém nas suas mãos as estrelas e anda no meio dos candeeiros. Descobrimos, então, que, em cada caso separado, a autodesignação de Cristo tem esse peso sobre a Igreja à qual a carta é escrita.[69]

A Igreja em Éfeso foi louvada pelas suas obras, pela sua labuta e pela sua perseverança. Com respeito a essas coisas ela era um candeeiro que fazia brilhar a luz do Salvador no meio das trevas do mundo. É importante, especialmente, observar que essa Igreja é também louvada pela sua "intolerância". Ela havia provado os que se diziam ser apóstolos e, julgando-os falsos, os rejeitou. Em todas essas tribulações essa Igreja havia sido leal à verdadeira doutrina e não havia se deixado esmorecer. Havia atentado para a advertência de Paulo (At 20.28,29; cf 1 Jo4.1).

Súbito, lemos esta acusação: "Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor". Já explicamos o sentido de tão séria reprovação. Certamente, havia obras, labutas e perse­verança em Éfeso; mas tudo isso estava presente embora hou­vesse uma diminuição de amor. Uma esposa, por exemplo, pode ser bastante fiel ao seu marido e pode até dar evidência de dili­gente atenção nas coisas a ele pertinentes - e, ainda assim, ter falta de amor. Seu senso de dever, apenas, pode movê-la a per­manecer fiel em todos os detalhes da atenção que lhe presta. Igualmente, um membro de Igreja pode ser assíduo na sua fre­qüência aos cultos, mas, a despeito disso, pode não estar tão devotado ao Senhor como já foi um dia.

A Igreja é desafiada a refletir sobre sua queda, a mudar sua mente, de forma que possa realizar as primeiras obras. A ameaçaque se segue, "e se não, venho a ti e moverei do teu lugar o teu candeeiro", foi cumprida. Hoje em dia não há Igreja em Éfeso. O próprio lugar está em ruínas.[70]

Então, mui ternamente, o Senhor volta ao seu louvor: 'Tens, contudo, a teu favor, que odeias as obras dos nicolaítas, as quais eu também odeio". É provável que esses nicolaítas e "os que sustentam as doutrinas de Balaão" (2.14) e os seguidores da mulher, Jezabel (2.20), representem o mesmo grupo geral de heréticos. Nós os veremos de novo. Deve-se notar que essas eram pessoas que não só se recusavam a abster-se dos banque­tes imorais e idólatras dos pagãos, mas também tentavam justi­ficar suas práticas pecaminosas.[71] O Senhor odeia qualquer com­prometimento com o mundo. Ele louva a Igreja em Éfeso pela sua posição firme contra as obras dos nicolaítas.

Daí, segue-se a exortação: "Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às igrejas". Observe o plural. Cada carta deve ser lida por todas as igrejas e não só por aquela à qual foi prima­riamente dirigida."

A expressão "ao vencedor" é a mesma expressão usada em 6.2: "e ele saiu vencendo e para vencer". O vencedor é o homem que luta contra o pecado, contra o diabo e contra todo o sua domínio, e, em seu amor por Cristo, persevera até o fim. A tal vencedor é prometido algo melhor do que a comida oferecida aos ídolos, com a qual os pagãos procuravam atrair os membros das igrejas para os seus cultos idólatras. Ao vencedor seria dado de comer da árvore da vida (Gn 3.22; Ap 22.2,14), isto é, ele herdaria a vida eterna no paraíso celeste. Essa promessa é adaptada ao caráter geral dessa carta, assim como é adaptada a cada uma das sete mensagens.

2. A carta a Esmirna (2.8-11)

Esta cidade, localizada num braço do mar Egeu, era uma rival de Éfeso. Dizia-se que era a "primeira cidade da Ásia em beleza e tamanho". Uma cidade pitoresca, numa encosta sobre o mar, com seus esplêndidos edifícios públicos no topo arre­dondado do monte Pagos, formavam o que era conhecido como "a coroa de Esmirna". A brisa do oeste, o zefir, vem do mar e sopra por cada parte da cidade tornando-a arejada e fresca, mes­mo durante o verão. Desde o início da subida de Roma ao poder, mesmo antes dos dias de sua grandeza, Esmirna era re­conhecida como leal aliada de Roma. Essa fidelidade e lealda­de se tornou proverbial.12

Com toda a probabilidade, a Igreja de Esmirna foi fundada por Paulo durante sua terceira viagem, em 53-56 A.D. Não estamos certos disso, mas parece-nos uma conclusão segura do que lemos em Atos 19.10: "...dando ensejo a que todos os habi­tantes da Ásia ouvissem a palavra do Senhor, tanto judeus como gregos".

É possível que Policarpo tenha sido bispo da Igreja em Esmirna nessa época. Ele foi discípulo de João. Fiel até a mor­te, esse venerável líder foi queimado na fogueira no ano 155 A.D. Foi-lhe ordenado dizer: "César é Senhor", mas ele se recu­sou. Levado ao estádio, o procônsul instou com ele: "Impropera a Cristo; nega-o e eu o porei em liberdade". A isso Policarpo respondeu: "Por 86 anos eu o tenho servido e ele jamais me causou qualquer mal: como, pois, eu poderia blasfemar contra meu Rei e meu Salvador?" Quando o procônsul novamente o pressionou, o velho homem respondeu: "Visto que em vão instas que ... jure pela prosperidade de César e ignore não conhecer quem sou e o que sou, declaro aqui com ousadia, que sou cris­tão..." Pouco depois o procônsul disse: "Tenho feras selvagens

7.W. M. Ramsay, op. cit., pp. 251-267.

à minha disposição; e eu o lançarei às feras caso não te arrepen­das. Eu o farei ser consumido pelo fogo uma vez que desprezas as feras, se não te arrependeres". Mas Policarpo disse: "Ameaças-me com o fogo que pode durar por uma hora e, então, se extingue, mas ignoras o fogo do julgamento vindouro e a puni­ção eterna reservada para os ímpios. Por que demoras? Faça sua vontade". Logo depois o povo ajuntou madeira e palha; os judeus, especialmente, segundo o costume, avidamente os aju­davam. E Policarpo foi queimado na fogueira.[72]

Incluímos, propositalmente, esse breve relato do martírio de Policarpo para que o leitor tenha conhecimento das reais condições em que vivia a Igreja nos séculos 1Q e 2- A.D.

E a essa Igreja que Jesus se dirige, como se segue: "Estas coisas diz o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a viver",[73] isto é, aquele que estava vivo mesmo quando morto: o que vive eternamente. Como no início das outras cartas, assim aqui: a autodesignação de Cristo se encontra em bela harmonia com o caráter geral da mensagem. Cristo, o vencedor da morte, o que vive eternamente, está apto a dizer, como o faz nesta car­ta: "Sê fiel até a morte e dar-te-ei a coroa da vida" (2.10).

"Conheço a tua tribulação, a tua pobreza." Extrema po­breza, é o que ele quer dizer. Aquelas pessoas eram, freqüen­temente, despedidas de seus empregos como resultado de sua conversão. Na verdade, diga-se logo que eram, geralmente, pobres quanto a bens terrenos. Tornar-se cristão era, de um ponto de vista terreno, um verdadeiro sacrifício. Isso signifi­cava pobreza, fome, prisão e, com freqüência, morte por meio de feras ou de fogo.[74]

O Senhor diz a esses crentes de Esmirna que não deviam sentir piedade de si mesmos. Podiam parecer pobres, mas, na realidade, eram ricos, a saber, de bens espirituais, ricos da gra­ça e de seus gloriosos frutos (Mt 6.20; 19.21; Lc 12.21). Que conforto para aqueles crentes perseguidos era o entendimento de que seu Senhor "sabia" disso tudo.

"...E a blasfêmia daqueles que se declaram judeus e não são, sendo antes sinagoga de Satanás." Esses judeus haviam escolhido Esmirna como local de sua residência provavelmente porque era uma cidade de comércio. Eles não só vilipendiavam o Messias, mas ansiosamente acusavam os cristãos diante dos tribunais romanos. Como sempre, eles se enchiam de maldade contra os cristãos (cf At 13.50; 14.2, 5, 19; 17.5; 24.1). Esses pretensos judeus podiam considerar-se "sinagoga de Deus", mas eram, na verdade, "sinagoga de Satanás", o principal acusador da irmandade. Como qualquer um pode dizer que os judeus de hoje são ainda, num sentido especial, glorioso e preeminente, o povo de Deus, é algo além do que eu posso entender. O próprio Deus chama aqueles que rejeitam o Salvador e perseguem os crentes verdadeiros de "a sinagoga de Satanás". Eles não são mais seu povo.

"Eis que o diabo está para lançar em prisão alguns dentre vós para serdes postos à prova." Por trás dos perseguidores romanos vemos os judeus, cheios de inveja maligna e de ódio contra os crentes, acusando-os perante os tribunais romanos. E esses judeus, por sua vez, eram instrumentos usados pelo próprio diabo. O diabo lançaria alguns em prisão, o que, geralmente, significava morte. Mas enquanto Satanás estivesse tentando os crentes, Deus, por essa mesma aflição, os estaria provando, testando, provando: "para serdes postos à prova". Essa tribula­ção duraria "dez dias", isto é, um tempo definido, cheio, mas breve.[75] O fato de que a provação é por breve tempo é uma palavra dada, geralmente, como encorajamento à perseverança (Is 26.20; 54.8; Mt 24.22; 2 Co 4.17; 1 Pe 1.6).

"Sê fiel até a morte" não significa meramente "ser leal até morrer", mas "ser fiel ainda que isso custe a vida". Disse o piloto, que navegava em seu barco num mar tempestuoso: "Pai Netuno, tu podes fazer-me naufragar, se quiseres; tu podes me salvar, se quiseres. Qualquer coisa que aconteça, porém, eu segurarei firme o timão". Uma atitude igual é requerida aqui - o que quer que aconteça, segure firme o timão; sê fiel até a morte. Aqueles que são fiéis é prometida a coroa da vida, a saber, a vida de glória no céu.[76] Ainda que os crentes possam sofrer a primeira morte, eles não serão feridos pela segunda morte, isto é, eles não serão jamais lançados, corpo e alma, no lago de fogo, na segunda vinda de Cristo (Ap 20.14).

Esmirna era fiel ao seu chamado para ser um candeeiro. O testemunho de Policarpo, dado na presença de judeus e de pa­gãos, foi imitado por outros.[77]

3. A carta a Pérgamo (2.12-17)

Esta cidade estava localizada sobre uma grande montanha de rocha tendo aos seus pés um grande vale circunvizinho. Os romanos a fizeram capital da província da Ásia. Aí, Esculápio, o deus da cura, era cultuado sob o emblema da serpente que, para os cristãos, era o próprio símbolo de Satanás. Nessa cidade se encontrava, entre os muitos altares pagãos, o grande altar de Zeus.[78] Todas essas coisas deveriam estar na cabeça de Cristo quando ele chamou Pérgamo de o lugar "onde está o trono de Satanás". Entretanto, parece-nos que o propósito óbvio do au­tor é dirigir nossa atenção para o fato de que Pérgamo era a capital da província e, como tal, centro do culto ao imperador.

Ali o governador era louvado, e ali os templos pagãos eram dedicados ao culto de César. Ali era exigido dos crentes que oferecessem incenso à imagem dos imperadores e que dissessem "César é Senhor". Aí Satanás tinha seu trono; ali ele reinava livremente. "Estas coisas diz aquele que tem a espada afiada de dois gumes." De novo, a autodesignação está em harmonia com o tom geral da carta. Aqui se diz que Cristo tem a espada de dois gumes porque ele fará guerra contra os nicolaítas, a menos que se arrependam (v. 16).

A despeito, porém, do fato de que o trono de Satanás esti­vesse localizado ali, e do fato de que ali Antipas tivesse mandado matar os crentes que se recusaram ser infiéis ao Senhor, os cren­tes de Pérgamo ainda se atinham tenazmente à sua confissão, ao seu Cristo.

Eles, entretanto, cometeram um grande erro, provavel­mente devido ao fato de terem enfatizado sua salvação indi­vidual à custa do dever cristão de se preocupar com o bem-estar da Igreja como um todo: eles negligenciaram a disci­plina.[79] Alguns dos membros da Igreja haviam atendido a festivais pagãos e haviam, com toda probabilidade, até mes­mo participado das imoralidade que caracterizavam essas festas. Semelhantes práticas haviam ocorrido entre os filhos de Israel nos dias de Balaão (Nm 25.1,2; 31.16). Como Israel, também, Pérgamo teve seus nicolaítas. Não devemos fazer pouco dessa tentação. Recusar-se a comer carnes sacrificadas aos ídolos e, especialmente, recusar-se a freqüentar essas festas significava retirar-se de grande parte de toda a vida social daquele tempo pela razão de que o comércio tinha como patronos as deidades que deveriam ser cultuadas nessas fes­tas. A recusa em participar dessas festas geralmente signifi­cava que um homem perderia seu emprego, seu comércio; ele seria considerado um excluído.[80] Assim, algumas pessoascomeçaram a argumentar que, afinal, alguém poderia freqüen­tar tais festivais e partilhar das carnes oferecidas aos ídolos, e, talvez, oferecer incenso aos ídolos pagãos, desde que man­tivesse sempre em mente - um tipo de reserva mental - que um ídolo nada significa! Outros levavam essa linha de ra­ciocínio ainda mais longe e diziam: "Como pode alguém condenar e vencer Satanás a menos que o conheça plena­mente?"

A Igreja de Pérgamo não estava totalmente cônscia dos perigos de sua atitude comprometedora, essa meia-aliança com o mundo. Ela deveria ter disciplinado seus membros faltosos. Se falha em fazê-lo, Cristo irá à guerra contra ela com a espada de sua boca. Não cremos que isso se refira tão-somente a uma condenação verbal. A condenação verbal está contida nessa carta. Antes, significa destruição: Cristo irá destruir aqueles que persistem em suas práticas mundanas - Ele levará a cabo sua sentença de condenação.

O vencedor, por outro lado, receberá "do maná escondi­do", isto é, Cristo em toda a sua plenitude (Jo 6.33,35), escon­dido do mundo, mas revelado aos crentes já aqui na terra e, especialmente, no porvir. Noutras palavras, esses vencedores que dominaram a tentação de participar dos festivais pagãos e de comer carne sacrificada aos ídolos, serão alimentados do próprio Senhor; a graça de Cristo e todos os seus gloriosos frutos serão sua comida, invisível, espiritual, e escondida, certamente, mas, no entanto, muito real e muito abençoada. Eles recebem o pão do céu.[81]

"...Bem como darei uma pedrinha branca e sobre essa pe­drinha escrito um nome novo, o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe." Os comentaristas estão grandemente di­vididos em suas opiniões com respeito ao significado dessas palavras. Depois de extenso estudo, chegamos à conclusão que só há duas interpretações que merecem considerações sérias. Todas as outras são objetáveis logo de princípio.[82]

Cada uma das duas teorias restantes tem tanto mais a seu favor que nos tem sido impossível tomar uma decisão definitiva. Portanto, colocaremos aqui as teorias e os argumentos que as suportam, e dei­xaremos para o leitor a escolha, ou permanecer indeciso.

Conforme a primeira interpretação, a pedra representa a pessoa que a recebe, tal como em Israel as doze tribos eram representadas por doze pedras preciosas no peitoral do sumo sacerdote (Êx. 28.15-21). Agora essa pedra é branca. Isso indica santidade, beleza, glória (Ap 3.4; 6.2). A própria pedra simboli­za durabilidade, imperecibilidade. A pedra branca, portanto, indica um ser livre de culpa e purificado de seu pecado, que permanece nesse estado para sempre. O novo nome inscrito na pedra indica a pessoa que a recebe. Expressa o caráter interior real da pessoa; sua personalidade individual, distinta. Cada um dos abençoados deve ter uma consciência particular e singular dessa personalidade: um conhecimento dado a ninguém mais senão àquele que o recebe.[83]

Os seguintes argumentos podem ser apresentados em fa­vor dessa teoria:

a. As palavras "o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe", deve significar "o qual ninguém conhece senão aquele que recebe o nome", não a pedra. O próprio crente recebe esse nome e este deve ser seu novo nome. Isso está em completa harmonia com Apocalipse 19.12, onde lemos isto com respeito a Cristo: "tem um nome escrito que ninguém conhece senão ele mesmo". O nome, então, indica a pessoa que o recebe.

b. Se esse nome indicasse o nome de Deus ou de Cristo, isso teria sido declarado como em outros casos (por exemplo: 3.12; 14.1; 22.4).

c. Essa explicação se baseia na firme fundação de passa­gens paralelas do Antigo Testamento, como, por exemplo:

"...e serás chamada por um nome novo que a boca do Senhor designará" (Is 62.2).

"...e a seus servos chamará por outro nome" (Is 65.15).

d. Conforme a Escritura, o nome indica o caráter ou a posi­ção do portador. Nessa base, muito freqüentemente, a pessoa cujo caráter é mudado recebe um novo nome que corresponde a ele. Na glória, nós receberemos uma nova santidade, uma nova visão, etc. Portanto, receberemos um novo nome.

De acordo com a segunda interpretação, a pedra preciosa translúcida - um diamante? - tem inscrito o nome de Cristo. Receber a pedra com o novo nome significa que a glória do vencedor recebe a revelação da doce comunhão com Cristo -em seu novo caráter, como Mediador coroado - uma comunhão que só quem a recebe pode apreciar.[84]

Em favor dessa explicação, os seguintes argumentos são oferecidos:

a. Em todas as outras passagens do Apocalipse, sem qual­quer exceção, o novo nome se refere a Deus ou a Cristo. Esse nome é dito como estando escrito na fronte dos crentes (3.12; 14.1; 22.4).

b. O ponto de vista de que esse nome se refere a Cristo é apoiado tanto pelo contexto precedente quanto pelo posterior: o maná escondido se refere ao que Cristo é para o crente; sobre­tudo, nesta mesma série de cartas encontramos uma passagem paralela (3.12) em que o nome, embora escrito no crente, é de­finido como pertencente a Cristo.

c. Assumir que a expressão "o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe" significa "aquele que recebe o nome", não prova que o nome seja a nova designação do pró­prio crente. Pode-se tanto dizer que o crente recebe o nome de Cristo quanto dizer que o nome de Cristo é inscrito na sua (do crente) fronte. É interessante observar, quanto a isso, que os não-crentes recebem, do diabo, a imitação do novo nome. Deles se diz que "receberam a marca na fronte e na mão" (Ap 20.4) tal como os crentes recebem o nome de Cristo na fronte (14.1). Essa "marca", porém, indica "outro", isto é, a besta. Essa é a marca da besta que os não-crentes recebem. Semelhantemente, na linguagem presente (2.17) os crentes recebem o nome de Cristo, isto é, seu nome é escrito na fronte no mesmo sentido que em d.

d. Essa idéia está em harmonia com o simbolismo do Antigo Testamento, o qual está embutido nas diversas passagens do Apocalipse. Na fronte do sumo sacerdote - para ser exato, na frente da mitra - estava escrito um nome. Não era o nome do sumo sacerdote, mas de Jeová. Esse nome designava o sumo sacerdote como servo consagrado de Jeová, como pertencente a Ele. Assim lemos: "Farás também uma lâmina de ouro puro, e nela gravarás à maneira de gravuras de sinetes: Santidade ao Senhor. Atá-la-ás com um cordão de estofo azul, de maneira que esteja na mitra; bem na frente da mitra estará. E estará so­bre a testa de Arão..." (Êx 28.36ss.).

O significado, então, é como se segue. Assim como na an­tiga dispensação o nome de Jeová estava escrito na fronte do sumo sacerdote para indicar que ele era especialmente consa­grado como servo de Jeová, assim os crentes - freqüentemente chamados sacerdotes no Apocalipse - terão um novo nome es­crito na fronte, a saber, o nome de Cristo, seu novo nome. Esse nome não é escrito sobre uma placa de ouro puro, mas, ainda melhor, sobre uma translúcida pedra preciosa. Isso indica que o vencedor pertence a Cristo, é seu servo, se regozija em sua co­munhão, na sua nova glória e domínio. Sobretudo, assim como na antiga dispensação só o sumo sacerdote havia recebido os segredos quanto ao nome de Jeová e só ele sabia como pronunciá-lo, assim na nova dispensação só o crente sabe o significado abençoado do nome do Senhor Jesus Cristo. Eles -e só eles - sabem o significado na comunhão com ele. Em prin­cípio, eles já sabem isso aqui sobre a terra; mas uma revelação a mais sobre o significado desse nome lhes está reservada nos céus onde, para sempre, aqueles que foram selados na fronte com o selo do Deus vivo serão designados como o próprio Cristo. Eles recebem seu nome, isto é, seu novo nome na fronte.

Não exageremos a diferença entre esses dois pontos de vista. Na primeira interpretação, o crente recebe um novo nome, isto é, uma nova relação com o seu Salvador, revelada num glorioso caráter transformado. Na segunda interpretação, Cristo revela seu novo nome ao crente, especialmente no porvir. Deveríamos perguntar, portanto: "o novo nome de Cristo - que ele certa­mente recebeu - não implica o novo nome do crente - que, de novo, ele certamente receberá?"

4. A carta a Tiatira (2.18-29)

Esse lugar está situado num vale que conectava dois outros vales. Sem fortificações naturais e estando aberta a ataque e invasão, uma guarnição estava, geralmente, estacionada ali não só para proteger a cidade, mas para obstruir aos inimigos o cami­nho para Pérgamo, a capital. Sendo um centro de comunicação, com muitas pessoas passando por ela, Tiatira se tornou uma cidade de comércio. Ali se achavam as associações de negó­cios: artesanato de lã, de linho, de capas, tingimento de panos, artesanato de couro, curtidores, oleiros, etc.26 Ali esses negócios se associavam com o culto de deidades patronais: cada negócio tinha seu deus guardião. A situação, portanto, era mais ou me­nos como se segue: se você deseja se dar bem neste mundo, precisa pertencer a uma associação; se você pertence a uma associação, sua própria adesão implica o culto ao seu deus. Espe­ra-se de você que atenda às festas da associação e que coma parte do que foi oferecido à deidade patronal, como um pre­sente dessa mesma deidade. Então, quando termina a festa, e o verdadeiro - totalmente imoral - divertimento começa, você não deve sair a menos que queria se tornar objeto de ridículo e de perseguição!

O que deve um cristão fazer numa situação tão difícil? Se ele deixa a associação, perde sua posição e participação na sociedade. Talvez tenha que sofrer necessidade, fome e perse­guição. Por outro lado, se ele permanece na associação e atende às suas festas imorais, comendo coisas sacrificadas a ídolos e cometendo o pecado de fornicação, ele nega o seu Senhor.

Nessa difícil situação, a profetiza Jezabel fingia conhecer a verdadeira solução do problema, o caminho para fora da difi­culdade. Ela, aparentemente, argumentava assim: para vencer Satanás, você precisa conhecê-lo. Você jamais será capaz de vencer o pecado a menos que se torne experimentalmente fami­liarizado com ele. Resumindo, um cristão deveria aprender "as cousas profundas de Satanás". Atendendo, de qualquer forma, às festas das associações e cometendo fornicação... e ainda per­manecendo um cristão; tornando-se, até, um melhor cristão!

 

Se, porém, membros de Igreja persuadem-se de que esse rumo é certo, não podem, no entanto, enganar aquele que tem olhos como que de fogo e pés prontos a pisar o iníquo. O Senhor louva aquilo que é digno de recomendação: obras, amor, fé, serviço - serviço de amor para com os irmãos - e perseverança. Ele os louva também "as tuas últimas obras, mais numerosas do que as primeiras". Quanto a tudo isso, a Igreja de Tiatira era, na verdade, um candeeiro, um candelabro. Mas isso não constitui uma desculpa para a falha em exercitar a disciplina quanto a um membro que se compromete com o mundo. Assim, nós lemos: "Tenho, porém, contra ti o tolerares essa mulher" - não uma esposa - "Jezabel". Seu nome é sinônimo de sedução à idolatria e à imoralidade (1 Rs 16.31; 18.4,13,19; 19.1,2). Se essa mulher "Jezabel" continua impenitente - quão gracioso é o Senhor que lhe dá tempo para se arrepender! - ela será pros­trada na cama, isto é, acometida de enfermidade; seus filhos naturais morrerão de morte violenta e seus seguidores espiri­tuais sofrerão punição. Assim toda a Igreja saberá que Cristo é quem sonda as mentes e os corações. Seus olhos penetrantes vêm os motivos escondidos que fazem as pessoas seguir Jezabel, a saber, falta de disposição para sofrer perseguição por amor de Cristo.

Sobre aqueles que permanecem fiéis, Cristo não impõe mais responsabilidade (cf At 15.28,29). Em sua relação com o mun­do eles devem cuidar que não haja fornicação e evitar comer coisas sacrificadas aos ídolos.

Logo as coisas serão mudadas. No presente, o mundo opri­me os membros da Igreja que desejam guardar a consciência limpa. Mas, depois, o membro da Igreja que permanecer leal a seu Senhor reinará sobre o mundo e, estando associado com Cristo no julgamento final, condenará os pecadores. Ele parti­cipará do domínio de Cristo sobre as nações - que Cristo, por sua vez, recebeu do Pai (SI 2.8,9); e no dia do juízo final o ímpio será reduzido a pedaços. Os oleiros de Tiatira estavam aptos a entender esse símbolo.

"Dar-lhe-ei ainda a estrela da manhã." Aqui, novamente, a referência primária é ao próprio Cristo (Ap. 22.16). Assim como a estrela da manhã reina nos céus, assim os crentes reinarão com Cristo; compartilharão do seu domínio e esplendor reais. A estrela é sempre símbolo de realeza, estando ligada ao cetro (Nm 24.17; cf. Mt 2.2).

5. A carta a Sardes (3.1-6)

Sardes, a inconquistável, estava situada sobre um mon­te quase inacessível, mirando o vale Herma, e, nos tempos antigos, a suntuosa capital da Lídia. Seu povo era arrogante, confiante em si mesmo. Eles estavam certos - muito certos, até! - de que ninguém poderia escalar aquele monte com suas encostas perpendiculares. Havia um único ponto de acesso: um estreito corredor na direção do sul que poderia ser facilmente fortificado. Mas o inimigo veio, em 549 A.C. e de novo em 218 A.C. e... tomou Sardes. Um ponto despercebido, desguardado e fraco, uma rachadura oblíqua na encosta de pedra, uma única chance em mil de um ataque noturno realizado por hábeis escaladores, era tudo o que foi preciso para causar uma ruptura na arrogância dos presunçosos cidadãos dessa orgulhosa capi­tal. O monte sobre o qual Sardes era erigida tornou-se muito pequeno para uma cidade crescente. Assim, a Sardes antiga, a acrópole, começou a ficar deserta e uma nova cidade surgiu nas vizinhanças. Quando o Apocalipse foi escrito, Sardes estava en­frentando a decadência, uma morte lenta, mas certa.[85] No ano 17 A.D. a cidade foi parcialmente destruída por um terremoto. Dessa forma, diversas vezes os independentes e jactanciosos habitantes de Sardes viram a destruição chegar "como o ladrão de noite", de modo súbito e inesperado.

Sardes estava naufragando num estupor espiritual. Isso explica a auto-designação de Cristo: "Aquele que tem os sete -viventes- espíritos". Ele tem, também, em sua mão direita as sete estrelas. Por meio dos ministros da Palavra e sua mensa­gem, os espíritos viventes são capazes de reviver uma Igreja morta.

"Conheço as tuas obras, que tens nome de que vives, e es­tás morto." Sardes gozava de boa reputação, mas não merecia essa reputação. Onde em Pérgamo e Tiatira um pequeno grupo da congregação havia caído na tentação do mundo, em Sardes a congregação toda havia "contaminado as suas vestiduras". Sardes também estava no mundo. Deveria ter sido um can­deeiro. Mas falhou no cumprimento do seu dever. Nem os ju­deus nem os gentios parecem ter atribulado o povo de Sardes. Sardes era uma Igreja "pacífica". Gozava paz, mas a paz de um cemitério! Cristo diz a esses membros de Igreja mortos que de­vem despertar e manterem-se acordados, e fortalecer o resto que estava à beira da morte. A luz no candeeiro está ficando cada vez mais fraca. Breve a pequena chama estará completa­mente apagada.

"...Não tenho achado íntegras as tuas obras na presença do meu Deus." As formas estavam ali, as cerimônias, os costumes religiosos, as tradições, os cultos; mas faltava a essência real. As formas estavam vazias. Eles não estavam plenamente cheios com a essência. Fé, esperança e amor, genuínos e sinceros, esta­vam em falta. A realidade se fora. À vista dos homens, Sardes pode ser vista como uma Igreja esplêndida. "Diante de Deus", porém, era uma Igreja morta. Por isso o povo de Sardes deveria lembrar seu passado. Haviam recebido o evangelho com ardor e sinceridade; que voltassem a uma vida de obediência ao evan­gelho da maneira como lhes foi pregado e do modo como seus pais o haviam recebido.[86]

"Porquanto, se não vigiares, virei como um ladrão, e não conhecerás de modo algum em que hora virei contra ti" (ver Mt 24.43). Sardes certamente sabia o que isso significava.

"Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras, e andarão de branco junto comigo, pois são dignas." "Umas poucas pessoas" - essas pessoas eram conhecidas nominalmente pelo Pai no céu. Eram conhecidas individualmente, cada uma separadamente. Deus sa­bia exatamente quem e o que eram. Ele conhece os que são seus. Eles eram como luz brilhando no meio das trevas do mun­do. Esses poucos, que aqui guardaram imaculadas as vestes da graça, iriam logo ser revestidos das brancas vestes da glória. Branco indica santidade, pureza, perfeição e festa (Is 61.10; Ap 19.8).

Quando os cidadãos terrenos morrem, seus nomes são apagados dos livros; os nomes dos vencedores espirituais ja­mais serão apagados; sua vida gloriosa perdurará. O próprio Cristo publicamente os reconheceria como seus . Ele faria isso diante do Pai e diante dos seus anjos (cf. Mt 10.32; Lc 12.8,9).

6. A carta a Filadélfia (3.7-13)

Esta cidade estava situada num vale, numa estrada impor­tante. Derivou seu nome de Átala II, 159-138 A.C., cuja lealdade ao seu innão Eumenes conquistou-lhe o epíteto de "irmão-amante". Foi fundada com a intenção de ser um centro para difusão da língua e costumes gregos na Lídia e na Frigia e, assim, desde o princípio foi uma cidade missionária, e muito bem-sucedida no seu propósito.[87]

A essa Igreja Cristo refere-se a si mesmo como aquele que é santo e verdadeiro. A pretensão dos falsos ou não-autênticos- isto é, descrentes - judeus não agrada a ele. Cristo somente tem "a chave de Davi", isto é, o mais alto poder e autoridade no reino de Deus (cf Is 22.22; Mt 16.19; 28.18; Ap 5.5). Cristo sabe que, embora sua Igreja tenha pouco poder por ser pequena em número e em riqueza, tem permanecido leal ao evangelho e não negou o nome do seu Senhor.

"...Eis que tenho posto diante de ti uma porta aberta a qual ninguém pode fechar." A porta aberta significa, primeiro, uma oportunidade maravilhosa de pregar o evangelho e, segundo, a operação da graça de Deus criando ouvidos para ouvir, ansiosos para recebê-lo (cf. 2 Co 2.12; Cl 4.3; At 14.27). A Igreja de Filadélfia, ainda que pequena aos olhos humanos, era grande aos olhos do Senhor. Enfrentando o escárnio e as acusações dos judeus, ela guardou a palavra da perseverança de Cristo, o que, provavelmente, significa o evangelho da cruz na qual a perseverança do Senhor ficou patente. Ela já recebeu em juízo a coroa da vitória e agora é instada a conservá-la. Note como a proteção divina - "também eu te guardarei" - e o empenho humano - "Conserva o que tens"- vão lado a lado. Uma quá­drupla recompensa gloriosa é prometida a essa Igreja que exibe de maneiras tão adequadas o que significa ser um candeeiro.

Primeiro, enfrentando os acusadores e escarnecedores ju­deus ela não apenas prevaleceu - como Esmirna - mas con­quistará a vitória que o vencedor participará por meio de sua conversão! Segundo, ela será guardada segura através da hora da tribulação (cf Is. 43.2; Mc 13.20). Terceiro, os vencedores serão "pilares" do templo de Deus. Um pilar é algo permanente. Eles obtêm aquilo que Davi desejou (SI 27.4). Nenhum terre­moto os encherá de medo ou os levará para fora da cidade celestial. Eles habitarão nela. Finalmente, Cristo escreverá sobre o vencedor o nome de seu Deus e o nome da cidade do seu Deus, a nova Jerusalém ... e seu próprio novo nome. Em outras palavras, ao vencedor será dada a segurança de que pertence a Deus e à nova Jerusalém, e a Cristo, e de que participará, eter­namente, de todas as bênçãos desses três. Para uma explicação da frase "que desce do céu, vinda da parte do meu Deus", ver as páginas 262-264.

7. A carta a Laodicéia (3.14-22)

Laodicéia estava situada nas vizinhanças de águas termais. Emitir água quente da boca era uma figura que seus cidadãos podiam bem compreender. Uma famosa escola de medicina cresceu ali, produzindo, entre outras coisas, um remédio para olhos fracos. Nessa cidade, a macia lã negra das ovelhas do vale era tecida em peças de roupa. Laodicéia, porém, era mais conhecida por sua riqueza. Localizada na confluência de três grandes estradas - para certificar-se, consulte um mapa ela cresceu rapidamente e se transformou num grande centro fi­nanceiro e comercial. Era o lar de muitos milionários. Havia, é claro, teatros, um estádio e um ginásio equipado com ba­nhos. Era a cidade de banqueiros e financistas. Tão rica era essa cidade que seus habitantes declinaram receber ajuda do governo após a cidade ter sido parcialmente destruída por um terremoto.[88]

Os cidadãos de Laodicéia eram ricos - e sabiam disso! Eles eram insuportáveis. Mesmo as pessoas da Igreja demonstravam essa atitude orgulhosa, desafiadora e presunçosa. Talvez imagi­nassem que sua riqueza era sinal de algum favor especial de Deus. A certa altura eles começaram a pensai- que "tinham che­gado lá". Estavam imbuídos do espírito que dominava a cidade. Orgulham-se de suas riquezas espirituais.[89] Se os habitantes de Laodicéia tivessem dito o que pensavam, sua linguagem seria como se segue - ouçam atentamente a um desses insuportáveis jactanciosos que representa o resto deles: "Estou rico e abastado, e não preciso de cousa alguma" (verso 17).

E fácil ver que essas pessoas não eram perturbadas por qualquer consciência de pecado. Jamais pensariam em ficar distantes, com olhos tristes e cabeças tombadas, suspirando e dizendo: "O Deus, sê misericordioso para comigo, um peca­dor". Eles haviam "chegado lá"! Conforme seu próprio modo de pensar, não tinham necessidade de qualquer admoestação e podiam ser mornos quanto a qualquer exortação. "Morno" é a palavra. O povo de Laodicéia sabia exatamente o que isso signi­ficava. Morno, tépido, lasso, claudicante, tíbio, sempre pronto a se comprometer, indiferente, desatento: Uma atitude de "somos todos boa gente aqui em Laodicéia". O autor deste livro se tor­nou pessoalmente familiarizado com essa atitude da parte de alguns membros de Igreja. É impossível se fazer qualquer coisa por essa gente. Com os pagãos, quer dizer, com aqueles que nunca tiveram contacto com o evangelho e que, portanto, são "frios" quanto a ele, pode-se fazer alguma coisa. Com cristãos sinceros e humildes, pode-se trabalhar com alegria. Mas com esses "somos todos boa gente aqui em Laodicéia", nada há que possa ser feito. Até mesmo o próprio Cristo não pode suportá-los. Uma emoção, um sentimento é aqui atribuído ao Senhor que em nenhum outro lugar lhe é atribuído na Bíblia. Não le­mos que ele está ofendido com eles. Nem que ele está irado contra eles. Não, ele está enojado de tais indecisos. E não apenas levemente enjoado, mas totalmente nauseado. "Assim, porque és morno, e nem és quente nem frio, estou pronto a vomitar-te de minha boca." Sabendo muito bem que toda a sua religião é somente muita simulação e fingimento, muita hipocrisia, o Senhor se apresenta como o exatamente oposto: "Estas coisas diz a teste­munha fiel e verdadeira". Noutras palavras, o Senhor revela-se aqui como aquele cujos olhos não somente vêem exatamente o que se passa no coração dessa gente de Laodicéia, mas cujos lábios também declaram, exatamente, a verdade que vêem. Ele de­clara, sobretudo, que ele é "o princípio da criação de Deus", isto é, a fonte de toda a criação (çf. 21.6; 22.13; Jo 1.1; Cl 1.15-18). "Gente de Laodicéia, vocês precisam tornar-se novas criaturas: precisam de novos corações. Tornem-se a mim, portanto, para que sejam salvos."

Embora ele esteja totalmente enojado dessa igreja porque ela falha em seus deveres de portadora da luz, não obstante, há graça aqui: maravilhoso amor cheio de carinho e admoestação. Cristo, na verdade, não diz: "Irei vomitá-los de minha boca", mas: "Estou prestes a vomitar-te de minha boca". O Senhor ainda aguarda. Ele envia essas cartas a fim de retirá-los dessa mornidão espiritual. E, verdadeiramente, severo na sua condenação exa­tamente porque ele é manso e carinhoso, amoroso e gracioso.

A essa congregação, e, portanto, ao seu membro típico, o Senhor diz: "...pois dizes: Estou rico e abastado, e não preciso de cousa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu". Deve-se notar que não é "miserável", mas lastimável. Quem é mais lastimável do que um indivíduo que imagina ser um bom cristão, quando, na realidade, o próprio Cristo está sumamente enojado dele? Leia essas palavras len­tamente e tente ver a figura de um indivíduo que tenha estas cinco características combinadas: vileza, mesquinhez, bajulação servil, cegueira e nudez!

"Aconselho-te." Quão suave ele fala - não "ordeno-te", mas "aconselho-te". Cristo aconselha essa igreja a comprar dele - o "de mim" é bastante enfático - ouro refinado pelo fogo, vestes brancas e colírio. Em poucas palavras: "compre salva­ção", pois a salvação é ouro que enriquece (2 Co 8.9); é veste branca que cobre a nudez ou nossa culpa e reveste-nos com justiça, santidade e alegria no Senhor; é colírio que, quando possuído, não mais nos deixa cegos. A salvação tem de ser com­prada, isto é, precisamos obter a justa posse dela. Mas como podem, aqueles que são pobres, e tudo o mais, comprar qual­quer coisa? Leia Isaías 55.1ss. e você terá uma resposta!

Há algo mais maravilhoso em toda a Bíblia do que isso, que a essa gente morna com que o Senhor está tão desgostoso a ponto de vomitá-los de sua boca, ele se dirija com estas palavras: "Eu repre­endo e disciplino a quantos amo. Sê, pois, zeloso e arrepende-te. Eis que estou à porta e bato..."

Observe que o Senhor está instando para que a porta seja aberta. Não apenas isso, mas - como fica evidente no próximo verso - ele mesmo é quem está batendo repetidas vezes e cha­mando o pecador. Note a frase "se alguém ouvir a minha voz". Não é a pessoa no interior que toma a iniciativa. Não, esse texto está em total harmonia com a Bíblia toda nos ensinamentos concernentes à graça soberana. É o Senhor que está à porta, ou contra a porta - ninguém o chamou - batendo, não uma, mas repetidas vezes: é ele quem chama, e sua voz no evangelho aplicado ao coração pelo Espírito é o poder de Deus para a salvação. Dessa forma, essa passagem faz justiça tanto à graça divina soberana quanto à responsabilidade humana.[90]

"Se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo." Observe que ele diz "se alguém..."; o Senhor dirige-se a indivíduos. A salvação é uma coisa muito pessoal; quando o coração é aberto pela voz do Senhor, esse princípio de regeneração se torna ativo para que, pelo Espírito Santo, o indivíduo regenerado abra a porta e receba a Cristo. O abrir da porta é o que, geralmente, é chamado de conversão. Não confunda regeneração (Jo 3.3ss.; At 16.4) com conversão. Aqui, na expressão: "Se alguém abrir a porta", a referência é feita à conversão, ao arrependimento e à fé em Cristo, como o contexto claramente indica. O Senhor entra (Jo 14.23). Que maravilha! Ele desce do trono de sua glória a fim de cear com esse indivíduo que, em si mesmo, é pobre e desprezível.

Cristo e o crente ceiam juntos, o que no Oriente é uma indicação de especial amizade e de uma aliança de comunhão. Noutras palavras, o crente tem uma abençoada comunhão com seu Salvador e Se­nhor (Jo 14.23; 15.5; 1 Jo 2.24). Essa comunhão começa aqui e agora, na presente vida. E aperfeiçoada na vida por vir quando o vencedor se assentará com Cristo no seu trono, assim como Cristo, o Vencedor, está assentado com seu Pai, em seu trono. O vencedor não somente reinará, mas reinará com Cristo (Ap 20.4), na mais íntima comunhão com ele.

"Aquele que tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas."

A condição sétupla dessas igrejas existe, presentemente, ao mesmo tempo. Existe hoje. Tem existido durante este perío­do. Essas sete igrejas representam a Igreja toda durante toda esta dispensação. E grandemente evidente que uma questão im­portante seja esta: são essas igrejas fiéis à sua vocação? Apegam-se elas, firmes e diligentes, no nome do Senhor no meio das trevas deste mundo (Ap 1.20)? Noutras palavras, são elas candeeiros, portadoras de luz? Em Sardes e em Laodicéia o mundo parece ter triunfado. Vemos apenas uma tênue e bruxuleante chama; a luz está quase - mas não totalmente - apagada. Em Éfeso a luz ainda brilha, mas a chama está diminuindo. Em Pérgamo e em Tiatira, onde a tentação vinda da parte do mundo era intensa, a luz brilha, mas não tão forte quanto deveria ser. Em Esmirna e em Filadélfia, o verdadeiro caráter da Igreja como portadora da luz é revelado e ali se pode encontrar fidelidade a Cristo; portanto, exerce sobre o mundo uma influência benéfica. E essa Igreja uma portadora de luz? Essa é a maior questão em todas as cartas do Apocalipse. Ela é fiel ao Senhor no meio do mundo?

A tentação de tornar-se mundana e de negar a Cristo vem de três direções.[91] Primeiro, da parte da perseguição anticristã, a espada, as feras selvagens, a fogueira, a prisão (2.10,13; 2.9; 3.9)

33.Verpp. 197ss.

e os judeus que constantemente acusavam os cristãos diante das cortes romanas. Segundo, e intimamente relacionado ao primei­ro, da parte da religião romana, o culto ao imperador (2.13). A primeira fonte de tentação não pode ser separada da segunda. Terceiro, há a tentação da carne: o constante apelo a juntar-se às festas imorais dos pagãos a fim de assegurar a posição social e para usufruir os prazeres do mundo. E essa forma de tentação se relaciona à segunda, a forma religiosa. A Igreja está no mundo. Isso era verdade na época. Ela ainda está no mundo hoje. A Igreja deve brilhar nas trevas.

"Vós sois a luz do mundo - e os sete candeeiros são as sete igrejas."

 

Capítulo 9

 

Apocalipse 4-7

Os Sete Selos

Sempre que, na História, a Igreja é fiel à sua vocação e dá testemunho da verdade, sobrevirão tribulações. Mesmo à parte desse fato, a Igreja está no mundo. Conseqüentemente, ela so­fre junto com o mundo. Os filhos de Deus não escapam aos horrores da guerra, da fome e da pestilência. A Igreja precisa dessas tribulações. Precisa tanto do antagonismo direto do mun­do quanto da participação comum nos espantos que pertencem à vida terrena como resultado do pecado. A Igreja, também, é pecadora. Tem constante necessidade de purificação e santificação.

Essas tribulações, portanto, são empregadas pelo nosso Senhor como instrumento para o nosso progresso espiritual. Vemos o estrado dos pés de Deus. Não nos esqueçamos do seu trono! Costumamos dizer que todas as coisas contribuem para o bem daqueles que amam a Deus, que são chamados pelo seu propósito, mas cremos nisso? Algumas vezes falamos e agimos como se o controle dos eventos e o destino do mundo estivesse nas mãos de homens em vez de nas mãos de Deus. Os capítulos 4 e 5, entretanto, provêem a necessária correção e dá-nos uma visão do trono que rege o universo.

No meio da provação e da tribulação, possam os nossos olhos estar fixos naquele que é Rei dos reis e Senhor dos senhores.

1. A visão do trono (4.1-6)

"Depois destas coisas olhei, e eis não somente uma porta aberta no céu" (4.1). Tendo ouvido as epístolas às igrejas, João retornou por um pouco ao seu estado de mente normal. Quanto tempo durou o intervalo, não sabemos. Após, ele teve uma vi­são. Ele não está, ainda, sequer "em Espírito". Quando uma pessoa tem uma visão, ela pode permanecer ainda sensível ao seu ambiente. Assim, por exemplo, Estevão estava plenamente cônscio da presença dos homens vis que o apedrejavam. De fato, ele se dirigia a eles enquanto tinha uma visão dos céus abertos e do Filho do homem em pé à mão direita de Deus (At 7.54-60; ver também Mt 3.16). Semelhantemente, o apóstolo João agora tem uma visão. Com os olhos arregalados de surpre­sa ele vê uma porta aberta no céu (cf Ez 1.1). Enquanto ele olha, a mesma voz que havia antes falado com ele (1.10) se dirige a ele. É a voz de Cristo, ordenando-lhe: "Sobe para aqui". O espírito do vidente recebe a ordem para subir ao trono. Quer dizer, é claro, o trono como aparece na visão. Somente quando vemos todas as coisas, incluindo nossa tribulação, da perspectiva do trono, temos uma visão clara da História.

"...E te mostrarei as coisas que devem acontecer depois destas cousas." Isso, evidentemente, não pode significar: "Mostra­rei as coisas que devem acontecer após esta dispensação".[92] Como em 1.19, "depois" significa "no futuro".

"Imediatamente eu me achei em espírito." Será isso o re­sultado da voz que o apóstolo ouviu? A partir da condição de simples vidente, o apóstolo João entra agora no mais alto estado

 

Diagrama da visão descrita em Apocalipse 4 e 5:

 

 o universo governado pelo trono

A visão consiste de uma única figura que ensina uma grande lição. O quadro no centro representa o trono com seus degraus dirigindo-se a ele. No centro do trono se assenta o Pai (Ap 4.2).

O círculo central 1 representa o diamante branco faiscante (4,3); o círculo 2, o sardônio (4.3); o círculo 3, o arco-íris de esmeralda (4.3); o círculo 4, os quatro seres viventes ou querubins (4.6); o círculo 5, os 24 tronos com os anciãos (4.4); o círculo 6, os muitos anjos (5.11); e o círculo 7, todas as demais criaturas em todo o universo (5.13).

Os sete candeeiros e o mar de vidro estão, também, diante do trono (4.5,6). O Cordeiro (C) se posta entre o trono e os seres viventes de um lado e os 24 anciãos do outro (5.6). O Cordeiro, porém, avança mais tarde para o trono (5.7), e, agora, está assentado com seu Pai (22.1).

O trono reina sobre tudo. Guarde esta lição no coração!

extático de "estar no Espírito". Certamente, o que o apóstolo está prestes a ver é também uma visão. Se não for uma visão, será necessário imaginar que há, no céu, um trono material cercado de 24 tronos físicos e que o Cordeiro, literalmente, tem sete chifres e sete olhos. Isso, logicamente, é um absurdo. João recebe uma visão. É uma continuação da "porta aberta nos céus". No entanto, é mais do que uma visão, isto é, o vidente entra aí num estado de êxtase mais alto, a saber, o de "estar no Espírito". Alguém poder ter uma visão e não estar no Espírito, como vi­mos no caso de Estevão. Quando uma pessoa está "no Espírito" e, nesse estado, tem uma visão, há uma suspensão do contato consciente com o ambiente físico. João não mais vê com seus olhos físicos; não mais ouve com seus ouvidos físicos. Sua alma é levada além de todos os objetos ao redor e totalmente fixada nas coisas que lhe são mostradas na visão. E levada à região do trono (cf. 17.3), à região do trono tal como este lhe aparece na visão.[93]

Contudo, ainda que os diversos objetos que João vê não existam nessa forma física, material, eles expressam uma im­portante verdade espiritual. Eles ensinam uma grande lição. Não nos percamos na interpretação de detalhes; não tentemos encon­trar um "sentido profundo" quando ele não existe. Repetimos: os capítulos 4 e 5 ensinam uma única e grande lição. O quadro é um; a lição é uma.

Esses capítulos, sobretudo, não nos dão um quadro do céu. Eles descrevem o universo todo da perspectiva do céu. O pro­pósito dessa visão é nos mostrar, em maravilhoso simbolismo, que todas as coisas são governadas pelo Senhor em seu trono. "Todas as coisas" devem incluir nossas provações e tribulações. Esse é o ponto. Essa é a razão pela qual a descrição do trono precede a predição simbólica das provações e tribulações que a

Igreja tem de experimentar aqui na terra. Essas são descritas no capítulo 6. Estude cuidadosamente o diagrama da visão em co­nexão com Apocalipse 4, 5, e nossa explicação.

Os capítulos 4 e 5 ensinam uma só grande lição. A menos que entendamos claramente esse ponto, jamais veremos a uni­dade gloriosa do Apocalipse. Acabaremos perdidos em alegorização. Essa única grande lição pode ser expressa nas palavras do salmista: "Reina o Senhor; tremam os povos. Ele está entronizado acima dos querubins; abale-se a terra" (SI 99.1). A segurança dessa verdade deve dar conforto ao crente no meio de ferozes provações. E por isso que a visão do universo gover­nado pelo trono precede a descrição simbólica das provações pelas quais a Igreja deve passar, capítulo 6. Essa é uma bela organização.

Com o auxílio do nosso diagrama, estudemos a visão.

"Eis armado no céu um trono." O trono é o próprio centro do universo, não o físiográfico, mas o centro espiritual. Aqui está a verdadeira fundação da astronomia. O universo da Bíblia não é nem geocêntrico nem heliocêntrico nem sagitariocêntrico, mas celicocêntrico, isto é, teocêntrico.[94] Ver o diagrama. Aqui, também, está a verdadeira filosofia da História. As notícias dos jornais e do rádio oferecem-nos as manchetes e as reportagens, as revistas acrescentam os comentários. Mas as explicações são, afinal, todas em termos de causas secundárias. A verdadeira mente, a verdadeira vontade que - conquanto mantendo a respon­sabilidade e a liberdade de instrumentos individuais - controla este universo é a mente, a vontade do Todo-poderoso Deus! Nada está excluído de seu domínio.

O termo "trono" ocorre dezessete vezes nesses dois capítu­los. Esse trono não está na terra, mas no céu. Está no Santo dos santos do templo celestial tal como a arca da aliança estava no

Santo dos santos do tabernáculo terrestre ou templo (Êx 25.22). Nessa visão, nós temos o cenário de um tabernáculo.[95] Deus é rei e como tal habita no templo. A idéia de que seu trono está no templo é claramente baseada num simbolismo bíblico (Is 6.1; Jr 3.17; 14.21; Ez 1.26; 8.4; 43.7).

"E no trono alguém assentado." No trono se assenta - em majestade - Deus o Pai. O que o apóstolo descreve não é o próprio Deus, pois ele não pode ser descrito (Êx 20.4), mas sua refulgência, sua radiância. Nesta visão ele é representado pelo brilho iridescente do diamante branco translúcido (21.11), ardente,[96] simbolizando a santidade de Deus; e com o verme­lho de sangue do sardônio, indicando que o caráter santo de Deus se expressa em juízos. Ele não pode tolerar o pecado, e isso é exposto pelas sete tochas de fogo e pelos relâmpagos, vozes e trovões que saem do trono (4.5). Tal é Deus, o Santo. Tal é o seu trono de majestade. Trema diante dele, ó terra e seus habitantes!

No entanto, ao redor do trono há um arco-íris de aparência verde-translúcido, significando que a tempestade passou para os filhos de Deus. Cristo se colocou no lugar do pobre pecador. O sol há muito escondido, brilha agora entre as nuvens. Mesmo que a santidade de Deus não possa tolerar o pecado e deva se expressar em juízos, mesmo assim essas aflições têm o propósi­to da salvação do pecador e seu desdobramento em santificação. Todas as coisas - incluindo morte e pobreza, guerra, fome e peste - operam juntamente para o bem dos que amam a Deus e são chamados para o seu propósito (Rm 8.28).

"E desde os seus lombos, e daí para baixo, vi-a como fogo e um resplendor ao redor dela. Como o aspecto do arco que aparece na nuvem em dia de chuva..." (Ez 1.27, 28).

2. Os anciãos e os seres viventes (4.7-11)

Ao redor do trono central João vê 24 tronos, e sobre esses tronos, 24 anciãos, provavelmente representando a totalidade da Igreja da antiga e da nova dispensações. Imagine os doze patriarcas e os doze apóstolos (cf. Ap 21.12-14). Eles vestem as vestes da santidade e sobre a cabeça deles há douradas coroas de vitória. Esses 24 anciãos são mencionados, primeiro, pela sim­ples razão de que eles são os primeiros em importância e em glória sobre as criaturas no céu (Gn 1.26; Hb 2.8). Não pode­mos perder de vista o fato de que a verdadeira razão por que esses 24 tronos e seus ocupantes são mencionados aqui é para aumentar a glória do trono que está no centro. Esse trono re­presenta a soberania de Deus. Os 24 anciãos estão, constante­mente, rendendo culto ao ser que está no trono. Quão grande é o trono!

A quem esses anciãos adoram? Só o Pai? Não, o Deus trino. Como em 1.4,5, assim também aqui temos uma descrição da Trindade em termos do simbolismo do templo. O Pai está as­sentado no trono que emite relâmpago e trovões. Ele é figurado aqui como habitando no Santo dos santos celestial.[97] Além disso, tal como no lugar santo do Tabernáculo terrestre, João vê sete tochas de fogo. Aqui ele as vê acesas diante do trono. (Ver diagrama.) Estas simbolizam o sempre ativo, sumamente sábio e que a tudo vê, o Espírito Santo, pleno de fogo contra o ímpio; pleno de poder santificador em relação ao piedoso. Ainda mais além, como no pátio do Tabernáculo terrestre, há uma pia, ou "mar". Esse mar está diante do trono. É de vidro claro como cristal, indicando o poder santificador. Podemos pensar dele como contendo, simbolicamente, o sangue purificador de Cristo, o Filho, em quem os santos lavaram suas vestiduras e as alvejaram (7.14).

"E também no meio do trono e à volta do trono, quatro seres viventes, cheios de olhos por diante e por detrás" (4.6). Cada um desses "seres viventes" se posta de um lado do trono, e os quatro estão ao redor do trono. (Ver o diagrama.) Esses quatro "seres viventes", que estão prontos para servir a Deus em qualquer das quatro direções, isto é, em qualquer parte do universo, representam todos os "seres viventes" assim como os 24 anciãos redimidos representam a totalidade do exército dos redimidos. Mas quem são esses "seres viventes"?

Para responder essa questão, deveríamos ter em mente que há uma relação próxima entre essa visão toda do trono e os capítulos 1 e 10 de Ezequiel. Instamos o leitor a estudar Ezequiel 1 e 10 muito cuidadosamente. Observe as seguintes marcantes semelhanças.[98] Em ambos os casos esses seres são chamados "viventes" (cf. Ez 1.5 com Ap 4.6). Em ambos os casos, o nú­mero simbólico é o mesmo, a saber, quatro (cf. Ez 1.5 com Ap 4.6). Em ambos os casos a aparência de suas faces é comparada à de homem, leão, boi e águia (cf Ez 1.10 com Ap 4.7). Em ambos os casos eles são intimamente associados ao trono (cf. Ez 1.26 com Ap 4.6). Em ambos os casos fogo se move do e para os "seres viventes" (cf. Ez 1.13 com Ap 4.5: "Do trono saem relâmpagos"). Em ambos os casos se diz que esses "seres viventes" têm olhos por diante e por detrás (cf. Ez 1.18; 10.12 com Ap. 4.8). Em ambos os casos um arco-íris contorna o trono com o qual os "seres viventes" estão associados (cf. Ez 1.28 com Ap 4.3). As poucas diferenças na descrição dos "seres viventes" não devem nos surpreender. De fato, devemos esperá-las. Elas estão em total harmonia com o distinto propósito que cada autor tinha em mente.[99]

Ezequiel 10.20, porém, nos diz com mais palavras que os "seres viventes" são os querubins. Cremos, portanto, plenamente, que, aqui no Apocalipse, esses "seres viventes" são, também, os querubins.[100] Eles são uma ordem maior de anjos, uma das mais altas. Essa conclusão é razoável. Os querubins guardam as coisas santas de Deus (Gn 3.24; Êx 25.20), sendo, portanto, normal e natural que os encontremos nessa visão em íntima proximidade do trono. Além disso, nós os encontramos aqui no Santo dos santos celestial, exatamente onde alguém esperaria achá-los (Êx 25.20).

Observe também que o canto desses "seres viventes" é o canto dos anjos. Em Isaías, os serafins cantam esse hino (Is 6.1-4). Por que, então, não o cantariam os querubins?

Essa conclusão recebe confirmação adicional da conside­ração de que os "seres viventes" são descritos como seres de força como a do leão, com a habilidade de prestar serviço como o boi, com a inteligência do homem - observe também seus muitos olhos, indicando penetração intelectual - e com a rapidez da águia, sempre prontos a obedecer aos comandos de Deus e a prestar-lhe serviço. Certamente, é digno de nota que as caracte­rísticas de força, serviço, inteligência e rapidez são atribuídas a anjos em outros lugares (cf SI 103.20,21; Dn 9.21; Lc 12.8; 15.10; Hb 1.14, etc).

Quando, em 5.11, lemos que "milhões de milhões" de an­jos cercavam os 24 anciãos, isso não conflita de modo algum com a conclusão a que chegamos, isto é, a de que os "seres viventes" aos pés do trono são os querubins.[101] E quando, em 7.11, lemos que "todos" os anjos cercavam os 24 anciãos, esse "todos" se refere, é claro, aos "milhões de milhões" de 5.11 -todos os "milhões de milhões" cercavam os 24 anciãos.

Não cremos que esses querubins tenham qualquer impor­tância mais profunda. Não cremos que eles representem todas as criaturas. Quando o vidente deseja referir-se a todas as cria­turas, ele o faz em linguagem clara (5.13).

Surge a questão: por que esses querubins? A resposta é que eles são apresentados aqui pela mesma razão que os 24 anciãos o são, isto é, para aumentar a significância do trono.11 Tão gran­de é o trono que mesmo os todo-gloriosos e santos querubins se organizam ao redor dele em reverência, humildade e admira­ção, sempre prontos a cumprir a vontade do Soberano do uni­verso. Eles atribuem glória e honra e ação de graças ao que vive para sempre e se assenta no trono (Ver 7.12). Fazem isso não só uma vez, mas muitas vezes. Estão constantemente dizendo: "Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-poderoso, aquele que era, que é e que há de vir". Assim esses querubins glorifi­cam a Deus, o Pai, que representa a Trindade (cf. Is 6.3). Isso não é de surpreender, pois eles habitam em sua imediata pre­sença. Eles vêem a sua glória. Reconhecem a sua sabedoria e vêem, melhor do que vemos neste mundo pecador, que a História é a realização de sua vontade. Por isso se prostram em ato de culto (5.8).

Agora, como sempre, seu "Santo, Santo, Santo" é, imedia­tamente, seguido dos cantos dos anciãos. E o hino de louvor ao Pai Criador. Esses anciãos, simbolizando a totalidade dos redi­midos, se ajoelham, em profunda humildade, prestando-lhe ho­menagem (5.14; 7.11); eles adoram, se curvam, e depositam suas coroas de vitória ao Senhor que está no trono, enquanto dizem: Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade vieram a existir e foram criadas" (Ver Ap 7.12). Esse é o hino da criação. A soberania de Deus é a verdadeira e última razão para a existência de todas as coisas. Todas as cria­turas "eram", isto é, existiam idealisticamente na mente de Deus desde a eternidade. Elas "foram criadas", isto é, vieram real­mente a existir depois já de existirem na mente de Deus.

3. O livro selado, tomado pelo Cordeiro (5.1-7)

"Vi na mão direita daquele que estava sentado no trono um livro escrito por dentro e por fora, de todo selado com sete selos."

Na mão direita do Pai está um rolo [pergaminho] (cf. 6.14). Ele representa o plano eterno de Deus, seu decreto que compreen­de todas as coisas. Simboliza o propósito de Deus com respeito à totalidade do universo através da História, e com respeito a todas as criaturas em todas as épocas e para toda a eternidade. Ele está completamente escrito em ambos os lados.

Esse rolo é descrito como selado inteiramente com sete selos. Esses selos foram, provavelmente, colocados em linha ao longo do exterior do rolo. Assim visto, eles selavam o conteúdo do rolo.[102] O significado é este: o rolo fechado indica o plano de Deus não-revelado e não-executado. Se esse rolo permanece selado, os propósitos de Deus não se realizaram; seu plano não foi cumprido. Abrir o rolo quebrando os selos não só significa revelar o plano, mas cumpri-lo. Por causa disso, um forte anjo proclama com alta voz: "Quem é digno de abrir o livro e desa­tar-lhe os selos?" A voz é tão alta e tão forte que toda criatura, em todo o universo, pode ouvir.

Ninguém foi achado em todo o universo - céu, terra, e sob a terra - que pudesse abrir o rolo e ver seu interior. Como resul­tado disso, João lamenta audivelmente.[103] Você entenderá o sen­tido dessas lágrimas se mantiver, constantemente, em mente que essa bela visão da abertura do rolo e do rompimento dos selos indica a execução do plano de Deus. Quando os selos são que­brados e o rolo é aberto, então o universo é governado no inte­resse da Igreja. Então, o glorioso propósito redentivo está sendo conhecido. Seu plano está sendo cumprido e o conteúdo do rolo passa a se desdobrar na História do universo. Se o rolo não é aberto, porém, significa que não haverá proteção para os filhos de Deus nas horas de amarga tribulação; não haverá julgamento sobre o mundo perseguidor; não haverá triunfo final para os crentes; não haverá novos céus nem nova terra; não haverá herança futura.

"Todavia, um dos anciãos me disse: Não chores: Eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos."

Agora foi a vez de um ancião falar. Não um forte e poderoso anjo, mas um ancião, isto é, um que havia, ele próprio, experi­mentado os efeitos da redenção em sua mesma alma; é sua hora de voltar-se a João com a maravilhosa mensagem de consolação.

"Venceu"! Cristo venceu o pecado na cruz. O grande obstá­culo foi removido. O sangue foi aspergido. A vitória sobre o pecado, sobre Satanás, sobre a morte etc, foi conquistada. Observe cuidadosamente os nomes dados a Cristo. Ele é cha­mado de "o Leão de Judá", uma bem clara referência a Gênesis 49.9, 10. Vencendo Satanás e levando sobre si o peso de toda a ira de Deus até as últimas conseqüências, ele provou ser o Leão. E ele foi chamado também de "Raiz de Davi", o Senhor de Davi, a verdadeira Raiz a quem Davi devia sua origem (Mt 22.41-45).[104]Na cruz, esse Leão de Judá, essa Raiz de Davi, venceu e, portanto, conquistou o direito de abrir o livro e de quebrar seus selos, isto é, de reger o universo em concordância com o plano de Deus.

"Então vi, no meio do trono e dos quatro seres viventes e entre os anciãos, de pé, um Cordeiro como tinha sido morto. Ele tinha sete chifres, bem como sete olhos que são os sete espíritos de Deus enviados por toda a terra. Veio, pois, e to­mou o livro da mão direita daquele que estava sentado no trono."

Nesta visão João vê... O quê? Espera-se "o Leão". Em vez disso, lê-se: "um Cordeiro". Cristo, em seu sofrimento e morte, mostrou ambas as características, de leão e de cordeiro. Ele é o verdadeiro Leão e o verdadeiro Cordeiro. Como ovelha, foi le­vado ao matadouro e sacrificado. O apóstolo vê esse Cordeiro, em pé, entre os querubins ao redor do trono e dos 24 anciãos (Ver o diagrama). O Cordeiro (cf Jo 1.29; At 8.32; 1 Pe 1.19; Êx 12.3; Is 53) estava de pé "como tendo sido morto". Sua morte tem valor permanente. O Cordeiro, isto é, o Senhor Jesus Cristo, tem sete chifres, o que indica seu poder e autoridade; e sete olhos, pois ele está cheio com o Espírito Santo.

O Cordeiro veio e tomou o rolo da mão daquele que estava sentado no trono. Isso, mui claramente, refere-se ao fato de que Cristo, como Mediador, na sua ascensão recebeu autoridade para reger o universo segundo o decreto eterno de Deus.[105] Refere-se à coroação do Cristo ascendido (Hb 2.8,9); vemo-lo coroado com glória e honra. Como recompensa por sua obra redentiva, Cristo, na sua ascensão aos céus, recebeu para si mesmo o reino (Lc 19.12; Hb 2.8,9; Fp 2.6-11), como predito e prometido na antiga dispensação (SI 2; 110; Dn 7.9-14).

Isso não significa que Deus, o Pai, deixe o trono. Significa, sim, que Cristo, o Mediador, se assenta no trono junto com o Pai. A partir desse momento o trono é de Deus e do Cordeiro (22.1). Deus governa o universo por meio do Cordeiro. Esta é a recompensa de Cristo e a nossa consolação. Significa que este é o princípio de uma nova era no céu (20.4); e também na terra(20.2,3).[106] O mais significativo momento na História é sua coro­ação; a investidura do Mediador no cargo de Rei do universo.

4. A adoração do Cordeiro (5.8-14)

Tão logo o Cordeiro toma o rolo, aceitando o cargo de Rei do universo, há uma explosão de triunfo e de exuberante rego­zijo em três doxologias.[107] Os que estão mais próximos do trono as lideram, isto é, os querubins e os 24 anciãos. Ajoelham-se diante do Cordeiro prestando-lhe culto divino. Cada um dos anciãos tem uma harpa, um instrumento de música agradável (18.22) e vasos dourados cheios de incenso, simbolizando a ora­ção e ação de graças no seu sentido mais lato. Eles cantam um novo cântico. E novo porque jamais houve tal grande e gloriosa libertação e jamais o Cordeiro recebeu tão grande honra. As palavras do cântico são como se segue: "Digno és de tomar o livro e de abrir-lhe os selos, porque foste morto e com teu san­gue compraste para Deus os que procedem de toda tribo, língua e nação, e para o nosso Deus os constituístes reino e sacerdotes; e reinarão sobre a terra". Esse é o hino da redenção.

Aqui, definitivamente, o presente desempenho ou domínio sobre o universo é descrito como uma recompensa por seu sofrimento e morte. Ambos os aspectos da expiação, tanto par­ticular quanto universal, estão maravilhosamente combina­dos. O Cordeiro não adquiriu a salvação de cada indivíduo, de cada singular indivíduo. Não, ele pagou o preço pelos seus elei­tos, isto é, por homens de todas as tribos e línguas, etc. Ainda assim, por outro lado, nada há de limitador ou segregador acerca dessa redenção. Abrange o mundo todo em seu escopo e abarca cada grupo, étnico (tribo), lingüístico (língua), político (pessoas) e social (nação).[108] Juntos, todos os remidos constituem-se reino e sacerdotes (Ver 1.6). Por meio do incenso de suas orações os santos já reinam sobre a terra.

Assim como os 24 anciãos formam um círculo ao redor dos quatro seres viventes, assim os anjos cercam os anciãos (Ver o diagrama).[109] O termo "anjo" não inclui os querubins, nem aqui nem em Apocalipse 7.11. Diz respeito a todos os outros anjos. O apóstolo os vê como uma grande multidão: milhões de milhões e milhares de milhares. Com altas vozes eles dizem: "Digno é o Cordeiro, que foi morto, de receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força,e honra, e glória, e lou­vor"- sete excelências que representam todas as virtudes nos céus e na terra (Ver 7.11). Primeiro, os anciãos cantam, pois experimentaram a salvação. Depois, cantam os anjos, pois fo­ram instruídos, pelos anciãos, nos mistérios da redenção (cf Ef 3.10).

Finalmente (v. 13), todo o universo, em todas as suas par­tes e com todas as criaturas, se juntam num coro de louvor (Ver diagrama). Temos nesse verso o clímax do que se encontra nos capítulos 4 e 5. O capítulo 4 fala de Deus e da criação; o capí­tulo 5.1-12 faz referência ao Cordeiro e à redenção. E, então, estes dois versos, 5.13,14, relatam a glória e a adoração conjunta de Deus e do Cordeiro.[110] Todo o universo louva a Deus e ao Cordeiro por causa de sua obra na criação e na redenção.

Os quatro querubins estão, constantemente, dizendo: "Amém". Depois de cada declaração de louvor por todo o uni­verso, esses quatro seres viventes dizem: "Amém". Eles apõem o seu selo, e o de Deus, de aprovação sobre essa adoração universal.

Também os anciãos se ajoelham e adoram, prestando culto divino não ao Deus triúno, mas, mais especificamente, ao Cordeiro. Que gloriosa antífona!

Então, todo o universo é governado pelo trono, isto é, por Deus mediante o Cordeiro. Quando o Cordeiro ascendeu ao céu, ele se assentou à direita de Deus, "acima de todo principado, e potestade, e poder, e domínio, e de todo nome que se possa referir não só no presente século, mas também no vindouro. E [ele, o Pai] pôs todas as coisas debaixo dos seus [de Cristo] pés e, para ser o cabeça sobre todas as cousas, o deu à Igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as cousas" (Ef 1.21-23). Todas as coisas, em última instância, devem glorificar a Deus: sua vontade é cumprida em todo o universo. O trono governa. O Cordeiro reina. Portanto, os crentes não devem temer em tempos de tribulação, de perseguição e de angústia.

5. Os quatro cavaleiros e seus cavalos (6.1-8)

Os selos descritos no capítulo 6 são símbolos de tais tribu­lações e perseguições. O Cordeiro tomou o rolo e imediata­mente começa a abrir os selos. E cada selo, quando rompido, apresenta um símbolo. O primeiro dos quatro selos dá lugar aos símbolos dos cavalos e seus cavaleiros, tal como em Zacarias 1.8ss.; 6.1ss. Na Escritura, o cavalo é, geralmente, mencionado em conexão com os conceitos de força, terror, guerra e conquista (ver Is 30.16; 31.1; Jó 39.22-28). No Apocalipse, temos a mesma associação de idéias (9.7; 14.20; 19.11).

Cada um dos quatro "seres viventes" tem sua vez na apre­sentação de um cavaleiro. Com voz como que de trovão, ele diz: "Vem". O chamado, nesse caso, é dirigido ao cavaleiro.

a. O cavalo branco. "Vi, então, e eis um cavalo branco e seu cavaleiro com um arco; e foi-lhe dada uma coroa; e ele saiu vencendo e para vencer." Concordamos com o ponto de vista de muitos eminentes intérpretes que consideram o cavaleiro do cavalo branco como símbolo de Cristo. Chegamos a essa con­clusão depois de cuidadoso estudo e com base nas seguintes considerações.

Primeiro, esse ponto de vista está em harmonia com o con­texto. Lembre-se de que nos primeiros três capítulos vimos o Cristo que habita a Igreja brilhando no meio do mundo. Você se recorda, sem dúvida, a figura vívida do Filho do homem reve­lando sua presença entre os candeeiros (1.13ss.). Sempre que Cristo aparece, Satanás fica ocupado: tribulações são reserva­das para os filhos de Deus. Na seção que estamos estudando, capítulos 4-7, já temos visto esse mesmo Cristo figurado como o Cordeiro que toma o rolo do decreto de Deus e abre os selos. Com respeito a esse Cordeiro, lemos: "Eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu..."

Isso foi dito em 5.5. O resto do capítulo contém a descrição da adoração do Cordeiro. Agora, o capítulo 6 se abre com um símbolo do cavaleiro que veio "vencendo e para vencer". Não parece óbvia a conclusão de que o "Vencedor" é o mesmo em ambos os capítulos?

Segundo, esse ponto de vista está em harmonia com um cuidadoso estudo de palavras.

(i) Esse cavalo é "branco". A cor branca é sempre associa­da com o que é santo e celestial. Pense nas vestes brancas, na nuvem branca, no trono branco, na pedra branca etc. Certamente, portanto, o cavaleiro sobre o cavalo branco não pode ser o diabo ou o anticristo.[111]

(ii) O cavaleiro recebe uma coroa. Isso se harmoniza bem com 14.14, onde lemos que Cristo estava usando uma coroa de ouro.

(iii) Finalmente, sempre que nesse livro a palavra "vencedor" ocorre - com duas exceções[112] - refere-se a Cristo ou aos crentes.

As duas passagens mais próximas à que estamos conside­rando são Apocalipse 3.21 e 5.5. Em ambos os casos a vitória é atribuída a Cristo. Depois, em seu Evangelho, o apóstolo João usa a palavra só uma vez (16.33), e aqui, de novo, referindo-se a Cristo. Vejamos essas quatro passagens em seqüência:

João 16.33: "No mundo passais por aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo".

Apocalipse 3.21: "Assim como eu também venci e me sen­tei com meu Pai no seu trono".

Apocalipse 5.5: "Eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu..."

Apocalipse 6.2: "e saiu vencendo e para vencer".

Medite sobre essa declaração exaltada. Ficamos certos de que, se não tivéssemos ouvido outra interpretação, iríamos ime­diatamente dizer: "Trata-se do Cristo conquistador".

Terceiro, esta interpretação é exigida pela passagem parale­la no próprio livro do Apocalipse. Em Apocalipse 19.11 temos uma outra ocasião em que aparece alguém montado num cavalo branco. Nessa passagem nos é dito, definitivamente, que o cava­leiro é Cristo, a Palavra de Deus, Fiel e Verdadeiro. Seu nome é "Rei de reis e Senhor de senhores". Excelentes comentaristas sentem que é impossível escapar à força desse argumento.[113] Dizer que o cavaleiro no cavalo branco em 19.11 é outro que não o de 6.2 porque os detalhes nas duas descrições são diferentes, é errar o alvo! E de se esperar que os detalhes sejam diferentes de alguma forma. Isso não serve de argumento contra nossa posi­ção, mas, antes, a corrobora. Em Apocalipse 5.5 lemos que Cristo "venceu". Isso se refere ao cumprimento da redenção na cruz do Gólgota. Em 6.2, o cavaleiro no cavalo branco é apresentado como "vencendo e para vencer". Essa vitória está se realizando no presente. Em 19.13, o cavaleiro sobre o cavalo branco é descrito como vestido com um "manto tinto de sangue", isto é, do sangue dos seus inimigos. Assim irá ele vencer no dia do juízo. Da mesma forma nos é dito que ele, agora, usa uma coroa (6.2). Logo ele terá sobre sua cabeça "muitos diademas" (19.12), pois terá vencido muitos. Francamente, não vemos como uma pessoa se justifica ao dizer que o cavaleiro no ca­valo branco em 6.2 significa uma coisa, e em 19.1 lss., outra. Por que não permitir que o próprio Apocalipse explique seu próprio simbolismo?

Quarto, a idéia de que o vencedor sobre o cavalo branco é Cristo está em harmonia com o próprio engenho e propósito do livro do Apocalipse. Já dissemos antes que o tema desse livro é a vitória de Cristo e de sua Igreja. Nele, repetidas vezes, o Senhor é representado como aquele que venceu, está vencendo e vencerá. (Leia cuidadosamente as seguintes passagens: Apocalipse l.I3ss.; 2.26,27; 3.21; 5.5; 6.16; 11.15; 12.11; 14.14ss.; 17.14; 19.11.) A idéia do Cristo vitorioso é um fio que corre através do livro do começo ao fim. E se alguém hesitar em crer nisso, que estude as referências que temos citado.

De todas essas referências, selecionamos apenas uma cita­ção por inteiro, a saber, 17.14: "Pelejarão contra o Cordeiro, e o Cordeiro as vencerá, pois é o Senhor dos Senhores e o Rei dos reis; vencerão também os chamados, eleitos e fiéis que se acham com ele".[114]

Portanto, quando dizemos que, em 6.2, o cavaleiro no ca­valo branco é o Cristo, estamos, simplesmente, expressando uma idéia que está em harmonia com o livro todo.

Quinto, o ponto de vista de que o cavaleiro no cavalo bran­co, em 6.2, é Cristo, está em harmonia com o que se acha em Mateus 10.34. Tal como nessa passagem é Cristo quem traz a espada, pois Cristo e a espada se seguem um ao outro, assim,aqui, era Apocalipse 6.2, 3, o cavaleiro no cavalo branco é seguido pelo cavaleiro no cavalo vermelho que recebe uma espada.[115]

Sexto, esta interpretação é fortemente suportada pela passa­gem paralela em Salmo 45.3-5:

"Cinge a espada no teu flanco, herói, cinge a tua glória e a tua majestade! E nessa majestade cavalga prosperamente pela causa da verdade e da justiça; e a tua destra te ensinará proezas. As tuas setas são agudas, penetram o coração dos inimigos do Rei: os povos caem submissos a ti."

A Septuaginta diz que o cavaleiro verga o arco e prospera e reina.

Note as semelhanças marcantes. Apocalipse 6.2 figura o cavaleiro vindo e vencendo e para vencer; assim também o faz o Salmo 45 ("E nessa majestade cavalga prosperamente"). Apocalipse 6.2 nos diz que o cavaleiro está equipado com um arco; assim também o Salmo 45 (na tradução da septuaginta). Mas será que o Salmo 45 se refere a Cristo? A esta altura não pode haver dúvidas. A Escritura mesmo cita parte dessa des­crição do cavaleiro do Salmo 45 e diz-nos que ele é "o Filho" (Hb 1.8).

Vemos, portanto, que o Antigo Testamento - e lembre-se de que o Apocalipse está imerso no simbolismo do Antigo Testamento[116] - retrata o Messias equipado com um arco (cf. Ap 6.2) e com uma espada (cf. Ap 19.15), cavalgando prospera­mente. Então, por que não afirmar que aqui, em Apocalipse 6.2, o cavaleiro do cavalo branco é a mesma pessoa exaltada?[117]

Sétimo, outra passagem paralela que pode ser citada em favor de nosso ponto de vista é Zacarias 1.8ss. A identificação do cavaleiro sobre o primeiro cavalo com Cristo, na visão de Zacarias, não é improvável (cf também Hc 3.8,9; Is 41.2).

Nosso Senhor Jesus Cristo está vencendo agora, isto é, por toda esta presente dispensação. Sua causa progride, pois ele exerce tanto seu poder espiritual quanto seu reinado universal. Por meio da Palavra (evangelho: Mt 24.14) e do seu Espírito, do testemunho e lágrimas dos seus discípulos, sua própria in­tercessão, dos anjos do céu e exércitos na terra, das trombetas do juízo e das taças de ira, nosso Senhor cavalga vitorioso, ven­cendo e para vencer. Esse, com toda probabilidade, é o signifi­cado do cavaleiro do cavalo branco.[118]

Agora, são introduzidos os outros cavalos e seus cavalei­ros. Sejamos cuidadosos em nossa interpretação do significado desses símbolos. Um método muito popular de interpretação do simbolismo dos quatro cavalos do Apocalipse consiste em colocar Apocalipse 6 e Mateus 24 em colunas paralelas.[119] Dessa forma, Mateus 24 é visto como um comentário completo de

Apocalipse 6! Tudo é muito simples, mas, talvez, simples demais. Certamente, há muitas semelhanças entre Mateus 24 e Apocalipse 6, mas também há muitas diferenças.[120] Lembremo-nos de que o simbolismo do Apocalipse se funda no Antigo Testa­mento.[121] Assim, o simbolismo dos cavalos e seus cavaleiros em passagens como Ezequiel 5.17; 14.21; Zacarias 1.8ss., devem ser levadas em consideração.

Agora, o que aprendemos dessas passagens do Antigo Tes­tamento que poderiam ser úteis na explicação de Apocalipse 6?

Em Ezequiel, quem aflige Judá é Babilônia. Mas Babilônia, por sua vez, é instrumento nas mãos de Jeová, que envia juízos a fim de purificar Jerusalém e para santificar seu povo. (Ver, especialmente, Ez 11.19; 33.11.) Semelhantemente, em Zacarias, o segundo, o terceiro e o quarto cavaleiros estão associados com o primeiro: estão a seu serviço.

Possivelmente, a mesma coisa é válida quanto aos cavalei­ros descritos em Apocalipse 6. Considerando o Antigo Testa­mento, não é de se surpreender, também, que o segundo e o terceiro cavaleiros servem ao primeiro: são instrumentos de Cristo para refinar e fortalecer seu povo. Na verdade, é o mun­do iníquo que persegue a Igreja.[122] Mas esse mesmo mundo é, por sua vez, instrumento na mão daquele que tomou o rolo. Assim, Satanás é derrotado pelas suas próprias armas; aquilo cuja intenção era ser instrumento de exterminação se torna meio de fortalecimento da Igreja, como instrumento de fomento do reino e de salvação do seu povo.[123]

Voltamos, então, para o discurso escatológico de Cristo, relatado em Mateus 24, Marcos 13 e Lucas 21. Embora esses capítulos não forneçam uma explicação completa e simples de Apocalipse 6, eles devem ser levados em conta. Quem lê o dis­curso do Senhor Jesus Cristo, imediatamente observa que, en­tre os sinais que anunciam a segunda vinda, há alguns que se referem à humanidade em geral e, outros, que dizem respeito, mais diretamente, aos crentes (Ver Mt 24.6-10; Mc 13.7-9). Vejamos Lucas 21.10-13.

(i) Sinais que se referem à humanidade em geral: "Então lhes disse: Levantar-se-á nação contra nação, e reino contra reino; haverá grandes terremotos, epidemias e fome em vários luga­res, cousas espantosas e também grandes sinais do céu", etc.

(ii) Sinais que dizem respeito, mais diretamente, aos cren­tes: "Antes, porém, de todas essas coisas, lançarão mão de vós e vos perseguirão, entregando-vos às sinagogas e aos cárceres, levando-vos à presença de reis e governadores, por causa do meu nome..."

Mesmo que as tribulações do primeiro grupo, que os cren­tes experimentam juntos com o resto da humanidade, sejam aqui preditas do ponto de vista de sua significância para os crentes, a distinção entre os dois grupos continua clara.

Se o simbolismo de Apocalipse 6 revelasse igual distinção, de modo que, digamos, o segundo e o terceiro cavaleiros des­crevem, particularmente, o que acontece com os crentes por permanecerem fiéis ao seu Senhor, enquanto o quarto cavaleiro expõe o que os filhos de Deus experimentam junto com o resto do mundo, então não deveríamos nos surpreender. Se, porém, Apocalipse 6 nada tem que ver com Mateus 24, Marcos 13 e Lucas 21, mais ou menos esperamos essa distinção.

b. O cavalo vermelho. Tendo já estudado as passagens que constituem o pano de fundo para Apocalipse 6, dirijamos nossa atenção para o segundo cavalo e seu cavaleiro. O segundo "ser vivente" ordena ao segundo cavalo que venha. "E saiu outrocavalo, vermelho; e ao seu cavaleiro foi-lhe dado tirar a paz da terra para que os homens se matassem uns aos outros; também lhe foi dada uma grande espada (machaira)"

Cremos que esse cavalo e seu cavaleiro referem-se à per­seguição religiosa dos filhos de Deus, mais do que a guerra en­tre nações; carnificina e sacrifício em vez de guerra. Os crentes são "mortos por causa do seu nome". Isso pertence à categoria de sinais dirigidos, mais diretamente, aos crentes: sua persegui­ção movida pelo mundo. Oferecemos os seguintes argumentos em favor deste ponto de vista.

Primeiro, esta explicação está em marcante acordo com o contexto imediato. O segundo cavalo se segue ao primeiro, isto é, sempre que Cristo, pelo seu evangelho, Espírito, etc, faz sua entrada, a espada da perseguição se segue. Essa passagem está, também, de acordo com Apocalipse 10.9.

Segundo, este ponto de vista é confirmado por uma passa­gem paralela, Mateus 10.34: "Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada. Pois vim causar divisão entre o homem e seu pai; entre a filha e sua mãe e entre a nora e sua sogra... e quem não toma a sua cruz, e vem após mim, não é digno de mim. Quem acha a sua vida perdê-la-á; quem, toda­via, perde a vida por minha causa, achá-la-á".[124]

Terceiro, não deve escapar à nossa atenção o que lemos em nossa passagem: "que os homens se matassem uns aos outros". Esse não é o termo comum que João usa para indicar o ato de matar ou guerra. Em todos os escritos do apóstolo João, com uma única exceção (Ap 13.3), esse termo se refere à morte de Cristo ou a execução de crentes. Eis todas as passagens nas quais João usa a palavra que, na sua forma formal, lhe é peculiar. "Caim... assassinou a seu irmão"(l Jo 3.12): aqui é dito de um filho de Deus (Abel) que foi assassinado ou morto brutalmente. "...Um Cordeiro como que tinha sido morto" (Ap 5.6): aqui está

Cristo sacrificado por causa do pecado. "Digno é o Cordeiro que foi morto" (Ap 5.12): esta é uma clara referência a Cristo. "...As almas daqueles que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus" (Ap 6.9): aqui a palavra se refere aos crentes. "...Do Cordeiro que foi morto" (Ap 13.8): uma referência a Cristo. "E nela se achou sangue de profetas, de santos e de todos os que foram mortos sobre a terra" (Ap 18.24): a referência é feita, claramente, aos crentes.

Contudo, em Apocalipse 13.3, a cabeça "golpeada de mor­te" pertence à besta, que arroga a si a honra e o poder perten­centes a Cristo.

Assim, não é improvável que na única passagem restante, esta sobre a qual estamos discutindo (Ap 6.4), também se refi­ra, primariamente, aos crentes. Perseguições religiosas parecem ser a questão principal, não a guerra em geral.

Quarto, lemos que, quando o quinto selo é aberto, João vê "as almas daqueles que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus". Como já foi mencionado, a mesma palavra "assassinado" é utilizada no original. Aqui, porém, diz, claramente, que as pessoas mortas são crentes. Foram mortos por causa da Palavra de Deus. Não parece razoável supor que aqueles que foram vistos sob o segundo selo como tendo sido assassinados são os mesmos descri­tos, sob o quinto selo, como também tendo sido assassinados?

Quinto, lemos: "...também lhe foi dada uma grande espada (machaira)". O termo machaira é usado num sentido bem amplo, como qualquer estudo da Escritura, com o simples auxílio de uma concordância, revelará. Aqui, ele significa, exatamente, uma adaga sacrificai,[125] o instrumento natural da matança men­cionada. É a palavra "cutelo", usada na Septuaginta para tradu­zir Gênesis 22.6,10, na História do sacrifício de Isaque, onde também encontramos a palavra "matar, sacrificar".[126]

Finalmente, mantenhamos em mente que o Senhor Jesus Cristo está falando, nesse livro, a crentes que, na ocasião em que a visão foi inicialmente revelada, estavam sendo persegui­dos até a morte. O morticínio dos crentes era uma preocupação imediata, muito mais premente do que uma guerra em geral.

Sempre que o cavaleiro do cavalo branco - Cristo - aparece, segue-se o cavaleiro do cavalo vermelho. (Ver Mt 5.10, 11; Lc 21.12; At 4.1; 5.17, etc.) Lembre-se de Estevão e Paulo, Públio e Policarpo, Perpétua e Felicitas, a Inquisição e a noite de São Bartolomeu, Armênia e Rússia, John e Betty Stam.[127] O cavalei­ro no cavalo vermelho não se refere a uma pessoa em particu­lar. Nem pertence a uma época em especial. Nenhum século fica sem seu cavaleiro do cavalo vermelho: o mundo está sem­pre perseguindo a Igreja. Cristo sempre traz a espada. A paz é retirada da terra (Mt 10.34).

Contudo, louvado seja Deus! Porque a espada sacrificai, ou cutelo, é "dada" ao cavaleiro. Todas as coisas estão nas mãos de Deus. O Cordeiro reina!

c. O cavalo preto. O terceiro "ser vivente" se dirige ao terceiro cavaleiro, dizendo: "Vem", e ele sai sobre seu cavalo preto. Esse cavaleiro tem na mão uma balança (Ez 4.10). Comer pão por peso é uma referência a uma condição de dificuldade econômica. Uma voz soa do meio dos quatro seres viventes, dizendo: "Uma medida de trigo por um denário; três medidas de cevada por um denário..." Noutras palavras, o salário de um dia pelo preço de farinha que basta para apenas uma pessoa por um dia (cf. Mt 20.2). Nesses termos, um homem poderia man­ter apenas a si mesmo, mas o que será de sua família? É claro que ele poderia comprar cevada, o alimento não-refinado, a um terço do preço e prover para a família. Mas é só de comida que a família precisa? E as outras necessidades? Quando tais preços prevalecem, é difícil para um homem acertar suas contas. Não é a fome que é mencionada aqui, pois tais preços, ainda que altos, não são preços de fome.[128] Além disso, qualquer um que tenha dinheiro pode comprar quanto trigo quiser! E essa é a questão. Como pode uma pessoa que ganha muito pouco, susten­tar sua família quando os preços estão tão altos? A classe mais baixa será duramente pressionada. Mais tarde saberemos a que grupo de pessoas o texto se refere.

A voz continua: "E não danifiques o azeite e o vinho". De óleo e de vinho, representando os confortos da vida, há pleno suprimento! Mas estão fora do alcance do homem que já tem bastante dificuldade em prover escasso alimento para sua família. Agora temos o quadro todo: vemos o rico usufruindo comida em abundância e todos os confortos da vida. O pobre, porém, mal tem o suficiente para manter corpo e alma juntos.

Surge a questão: Quando o vidente se refere a essas pessoas pobres e duramente pressionadas, em quem ele está pensando? A resposta é óbvia. Fica bem claro no livro do Apocalipse que os crentes eram pobres. Os primeiros leitores entendiam imedia­tamente esse símbolo. Recebemos do próprio livro do Apocalipse a informação sobre as condições econômicas prevalecentes na Igreja nesse tempo.

Sabemos, antes de tudo, que ninguém poderia permanecer em seu negócio sem sacrificar suas convicções e seus princí­pios religiosos.[129] O que aconteceria se uma pessoa evitasse tais organizações? É preciso pouca imaginação para entender que o resultado de tal afastamento seria perdas materiais e sofrimento físico.

Então, aprendemos, também, que qualquer que não tivesse a "marca da besta" não estava habilitado a comprar ou vender (verAp 13.17).

Não tem isso sido verdadeiro através dos tempos? Não é um princípio da conduta humana oprimir os crentes e fazê-los sofrer necessidades físicas? Quão freqüentemente os filhos de Deus têm sido barrados em seus empregos, negócios ou pro­fissões porque insistem em ser fiéis às suas convicções? Um homem, por exemplo, que se recusa a trabalhar no Dia do Senhor e é despedido. Conseqüentemente, ele é forçado a tra­balhar noutro emprego por um salário menor. Ele tem família para sustentar. Em vão se procuraria qualquer conforto ou luxo em sua casa. Outro, por questões de consciência, recusa-se a afiliar a um sindicato que defende uma política de violência e o resultado é que ele, também, perde o emprego. O rico opressor, entretanto, tem abundância. Ninguém danifica seu óleo ou seu vinho.

O segundo e terceiro cavaleiros pertencem à mesma catego­ria. Ambos descrevem a perseguição do povo de Deus. Alguns crentes são mortos. Seu sangue é derramado. Esses são mártires no sentido mais restrito do termo. O segundo (vermelho) cavalo e seu cavaleiro os descrevem. Mas nem todos os crentes sofrem real martírio nesse sentido. Ainda assim, num sentido mais amplo, os outros também são mártires. Sofrem pobreza e difi­culdade (cf 1 Co 1.26). O cavalo preto e seu cavaleiro podem ser vistos em sua missão de espalhar espantosa opressão, injus­tiça e dificuldade econômica através dos séculos de existência da Igreja.

Essa forma de perseguição é também um instrumento na mão de Cristo para o progresso do seu reino. O indivíduo dura­mente oprimido sente sua dependência em Deus.

Assim, o segundo e o terceiro cavaleiros descrevem esses infortúnios que afetam os crentes de maneira muito especial. Eles simbolizam que o mundo, ao longo de toda a dispensação, perseguirá a Igreja de todas as maneiras possíveis. Lembremo-nos de que as duas formas de perseguição aqui mencionadas, isto é, assassinato e injustiça ou dificuldade econômica, repre­sentam todas as formas.

d. O cavalo amarelo. São essas, porém, as únicas prova­ções pelas quais a Igreja deve passar em seu caminho para a glória eterna? De modo algum. Tal como em Mateus 24, Marcos 13 e Lucas 21 há a menção de um segundo grupo de tribula­ções, assim também aqui. Há desgraças que a Igreja deve sofrer junto com o mundo pela simples razão de que está no mundo. Assim é que essa classe de tribulações que o quarto cavalo e seu cavaleiro trazem chamam a nossa atenção.

O quarto selo é aberto. O quarto ser vivente diz: "Vem", e um cavalo pálido ou arroxeado é visto.[130] É um cavalo com uma cor doentia e repulsiva, símbolo de doença e morte. Sobre[131] esse cavalo se assenta um cavaleiro cujo nome é Morte. Significa morte em geral; sim, morte em sua forma mais universal, pois os instrumentos de morte aqui mencionados afetam tanto os crentes quanto os não-crentes. Após a morte, como sempre, vem o Hades.[132] A morte ceifa, e o Hades - que simboliza o estado de existência desencarnada - ajunta os mortos.[133] Ainda assim, a morte e o Hades não podem agir como querem. Nada podem fazer além do permitido pela vontade divina. Isso é enfatizado pela consolação dos crentes. Lemos que tal autoridade é dada à morte e ao Hades. Sua esfera de atividade, sobretudo, é bem definitivamente restrita. Embora o território seja grande, a quarta parte da terra, mesmo assim seus limites são definitivamen­te estabelecidos pelo decreto divino, o qual é cumprido pelo Cordeiro. A quarta parte e nada mais!

A eles é dada autoridade para matar "à espada, pela fome, com a pestilência [ou morte] e por meio das feras da terra". Essas são quatro desgraças que não haviam sido descritas sob o segundo e terceiro selos. Essa passagem é decididamente ba­seada em Ezequiel 14.21, 22. Observe a íntima semelhança:

"Porque assim diz o Senhor Deus: Quanto mais, se eu enviar os meus quatro maus juízos, a espada, a fome, as bestas-feras e a peste, contra Jerusalém, para eliminar dela homens e animais? Mas eis que algumas restarão nela". Aqui (Ap 6.8) as mesmas quatro desgraças são mencionadas quase na mesma ordem.

Primeiro, menciona-se a morte pela espada. Aqui não lemos "assassinar", como no segundo selo, mas "matar". Também o termo traduzido por "espada" é diferente. Não é a machaira, mas a rhomphaia. Não é a faca sacrificai ou cutelo, a espada longa e pesada, como a que Davi usou para cortar a cabeça de Golias. Na tradução da Septuaginta, de Ezequiel 14.21, encon­tramos a mesma palavra (rhamphaia) usada aqui em Apocalipse 6.8. Aqui, trata-se de guerra] Os comentaristas que mantêm que o segundo cavalo e seu cavaleiro se referem à guerra entram em dificuldades na explicação do quarto cavalo. E se, além disso, interpretaram o terceiro selo como significando fome, eles estarão perdidos quanto ao que fazer com o quarto selo quando este também indicar fome. Eles tentam evitar essa difi­culdade ensinando que as desgraças do segundo e terceiro selos se repetem no quarto - uma repetição improvável e ininteligente - ou que muito do que é descrito no quarto selo é uma interpolação.[134] Este, é claro, é um meio muito conveniente de despachar o problema. Culpe o escriba!

Um estudo cuidadoso revela, porém, que esses quatro selos indicam tipos de desgraças facilmente distinguíveis. O quarto selo, sobretudo, descreve quatro[135]-'' desgraças universais. São vistas aqui do aspecto de seu significado para a Igreja. E mencionada, primeiro, a guerra, não apenas uma guerra em particular, mas guerra entre nações, sempre e quando ela ocorra através de toda a dispensação. Fica claro que a espada (rhamphaia) se refere à guerra, baseado em Apocalipse 2.16; 19.21.

Depois, são mencionadas fome e escassez. Isso, também, é uma desgraça geral, freqüentemente mencionada na Bíblia. Quando uma cidade é sitiada em tempos de guerra, geralmente seguem-se fome e escassez.

A escassez, por sua vez, é geralmente seguida, ou asso­ciada, à pestilência. Pestilência, tanto aqui quanto na tradução da Septuaginta de Ezequiel 14.21, é chamada "morte". Tal como hoje a chamamos de "morte negra". Assim mencionada em conexão com a fome, é provável que se refira à própria peste bubônica.[136] Quem estiver interessado numa fascinante descrição do que consideramos ser a peste bubônica deve ler 1 Samuel 5-7.[137]

Ver Jeremias 21.6-9; Lucas 21.11 para uma íntima relação entre fome e pestilência.

Finalmente, tal como em Ezequiel, aqui as bestas são men­cionadas (Ver 2 Rs 17.25). Estas bestas também não distinguem entre crentes e não-crentes. Elas fazem em pedaços e devoram o que quer que agarrem dentro e fora das arenas romanas.

Assim, todas as quatro - guerra, fome, pestilência e bestas feras - são gerais em seu caráter. Essas quatro, sobretudo, são símbolos de todas as desgraças universais que os crentes sofrem juntamente com o resto da humanidade através de toda a dispensação. Contudo, com respeito à Igreja, essas desgraçastêm um significado especial. Nosso Senhor Jesus Cristo usa essas desgraças como instrumentos para a santificação de sua Igreja e para a extensão do seu reino.[138]

Chegamos à seguinte conclusão com respeito ao significado dos quatro cavaleiros do Apocalipse:

O cavaleiro do cavalo branco é o Senhor Jesus Cristo.

O cavaleiro do cavalo vermelho representa a mortandade.

O cavaleiro do cavalo preto representa as dificuldades eco­nômicas e a pobreza devidas à injustiça.

O segundo e o terceiro selos simbolizam a perseguição direta da Igreja, movida pelo mundo.

O cavaleiro do cavalo pálido (amarelo) representa a Morte, a espada (guerra), fome, pestilência, bestas feras. Estas são desgraças comuns da humanidade descritas aqui da perspectiva de seus efeitos sobre o reino de Deus.

6. O clamor dos mártires (6.9-11)

"Quando ele abriu o quinto selo, vi debaixo do altar as almas daqueles que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa do testemunho que sustentavam. Clamaram em grande voz, dizendo: Até quando, ó Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não julgas nem vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra?"

Não se esqueça de que o que João vê não é o céu ou a própria terra, mas uma visão simbólica. Nessa visão, o apóstolo observa o altar que, aqui, aparece como um altar de ofertas queimadas em cujas bases o sangue dos animais sacrificados deveria ser derramado (Lv 4.7). Sob esse altar João vê o sangue dos santos sacrificados. Ele viu a alma deles, pois "a vida está no sangue" (Lv 17.11). Eles haviam oferecido sua vida como sacrifício, tendo-se apegado tenazmente ao testemunho com respeito a Cristo e à salvação que há nele. Essas são as almas que haviam sido sacrificadas sob o segundo selo [139] Essas almas clamam por vingança sobre aqueles que as imolaram.

Surge a questão: como harmonizar esse clamor por juízo e vingança com a oração de Cristo por seus inimigos (Lc 23.34) e com a oração de Estevão pedindo que Deus não lhes atri­buísse culpa? Respondemos: esses mártires não invocam re­tribuição por sua própria causa, mas por causa de Deus. Esses santos foram sacrificados porque colocaram sua certeza e sua confiança no Senhor. Imolando-os, o mundo desprezou a Deus. Não afirma o próprio Deus que o sangue dos seus santos cla­ma pela ira? (Gn 4.10; cf. Hb 11.4). Indivíduos insignifican­tes, meros habitantes da terra, desafiaram o santo, verdadeiro e soberano Senhor do universo. Desafiaram seus atributos. A menos que haja plena retribuição, a justiça e a soberania de Deus não raiará em seu total e perfeito brilho. Não, os santos em glória não desejam mais vingança pessoal do que desejou Estevão, mas anseiam pela vinda do grande dia quando a ma­jestade e a santidade, a soberania e a justiça de Deus em Cristo serão reveladas.

A cada um desses sacrificados é dada uma esvoaçante veste branca, simbolizando justiça, santidade e regozijo. A eles é dada a certeza de que suas orações serão respondidas, mas que o tempo do juízo ainda não é chegado. Assim, essas almas dos mártires devem gozar seu repouso celestial "por pouco tempo" até que cada eleito tenha sido levado ao recôndito e esteja completo o número dos mártires. Deus sabe o número exato. Ele está fixado em seu decreto desde a eternidade. Até que esse número seja alcançado na terra, o dia do juízo final não pode vir.

7. O juízo final (6.12-17).

O sexto selo, então, introduz[140] o dia do juízo. Ele descreve a grande catástrofe do final desta época. O horror e o terror, o espanto e a consternação desse dia são retratados sob o duplo simbolismo de uma hecatombe universal e de uma humanidade aterrorizada.

O terror desse grande dia se refere, é claro, somente ao iníquo. Considerando, porém, que será pequeno o número de crentes no tempo da segunda vinda (Lc 18.8), podemos dizer que o mundo em geral é tomado de sobressalto. Quanto a isso, é interessante observar que o derramamento final da ira divina sobre a humanidade é descrito sob o sexto selo - seis, ou melhor 666, sendo número de homem (Ap 13.18)-, representado como afetando seis objetos da criação e distribuído entre seis classes de pessoas.[141]

Note os seis objetos enumerados nessa descrição simbólica do terror do dia do juízo.

Primeiro, há um grande terremoto (cf especialmente Ez 38.19; Jl 2.10; Am 8.8; Mt 24.29). Imagine o quadro: a terra se erguendo e baixando em rápidas ondas como uma indicação do poder e da ira de Deus.

Então, em conexão com esse terremoto, o sol se escurece como um saco de carvão e a lua cheia se torna cor de sangue. O escurecimento do céu geralmente se segue aos terremotos; con­tudo, a descrição pretende mais do que isso. Esse não é um simples escurecimento do céu ou mesmo um eclipse, pois a própria luz do sol é bloqueada e a lua se torna vermelha como sangue. Há algo muito real no quadro que João vê. Devemos ser cuidadosos, porém, em tirar as nossas conclusões. Tomemos a figura em sua totalidade.[142] Não temos o direito, com base nessa descrição, de tirar conclusões sobre as mudanças exatas que ocorrerão nos corpos celestes ao final da presente época. O que temos aqui é uma figura simbólica do terror do dia do juízo. O símbolo, em sua totalidade, ensina apenas uma lição, a saber, que a efusão final e completa da ira de Deus sobre o mundo perseguidor da Igreja é verdadeiramente terrível.

Três objetos foram agora mencionados, isto é, terremoto, sol e lua. O quarto elemento é o céu e suas estrelas caindo sobre a terra como a figueira deixando cair seus figos de inverno quan­do sacudida por violenta ventania. Sem dúvida, João viu, com freqüência, esses figos de inverno escondidos pelas folhas até que estivessem secos e caíssem como chuva ao serem as árvo­res sacudidas por forte vento. De modo semelhante, as estrelas são vistas caindo de suas órbitas. Elas caem na terra. Não co­metas ou meteoros, mas estrelas. Você diz: como isso é possí­vel? A terra é muito pequena para que mesmo uma única estre­la caia sobre ela. De novo, lembramos que isso é uma figura. Nas figuras as coisas são possíveis mesmo que não sejam real­mente possíveis. Quando dizemos isso, não negamos, é claro, que haverá um completo deslocamento dos corpos celestes e um rejuvenescimento do universo em conexão com o fim desta presente era. A Escritura ensina isso claramente (2 Pe 3.10,12, etc). Também não negamos que a passagem em questão se re­fere a esse fato (cf. Mt 24.39). Porém, o ponto mais forte é este: ela ressalta o terror do dia da ira para o iníquo. Os elementos se desfazendo, terremoto, estrelas caindo, etc, acrescentam terror à figura.

Nessa figura vívida e espantosamente inspiradora, João vê o próprio céu se enrolando como um pedaço de papel (cf. Is 34.4). O sexto e último objeto mencionado é "todos os montes e ilhas". Esses montes e ilhas desaparecem completamente, movidos para outro lugar.

Outra vez, tente visualizar o que João viu, tomando a figu­ra em sua totalidade: os céus se enrolando como um pedaço de papel, como um rolo; o sol com sua luz bloqueada de maneira a semelhar uma veste negra usada como luto; a enorme lua cheia como uma gigante e espantosa bola de sangue; as estrelas lançadas fora de suas órbitas e caindo na terra como chuva; a terra se estremecendo violentamente até que toda casa vá ao chão; e cada montanha e ilha desaparecendo num repente. Que figura de terror e desespero, de confusão e de consternação -para o iníquo!

Observe agora as seis classes da humanidade sobre as quais caem esses terrores.

Primeiro, os reis da terra, os ditadores e supremos governantes políticos da terra. Segundo, os príncipes, os próxi­mos em autoridade após os reis. Terceiro, as autoridades milita­res, ditadores e generais. Quarto, os homens ricos, os líderes do comércio e da indústria. Estes são os capitalistas, os magnatas financeiros. Quinto, os homens fortes, os que exercem influên­cia poderosa em qualquer âmbito quer físico quer educacional. Finalmente, cada ser humano, escravo ou livre, a totalidade das classes mais baixas, consistidas daqueles que ainda servem como escravos ou aqueles que foram libertos de suas cadeias.

Dessa forma, sob o simbolismo dessas seis classes, João vê todo o mundo sem Deus tomado de súbito terror. Ele vê seus habitantes tomados de terror e em fuga, fugindo de algo ainda mais terrível do que montanhas se desagregando e rochas cain­do. Buscam segurança até na própria morte. Se ao menos a morte se lhes sobreviesse - João ouve gritos de agonia emitidos por milhares de vozes. Reis e escravos, príncipes e servos, todos são tomados da mesma auto-infligida agonia de desespero. O aterrorizante lamento é ouvido: Montanhas e rochedos, "caí sobre nós, e escondei-nos da face daquele que se assenta no trono, e da ira do Cordeiro, porque chegou o grande dia da ira deles; e quem é que pode suster-se?" A porta da graça estará fechada para sempre uma vez que chegue esse dia!

Embora a retribuição final e completa não seja dada até o dia do juízo, mesmo agora, durante esta presente época, juízos são enviados à terra porque o iníquo persegue os filhos de Deus. Através da História os selos da perseguição dão lugar às trom­betas do juízo. Este é um princípio no governo moral divino deste mundo. Devemos entender os eventos daquele dia à luz desse princípio.

8. A multidão selada (7.1-17)

Essas trombetas de juízo que surgem do sétimo selo são descritas nos capítulos 8 e 9. Mas mesmo no começo do capítulo 7 tudo parece estar pronto para a execução de tais juízos. Então, por que eles não recaem sobre os não-crentes? Está tudo pron­to: os ventos de aflição estão prestes a cumprir sua missão de destruição; os quatro anjos - quatro, porque eles controlam as agências de destruição por toda a terra, em cada direção, norte, sul, leste e oeste - estão preparados para a sua tarefa de afligir a terra e o mar (Ap 7.2). Então, subitamente, dramaticamente, João vê outro anjo subindo do lado do oeste. Ele tem o selo do Deus vivo. Grita aos quatro anjos que estão no controle ou re­tendo os quatro ventos de juízo. Em alta voz lhes diz: "Não danifiqueis nem a terra, nem o mar, nem as árvores, até selar­mos em suas frontes os servos do nosso Deus".

Essas aflições são punições para o mundo iníquo e perse­guidor. Elas não o atingirão, se o selo de Deus está em sua fron­te. O Senhor lançou sobre Cristo a iniqüidade de todos os cren­tes (Is 53.6). Esteja certo de que "todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito" (Rm 8.28).

Esse selo é a coisa mais preciosa sob o céu. A Escritura fala do selo num sentido tríplice. Primeiro, um selo protege contra adulteração. Dessa forma, o túmulo de Jesus foi selado com uma guarda (Mt 27.66; cf. Ap 5.1). Segundo, um selo mar­ca propriedade. Assim, lemos nos Cânticos de Salomão 8.6: "Põe-me como selo sobre o teu coração". Terceiro, um selocertifica caráter genuíno. O decreto de que todos os judeus deveriam ser eliminados foi selado com o sinete do rei Xerxes (Et 3.12).

O cristão é selado nesse tríplice sentido. O Pai o selou, pois ele goza de sua proteção ao longo da vida. O Filho o selou, pois o comprou e redimiu com seu sangue precioso. Agora, ele o possui. O Espírito o selou (Ef 1.13), pois ele certifica que somos filhos de Deus (Rm 8.15).

Na passagem que estamos discutindo a ênfase cai sobre a propriedade e conseqüente proteção. Observe que os filhos de Deus são selados em "suas frontes". No capítulo 14 encontra­mos outra vez essa mesma multidão selada em suas frontes, os 144.000. Ali lemos que eles têm em suas frontes o nome do Cordeiro e o nome do Pai. Esse nome, com toda probabilidade, é o selo[143] (cf. também Ap 22.4).

João ouve o número dos selados. Ele não vê seu número exato, pois esses selados estão ainda na terra. Só Deus sabe quantas pessoas realmente seladas há sobre a terra. O número é 144.000. Esse, é claro, é um número simbólico. Primeiro, o número três, indicando a Trindade, é multiplicado por quatro, indicando o número de toda a criação, pois os selados vêm do leste, do oeste, do norte e do sul. Três vezes quatro resulta em doze. Esse número indica: a Trindade (3) operando no universo (4).[144] Quando o Pai pelo Filho no Espírito executa sua obra sal­vadora na terra - o divino (3) operando no universo (4) - vemos na antiga dispensação os doze (3 X 4) patriarcas e, na nova, os doze apóstolos. Para chegar à compreensão da Igreja da antiga e da nova dispensações temos de multiplicar doze por doze. Isso nos dá 144.

Em completa harmonia com essa representação, lemos em Apocalipse 21 que a cidade santa de Jerusalém tem doze portões e doze fundamentos. Sobre esses doze portais estão escritos os nomes das doze tribos dos filhos de Israel. Nas doze fundações estão escritos os nomes dos doze apóstolos do Cordeiro (21.9-14). Lemos, também, que o muro é de 144 cúbitos de altura (21.17).

E bem claro, portanto, que a multidão dos selados de Apocalipse 7 simboliza a totalidade da Igreja da antiga e da nova dispensações. A fim de enfatizar o fato de que não é pe­quena a referida porção da Igreja, mas toda a Igreja militante, esse número 144 é multiplicado por mil. Um mil é 10X10X10, que indica um cubo perfeito, isto é, uma completa reduplicação.[145](Ver Apocalipse 21.16.) Os 144.000 indivíduos selados das doze tribos de Israel literal simbolizam o Israel espiritual, a Igreja de Deus na terra.

E errado dizer que o símbolo significa, em última instân­cia, Israel segundo a carne. O apóstolo, certamente, sabia que dez das doze tribos haviam desaparecido na Assíria, ao menos em grande parte, enquanto que Judá e Benjamim haviam perdi­do sua existência nacional quando da queda de Jerusalém, em 70 A.D. Além disso, se o texto dizia respeito a Israel segundo a carne, por que Efraim e Dã seriam omitidos? Certamente, nem todos os da tribo de Dã estariam perdidos. Novamente, observe a ordem na qual as tribos estão organizadas. Não a tribo de Rubem, mas Judá é mencionada primeiro. Lembre-se de que nosso Senhor Jesus Cristo era da tribo de Judá (Gn 49.10). Mesmo o fato de esse número exato, doze mil, ser selado de cada tribo - harmonia em meio à variedade - deveria ser suficiente para indicar que estamos lidando com um símbolo, como já indica­do. Quanto ao significado desse símbolo, também não somos deixados no escuro. Em primeiro lugar, o próprio número, sendo o produto de 144 vezes um mil, é plenamente explicado em Apocalipse 21, conforme já demonstramos. Segundo, esse ca­pítulo ele deve indicar a Igreja da antiga e da nova dispensações. Além disso, no capítulo 14 vemos, novamente, essa mesma multidão, os 144.000. Aí nos é dito explicitamente que esses são os que foram comprados da terra. Representam aqueles que seguem o Cordeiro por onde quer que vá, e a totalidade da Igreja militante, portanto, tal como também é claramente ensinado em Apocalipse 22.4.[146] Cristo, havendo-os comprado com seu precio­so sangue, possui-os, e o Pai (por Cristo, no Espírito) protege-os. Deixe que os ventos soprem; eles não causarão dano ao povo de Deus. Deixe que venham os juízos; eles não causarão mal aos seus eleitos!

Depois dessas coisas, João vê a mais gloriosa visão de todas. É a Igreja triunfante assim como estará para sempre na presença imediata do Senhor e de seu trono. E a grande multi­dão que ninguém poderia contar, embora seu número preciso seja conhecido do Senhor (2 Tm 2.19). Ela foi ajuntada de entre todas as nações e tribos, e povos, e línguas.[147] Fica claro que os eleitos de Deus chamados de entre os judeus estão aí incluídos: ambos, judeus e gentios, são representados. Postam-se diante do trono e do Cordeiro, o qual, agora, está sentado no trono (Ap 5.7). Permanecer diante do Cordeiro e do trono significa ter comunhão com ele, render-lhe culto e participar de sua honra. A multidão incontável está vestida com esvoaçantes vestes brancas. As vestes esvoaçantes indicam festividade, bênçãos; sua alvura simboliza justiça, santidade (cf. 7.14). João vê os abençoados com palmas em suas mãos. Essas palmas indicam salvação (Jo 12.13). De conformidade, essa imensa multidão é ouvida gritando com alta voz:

"Ao nosso Deus, que se assenta no trono, e ao Cordeiro, pertence a salvação". Literalmente, lemos que é a salvação ­não salvação em geral, mas uma bem definida salvação (do peca­do e de suas conseqüências) - que esses redimidos estão gozando agora. Eles atribuem essa obra a Deus e ao Cordeiro e não à sua própria sabedoria ou bondade. Igualmente, nós cantamos:

Tu és, ó Deus, nosso louvor, glória e poder; Tua graça soberana é nossa proteção. Erguemos nosso rosto, pois vens nos defender Naquele que assegura a nossa salvação. Vitória da coroa sobre o vil labéu Do Rei enaltecido por Deus de Israel.

Os anjos cercam essa multidão dos redimidos. (Ver o dia­grama na página 117) Eles rendem culto a Deus e num duplo Amém e numa sétupla declaração de louvor (7.12)[148] eles dão testemunho de sua concordância com a adoração da Igreja triun­fante (cf.5.11). "Um dos anciãos tomou a palavra, dizendo: Estes, que se vestem de vestiduras brancas, quem são e de onde vieram? Respondi-lhe: Meu Senhor, tu o sabes."

Agora, é um ancião que fala (7.13; cf. 5.5). E alguém que sabe por experiência o significado da salvação. Ele pergunta a João, não para que o apóstolo o informe, mas para chamar a atenção de João sobre essa multidão incontável, especialmente, sobre esse milagre portentoso, isto é, que todos esses indivíduos que uma vez foram pecadores, são agora justos e santos, reves­tidos de vestes brancas esvoaçantes. O apóstolo, dizendo "Meu senhor, tu o sabes", indica que ele deseja ouvir a explicação desse grande milagre.

A explicação dada pelo ancião, da mais sublime e bela maneira, fecha esta seção, os capítulos 4-7. Mantenha sempre em mente que essa seção tem como tema a Igreja na tribula­ção. Temos visto o cavalo vermelho da mortandade, o cavalo preto da pobreza e da injustiça, o cavalo amarelo da morte. Ouvimos o grito das almas daqueles que foram mortos por causa da Palavra de Deus e por causa do testemunho que mantiveram. Tornou-se claro que todas essas provações são controladas por aquele que está assentado no trono. Agora, em acréscimo, torna-se claro para nós que a Igreja não permanece na tribulação. A multidão incontável é composta de pessoas que "saíram" da grande tribulação. Lemos: "Ele, então, me disse: São estes os que vêm da grande tribulação, lavaram suas vestiduras, e as alvejaram no sangue do Cordeiro, razão por que se acham diante do trono de Deus e o servem de dia e de noite no seu santuário; e aquele que se assenta no trono estenderá sobre eles o seu tabernáculo. Jamais terão fome, nunca mais terão sede, não cai­rá sobre eles o sol nem ardor algum, pois o Cordeiro que se encontra no meio do trono os apascentará e os guiará para as fontes da água da vida. E Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima".

O ancião diz a João que essas pessoas que estão revestidas com as vestes brancas esvoaçantes vêm da "grande tribulação". Essa tribulação é a grande porque é totalmente inclusiva: todas as perseguições e tribulação sobre o povo de Deus, simboliza­das pelos selos, estão aí incluídas. Isso confere unidade à seção inteira, os capítulos 4-7.0 ponto chave é que os santos saem de suas tribulações. A língua holandesa tem um termo para "morrer" que literalmente significa "acabar (ou ultrapassar) o sofrimento". Ele expressa a verdade sempre que um crente morre. Esses são os santos que, na visão de João, lavaram seus vestidos esvoaçantes e os tornaram brancos no sangue do Cordeiro (cf. 1 Jo 1.7; Hb 9.14). Em outras palavras, eles colocavam toda sua confiança no sangue salvador de Jesus Cristo. Esse sangue, representando a completa expiação realizada pelo nosso Senhor, lavou-os de sua culpa e da poluição do pecado. Por meio do rubro sangue de Cristo, eles foram feitos brancos.

Assim, eles estão diante do trono de Deus. Somente aqueles que colocaram sua confiança em Cristo e em sua expiação apare­cem diante dele. Eles o cultuam, isto é, rendem-lhe espontânea, alegre e plena devoção de coração. E uma incessante adoração. Esses santos redimidos em glória experimentam a mais doce, plena e íntima comunhão com Deus por meio de Cristo; ado­ram-no em seu santuário, isto é, em sua imediata presença. Aquele que se assenta no trono trata-os como seus próprios filhos queridos, pois tais eles são pela graça; ele lança sua presença sobre eles como uma tenda. Negativamente, sua salvação con­siste em que são libertos de cuidado e provação, de qualquer forma de tribulação e perseguição: não mais fome, sede ou ardor. Positivamente, sua salvação significa que eles gozam da mais perfeita felicidade; o Cordeiro é seu pastor (cf. SI 23; Jo 10.11,14). Pense nisto: um Cordeiro sendo um Pastori Esse Cordeiro conduz seu rebanho às fontes de água viva. Água sim­boliza vida eterna e salvação (Is 55.1; Jo 7.38,39). As fontes de água indicam a fonte da vida, pois, pelo Cordeiro, o redimido tem eterna e ininterrupta comunhão com o Pai.

Finalmente, o toque mais doce de todos: "E Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima". Não apenas as lágrimas serão colhidas, mas tiradas; ele as enxugará para que haja a mais perfeita alegria, felicidade, glória, doce comunhão e vida abun­dante! E o próprio Deus é o autor dessa perfeita salvação.

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 8-11 As Sete Trombetas

O panorama da História da Igreja desenrolou-se por duas ve­zes ante nosso olhar admirado. Vimos os candeeiros e o Filho do homem se movendo entre eles. Ouvimos sua voz de terna exortação, honesta reprovação e generosa promessa. Em sete, belas cartas ele pareceu se aproximar mais e mais de nós até que o vimos batendo à nossa porta. Então, quando ansiávamos pelo pleno cumprimento de sua promessa de vir e cear conosco, a visão cessou. Mas a impressão sobre nós dessa visão é indelével. Através de lágrimas amargas vemos o Senhor, bem próximo de nós, cheio de terno amor e de poder sustentador. Vemo-lo como a luz do mundo. Uma luz que brilha por nosso intermédio: as igrejas são os candeeiros (capítulos 1-3).

Mais uma vez os anos voltaram atrás em seu progresso... até o momento da ascensão de nosso Senhor. Com os olhos extasiados vimos uma porta aberta no céu. Olhando através dela, vimos um trono do qual saíam relâmpagos, vozes e trovões. Os seres celestiais ao seu redor reconheciam com hinos de gratidão a soberania daquele cujo rosto estava escondido por trás do bri­lho faiscante do diamante e do rubro fulgor do sardônio. Súbito, testemunhamos o evento central - a coroação de Jesus, que to­mou o rolo da mão direita do Senhor assentado no trono. Ouvi­mos um ancião dizer: "Não chores; eis que o Leão... venceu...".

Desse modo, não nos surpreendemos quando, com a aber­tura do primeiro selo, vimos o mesmo Jesus vindo, vencendo e para vencer. Esse cavaleiro do cavalo branco, porém, é sempre seguido pelo cavaleiro do cavalo vermelho; onde quer que o Senhor Jesus Cristo comece a erguer seu cetro espiritual, Satanás começa a brandir sua espada. Os selos descrevem a persegui­ção movida pelo mundo contra a Igreja, e não somente perse­guição, mas toda forma de provação e de tribulação. Na visão das almas postadas sob o altar nós fomos assegurados de que o morticínio dos santos não ficaria sem vingança. Embora a retri­buição final e completa esteja reservada para o grande dia de Jeová, mesmo agora os selos da perseguição são seguidos pelas trombetas do juízo. Antes, porém, que essas trombetas sejam introduzidas, a Igreja militante é selada contra qualquer mal. Finalmente, vimos a Igreja triunfante que veio da grande tribu­lação e que goza para sempre na imediata e gloriosa presença do Cordeiro (capítulos 4-7). Agora, tudo está pronto para as trombetas do juízo.

Essas trombetas de juízo (capítulos 8-11) indicam uma série de acontecimentos, isto é, calamidades que ocorrerão muitas vezes ao longo desta dispensação.[149] Elas não simbolizam even­tos separados, mas referem-se a desgraças que podem ser vistas a qualquer dia do ano em qualquer parte do globo. Portanto, as trombetas soam em sincronia com a abertura dos selos.

Novamente, essas trombetas de juízo são, claramente, retribuitivas em seu caráter. Terríveis calamidades caem sobre os ímpios para puni-los por sua oposição à causa de Cristo e pela sua perseguição aos santos. Assim mesmo, Deus continua, constantemente, chamando os ímpios ao arrependimento por meio desses julgamentos. Essas desgraças não simbolizam o final e completo descontentamento de Deus. Ao contrário, eles indicam seus juízos iniciais. Eles recebem graves advertências, não a destruição final. Lembre-se de que trombetas proclamam e taças são derramadas. E por essa razão que as trombetas afe­tam uma terça parte - não a totalidade - da terra, do mar, das águas, do sol, da lua e das estrelas. A função das trombetas é a de avisar (Ez 33.3).

Observe, também, que essas trombetas afetam as diversas partes do universo: a terra, o mar, etc. Em nenhum lugar há segurança para o iníquo. Contudo, fica evidente uma certa ordem. As primeiras quatro trombetas afetam o iníquo em seu ser físico; as três últimas trazem angústia espiritual: o inferno está solto!

Esses juízos são expressos em linguagem que lembra ao leitor as dez pragas do Egito. Note os termos "saraiva e fogo" (8.7); a "escuridão" (8.12) e os "gafanhotos" (9.3). Mas a descri­ção encontrada no Apocalipse é ainda mais terrível: saraiva e fogo são misturados com sangue; os gafanhotos não ferem gra­ma ou árvores, mas homens. Tais juízos caem sobre o mundo iníquo e perseguidor (Egito), onde nosso Senhor foi crucificado (11.8). Eles não afetam os crentes.

1. O sétimo selo (8.1-6)

"Quando o Cordeiro abriu o sétimo selo, houve silêncio no céu cerca de meia hora."

Por que esse silêncio? Será para que as orações dos filhos de Deus perseguidos sejam ouvidas nos céus?[150] Inclinamo-nos a pensar que devemos, aqui como em qualquer parte, buscar a interpretação no simbolismo do Antigo Testamento. Nos profe­tas, o movimento de juízo do Todo-poderoso é, muitas vezes, introduzido por uma referência ao silêncio, por exemplo, Habacuque 2.20: "O Senhor está no seu santo templo; cale-se diante dele toda a terra" (cf Sf 1.7; Zc 2.13). Aqui no Apoca­lipse, por semelhante modo, o silêncio é apresentado para nos preparar para o terrível caráter dos juízos que estão prestes a ser relatados. Esse silêncio torna as manifestações da ira de Deus ainda mais impressionantes. Tão terrível e apavorante é essa retribuição inicial prestes a ser imposta sobre os iníquos que os habitantes do céu quedam-se mudos, perdidos por algum tempo - meia hora - com a respiração suspensa, em surpreso silêncio. Outrossim, Deus não aflige "de coração". Isso também é indi­cado pelo silêncio no céu (Lc 19.41; Lm 3.33; Ez 33.11). E ago­ra João vê os sete anjos que estão diante de Deus - uma alta ordem de anjos - a cada qual é dada[151] uma trombeta. Outro anjo surge em cena. Ele paira sobre o altar que, aqui, é o dourado altar de incenso.[152] Ele traz um incensório dourado. Mais incenso lhe é dado. Observe que isso lhe é dado: o anjo não traz sua própria oferta. Será que estamos esticando demais o sentido do símbolo ao derivar a conclusão de que esse incenso dado ao anjo representa a intercessão de nosso Salvador, no céu, por sua Igreja perseguida na terra?[153] Não é essa intercessão, baseada na expiação, que santifica e purifica nossas orações? Traduzimos a próxima cláusula como se segue: "para que pudesse oferecê-lo pelas orações dos santos sobre o altar, o dourado, aquele que está diante do trono".

Esses santos sob perseguição e tribulação estão orando. Sua vida[154] de oração, porém, é imperfeita. Precisa ser incensada com a intercessão de Cristo. Uma vez incensadas, o vidente percebe que a fumaça sobe à presença de Deus, isto é, as orações dos santos, acompanhadas pelo incenso, são ouvidas no céu. O Senhor no trono vê os ais e o sofrimento, ele ouve as preces e as ações de graças dos seus filhos que estão no meio da tribulação.

O anjo entende isso; ele sabe que as orações foram ouvidas. Assim, ele toma o incensário, agora esvaziado do incenso, e enche-o com as brasas do altar, lançando-as sobre a terra, isto é, Deus ouviu as orações dos santos, e os juízos sobre a terra são respostas a elas. Sobretudo, para mostrar que isso é realmente a visão de Deus e não apenas do anjo, nós lemos: "E houve tro­vões, vozes, relâmpagos e terremoto". Por causa disso, os sete anjos preparam-se para soar as trombetas.

2. As primeiras quatro trombetas (8.7-13)

O primeiro anjo toca a trombeta, resultando numa tempes­tade de saraiva e fogo. Tanto a saraiva quanto o fogo são vistos misturados com sangue. Isso enfatiza seu caráter destruidor, e lemos que a terça parte da terra, a terça parte das árvores e de toda planta verde - incluindo ervas - foi queimada. Com toda probabilidade, essa primeira trombeta indica que por todo o período que se estende da primeira à segunda vinda, o nosso Senhor, que agora reina no céu, afligirá os perseguidores da Igreja com diversos desastres que ocorrerão na terra, isto é, em terra seca. E claramente indicado na cláusula "e foram lançadas à terra" que essas calamidades, qualquer que seja a sua natureza, são controladas do céu e, num sentido organizacional, enviadas pelo Senhor governante.

O segundo anjo toca a trombeta. João vê uma grande mon­tanha ardendo em chamas ser lançada ao mar. Observe que ele não vê uma montanha real, mas algo como que uma montanha. O que ele viu simbolizava o terror do juízo de Deus sobre o mar. O nosso Senhor não usa apenas calamidades sobre a terra para punir o iníquo; ele usa também o mar como instrumento contra eles. Devemos interpretar todos os desastres que ocorrem no mar à luz dessa perspectiva. A figura de uma montanha sendo lançada ao mar é o símbolo mais vívido de terríveis calamida­des marítimas, especialmente quando essa montanha arde em chamas! Ela simboliza grande transtorno e comoção (cf. SI 46.2;

Is 34.3; 54.10; Ez 38.20; Mq .1.4; Na 1.5; Jó 9.5, etc). Esse jul­gamento se apresenta mais severo do que o primeiro; um terço do mar se torna em sangue; um terço dos seres viventes no mar perecem; um terço das embarcações são destruídas e com elas, é claro, seus passageiros e tripulantes.

O terceiro anjo toca a trombeta. Tal como após a primeira trombeta o Filho de Deus usou a vegetação, e após a segunda trombeta o mar, assim agora o Senhor Jesus usa as águas doces como instrumentos contra o iníquo. A mensagem a ser passada é esta: "Filhos de Deus perseguidos, lembrem-se de que nosso Salvador vê nossas lágrimas e não está alheio às nossas aflições. Não haverá lugar onde o perseguidor iníquo encontre descanso ou alegria duradoura. Não só a terra e o mar, mas até as fontes e os rios por toda esta época se tornarão contra os que praticam males". João, então, vê uma grande estrela ardendo como tocha, a qual é lançada do céu. O que poderia produzir maior medo do que isso? Que melhor símbolo poderia provocar terror no co­ração dos homens? Lembre-se, sobretudo, de que essa estrela ardendo como tocha é lançada do céu! Noutras palavras, esses juízos sobre as águas doces são atos de Deus. Isso é freqüente­mente esquecido. Os jornais falam de inundações e de epidemias provindas das terras alagadas etc, mas falham em dizer que esses são prenúncios dos julgamentos de Deus! Lembra-se da terrível inundação do rio Ohio? Será que alguém viu esse desas­tre - ou qualquer outro ao longo do tempo - como trombetas de Deus chamando ao arrependimento? O nome da estrela é Absinto, símbolo de remorso amargo (Lm 3.19). O significado é que amargo remorso encherá o coração dos iníquos como resul­tado da praga mencionada. Muitos homens, sobretudo, morre­rão por causa dessas águas amargas.[155]

O quarto anjo toca a trombeta. Um terço do sol é atingido; também um terço da lua e um terço das estrelas, resultando que não há luz por um terço do dia e por um terço da noite. Assim, mesmo as estrelas em seu curso lutam contra os inimigos da Igreja de Deus (cf. Jz 5.20). O efeito do sol, lua e estrelas sobre a vida não poderia ser, jamais, superestimado. São aqui referi­dos todos os males advindos do funcionamento anormal dos corpos celestes por toda a presente era. Assim, todo o universo, incluindo o sol, a lua e as estrelas, é usado pelo Senhor como advertência para os que não o servem e que perseguem seus filhos.

Quatro anjos já tocaram suas trombetas. Agora, há um intervalo.[156] João vê e ouve uma águia (ver verso 13). Ela voa alto, até o zénite, para que seja vista em todo lugar. O próprio fato de que essa ave é uma águia prenuncia o mal, pois a águia é uma ave predadora (Mt 24.28). De conformidade com isso, essa águia diz em alta voz: Ai, ai, ai dos que moram na terra, por causa das restantes vozes da trombeta dos três anjos que ainda têm de tocar".

A voz é alta e clara para que seja ouvida em todo lugar. O significado é simples: as três vozes restantes serão piores do que as quatro primeiras.

3. A quinta e a sexta trombetas (9.1-21)

O quinto anjo toca a trombeta. João vê uma estrela que cai dos céus na terra. Cf. Lucas 10.18: "Eu via a Satanás caindo do céu como um relâmpago". Esta é a presente condição do diabo; havendo se rebelado contra Deus, ele perdeu sua santidade, sua posição no céu, seu esplendor. Na visão, o apóstolo agora observa

que o príncipe das trevas recebe a chave do poço do abismo. Noutras palavras, ele recebe poder para abrir o abismo e permi­tir que os demônios saiam. O abismo significa o inferno antes do juízo final (Lc 8.31; Ap 20.1, 3). Depois do julgamento, o inferno será chamado de "lago de fogo" (20.14,15). Quando lemos que Satanás abre o poço do abismo, o significado é que ele incita ao mal; ele enche o mundo com demônios e com sua influência e operação malignas. João vê que o poço, tão logo é aberto, começa a expelir colunas de fumaça suja, negro-cinzenta, como a fumaça de uma fornalha. A fumaça do engano e da ilu­são, do pecado e da dor, da escuridão moral e da degradação que sobe constantemente do inferno. Tão densa e escura é essa fumaça que bloqueia completamente a luz do sol e escurece a atmosfera.[157] O poder de produzir isso é dado ao diabo, isto é, pelo decreto permissivo de Deus ele não é impedido de cumprir seus desígnios malignos no coração dos filhos dos homens, um mal pelo qual ele - e não Deus - é responsável. Mantenhamos em mente que esta, também, é uma das trombetas. Deus usa até mesmo a obra do diabo como punição e aviso para o iníquo, uma advertência para que se arrependa (9.21). comércio. Assim, o envenenamento das fontes de águas poderia indicar, entre ou­tras coisas, desordem na indústria e no comércio, etc.

 

Então, da fumaça saem gafanhotos que descem sobre a terra. Uma praga mais terrível do que esta dos gafanhotos é dificilmente concebida. Temos uma descrição explícita desse tipo de praga em Êxodo 10.4-15 e, especialmente, nas profe­cias de Joel, que qualquer um estuda com acurácia.[158] Obser­ve o efeito dessa praga sobre a vegetação e sobre o homem (Jl 1.7-12).

Fez de minha vide uma assolação,

destroçou a minha figueira,

tirou-lhe a casca, que lançou por terra;

os seus sarmentos se fizeram brancos.

A vide se secou,

a figueira se murchou,

a romeira também, e a palmeira e a macieira;

todas as árvores do campo se secaram

e já não há alegria entre os filhos dos homens.

A destruição, a ruína total, a desolação e o desalento cau­sados por uma nuvem de gafanhotos só podem ser entendidos por alguém que a tenha visto e experimentado. Esses gafanho­tos, incrivelmente terríveis em seu poder destrutivo, são um sím­bolo apropriado da muito mais terrível e destrutiva praga de gafanhotos infernais que o apóstolo está prestes a descrever. Sob o símbolo da praga de gafanhotos, João descreve o poder e a influência da operação do inferno no coração e na vida dos homens iníquos. Não se trata de gafanhotos comuns; eles não destroem a vegetação; nem mesmo a danificam. Eles causam danos aos homens que não foram selados (cf Ap 7.1-8). No entanto - glória seja dada a Deus a duração de sua obra destrutiva foi determinada pelo decreto permissivo de Deus: cinco meses e não mais.[159]

Segue-se uma descrição explícita desses gafanhotos infer­nais (9.7-11). Deveríamos tomar essa figura em sua totalida­de.[160] Os gafanhotos parecem cavalos preparados para a batalha; as coroas de falso ouro prenunciam a vitória; suas faces são como as dos seres humanos que são voltadas apenas para a destruição; seus cabelos são como o de mulheres; os dentes como de leões; as couraças de aço pressagiam invencibilidade; o som de suas asas parece com a cavalgada de cavalos e o sacolejo dos carros de guerra no campo de batalha; e - por último, mas não menos importante - a extrema dor e ardência dos ferrões de escorpião. Ainda que não fatal, eles atingem com terror o cora­ção dos homens enchendo sua alma do pior horror concebível e da maior desesperança de modo que eles buscam a morte, mas sem poder achá-la - pode imaginar mais atemorizante, horrível e real figura da operação dos poderes das trevas na alma dos iníquos durante esta presente época? Aqui estão os demônios, roubando aos homens toda a luz, isto é, toda justiça verdadeira e toda santidade, alegria, paz, sabedoria e entendimento. E seu rei é o "anjo do abismo", cujo nome, em duas línguas - hebraico e grego - é Destruidor. A figura simbólica em sua totalidade enfatiza esta única idéia: terror e destruição, pois Satanás está operando!

Ouça a voz de Deus advertindo: "o primeiro ai passou. Eis que depois destas cousas vêm ainda dois ais".

O sexto anjo toca a trombeta. E agora, os mesmos poderes das trevas que operaram destruição no coração dos homens trans­formam homens em seres malignos. Em tempos de guerra os homens iníquos parecem se tornar demônios encarnados. A sexta trombeta descreve a guerra; não uma guerra em particular, mas todas as guerras, passadas, presentes e futuras. Ainda assim, estamos convencidos de que esse símbolo se refere especial-. mente às mais terríveis guerras que ocorrerão perto do fim des­ta dispensacão. Lembre-se de que a guerra foi também simboli­zada pelo quarto selo. Ali ela é mencionada como provação ou tribulação que os crentes devem sofrer juntamente com o resto do mundo. Aqui, na visão das trombetas, a guerra é descrita como punição e advertência em relação aos não-crentes. Através desta dispensação Deus, repetidas vezes, atende às orações dos seus filhos perseguidos, as orações incensadas com os méritos da expiação de Cristo e da sua intercessão. Do altar de incenso vimos essas orações e esse incenso subindo aos céus (8.3,4). A resposta a essas orações é aqui, em 9.13, também representada como vindo "dos quatro ângulos do altar".

A voz vinda dos ângulos do altar de ouro diz ao sexto anjo: "Solta os quatro anjos que se encontram atados junto ao grande rio Eufrates" (9.14). Esse rio representa a Assíria, a Babilônia, isto é, o mundo iníquo. Os quatro anjos não são os mesmos mencionados em 7.1.[161] Aqui, trata-se de anjos maus. Eles se deleitam em incitar a humanidade à guerra. Mesmo assim, eles nada podem fazer sem a permissão de Deus. Não nos esqueça­mos de que, finalmente permitindo que sejam libertados, Deus usa a guerra como advertência ao iníquo (9.20). Desse modo, a guerra está também incluída no decreto de Deus para a hora e dia, e mês, e ano predeterminados.

João, agora, vê os exércitos no campo de batalha. Há tan­tos cavaleiros que é até impossível de se contar. Ele ouve seu número: duzentos milhões! É um número simbólico, é claro, que indica um exército tremendo. Sobretudo, esses cavaleiros e seus "cavalos" têm um propósito, a saber, destruir. A fim de mostrar a perfeita harmonia entre os cavaleiros e os "cavalos", os primeiros são descritos como tendo couraças cuja cor lembra fogo, absinto e enxofre, enquanto a boca dos últimos expele fogo, absinto e enxofre. Deve ficar claro, a esta altura, que estes não são cavalos comuns. Eles simbolizam, claramente, artefa­tos e armas de guerra de toda sorte. Todo esse mortal maquinário de guerra, que causa destruição para todos os lados (verso 19) é incluído no simbolismo desses "cavalos". Eles matam um terço da humanidade.

O sentido geral das trombetas é claro. Através da totalidade do período que se estende da primeira à segunda vinda, o nosso Senhor Jesus Cristo, que rege todas as coisas em concordânciacom o rolo do decreto de Deus, punirá muitas vezes os perse­guidores da Igreja, infligindo sobre eles desastres em todas as esferas da vida, física e espiritual. O sangue dos mártires é pre­cioso aos olhos do Senhor. As orações de todos os santos são ouvidas. Deus vê suas lágrimas e seu sofrimento. E a despeito de todas essas advertências, a humanidade em geral não se arre­pende. Os homens, estultos e teimosos, continuam a transgredir tanto a primeira (verso 20) quanto a segunda tábua da lei (verso 21). O mundo perseguidor se torna no mundo impenitente. E é essa impenitência que atrai não só o derramamento das taças da ira final (capítulos 15, 16), mas também o auge dessa ira no juízo final. Não é mais possível demorar.

4. O anjo com o livrinho (10.1-11)

Para anunciar essa terceira e última voz - o juízo final -surge outro anjo. João vê esse anjo descendo do céu. É um gi­gante. Seus pés são como pilares de fogo, colunas tão imensas que enquanto o pé esquerdo está firmemente plantado em terra, o pé direito repousa longe no oceano, de modo que, digamos, ele é capaz de ir de um ponto ao outro com um só tremendo passo. Sua face é como o sol, e uma nuvem se revolve ao seu redor. Sua face brilha como o sol dentro da nuvem e projeta um arco-íris como um alo sobre sua cabeça. O simbolismo mostra, claramente, que esse anjo está intimamente associado com o Cristo (cf. 1.7,17; 4.3). Olhe essas referências e veja a semelhan­ça próxima entre Cristo e o anjo. As duas figuras, no entanto, não falam da mesma pessoa.[162] A santidade de Deus é simboliza­da pela face do anjo, e seu julgamento é mostrado pela nuvem (Sf 1.15; SI 97.2), mas sua misericórdia e sua aliança cheia de fidelidade são expressas pelo arco-íris.

Por que esse anjo se posta sobre o mar e sobre a terra, e por que ele emite um grito como o rugido de um leão? Porque sua mensagem diz respeito à totalidade do universo e deve ser ouvi­da por todos. Em resposta a esse grito os sete trovões - (cf. SI 29)[163]- levantam sua voz em sete mensagens distintas. João está prestes a registrá-las, mas escuta uma voz do céu que diz: "Guarda em segredo as cousas que os sete trovões falaram, e não as escrevas". O sentido é claramente este: jamais podere­mos saber e descrever todos os fatores de agências que determi­nam o futuro. Conhecemos o significado dos candeeiros, dos selos, das trombetas, das taças, etc, mas outras forças estão trabalhando; há outros princípios operando no universo, isto é, os sete trovões. Assim, sejamos bem cuidadosos na predição com respeito ao futuro: poderemos deixar de lado um fator muito importante.

O anjo, cuja glória é outra vez enfatizada, agora levanta sua mão direita para o céu (cf Gn 14.22; Dn 12.7) e jura pelo Deus eterno e onipotente, que criou o universo, que já não haverá demora. Não mais demora! o juízo final está prestes a vir. O mistério de Deus - mistério, não porque seja algo total­mente desconhecido, mas porque teria passado desconhecido se Deus não o tivesse revelado -, esse mistério do decreto de Deus quanto à História do mundo, está prestes a alcançar seu auge no juízo final. Então o povo de Deus receberá sua final e gloriosa herança, sua completa salvação como prometido aos seus servos, os profetas.

Então, agora o juízo final pode vir. Nossa expectativa é que o próximo verso diga: "Então, o sétimo anjo tocou a trom­beta". Entretanto, ele não será apresentado definitivamente até 11.15ss. Assim como após o sexto selo não se segue imediata­mente o sétimo, mas é precedido por um belo e confortanteparágrafo (capítulo 7) em que a segurança e a vitória final da Igreja é reafirmada, assim aqui a descrição da sexta trombeta não é seguida imediatamente pela descrição da sétima. Primeiro, o sofrimento, o poder, o dever e a vitória final da Igreja devem ser mostrados para que os crentes recebam consolação quando os juízos forem infligidos sobre o iníquo. De novo, o inevitável caráter do juízo final se tornará mais claro quando demonstrado que o mundo ímpio não apenas falha em ouvir as vozes de advertência de Deus reveladas nas seis pragas, mas, sobre isso, rejeita o mui claro e definido testemunho das "duas testemunhas" (capítulo 11).

Mas isso afinal de contas não seria uma demora? O anjo jurou solenemente que não haveria mais demora, mas ainda assim parece que temos uma espera aqui. Contudo, essa espera é só aparente. O que temos em 10.8-11.13 não intervém crono­logicamente entre a sexta e a sétima trombetas. E simplesmente a descrição da presente dispensação de uma perspectiva dife­rente, isto é, da perspectiva do sofrimento, poder, dever e vitó­ria final da Igreja, como mostrado antes.

Quando João viu o anjo, notou que esse ser glorioso tinha um livrinho aberto em sua mão (verso 2). O apóstolo agora re­cebe a ordem de tomar esse rolo. Assim, ele pede ao anjo que lho entregue. O anjo, acedendo ao pedido, diz a João: "Toma-o e devora-o; certamente ele será amargo ao teu estômago, mas na tua boca, doce como o mel" (cf. Ez 2.9ss.; 3.1). O Salmo 119.103 deixa bem claro o que isso significa: o rolo é a Palavra de Deus, seu evangelho em que o mistério da salvação é apre­sentado. Esse evangelho é, em si mesmo, glorioso e doce. Sua proclamação, porém, é sempre seguida de amarga perseguição. Da mesma forma que o primeiro cavaleiro (6.2), isto é, Cristo, é sempre seguido pelo segundo, isto é, a mortandade, assim, na visão, João toma o rolo das mãos do anjo e come-o. Em sua boca ele é, na verdade, doce como o mel; mas quando já o comeu, tornou amargo o seu ventre. O significado disso é claro: o apóstolo deve não somente entender e digerir a mensagem do evangelho; precisa experimentar tanto sua doçura quanto seu sofrimento, o tomar a cruz, o que é a porção daqueles que fiel­mente o proclamam. Porventura, não estava, João, no exílio na ilha de Patmos? Não estava ele escrevendo a cristãos que passa­vam por tribulação por causa da Palavra de Deus e pelo teste­munho de Jesus? (cf 1.9). Sobretudo, o próprio sofrimento por causa de Cristo habilita os crentes a perseverar na proclamação da Palavra. Por essa razão, mensageiros celestes asseguram o apóstolo de que ele deve profetizar de novo quanto aos muitos povos e nações, e línguas, e reis (cf. Ap 17). Nesse capítulo, João está, realmente, profetizando a respeito de nações e de reis.

5. A medição do templo (11.1,2)

Em íntima conexão com 10.8-11, o capítulo 11 oferece-nos, agora, uma descrição das "acres" experiências que a verdadeira Igreja deve sofrer quando ela prega o "doce" evangelho da salvação. Na visão,[164] alguém dá a João um caniço grosso e pesa­do como uma vara de medir. E-lhe dito que meça o santuário de Deus, o altar e aqueles que cultuam diante dele. Ele não deve medir o pátio que está do lado de fora do santuário. Esse ele deve rejeitar. "Mas deixa de parte o átrio exterior do santuário, e não o meças, porque ele foi dado aos gentios; estes por qua­renta e dois meses calcarão aos pés a cidade santa."

Por que essa medição? O que ela significa? Com base no contexto imediato, a expressão paralela (21.15) e o pano de fundo do Antigo Testamento (Ez 40.5; 42.20; Zc 2.1), chegamos à conclusão de que a medição do santuário significa apartá-lo de tudo o que é profano; para que, uma vez separado, esteja perfei­tamente seguro e protegido de qualquer dano. O santuário é "aceito", enquanto o pátio é "rejeitado".

E de enorme importância que mantenhamos em mente que aqui, como nos outros lugares, o apóstolo recebe uma visão. Portanto, a presunção de que o templo de Herodes devesse estar em pé em Jerusalém, e de que o Apocalipse tenha sido escrito antes da destruição da nação judaica, pelos romanos, é despro­vida de base. Numa visão a pessoa pode ver coisas que não mais existem na realidade literal.

Novamente, julgando pelo contexto, parece provável que o que o apóstolo vê na visão é, na verdade, o templo de Herodes em Jerusalém. De qualquer modo, ele vê o Templo dos judeus assim como ele existiu na terra. É-lhe dito que meça o santuário, isto é, a parte do templo que compreende o Lugar Santo e o Santo dos santos. A parte externa, quer dizer, o pátio dos gentios, deve ser rejeitada. Não deve ser medida. Há, é claro, diversos átrios adicionais, mas esses não são mencionados, talvez por que não tenham significância simbólica. Além, fora do pátio dos gentios, está Jerusalém, ainda hoje chamada de a "cidade santa", como em Mateus 27.53. O apóstolo não está pensando na Jerusalém celestial, mas, certamente, na cidade terrestre que rejeitou a Cristo. Ela é chamada de "cidade santa" aqui e em Mateus 27.53 pela simples razão de que havia sido santa. Ainda hoje a Jerusalém terrestre é freqüentemente conhecida como a "cidade santa". O fato de que, na visão, João vê a Jerusalém terrestre - e, portanto, o templo terrestre - fica, também, claro segundo o que se segue: "estes, por quarenta e dois meses calca­rão aos pés a cidade santa". Esta é a Jerusalém que será pisada pelas gentes. Lucas 21.24, uma passagem paralela, indica com clareza o que significa essa Jerusalém terrestre.

Esta é a figura, o símbolo e a visão. Vejamos isso mais claramente. O apóstolo vê a Jerusalém terrestre e o templo terrestre. Ele mede o santuário interior, mas rejeita o pátio externo. A "cidade santa" e mesmo o pátio externo do templo são calcados aos pés pelos gentios por 42 meses.

Agora, surge uma questão: o que essa figura significa? Essa é a grande questão quanto a cada figura ou símbolo. Qual é seu último significado simbólico? A figura é uma coisa. Seu últi­mo significado simbólico é outra. Embora esses dois estejam sempre intimamente relacionados, não devem ser jamais con­fundidos. Um sentido espiritual mais alto é geralmente ex­presso no simbolismo terrestre. Ilustremos o que isso signifi­ca. Conforme 1.12, João viu sete candeeiros de ouro no senti­do literal do termo. Na visão, eles são, literalmente, sete can­deeiros de ouro. Mas esses candeeiros, por outro lado, têm um significado. Eles têm um significado simbólico. "Represen­tam" algo mais. Representam ou simbolizam "as sete igrejas" (1.20). Assim também aqui. Na visão, o apóstolo vê, na verdade, a Jerusalém terrestre, o templo terrestre, o santuário terrestre, o pátio externo terrestre, etc. A próxima questão é: o que tudo isso simboliza?

A resposta é que esse "santuário de Deus" simboliza a Igreja verdadeira, isto é, todos aqueles em cujo coração habita Cristo, no Espírito. São medidos todos os verdadeiros filhos de Deus que o cultuam em espírito e em verdade. São protegi­dos enquanto os juízos são infligidos sobre o mundo iníquo e perseguidor. Com certeza, esses santos sofrerão severamente, mas não perecerão; estão protegidos da ruína eterna. Essa prote­ção divina, contudo, não se estende ao "pátio", isto é, àqueles que, embora membros de Igreja, não são crentes verdadeiros. Assim como na visão dos gentios pisoteando Jerusalém e o pátio do templo, assim o mundo pisoteia a cristandade mera­mente nominal. O mundo invade essa falsa Igreja e toma posse dela. Membros de Igreja mundanos são receptivos às idéias do mundo; sentem-se perfeitamente à vontade com o mundo; gozam da companhia do mundo; ao votar para cargos políticos são dirigidos por considerações mundanas; em suma, eles amam o mundo. Essa condição perdura por 42 meses, isto é, por toda a época do evangelho. Mais será dito depois sobre esses 42 meses.

Nossa interpretação é suportada pelos seguintes argumen­tos: primeiro, observe que o termo "santuário de Deus" é uma expressão bem comum em referência à Igreja (cf 1 Co 3.16, 17; 2 Co 6.16; Ef 2.21). Deus habita em seu templo, ou melhor, seu santuário.

Segundo, o conceito de "santuário de Deus" é definido em nossa passagem significando "o seu altar [de incenso], e os que nele adoram". Enquanto o incenso estava sendo oferecido no altar, os adoradores, reverentemente, curvavam sua cabeça em oração. Fica claro, portanto, que a expressão "santuário de Deus" simboliza pessoas; as pessoas que ofere­cem a Deus o incenso das orações, todas as quais são cristãs verdadeiras.

Terceiro, lemos: "mas deixa de parte o átrio exterior do santuário". A referência é, certamente, a pessoas, membros de Igreja infiéis que devem ser rejeitados ou excomungados (cf. Jo 9.34). O termo "santuário de Deus" refere-se aos fiéis, aos que não são rejeitados, mas protegidos.

Quarto, assim como em Apocalipse 7 todos os crentes so­bre a terra são numerados e recebem o selo de Deus em sua fronte, assim também aqui, no capítulo 11, todos os que adoram no altar, isto é, os verdadeiros adoradores (cf. 8.3) devem ser medidos. Ambas, numeração e medição, referem-se à proteção. Além disso, tal como em Apocalipse 7 a Igreja militante foi descrita sob o símbolo das tribos de Israel terrestre, assim aqui a verdadeira Igreja é simbolizada pelo santuário terrestre de Israel. O santuário físico simboliza o santuário espiritual, isto é, o povo de Deus.

Quinto, essa interpretação está em harmonia com o simbo­lismo do Antigo Testamento. O templo de Ezequiel simboliza a Igreja (cf Ez 43.4ss.; 47.1ss.).'7

Finalmente, a melhor interpretação de Apocalipse 11 é o próprio capítulo 11 de Apocalipse! Segundo o verso 8 a Jerusalém

terrestre é claramente o símbolo do que quer que se oponha à verdadeira Igreja de Deus. E o símbolo e o centro do anticristia-nismo, isto é, da imoralidade (Sodoma) e da perseguição dos filhos de Deus (Egito). Daí se deveria concluir que o termo "santuário de Deus" tem de ser tomado, também, simbolica­mente, como falando do povo de Deus, dos que são fiéis.

6. As duas testemunhas (11.3-14)

Estabelecido esse ponto, não será difícil entender o signi­ficado do restante do capítulo. A verdadeira Igreja é agora re­presentada pelo símbolo das duas testemunhas. Essas testemu­nhas simbolizam a Igreja militante dando testemunho por meio dos seus ministros e missionários ao longo de toda a presente dispensação. O fato de que são duas testemunhas enfatiza a tarefa missionária da Igreja (cf. Lc 10.1). O Senhor envia seus missionários dois a dois; o que falta a um o outro supre. Agora, a Igreja como organização, funcionando por meio de seus mi­nistros e missionários, desenvolverá seu trabalho por 1.260 dias. Esse é o período que se estende do momento da ascensão de Cristo até quase o dia do juízo final (cf. Ap 12.5,6,14). Trata-se, sem dúvida, do equivalente exato de 42 meses, pois 42 vezes 30 é 1.260 - e de "um tempo, tempos e metade de um tempo", que são três anos e meio (Ap 12.14). É o período de aflições, a presente era do evangelho. Pode surgir a questão: Por que esse período é agora expresso em termos de meses (verso 2), depois em termos de dias (verso 3)? Aqui a nossa resposta é uma supo­sição: no verso 2 temos a figura de uma cidade sendo sitiada e, finalmente, tomada e pisoteada. A duração do sítio de uma cidade é geralmente expressa em termos de meses. No verso 3, entretanto, as duas testemunhas são descritas profetizando; essa é uma atividade diária. Elas testemunham a cada dia, pela dispensação inteira. Elas pregam o arrependimento, razão pela qual se vestem de saco.

Para que tenhamos uma visão nítida da figura da Igreja como uma poderosa organização missionária por toda a presente era do evangelho, ela é aqui descrita num quádruplo simbolismo.

Primeiro, assim como "as duas oliveiras e os dois candeei­ros", Josué e Zorobabel (?) (cf Zc. 4), representam os ofícios pelos quais Deus abençoou Israel, assim durante a era do evan­gelho ele abençoa sua Igreja por meio de ofícios, a saber, a pre­gação da Palavra e a ministério de sacramentos.

Segundo, tal como os missionários saíram dois a dois (Lc 10.1), assim através da era do evangelho a Igreja, como uma organização, cumpre sua missão no mundo.

Terceiro, assim como o fogo do julgamento e da conde­nação saiu da boca de Jeremias para devorar os inimigos de Deus (Jr 5.14), assim também quando a Igreja de hoje, por meio dos seus ofícios, condena o ímpio, com base na Palavra de Deus, essa condenação realmente resulta em sua destrui­ção (Mt 18.18).

Quarto, tal como Elias recebeu poder para fechar os céus de modo que não chovesse (1 Rs 17.1), e tal como Moisés rece­beu autoridade para tornar as águas em sangue (Ex 7.20), tam­bém assim o poderoso ministério da Igreja desta presente épo­ca, no caso de sua mensagem ser rejeitada, tem de julgar e con­denar o mundo.

Esse poder não é imaginário, mas muito real. O Senhor não apenas derrama desgraças sobre o mundo iníquo em res­posta às orações dos santos perseguidos (8.3-5), mas tam­bém assegura à Igreja que, sempre que ela estiver engajada no ofício oficial da Palavra e verdadeira diante do mundo, seus julgamentos serão os seus julgamentos (Mt 16.19; 18.18, 19; Jo 20.21-23).

Na verdade, num sentido moral, a Igreja ainda golpeia a terra com cada praga! O mundo iníquo deveria ser cauteloso, pois se alguém está firmemente determinado a prejudicar a Igreja, contra ele sai o fogo da boca das testemunhas de Deus.

Se alguém pretender[165] causar dano aos verdadeiros ministros e missionários, será igualmente destruído (verso 5).

Esta era do evangelho, contudo, chegará ao final (cf. Mt 24.14). A Igreja, como poderosa organização missionária, fin­dará seu testemunho. A besta que sobe do abismo, isto é, o mundo anticristão, movido pelo inferno, pelejará contra a Igreja e a destruirá. Esta é a batalha do Armagedom.[166] A besta não matará todos os crentes. Haverá crentes na terra quando Cristo voltar, embora sejam um pequeno número (Lc 18.8). Mas a Igreja, como poderosa organização missionária e para a disseminação do evan­gelho e o ministério da Palavra, será destruída. Como ilustra­ção, pense da condição do comunismo na China no presente tempo; certamente, há crentes sinceros ali, mas e quanto à pro­clamação poderosa, oficial, aberta e pública e à disseminação do evangelho? E não é essa a condição que se espalha em ou­tros países? Assim, logo antes da segunda vinda, o cadáver da Igreja, cujo testemunho oficial e público foi silenciado e sufo­cado pelo mundo, está tombado na praça da grande cidade. Esta é a praça da Jerusalém imoral e anticristã. Jerusalém crucificou o Senhor. Por causa de sua imoralidade e perseguição dos san­tos ela se tornou, espiritualmente, como Sodoma e Egito (cf Is 1.10; 3.9; Jr 23.14; Ez 16.46). Tornou-se símbolo da Babilônia e da totalidade do mundo imoral e anticristão. Assim, quando lemos que o cadáver da Igreja está jogado na praça da grande cidade,[167] isso quer dizer, simplesmente, que a Igreja está morta no meio do mundo: ela não mais existe como instituição de influência e de poder missionário! Seus líderes foram mortos; sua voz foi silenciada. Essa condição dura três dias e meio, o que é um breve período (Mt 24.22; cf Ap 20.7-9). O mundo nem mesmo permite que os corpos das testemunhas sejam en­terrados. Esses corpos estão jogados nas praças, expostos aos insetos, aves e cães. O mundo faz um grande piquenique: ele celebra! As pessoas enviam presentes umas às outras e tripudiam sobre as testemunhas (cf. Ef 9.22).

Sua palavra não os atormenta mais. Mundo estulto! Sua alegria é prematura.

Os cadáveres, de repente, começam a se mexer; o fôlego de vida de Deus entrou neles; as testemunhas se põem em pé. Em conexão com a segunda vinda de Cristo a Igreja é restaura­da à vida, à honra, ao poder, à influência. Para o mundo, a hora da oportunidade se foi. No dia do juízo, quando o mundo verá a Igreja restaurada à honra e à glória, o mundo ficará para­lisado de medo. A Igreja - ainda sob o simbolismo das duas testemunhas - agora ouve uma voz: "Subi para aqui". Imediata­mente a Igreja ascende ao céu numa nuvem de glória. "E seus inimigos a contemplaram." Não se trata de um arrebatamento secreto!

Agora, outra vez dirigimos nossa atenção para o mundo iníquo. Conquanto o resumo da História da Igreja tenha nos levado para o dia do juízo e além dele, retornemos para os even­tos que ocorrem pouco antes desse dia final. Como todos esses eventos se agrupam em torno da segunda vinda, é evidente que a expressão "naquela hora" não nos impede de fazê-lo. Na visão, o apóstolo vê que a terra está tremendo. Temos aqui a mesma figura de 6.12. Um terremoto imediatamente precede o juízo final. Já cai uma décima parte da cidade; em outras palavras, a obra de destruição começa. Tão terrível é o terremoto que mata sete mil pessoas. Este é, provavelmente, uma representação sim­bólica dos acontecimentos alarmantes nas vésperas do juízo fi­nal. O número sete mil não deve ser tomado literalmente; ele fala do número completo dos que são destinados à destruição pelo terremoto. Nem todos os iníquos serão destruídos. Aque­les que permanecem vivos ficam aterrorizados e "dão glória ao Deus do céu". Isso, é claro, não significa que se converteram. Longe disso! Estão, simplesmente, chocados de terror. O Rei

Nabucodonosor, em seus dias, muitas vezes glorificou o Deus do céu (Dn 2.47; 3.28; 4.1ss.; 4.34; 4.37). Mas isso não implica que ele era um homem convertido.

Agora tudo está pronto para o juízo final; pois, a despeito de todas as trombetas de advertência, o mundo permaneceu impenitente e, além disso, rejeitou o testemunho das duas teste­munhas - a Igreja como uma organização - e as matou (verso 7). Portanto, agora o ajuste final deve ocorrer. Assim, lemos: "Passou o segundo ai, vem ai o terceiro ai".

7. A sétima trombeta (11.15-19)

O sétimo anjo toca a trombeta. Outra vez, o juízo final não é descrito, mas introduzido.[168] Sobretudo, é mostrada a significância do dia do juízo em relação a Deus, à sua Igreja, aos crentes e aos não-crentes. Observe o duplo coro.

Primeiro cantam os anjos. Em espírito, o apóstolo ouve seu glorioso e inspirado hino de louvor e adoração. O domínio do mundo[169] se tornou domínio de nosso Senhor Jesus Cristo; e ele reinará para sempre.

Certamente, Deus sempre reina. Ainda assim, seu poder e sua autoridade, que ele exerce com respeito ao universo, nem sempre são evidentes. Algumas vezes, parece que Satanás é o governante supremo. Uma vez, porém, que o dia do juízo tenha chegado, o pleno esplendor real da soberania de Deus será re­velado, pois toda oposição será abolida. Então ficará claro a todos que o mundo se tornou território de nosso Senhor e do seu Cristo. E ele reinará para sempre. Se há o desejo de saber o que significam essas palavras, ouça o Messias, de Handel e, especial­mente, o seu coro, Aleluial Enquanto escrevo estas coisas, aspalavras dessa mais admirável composição musical estão soando em meus ouvidos. É um antegozo do céu! Quando o dia do juízo chega, então o pleno significado do Salmo 2.7ss. e de Daniel 7.14 (cf. Lc 1.33) será revelado.

A totalidade da multidão redimida, representada pelos 24 anciãos, responde ao hino dos anjos por meio da rendição de culto a Deus da maneira mais humilde - os anciãos prostram-se sobre o rosto - e dizendo: "Graças te damos, Senhor Deus, Todo-poderoso, que és e que eras, porque assumiste o teu grande poder e passaste a reinar. Na verdade, as nações se enfureceram; chegou, porém, o tempo determinado para serem julgados os mortos, para se dar o galardão aos teus servos, os profetas, aos santos e aos que temem o teu nome, assim aos pequenos como aos gran­des, e para destruíres os que destroem a terra" (11.17, 18).

Observe que neste hino o Senhor não é mais chamado "aquele que é, que era e que há de vir", como em 1.8, pois eleja veio. A Igreja se regozija com o fato de que o Senhor atingiu o ápice de seu poder e autoridade, agora publicamente exibidos. Os povos se enfureceram; promoveram guerra contra as teste­munhas, venceram, mataram-nas e tripudiaram sobre o sofri­mento delas (11.7ss.). Mas, afinal, a ira de Deus se revelou com­pletamente na chegada do dia do juízo. Nesse mesmo dia todos os que temem o Senhor receberão o galardão, enquanto os des­truidores serão destruídos (cf Mt 25.3lss.).

Para entender o parágrafo final deste capítulo, certifique-se de levar em conta que trata-se ainda de uma visão. O apóstolo não vê o próprio céu, mas uma figura simbólica. Nessa figura, o santuário de Deus no céu está, agora, totalmente aberto. Nada permanece velado. Nada escondido ou obscuro. A arca da aliança, por tanto tempo longe dos olhos, é agora vista. Essa arca da aliança é o símbolo da comunhão superlativamente real, íntima e perfeita entre Deus e seu povo - uma comunhão ba­seada na expiação. Pense no trono de misericórdia. Lemos em Êxodo 25.22: "Ali virei a ti e, de cima do propiciatório ...falarei contigo...".

Assim, quando a arca é agora vista, isto é, plenamente re­velada, o pacto da graça (Gn 17.7)[170] é cumprido na totalidade de sua doçura no coração e na vida dos filhos de Deus.

Para o ímpio, porém, essa mesma arca, que é o trono de Deus, é símbolo de ira. Também essa ira será totalmente revelada. Por isso é que se seguem relâmpagos, vozes, trovões, terremoto e grande saraivada (cf. 4.5).

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 12-14 Cristo versus o Dragão e Seus Aliados

como em cada uma das seções anteriores, aqui também retornamos ao início da presente dispensação a fim de uma vez mais pisar o mesmo chão. Em cada visão nós fizemos uma cami­nhada que nos levou, através da totalidade do curso desta era, da primeira à segunda vinda de Cristo. Num simbolismo inegável o vidente nos leva de volta ao tempo do nascimento de Cristo e de sua ascensão (12.1-5). A visão não termina até que vejamos aquele que se assenta como o Filho do homem "tendo na cabeça uma coroa de ouro, e na mão uma foice afiada" (14.14ss.). O dia do juízo chegou.

Como já dissemos,1 o capítulo 12 é o início não só de outra seção menor, isto é, a quarta, mas também o início da segunda divisão maior do livro. Essa divisão maior cobre os capítulos 12-22. Compõe uma unidade. As grandes personagens que surgem em oposição a Cristo e sua Igreja são apresentadas nos capítulos 12-14. São elas o dragão, a besta que sobe do mar, a besta que sobe da terra, Babilônia e os homens que portam a marca da besta. As visões que se seguem mostram-nos o que acontece a cada uma dessas forças anticristãs, àqueles que têm a marca da

besta (capítulos 15, 16), à Babilônia prostituta e às duas bestas (capítulos 17-19) e, finalmente, ao dragão (capítulos 20-22).

Fica claro, portanto, que o tema central da primeira divisão maior (capítulos 1-11) continua na segunda. Esse tema é, como há foi declarado,[171] a vitória de Cristo e de sua Igreja sobre o dra­gão e seus aliados. Mas, enquanto a primeira divisão maior retra­ta a luta externa entre a Igreja e o mundo, a segunda parte do livro revela as profundezas por trás das cenas. Agora vemos mais claramente do que na divisão anterior que a manifestação do conflito entre a Igreja e o mundo nada mais é do que a mani­festação externa do conflito entre Cristo e Satanás (o dragão).

E importante observar que no capítulo 12 o dragão é pri­meiro retratado como tendo o propósito de destruir a Cristo (versos 1-12). Falhando nesse intento, ele persegue a mulher porque ela deu à luz o Cristo (versos 13-17a). Sem sucesso também nisso, ele promove guerra contra o resto da semente (verso 17b).

1. A mulher, o filho e o dragão (12.1-6).

Esses seis versos contêm a primeira figura simbólica. O pal­co é o céu. Aqui João vê a mulher gloriosamente adornada: o sol é sua veste, a lua o escabelo dos seus pés e uma tiara de doze estrelas, sua coroa. Ela está para dar à luz. Grita porque está em trabalho de parto. De repente, João vê, em frente à mulher, um terrível dragão vermelho. Imagine uma serpente alada com cabe­ça cristada e com patas destruidoras - cruel, selvagem, maligna, depravada; mas lembre-se de que essa é uma figura, um símbolo. Assim, essa besta tem sete cabeças coroadas e dez chifres. Tão imenso é o dragão que sua cauda colossal chicoteia furiosamente o céu e varre um terço das estrelas, lançando-as à terra! Por que esse terrível monstro se posta frente à mulher que está para dar à luz um filho? Para devorá-lo tão logo nasça! Será que alcança sucesso? Não. A mulher dá à luz um filho, um macho, poderoso, que deverá reger a terra com vara de ferro. Então, subitamente... Mas ouçamos o que acontece nas palavras do autor: "E o seu filho foi arrebatado para Deus ale o seu trono". Havendo falhado em sua tentativa de devorar o filho, o dragão, agora, dirige toda a sua fúria contra a radiante e gloriosa mulher. A mulher, porém, foge para o deserto onde Deus lhe havia preparado comida e refúgio por 1.260 dias. Leremos mais acerca dessa tentativa do dragão de destruir a mulher (ver verso 15).

Esta é, em suma, a figura. O que é que ela quer dizer?

Há três personagens. Primeiro, a mulher radiante. A mu­lher simboliza a Igreja (cf. Is 50.1; 54.1; Os 2.1; Ef 5.32). A Escritura enfatiza o fato de que a Igreja é uma só entidade em ambas as dispensações. E o povo escolhido em Cristo. E uma casa, uma vinha, uma família - Abraão é o pai de todos os cren­tes, quer sejam circuncidados quer não -, uma oliveira; uma raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade de Deus; uma só noiva maravilhosa; e em sua consumação, uma só Nova Jerusalém cujos portões portam os nomes das doze tribos de Israel e em cujas fundações estão inscritos os nomes dos doze apóstolos (cf. Is 54; Am 9.11; Mt 21.33ss.; Rm 11.15-24; Gl 3.9-16, 29; Ef. 2.11; 1 Pe 2.9 [cf. Êx 19.5, 6]; Ap 4.4; 21.12-14).

Na terra, essa Igreja pode parecer bem insignificante e suscetível ao escárnio e à ridiculização, mas da perspectiva do céu essa mesma Igreja é gloriosa: tudo que o céu pode oferecer de glória e de esplendor lhe é dado prodigamente.[172] Está vestida com o sol, pois é gloriosa e exaltada. Tem a luz sob seus pés, pois exerce domínio. Tem na fronte uma tiara de doze estrelas, pois é vitoriosa. Está grávida, pois sua tarefa é dar à luz o Cristo "segundo a carne" (Rm 9.5).

Segundo, há um filho, a semente da mulher. Essa criança poderosa é o Cristo.[173] Ele é aquele "que há de reger as nações com cetro de ferro". Essa expressão é, claramente, emprestada[174]do Salmo 2.9, um salmo messiânico, aplicada pelo próprio Cristo em Apocalipse 2.27. A denominação de "o filho (ou semente) da mulher" é usada sempre para indicar o Cristo (Gn 3.15; Gl 4.4). Se alguém ainda hesitar em crer que o filho da mulher se refere a Cristo, que compare o verso 5 com o verso 10: quando o filho é levado a Deus e seu trono, e o dragão é expulso, os céus cantam: "Agora veio a salvação... do nosso Deus e a autoridade do seu Cristo..."

Terceiro, há o dragão. Ele simboliza Satanás (Ap 20.2). As sete cabeças coroadas referem-se ao seu domínio mundial (cf Ef 2.2; 6.12). Ver também nossa explicação de Apocalipse 13.1 e 17.9. As coroas, entretanto, não são grinaldas de vitória, mas meras coroas de pretensa autoridade. Os dez chifres falam do poder destrutivo de Satanás; ele se posta à frente da mulher para devorar seu filho! Quando Satanás cai, ele arrasta consigo em sua ruína "um terço das estrelas dos céus", isto é, um vasto nú­mero de espíritos maus (cf Jó 38.7; 2 Pe 2.4; Jd 6).

Estudemos, agora, o pensamento principal. O dragão está parado em frente da mulher que está para dar à luz, para que, quando ela der à luz, ele devore seu filho, isto é, Satanás está, constantemente, objetivando a destruição de Cristo. Assim vis­to, a totalidade do Antigo Testamento torna-se uma só História, a História do conflito entre a semente da mulher e o dragão, entre Cristo e Satanás. Nesse conflito, Cristo é, obviamente, o vitorioso.

Vejamos a história do Antigo Testamento a partir dessa perspectiva:

a. A promessa inicial (Gn 3.15). Apocalipse 12 é, com toda certeza, baseado nesse verso. As mesmas personagens aparecem em ambos; a mesma verdade é proclamada por ambos. As pala­vras da promessa são: "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar". A "serpente" de Gênesis 3 é o "dra­gão" de Apocalipse 12. A "semente" da mulher, de Gênesis 3, é o "filho varão" de Apocalipse 12. Também em Gênesis 3.15 a expressão "sua semente" refere-se a Cristo. Aqui em Gênesis 3 é anunciado o conflito.

b. De Sete ao Dilúvio. Depois, nascem filhos a Adão e Eva - Caim e Abel. Mas Caim mata Abel. Então nasce Sete. Será que Satanás compreende que a família de Sete foi predestinada para cumprir a promessa da semente, o Messias? Somos inclinados a pensar que sim, pois o diabo agora começa a fazer tudo que está em seu poder para destruir Sete. Ele cochicha aos ouvidos dos filhos de Sete que eles devem casar-se com as filhas de Caim. Tenta destruir a geração de Sete a fim de anular a promessa quanto ao Messias. Terá ele sucesso? Pode parecer que sim. Leia Gênesis 6.12. Satanás triunfou... não, não totalmente. Entre as famílias que descendem de Sete há uma que teme ao Senhor, isto é, a de Noé. Deus salva essa família, enquanto o dilúvio destrói o res­tante. Nessa única família a promessa é continuada.

c. Do Dilúvio a Jacó. De novo, o dragão se coloca em frente à mulher para destruir o filho. A promessa referente ao Messias é agora feita a Abraão e a Sara, sua mulher. Humanamente falan­do, entretanto, essa promessa jamais poderia ser cumprida, pois Abraão é velho e Sara é estéril. O dragão havia quase vencido, quando acontece o milagre e nasce Isaque. Então a promessa lhe é feita. Mas Deus ordena a Abraão que o ofereça num sacrifício queimado. "E, estendendo a mão, tomou o cutelo para imolar seu filho...". O que será agora da promessa de Deus? Certamente, o dragão está triunfando. Está? Ele sabe a resposta. O Anjo do Senhor aparece, isto é, o próprio Cristo aparece para salvaguardar seu próprio nascimento segundo a carne. Até na antiga dispensação é, constantemente, o próprio Cristo quem prepara todas as coisas para seu nascimento. O Anjo do Senhor, isto é, o próprio Cristo, diz a Abraão: "Não estendas a mão sobre o rapaz, e nada lhe faças, pois agora sei que temes a Deus, porquanto não me negaste o filho, o teu único filho ... a tua descendência possuirá a cidade dos seus inimigos, nela serão benditas todas as nações da terra".

A semente que deveria destruir a cabeça da serpente nasce­ria das gerações de Isaque e de Rebeca. Rebeca, porém, era estéril (Gn 25.21). Novamente, Jeová, o Deus da promessa, re­aliza um milagre, e Rebeca concebe de maneira que a promessa continue na linhagem de Jacó.

Veja, entretanto, o que acontece. Jacó engana seu pai e re­cebe a bênção que ele havia reservado para Esaú. Jacó tem de fugir. Anos depois, quando ele retorna para sua terra, ele tem muito medo. Mas Esaú não mata Jacó. A promessa em relação ao filho da mulher é preservada outra vez.

d. De Jacó aos judeus no deserto. O dragão está mais uma vez frente à mulher. Ele ataca os descendentes de Jacó. Os judeus. Dessa vez ele parece ter sido bem-sucedido, pois ainda que Deus, em sua terna misericórdia, tenha tirado seu povo do Egito, este o rejeita e dança diante de um bezerro de ouro.

"Disse mais o Senhor a Moisés: ... Agora, pois, deixa-me; para que se acenda contra eles o meu furor, e eu os consuma..."

Triunfará dessa vez o dragão? Sim... a menos que haja um intercessor. E há! Moisés intercede e a promessa é, novamente, preservada. Lembre-se de que foi o grande Mediador, Cristo, que criou, no coração do intercessor menor, o espírito da inter­cessão.

e. Dos judeus no deserto a Davi, o rei. Mais uma vez a História prossegue. Da tribo de Judá, Deus escolheu uma famí­lia, a de Davi. O Messias prometido nasceria da semente de Davi (2 Sm 7.12ss.; SI 89.29, 35, 36; Jr 23.5; At 2.30). Assim, o diabo volta sua seta contra Davi. Davi precisa ser destruído.

Lemos isto: "Procurou Saul encravar a Davi na parede, porém ele se desviou do seu golpe, indo a lança ferir a parede". Saul fez isso porque um espírito maligno veio poderosamente sobre ele. Terá o dragão obtido sucesso? Não, pois Davi escapou duas vezes da presença de Saul. Mesmo durante a antiga dispensação o Cristo trabalhava na terra preservando a promessa a respeito de si mesmo.

/ De Davi à rainha Atália. Atália, a filha iníqua de pais iníquos - Acabe e Jezabel - está reinando. Com o objetivo de conquistar poder absoluto, ela concebe em seu coração a destruição de toda a descendência de Davi. Assim, outra vez, a vinda do Messias em forma humana é ameaçada. O dragão se posta diante da mulher; sua ira é dirigida contra o filho. E agora? Será que Satanás consegue? Pelo menos, parece; pois lemos: "Vendo Atália, mãe de Acazias, que seu filho era morto, levantou-se e destruiu toda a descendência real". Com toda probabilidade, se a descen­dência real inteira fosse destruída, então Cristo não poderia ser o filho e herdeiro legal de Davi. Então o plano de Deus teria falha­do. Atália destruiu toda a semente real. Contudo, leia o que se segue (2 Re 11.1, 2ss.): "Mas Jeoseba, filha do rei Jorão, irmã de Acazias, tomou a Joás, filho de Acazias, e o furtou dentre os filhos do rei, aos quais matavam, e o pôs a ele e a sua ama numa câmara interior; e assim o esconderam de Atália, e não foi morto".

Quão maravilhosos são os caminhos do Senhor! Quão ma­ravilhosa a sua providência!

Mais tarde vemos Joás de novo, e sobre a sua cabeça está uma coroa. Ouvimos as pessoas gritando: "Longa vida ao Rei!" Novamente, a promessa é preservada. Cristo nascerá da linha­gem de Davi. A menos que o dragão ainda consiga impedir isso.

g. De Atália ao rei Acaz. Agora, as forças combinadas de Israel e Síria se juntam contra Judá. Seu propósito é obliterar a casa de Davi com a qual estavam relacionadas esperanças e pro­messas referentes ao Messias, e colocar um rei estrangeiro nomeio de Judá, mesmo que fosse "o filho de Tabeel" (Is 7.6). É um momento crítico na História. Nascerá o Cristo, porventura, da semente de Davi? Jeová ordena ao profeta Isaías que vá ao encontro do rei Acaz de Judá para encorajá-lo. Acaz, entretanto, desdenhosamente, se recusa a pedir um sinal como garantia da ajuda de Jeová. Certamente, o dragão - a serpente de Gênesis 3.15 - alcançará sucesso agora, pois contra a casa de Davi se juntam os exércitos da Síria e de Israel - bem como a maldade do próprio rei Acaz! Satanás se diverte. Mas, de novo, ele ri muito cedo, pois lemos: "Portanto, o Senhor mesmo vos dará um sinal: Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e lhe chamará Emanuel". O propósito de Deus tem de permanecer. Emanuel nascerá da família de Davi.

h. Do rei Acaz a Ester. E o 5- século a.C. e o rei Assuero está reinando. A pedido de Hamã, o rei emite um decreto que ordena que, por todo o seu vasto domínio, todos os judeus sejam mortos (Ef 3.15). O decreto é selado com o timbre do anel do rei. Mas a promessa de Jeová quanto ao Messias nascer da semente de Davi foi selada com o juramento do Rei dos reis. Será preciso que se relate o que aconteceu? Leia o livro de Ester. Os judeus, outra vez, foram salvos.

i. De Ester a Belém. Então se dá o ato final desse poderoso drama. O palco é Belém. Ali, numa manjedoura, repousa o Cristo-menino. Mesmo que eleja tenha, de fato, nascido, o dragão ainda tenta destruí-lo. Na verdade, Apocalipse 12, ainda que cobrindo com poucas palavras a totalidade da história do conflito de Sata­nás contra Cristo, refere-se direta e especificamente aos aconte­cimentos que ocorreram em relação ao nascimento de Cristo. "E o dragão se deteve em frente da mulher que estava para dar à luz, a fim de devorar-lhe o filho quando nascesse".

Os sábios do oriente estão na sala de audiências de Herodes. "Ide informar-vos cuidadosamente a respeito do menino" - disse Herodes - "e, quando o tiverdes encontrado, a vi sai-me para eu também ir adorá-lo." Sua intenção era a de matar o infante. Mas os sábios, advertidos por Deus, retornaram ao seu país por outro caminho após haverem adorado a Cristo. Mesmo assim, o dra­gão se recusa a admitir sua derrota. As crianças de até 2 anos, de Belém e de todo o distrito, são mortas. Mas Herodes falhou. E também o dragão. O Cristo-menino está a salvo no Egito (Mt 2.13). O propósito de Deus não pode ser jamais frustrado. O nascimento de Cristo em Belém é a vitória de Cristo sobre o dragão. A morte do Salvador na cruz pelo seu povo é sua vitória ulterior. "E o seu filho foi arrebatado para Deus até ao seu trono." Isso se refere à ascensão de Cristo e à sua entronização (Ap 12.5; cf Fp 2.9). Aqueles que se opõem a ele serão tratados com "vara de ferro". Isso é verdadeiro ao longo de toda dispensação. Cristo triunfa e os anjos cantam "glória a Deus nas maiores alturas!".

2. A expulsão do dragão (12.7-12).

A segunda figura simbólica mostra-nos o efeito do nasci­mento, da expiação e da ascensão de Cristo ao trono celeste. Como sempre, vejamos, primeiro, a totalidade da figura. Há uma batalha no céu. Miguel, como líder dos bons anjos de Deus e defensor do seu povo (Dn 10.13, 21; 12.1; Jd 9), move um ataque contra o dragão, o líder dos anjos maus e opositores do povo de Deus. Dois generais e dois exércitos opõem-se um ao outro. Observe, entretanto, que é Miguel e seu exército que movem o ataque. O resultado é que o dragão é derrotado e lan­çado para fora do céu.

"E foi expulso o dragão, a antiga serpente, que se chama diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo, sim, foi atirado para a terra e, com ele, os seus anjos."[175]

O quadro que João vê é completamente explicado pelas pa­lavras que ele ouve. A batalha no céu e a derrocada do dragão não podem ser entendidas literalmente. Satanás é "atirado para a terra" no sentido de que perdeu seu lugar de acusador dos nossos irmãos. Uma vez que Cristo nasceu e satisfez a justiça quanto ao pecado, Satanás perdeu qualquer semelhança de justiça com que basear suas acusações contra os crentes. Na verdade, ele conti­nua a nos acusar. Esse é o seu trabalho ainda hoje. Mas ele não pode mais se louvar na obra incompleta do Salvador. A expiação de Cristo foi plenamente cumprida; a completa satisfação pelo pecado foi realizada quando ele ascendeu ao céu (cf. Rm 8.33: "Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica"; cf. também Rm 8.1 e Lc 10.18). Observe o efeito tríplice dessa derrota de Satanás e dos seus anjos.

Primeiro, por causa de sua derrota, a salvação operada por Deus em Cristo se torna manifesta; o poder de Deus é vindicado; seu governo real no coração do seu povo é estabelecido; sua autoridade é revelada (verso 10). Como resultado, há uma es­trondosa aclamação no céu.

Segundo, por causa dessa denota, o povo de Deus, que dá testemunho de sua fé - no sangue do Cordeiro - e prova o caráter genuíno dessa fé pela perseverança até a morte, triunfa (verso 11). De conformidade com isso, os céus e os que nele habitam se regozijam.

Terceiro, por causa dessa derrota, Satanás se enche de ira. Ele sabe que tem pouco tempo. Essa, a sua segunda derrota, a final, sobrepuja a anterior na conclusão da História (verso 12). Assim, que o céu ressoe com júbilo.

3. Os últimos ataques do dragão (12.13-17)

Nessa terceira figura simbólica, o dragão que foi expulso do céu persegue a mulher porque ela daria à luz o varão. Isso explica sua tentativa de destruir a mulher, o que é, na realidade, outra fase de sua ira contra seu filho. Certifiquemo-nos de notar esse fato. A mulher recebeu duas asas de águia (Êx 19.4; Dt 32.11; Is 40.31) para que voasse até o deserto. Nesse deserto Deus havia preparado um lugar para ela (verso 6). Ali ela é sustentada por um tempo, dois tempos e metade de um tempo, isto é, por 1.260 dias (verso 6). Ali ela permanece "fora da vista da serpente". O dragão, não querendo ainda desistir, tenta afogar a mulher com as águas de um rio que sai de sua boca; mas a terra engole esse rio. Então o dragão fica furioso, cheio de raiva contra a mulher. Mesmo havendo falhado, não só na tentativa de destruir o filho, mas também em seu ataque à mulher, ele se retira para batalhar contra o restante da semente da mulher, isto é, aqueles que guar­dam o mandamento de Deus e têm o testemunho de Jesus.

Interpretamos a figura tal como se segue. Satanás, tendo falhado em vencer a Cristo, continua seu ataque contra a Igreja. Dirige sua fúria contra a Igreja porque ela deu à luz a Cristo. Mas o Senhor protege o seu povo. Ele o sustém com asas de águias. No deserto da aflição, esta caminhada terrena, ele preparou um lugar para sustentá-lo com o maná da Palavra. Ali a Igreja habita "fora da vista da serpente", isto é, longe dos ataques mais diretos e mortais de Satanás. O diabo não pode destruí-la. Esse é o milê­nio de Apocalipse 20. De fato, o diabo tenta afogar a Igreja num rio de mentiras, desilusões, "ismos", falsidades filosóficas, utopi­as políticas, dogmas quase-científicos, mas a Igreja verdadeira não se deixa enganar. As pessoas mundanas, por outro lado, estão prontas a engolir o rio inteiro! Essa falha em enganar a Igreja torna o dragão ainda mais irado. Ele está determinado a voltar seu ataque contra "os restantes da sua descendência", isto é, crentes individuais.

Esse período de tempo durante o qual a Igreja experimenta tanto o bom quanto o mau, a perseguição de Satanás e o cuidado especial de Deus que torna impossível que o diabo ataque direta­mente a Igreja e a destrua; esse período sombrio durante o qual o povo de Deus é sustentado com o maná da Palavra e goza de certo grau de tolerância e de segurança na terra, tendo o Senhor preparado um lugar para ela no deserto, é descrito como "um tempo, dois tempos e metade de um tempo".

Esse é o período durante o qual as testemunhas (capítulo 11) profetizam; o evangelho está sendo proclamado abertamente. Seguem-se os "três dias e meio" durante os quais as testemunhas são mortas e seus corpos ficam tombados na praça da grande cidade (Ap 11.7ss.). Essa é a batalha do Armagedom. Esses três dias e meio são, por sua vez, seguidos do dia do juízo. Fica claro, portanto, que o período descrito como "um tempo, dois tempos e metade de um tempo" começa no momento da pri­meira vinda de Cristo - seu nascimento, ministério, cruz e coroação e se estende até um ponto no tempo bem próximo à sua segunda vinda para juízo. Um estudo cuidadoso do Apocalipse confirma nosso ponto de vista. Aí, também, o longo período durante o qual a Igreja é mantida longe da serpente de modo que a influência de Satanás seja restringida, é seguido por um breve espaço de tempo durante o qual o diabo comanda os exércitos de Gogue e Magogue contra o campo dos santos. E aí, ainda, esse breve espaço de tempo é seguido pela segunda vinda de Cristo para julgar o mundo (20.11ss.).[176] Em todos esses capítulos temos a seguinte ordem.

(i) Um período longo (a época do evangelho) de "42 me­ses", "mil anos", "um tempo, dois tempos e metade de um tem­po" e 1.260 dias (Ap 11.2, 3; 12.6, 14; 13.5; 20.2-5).

(ii) Um período breve de 3v2 dias (Ap 11.7,9; 13.7; 20.7-10).

(iii) O dia do juízo (Ap 11.11,12,16ss.; 14.14ss.; 20.11ss.).

Vemos imediatamente que essas três formas de designar esse período que encontramos nos capítulos 11,12 e 13 diferem, mas muito pouco. De fato, 42 meses são 1.260 dias; ambos são iguais a "um tempo, dois tempos e metade de um tempo", se o termo "tempo" for interpretado como significando um ano e, "tempos", significando dois anos. Nos três casos estamos lidando com um período que é designado como três anos e meio.

Está na hora de perguntar por que o termo "três anos e meio é usado para caracterizar esse período longo. Para responder a essa questão devemos nos lembrar de que, durante a antiga dispensação, havia um período de três anos e meio do qual o povo de Deus não poderia se esquecer jamais. Foi um tempo de aflição, ainda que tenha sido um tempo em que o poder da Palavra de Deus foi exibido (1 Rs 17; Tg 5.17). Quando se compara Tiago 5.17 com Apocalipse 11.6, vê-se, imediatamente, que o apóstolo estava pensando nos dias de Acabe e de Elias. Durante esse período de três anos e meio a Igreja de Deus foi perseguida (1 Rs 18.10, 13), ainda que não tenha sido destruída (1 Rs 18.4, 39; 19.18). A Palavra de Deus demonstrou seu grande poder (1 Rs 17.1). Elias e outros foram sustentados por Jeová de modo miraculoso (1 Rs 17.4,9ss.). Da mesma maneira, através do longo presente período de atividade evangélica, que começou com a primeira vinda de Cristo e estende-se até quase a segunda vinda, a Igreja é perseguida, mas não destruída, a Palavra de Deus exerce poderosa influência, e o povo de Deus recebe nutrição espiritual.

A expressão "um tempo, dois tempos e metade de um tempo" ocorre pela primeira vez no livro de Daniel 7.25; 12.7. É o período do anticristo. João enfatiza o fato de que o espírito do anticristo já está no mundo (1 Jo 4.3). No Apocalipse esse período de três anos e meio se refere à totalidade da época do evangelho. Ela é seguida pelos "três dias e meio" durante os quais a "besta que sobe do abismo" - o mundo anticristão em sua fase final -matará as testemunhas e silenciará a voz do evangelho (cf. Ap 11.7ss.).

4. Os aliados do dragão (13.1-18)

O capítulo 13 mostra-nos os agentes, instrumentos ou armas que o dragão usa em seus ataques contra a Igreja. Duas bestas são descritas. A primeira é um monstro de indizível horror. A segunda tem uma aparência inofensiva e, por isso, é vista comomenos perigosa do que a primeira. A primeira besta sobe do mar. A segunda, da terra. A primeira é a mão de Satanás. A segunda é a mente do diabo. A primeira representa o poder perseguidor de Satanás operando em e por meio das nações deste mundo e de seus governantes. A segunda simboliza as religiões falsas e as filosofias deste mundo. Ambas as bestas fazem oposição à Igreja ao longo desta dispensação; contudo, o apóstolo as descreve em termos que indicam a forma que assumem na última década do l[177] século A.D.8

Em 14.8, um terceiro agente é mencionado, isto é, Babilônia, a meretriz. No total, três agentes são empregados por Satanás em seus ataques sobre a terra. São eles as perseguições anticristãs, as religiões anticristãs e a sedução anticristã.

João observa que o dragão "se pôs em pé sobre a areia do mar" para convocar seus aliados. O dragão, portanto, deve ser visto como estando num lugar em que mar e terra se encontram. O primeiro aliado sobe do mar. O segundo aliado vem da terra. O apóstolo vê um monstro de indescritível horror subindo do mar. Bem lentamente a besta emerge das águas. Primeiro João vê apenas os chifres. Há dez deles cobertos de diademas.

Depois, surgem as cabeças. Essa besta tem sete cabeças e sobre essas cabeças estão escritos nomes de blasfêmia. Após, o corpo aparece. E um corpo como de leopardo, grande e feroz, pronto a se lançar sobre sua presa (cf. Dn 7.6; Os 13.7; Hc 1.8). Agora a besta está saindo da água. João vê seus pés. São como pés de urso. Imagine a familiar figura de uma ursa roubada de sua cria (2 Sm 17.8; Pv 17.12; Os 13.8); está preste a rasgar e despedaçar, ansiosa para esmagar sob seus grandes e terríveis pés, os seus inimigos. Como a cabeça é o ponto-chave da figura, ela é mencionada por último. Essa besta horrível tem a boca de um leão: rosnando e rugindo, está ávida por sua presa, ansiosa por destruir (SI 17.12; Os 5.14; 1 Pe 5.8). A esse monstro o

7. Ver Capítulo Seis, pp. 67s.

dragão confere seu poder e autoridade. João, então, olhando mais de perto, observa que uma das sete cabeças parece ter sido ferida mortalmente e, depois, curada. O mundo todo, maravilhado, se­gue a besta em espírito de adoração e culto, dizendo: "Quem é semelhante à besta? Quem pode pelejar contra ela?" Ao cultuar a besta, os homens prestam culto ao dragão que lhe deu autoridade. A besta, então, começa a falar; ela profere palavras de ostenta­ção e de blasfêmia. Isso prossegue por 42 meses. As blasfêmias são dirigidas contra Deus e contra todos os que habitam no seu tabernáculo celeste. Quanto aos que habitam na terra: "Foi-lhe dado também que pelejasse contra os santos e os vencesse. Deu-se-Ihe ainda autoridade sobre cada tribo, povo, língua e nação; e adorá-la-ão todos os que habitam sobre a terra, aqueles cujos nomes não foram escritos no livro da vida do Cordeiro que foi morto, desde a fundação do mundo" (13.7, 8).

Interpretamos a figura como se segue. O mar representa as nações e seus governantes (cf. Is 17.12 em que o rumor dos po­vos é comparado ao rumor do mar; e o movimento das nações como o movimento de muitas águas).[178] Apocalipse 17.15 prova esse ponto. A besta que sobe do mar está bem associada à besta que sobe do abismo (11.7). Essa última é a forma final que a anterior assume. A besta nascida do mar simboliza o poder per­seguidor de Satanás incorporado em todas as nações ao longo da História. O domínio mundial dirigido contra o povo de Deus, onde e quando isso ocorre na História, isso é a besta. A besta assume diferentes formas; ela tem sete cabeças. Primeiro vem a Antiga Babilônia; depois, a Assíria; então, a Nova Babilônia; após, Medo-Pérsia; Macedónia; Roma, etc. Contudo, ainda que difiram as formas, a essência permanece a mesma: governos mundanos dirigidos contra a Igreja. Nessa besta o poder perseguidor de Satanás torna-se visível. Essa é a razão de tanta semelhança entre a besta e o dragão; ambos são monstros cruéis, tendo dez chifres

e sete cabeças. Observe, entretanto, que no caso da besta os chi­fres - e não as cabeças - são coroados, enquanto o dragão usa na cabeça os seus diademas de arrogante autoridade. Noutras pala­vras, é o dragão, Satanás, quem governa: seus planos são execu­tados pelos governantes do mundo. E certo que os governantes terrenos também portam coroas; pense sobre esses chifres como símbolos de crueldade coroada. Esses governantes terrenos, po­rém, estão sujeitos a Satanás e dele recebem inspiração! Isso é verdadeiro quanto a cada autoridade e governo que persiga a Igreja. Tais autoridades e governos blasfemam contra Deus e reivindicam títulos divinos para si mesmos. Assim, nos dias de João, os imperadores romanos exigiam que seus vassalos se diri­gissem a eles como "Senhor" e "Salvador". O fato de que essa besta representa cada forma de governo terreno que persiga a Igreja, onde e quando isso ocorra na História, fica claro quando observamos que, segundo o verso 2, as quatro bestas da visão de Daniel (Dn 7) foram, aqui, combinadas numa única besta. Em Daniel, essas quatro bestas representam quatro sucessivos impé­rios mundiais.[179] Aqui, porém, essa besta composta não pode sim­bolizar meramente um império ou governo. Deve indicar todos os governos anticristãos.

Uma dessas cabeças foi ferida mortalmente, mas a ferida foi curada. Para dar uma interpretação correta a essa declaração, nós devemos manter em mente que as sete cabeças representam sete impérios que se sucederam na História (cf. 17.10). Portanto, a declaração de que uma das cabeças recebeu um golpe mortal e que esse ferimento mortal foi curado deve significar que um dos sete impérios cessou, por um pouco de tempo, de ser um poder violentamente perseguidor, mas que retorna ao seu papel contra a Igreja. De conformidade com isso, a explicação que achamos ser a mais provável é a que se segue. A cabeça da qual João fala representa Roma, a Roma de seus dias. Quando Nero foi impera­dor (54-58 A.D.), esse tirano cruel, a fim de desviar de si a suspei­ta de que o incêndio de Roma era ato seu, instigou a perseguição aos cristãos. Alguns crentes foram crucificados. Outros foram cobertos com breu ou óleo, atados a postes e queimados como tochas de iluminação para diversão da turba." No ano 68 A.D., Nero cometeu suicídio. Como perseguidora, Roma recebeu seu golpe mortal. Contudo, sob Domiciano a perseguição foi reto­mada. O golpe mortal foi curado. Roma surge de novo como a perseguidora inspirada por Satanás, contra a Igreja.[180] Nos dias do apóstolo, o mundo em geral adorou Roma e prestou culto ao seu imperador.

Através de toda a época do evangelho - os 42 meses sobre o qual já discutimos[181]- os governos deste mundo se colocam no trono; arrogam a si mesmos a autoridade que pertence a Deus (imagine os governos totalitários de hoje) e blasfemam contra Deus e contra o céu. Essa condição resultará, finalmente, na com­pleta destruição da Igreja como poderosa e influente organização de disseminação do evangelho. No final, cada tribo, língua e na­ção adorará o governo do anticristo (Ap 13.7 e 11.7 devem ser comparados).[182] Mas mesmo nesses dias mais terríveis que prece­dem a segunda vinda de Cristo à terra, haverá crentes na terra, isto é, aqueles cujos nomes foram escritos desde a eternidade no livro da vida do Cordeiro (cf. 17.8).[183] Pelo fato de que Deus elegeu-os desde a eternidade para a salvação na santificação do Espírito e para a crença na verdade (2 Ts 2.13), esses indivíduos não podem perecer. O governo do anticristo talvez destrua o corpo, mas não pode destruir a alma deles. Que os crentes espe­rem pacientemente por esse tempo de tribulação, sabendo que todas as coisas estão incluídas nos decretos divinos; e sabendo,

11. Ver P. Schaff, History of the Christian Church, I, p. 381.

além disso, que quando o mundo se utiliza da espada em suas guerras contra a Igreja, Deus se torna o seu vingador. O indiví­duo que entende isso exercerá paciência e perseverará na fé. Se alguém tem ouvidos, que ouça essa exortação e guarde-a no coração (versos 9 e 10). Não é Satanás, mas Deus o governante supremo.

Depois disso, João vê outra besta. Ela surge da terra. Confor­me diz Tiago 3.15, a "sabedoria" anticristã procede da terra (cf Fp 3.19). Contudo, vejamos, primeiro, a figura. Essa besta não tem dez chifres, mas apenas dois: dois pequenos chifres como os de um cordeiro. Mas fala como um dragão! Essa segunda besta é serva da primeira, isto é, coopera plenamente com a primeira. Realiza muitas proezas e pseudomilagres para enganar as massas. Faz vir fogo do céu, isto é, faz aparecer fogo como que vindo do céu. Ordena às pessoas que adorem a estátua ou imagem erigida em honra à primeira besta. Depois, faz a imagem falar. As pessoas, imersas em superstição e ignorância, são iludidas de maneira que realmente acreditam nas coisas que a imagem fala. Além disso, a segunda besta ordena que todos os que se recusam a adorar a besta sejam mortos. Finalmente, ordena que a marca da besta seja impressa sobre a mão direita ou na fronte das pessoas como evidência de sua lealdade. Os que se recusam a receber essa mar­ca são boicotados. Não lhes é permitido comprar ou vender, ou administrar qualquer negócio. Essa marca da besta é ao mesmo tempo o nome da besta e o número do seu nome. O que quer que tenha uma mente, isto é, quem recebeu sabedoria, pode explicar esse número; pois é número de homem, a saber, 666.

Esse é, talvez, o parágrafo mais difícil em todo o livro do Apocalipse. As idéias principais são claras; os detalhes são obscuros. Dentre as muitas interpretações, julgamos que a mais razoável seja a seguinte, ressaltando, porém, que a explicação dos detalhes fica prejudicada.

A segunda besta é o falso profeta (19.20). Ele simboliza a falsa religião e a falsa filosofia sob qualquer forma que se apre­sentem ao longo desta presente dispensação. Embora essa besta se pareça exteriormente com o Cordeiro, ela esconde um dragão no seu interior.[184] Noutras palavras, ela surge de modo atraente e chamativo aos olhos. A besta parece muito inocente: um pequeno c lindo cordeirinho, um bichinho de estimação para crianças. Mas sua fala revela seu pensamento interior, sua vida, sua essência e seu caráter. Ela fala como o próprio diabo! Essa segunda besta, de conformidade com isso, é a mentira de Satanás proferida como se fosse verdade. E Satanás travestido de anjo de luz (2 Co 11.14). Ela simboliza todos os falsos profetas em todas as épocas desta dispensação. Eles vêm disfarçados de ovelhas, mas são, na ver­dade, lobos devoradores (Mt7.15).

As duas bestas - os governos e as religiões anticristãs -operam em conjunto. Esse é, invariavelmente, o que acontece. Foi verdadeiro nos dias do apóstolo: o sacerdote pagão era amigo do procônsul. A influência sacerdotal apoiou e manteve o poder secular do Estado em sua perseguição contra os crentes. A religião e a política pagãs cooperaram nas batalhas contra os cren­tes. Os sacerdotes dos templos pagãos fizeram o máximo para imprimir a mentira de Satanás na mente do povo: César é Senhor! Recorreram até mesmo a proezas e pseudomilagres para enganar o povo. Ordenaram aos habitantes dos diversos distritos que erigissem estátuas em honra ao imperador. Lembre-se de Pérgamo.[185] Qualquer que se recusasse a prestar culto ao impera­dor frente à sua estátua, ou a declarar: "o imperador é senhor", era, imediatamente, morto.[186] Será que o apóstolo, realmente, pretende nos dizer que, em seus dias, os sacerdotes pagãos, a fim de estabelecer mais firmemente na mente das pessoas a religião do Estado ou o culto ao imperador, teriam recorrido a proezas tais como fazer surgir fogo sem causa aparente e, por meio de ventriloquia, fazer parecer que a voz do imperador vinha da está­tua?[187] Ou esses detalhes apenas pertencem à figura e atribuem-lhe uma interpretação simbólica? De qualquer modo, o significado principal parece ser que, durante toda esta dispensação - e num crescente à medida que a segunda vinda de Cristo se aproxi­ma - falsos profetas tentam enganar as massas por meio de sinais e maravilhas (Mt 24.24), e fortalecer a mão do governo quando ele ataca a Igreja. Observe, entretanto, o verso 15: "E lhe foi dado..." Além da esfera da permissão de Deus, Satanás nada pode fazer!

A seguir, o falso profeta marca a todos - pequenos e grandes, ricos e pobres, livres e escravos - com a marca da primeira besta. Esse profeta, aqui, se parece, exteriormente, com o Cordeiro. Não foram, os seguidores do Cordeiro, selados na fronte?[188] De igual modo, os seguidores da besta devem ser marcados em sua fronte ou mão direita. Contudo, o que significa a "marca da bes­ta"? Diversas respostas divertidas têm sido dadas.[189] Essas teorias falham em interpretar essa marca como um sinal único, indivi­dual e externo, que aparece na fronte ou na mão do iníquo em um momento particular da História; nessa hora e só nessa hora. A besta, entretanto, persegue sempre a Igreja e usa toda forma de poder secular para tentar destruir os crentes. Onde e quando a besta aparece, poderá se encontrar a marca da besta. Ambas andam juntas e não podem ser separadas.

Para se entender a expressão "marca da besta", devemos nos lembrar que não apenas o gado, mas também os escravos, eram marcados com um sinal de propriedade. A marca significava que o escravo pertencia ao seu dono. Logo, a expressão "receber a marca de alguém" começou a ser usada para indicar que alguém servia ou cultuava a alguém. Provemos esse ponto. Em Apocalipse 14.9, lemos: Se alguém adora a besta e a sua ima­gem, e recebe a sua marca na fronte ou sobre a mão". Aqui, "receber a marca da besta" parece significar "pertencer à besta é adorá-la". Igualmente, em Apocalipse 14.11: "os adoradores da besta e da sua imagem, e quem quer que receba a marca do seu nome" (cf também Ap 20.4). Assim, "receber a marca da besta" parece significar "pertencer à besta e adorá-la". A "marca da bes­ta" é a oposição a Deus, a rejeição a Cristo, o espírito do anticristo de perseguição da Igreja, onde e quando ela se manifesta. Essa marca está impressa na fronte e na mão direita (cf Dt 6.8). A fronte simboliza a mente, a vida em termos de pensamento, da filosofia da pessoa. A mão direita refere-se às obras da pessoa, a ação, o comércio, a indústria, etc. Portanto, receber a marca da besta na fronte e na mão direita, significa que a pessoa pertence à companhia dos que perseguem a Igreja, e nisso - quer eminente­mente no que ela pensa, diz, escreve ou, mais enfaticamente, no que ela faz - o espírito anticristão se torna evidente.

Essa interpretação se harmoniza perfeitamente com nossa explicação com respeito ao selo que o crente recebe em sua fron­te. O selo indica que ela pertence a Cristo, adora-o, respira seu Espírito e pensa seus pensamentos. Igualmente, a marca da besta simboliza que o não-crente, que persiste em iniquidades, pertence à besta e, assim, a Satanás, a quem adora. Observe, entretanto, que há uma diferença. O crente recebe um selo, não apenas uma marca.[190] Através da dispensação tem-se demonstrado ver­dadeiro (lembre-se de Tiatira)[191] que aqueles que não recebem a marca da besta e que não adoram o seu nome sofrem restrições em seus negócios. São impedidos e oprimidos. Não lhes é permi­tido comprar ou vender enquanto permanecem leais aos seus prin­cípios. A medida que nos aproximamos do fim, essa oposição au­mentará. Não obstante, que o crente não se desespere. Que ele se lembre de que o número da besta é número de homem. Ora, o homem foi criado no sexto dia. O número seis, sobretudo, não é o número sete e jamais chega a sete. Falha sempre em atingir a perfeição, isto é, nunca se toma sete. Seis significa não atingir a marca, significa falha. Sete significa perfeição ou vitória. Rego­zije-se, ó Igreja de Deus! A vitória está do seu lado. O número da besta é 666, isto é, falha sobre falha sobre falha![192] É número de homem, pois a besta se gloria no homem; e tem de falhar!

5. O triunfo da Igreja de Deus (14.1-16)

Esse capítulo se divide em três partes. A cláusula "Olhei", nos versos 1, 6 e 14, indica o começo dos três parágrafos.

a. A bênção dos redimidos (versos 1-5). O primeiro dos parágrafos mostra-nos o Cordeiro postado sobre o monte Sião. Este é o Sião "que não se abala, firme para sempre"(Sl 125.1). É o céu (Hb 12.22), pois lemos: "Ouvi uma voz do céu". Junto com o Cordeiro, o apóstolo vê 144.000 com o seu nome e o nome do seu Pai escritos em sua fronte. Essa é a multidão selada, mencionada no capítulo 7. Ali, esses santos ainda vivem na terra cercados por inimigos. Aqui eles gozam da bênção do céu depois do julgamento final. Embora o dragão tenha tentado ao máximo tomá-los infiéis ao seu Senhor, e mesmo que ele tenha empregado duas bestas para assisti-lo, não faltará nenhum desses 144.000 "quando se fizer chamada".

O apóstolo ouve um som vindo do céu: os 144.000 cantam o novo cântico. É como o som de muitas águas e como a voz de grande trovão, constante, majestoso, sublime. Imagine a poderosa catarata do Niágara, com seu incessante som em crescendo, alcançando um tonitruante estrondo quando as águas atingem as profundezas. Tal será o soar do novo cântico! O que quer que seja insignificante e mesquinho ficará fora dele. Mesmo que tenha de ser majestoso, sublime, constante, será, ao mesmo tempo, o cântico mais terno, doce e suave jamais ouvido, como o som de "harpistas quando tangem suas harpas". O majestoso e o sensí­vel, o sublime e o terno serão belissimamente combinados nesse novo cântico. Será um novo cântico, pois grava uma nova expe­riência: os 144.000 foram comprados da terra. Cada um dos remidos canta esse cântico diante do trono - sobre o qual se assentam Deus e o Cordeiro - e diante dos querubins, e diante de toda Igreja em glória. Como esse cântico grava a experiência de ter sido comprado da terra pelo precioso sangue do Cordeiro, segue-se que somente aqueles que têm essa experiência podem aprender a cantá-lo. Esses 144.000 são castos, isto é, não se macularam. Não se tornaram infiéis a Cristo. Eles o seguem por onde quer que vá (cf. 2 Co 11.2). "São os que foram redimidos dentre os homens, primícias para Deus e para o Cordeiro". Cristo morreu por eles. Um dos resultados de sua morte foi a obra purifi­cadora do Espírito Santo em seu coração por meio da qual foram separados de uma vida de pecado e de mentiras (cf. 1 Co 6.20).

Observe, especialmente, que esses 144.000 são primícias para Deus e para o Cordeiro no sentido de que foram comprados dentre os homens. Noutras palavras, houve uma separação; as primícias eram dedicadas ao Senhor. Da mesma forma eles fo­ram colocados à parte dos homens em geral (cf. Tg 1.18). O mundo da humanidade, que está caminhando para o juízo final, é freqüentemente comparado ao fruto que está amadurecendo para a colheita (Mt 9.37; 13.30; Lc 10.2; Jo 4.25). Encontramos esse símbolo no capítulo em questão (Ap 14.14ss.). Aqui, tam­bém, as primícias são para o Senhor (versos 14-16); o resto é para Satanás (versos 17-20). O símbolo se baseia na lei do Antigo

Testamento com respeito às primícias. Todas as primícias eram oferecidas ao Senhor, após o que os israelitas tinham liberdade de dispor do resto (Êx 23.19; Nm 18.12). Da mesma maneira, temos aqui um contraste entre as primícias e os homens em ge­ral. Todos os redimidos, o número completo dos eleitos, estão incluídos nas primícias. Qualquer que não pertença às primícias não é do Senhor, não é um eleito. Esses 144.000 não são primícias versus outros crentes. Não constituem um grupo especial no céu, um grupo de supersantos. São as primícias "compradas dentre os homens". Isso fica evidente, também, pelo fato de que esses 144.000 têm em sua fronte escrito o nome do Cordeiro e o nome do seu Pai. Assim, eles são o oposto de "os pequenos e os gran­des, os ricos e os pobres, os livres e os escravos" que recebem a marca da besta em sua fronte ou sobre a mão direita (13.16). Todos os crentes, sem exceção, são selados com os nomes de Deus e do Cordeiro. Semelhantemente, todos os réprobos, aque­les que se endureceram em seu pecado e em sua descrença, são marcados ou registrados. Então, de novo, os redimidos - não apenas um número seleto de supersantos - cantam um novo cântico em glória. Nenhum dos demais pode aprender a cantá-lo. O capítulo 7.1-8 descreve a Igreja militante aqui na terra. O capí­tulo 7.9-17 retrata a Igreja triunfante no céu. Aqui, no capítulo 14, a mesma Igreja triunfante é descrita da perspectiva de sua bem-aventurança e santidade celestes.[193] Esses 144.000 não acei­taram a mentira de Satanás. Conseqüentemente, em Cristo, eles são imaculados (cf. Êx 12.5; Lv 1.3; 9.2; Mt 5.48).

b. Advertências à humanidade (versos 6-13). Assim como, em Apocalipse 11.12, os crentes são descritos como subindo "ao céu na nuvem" enquanto que o verso seguinte nos traz de volta às condições terrenas anteriores ao dia do juízo, também aqui, no capítulo 14, após a bem-aventurança do redimido ter sido retratada, nós retomamos aos eventos que ocorrerão logo antes da segunda vinda. Os três anjos dos versos 6, 8 e 9 devem ser vistos juntos. Eles têm um único propósito, isto é, advertir a hu­manidade acerca do juízo vindouro para que ela possa voltar-se para Deus em verdadeira fé.

O primeiro anjo é enviado "aos que se assentam sobre a terra". Isso diz respeito à humanidade em geral às vésperas do juízo: os homens se assentam sobre a terra - eles são complacen­tes, indiferentes, despreocupados, desatentos e descuidados. Ima­gine um artista que tenha achado um ponto conveniente numa rocha que se debruça sobre o mar de onde pode pintar toda a beleza da vila próxima e da vizinhança. Ele está completamente alheio ao fato de que a maré cheia está prestes a tomar a base da pedra. Está tão absorvido em sua pintura que não presta atenção às vergastadas das ondas contra a rocha. Ele não escuta os gritos de aviso. Apenas fica ali, assentado, absorto em sua pintura. Então, as ondas, finalmente, o submergem. Semelhantemente, logo antes do juízo final, as pessoas em geral estarão a tal ponto extasiadas com os encantamentos do mundo que não se aperce­berão que o juízo serpenteia e se aproxima cada vez mais. Estão alheias ao perigo... até que seja tarde demais (cf. Lc 17.26s.). A essas pessoas indiferentes aparece um anjo, voando nos ares e ouvido por todos, dizendo: "Temei a Deus e dai-lhe glória, pois é chegada a hora do seu juízo..." Ninguém que continue em sua incredulidade escapará, pois Deus é o Todo-poderoso que "fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas". Para o povo de Deus, contudo, sua advertência da proximidade do dia do juízo é "o evangelho eterno" pois significa seu livramento (Hc 3.13ss.; Mq 4.1ss.). Além disso, todas as promessas de Deus terão seu bendito cumprimento para toda a eternidade.

Um segundo anjo segue-se, dizendo: "Caiu, caiu a grande Babilônia que tem dado a beber a todas as nações do vinho da fúria de sua prostituição".

Babilônia é o mundo como centro de sedução. Sua queda futura é descrita aqui como seja houvesse ocorrido, tão certo é oevento. Assim, que o iníquo se converta de sua prostituição, de sua apostasia e da adoração à besta. Observe que o dragão tem aliados: a besta que sobe do mar, a besta que sobe da terra e a Babilônia.

Segue-se um terceiro anjo. Ele anuncia em linguagem solene (versos 9 e 10) que todos os que estão ligados a este mundo perecerão com ele. Se alguém escolhe servir a Satanás, deve aguar­dar as conseqüências. Não se pode pecar sem conseqüências. A ira de Deus visitará aqueles que adoram a besta. Aqui na terra a sua ira se mistura à sua graça. O Senhor faz com que o Sol surja para o bom e para o mau, e faz cair a chuva sobre justos e injus­tos (Mt 5.45). Mas no inferno a ira será sem mistura. Haverá tormento com fogo e enxofre. Será tão justa a sua punição que os anjos e o Cordeiro concordarão com ela. E esse juízo jamais acaba, conforme a vívida linguagem do verso 11. O fato de que essa punição eterna aguarda aqueles que perseguem a Igreja e odeiam o Senhor deveria encorajar os crentes a permanecerem fortes sob aflição e sob provação (verso 12). Mesmo que esses crentes morram por causa da guarda dos mandamentos de Deus e da fé em Cristo, está assegurada a sua bem-aventurança.

c. A colheita e o fim (versos 13-16). "Então ouvi uma voz do céu, dizendo: Escreve: Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem das suas fadigas, pois as suas obras os acompanham". A bem-aventurança do redimido foi descrita. (Ver os capítulos 2; 3; 7; 14.1-5.) Os que morrem no Senhor de agora em diante vêem a face daquele que morreu por eles e que vive para sempre para interceder por eles. Vêem-no agora como o Cordeiro que foi morto. Vêem-no na glória de sua natureza humana, a qual ele levou consigo para o céu. Vêem-no como aquele que venceu o pecado, a morte e Satanás. Repousam de suas fadigas. Suas obras, entretanto, os acompanham. Isto é verdadeiro, não só no sentido de que suas obras são o resultado de seu caráter, que quando completamente santificado, vai com eles para o céu, mas também no sentido de que essas obras serão recompensa­das com o galardão da graça e da glória.

Assim, chegamos outra vez ao juízo final. Ele é descrito[194]sob o símbolo de uma dupla colheita. O apóstolo vê uma nuvem branca - esse branco referindo-se à santidade e a nuvem referin­do-se ao juízo (ver 1.7). Sobre a nuvem se assenta "um seme­lhante a filho de homem", Jesus (cf. Dn 7.13; e ver nossa expli­cação de Ap 1.13). Em sua cabeça não há uma coroa de espi­nhos, mas uma coroa ou louros de vitória, a estefânia dourada.[195]Em sua mão direita há uma foice afiada. Ele está pronto para a ceifa. A ceifa é ele mesmo, pois os homens simbolizados por ela são as primícias. Visto que o tempo do juízo final chegou, um anjo sai do santuário, o lugar da santidade de Deus. Ele traz a mensagem de Deus ao Mediador, Cristo. Ele diz, gritando em alta voz: "Toma a tua foice e ceifa, pois chegou a hora de ceifar, visto que a seara da terra já secou". Mateus 3.12 é comentário suficiente: "...recolherá o seu trigo no celeiro..." Então a foice foi lançada à terra, e a terra foi ceifada, e recolhidos a ele os eleitos.

6. O julgamento do ímpio (14.17-20)

O juízo é levado a cabo por dois anjos. Um anjo vem do santuário, isto é, após receber ordens do Deus santo. Em sua mão há uma foice afiada. O outro anjo vem do altar (ver 6.9, 10; 8.3-5). Esse é o altar relacionado às orações incensadas dos santos que sobem ao trono. O julgamento do iníquo é a resposta final de Deus a essas orações. O segundo anjo, então, grita para o primeiro: "Toma a tua foice afiada, e ajunta os cachos da videira da terra, porquanto as suas uvas já estão amadurecidas" (cf. Is63.1-6). A vinha da terra simboliza a totalidade da multidão dos homens maus; suas uvas são as pessoas não-crentes. Tal como as uvas são pisadas, prensadas, espremidas, assim os iníquos serão destruídos e punidos para sempre.

As uvas são lançadas no grande lagar da ira de Deus, e es­premidas. No quadro que João vê, surge um lago de sangue. Ele é tão profundo que os cavalos podem nadar nele. Ele se espalha em todas as direções numa extensão de 1.600 estádios. Lembre-se de que o número 4 é o número do universo e da terra. Esse é o julgamento do iníquo. Dez é o número da plenitude.[196] Assim, 1.600, que é o produto de quatro vezes quatro, vezes dez vezes dez, parece indicar o completo julgamento do iníquo. E o lagar da ira de Deus foi pisado fora da Cidade Santa!

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 15,16 As Sete Taças

Aca evidente na História do mundo uma ordem de eventos definitiva e recorrente.

Por meio da Palavra aplicada ao coração pelo Espírito Santo, são estabelecidas igrejas. Isso acontece repetidas vezes. Elas são candeeiros - portadoras de luz - no meio de um mundo que jaz em trevas. São abençoadas com a constante presença espiritual de Cristo (capítulos 1-3).

Vezes sem conta o povo de Deus é perseguido pelo mundo. E submetido a muitas provações e aflições (capítulos 4-7).

Vezes sem conta os juízos de Deus visitam o mundo perse­guidor. Tais juízos, vezes sem conta, não levam os homens ao arrependimento (capítulos 8-11).

Repetidas vezes o conflito entre a Igreja e o mundo revela uma guerra mais profunda e fundamental entre Cristo e Satanás, entre a "descendência da mulher" e a "descendência do dra­gão" (capítulos 12-14).

A questão que surge agora é: o que acontece na História sempre que as trombetas de julgamento, as pragas iniciais, não resultam em penitência e conversão? Será que Deus permite que tal impenitência, tal dureza de coração permaneça sem pu­nição até o dia do juízo final no último dia? Devemos entender que a ira de Deus tenha sido completamente suspensa até a segunda vinda, até a ceifa descrita no capítulo 14? Essa questão é respondida na presente visão. A resposta, em suma, é esta: sempre que na História o iníquo falha em arrepender-se e em responder às manifestações iniciais e parciais da ira de Deus nos seus julgamentos, segue-se uma conclusiva efusão de ira. É conclusiva, ainda que não seja completa até o dia do juízo. Es­sas pragas são as últimas. Não deixam oportunidade para arrepen­dimento. Quando o iníquo, freqüentemente advertido pelas trom­betas de juízo, continua a endurecer o coração, a morte final­mente o assalta pelas mãos de um Deus irado. Porém, antes que morra, ele tem de cruzar a fronteira, a linha entre a paciência e a ira de Deus (Êx 10.27; Mt 12.32; Rm 1.24; 1 Jo 5.16).

Ao longo da História do mundo a ira conclusiva de Deus se revela repetidas vezes: ora abate este, ora aquele. Ela é derrama­da sobre o impenitente (Ap 9.21; 16.9). Desse modo, uma liga­ção bem definida é estabelecida entre a visão das trombetas (ca­pítulos 8-11) e a das taças (capítulos 15, 16). As trombetas ad­vertem; as taças são derramadas. Ainda assim, a conexão entre os capítulos 8-11 e 15, 16 é bem próxima. Os impenitentes são os homens que recebem a marca da besta (13.16). Eles adoram o dragão e são amigos das duas bestas e da Babilônia prostituta.

Assim concebida, observamos que a visão das taças de ira corre paralela às demais visões e cobrem, igualmente, a totali­dade da dispensação. Provemos esse ponto.

Primeiro, a grande semelhança entre a visão das trombetas e a das taças - já demonstrada - parece implicar uma dupla referência ao mesmo período de tempo.[197] Se a visão das trombetas diz respeito a esta presente dispensação, assim também a visão das taças.

Segundo, a visão das taças de ira termina da mesma forma que as visões anteriores, isto é, com uma cena de juízo (Ap 16.15-21). Conclui-se, portanto, que as primeiras cinco taças referem-se a uma série de acontecimentos que precedem o juízo final.

Terceiro, observe o fato muito interessante de que essa visão, a das taças, é introduzida de modo quase idêntico à Introdução da quarta visão (cf. Ap 15.1 com Ap 12.1). Apocalipse 12, claramente, nos leva de volta ao momento do nascimento e da ascensão de Cristo. Não é razoável presumir que Apocalipse 15, 16 faça o mesmo e que, da mesma forma, descreva o período inteiro entre a primeira e a segunda vinda?

Quarto, observe que as taças são derramadas sobre os ho­mens que têm a marca da besta. Essa caracterização é bem geral, como já vimos, e se aplica a todos que adoram o dragão ao longo da História do mundo, especialmente durante esta dispensação.

Finalmente, nossa atenção é chamada para o fato de que lemos nessa quinta visão uma descrição exatamente das mes­mas forças que vimos na quarta visão. O dragão, a besta que sobe do mar e a besta que sobe da terra, na visão das trombetas, correspondem exatamente ao dragão, à besta e ao falso profeta na visão das taças (16.13). Conseqüentemente, as duas visões, evidentemente, cobrem o mesmo período, a totalidade da épo­ca entre a primeira e a segunda vinda de Cristo.

No entanto, esse espírito de independência se revela mais e mais claramente à medida que nos aproximamos do dia final. A visão das taças, ainda que cobrindo a totalidade desta presen­te dispensação, é aplicável, especialmente, ao dia do juízo e às condições que imediatamente o precedem.

João vê outro sinal no céu, um grande e maravilhoso sinal. Eleja viu o sinal da mulher radiante e seu filho (12.1, 2); tam­bém, o sinal do grande dragão vermelho que se opõe a eles (12.3). Agora ele vê outro sinal que completa o trio - os sete flagelos por meio dos quais Deus golpeia os que adoram o dragão. Sete anjos derramam sete flagelos pelos quais a ira ardente de Deus é conduzida ao seu alvo. O alvo é o juízo final. Esses sete flagelos - o número sete simboliza perfeição e plenitude divinas - alcan­çam seu objetivo. Uma vez que Deus retire o seu Espírito da proximidade do iníquo, para que eles se endureçam, nada mais há que impeça sua ruína no dia do juízo. Assim, pelos sete flagelos que cobrem a totalidade do período desta dispensação, a ira de Deus é levada a seu telos e objetivo.

/. O mar de vidro misturado com fogo (15.1-4)

O apóstolo vai nos falar sobre os sete anjos com suas taças de ira. Antes, porém, ele nos mostra a Igreja triunfante após o dia final. O que dirá o exército dos redimidos depois que as taças de ira tenham sido esvaziadas? João vê um mar. Na praia está uma multidão vitoriosa. Eles tocam suas harpas e cantam o hino de Moisés e o cântico do Cordeiro. Mui claramente, essa visão está baseada na História da submersão das hostes de Faraó no Mar Vermelho. Assim, um povo vitorioso está postado à bei­ra-mar e canta o hino de livramento e de vitória:

"Cantarei ao Senhor, porque triunfou gloriosamente, lan­çou no mar o cavalo e o seu cavaleiro".

A vitória sobre os egípcios foi um vislumbre da vitória de todos os redimidos de Deus sobre a besta, sua imagem e seu núme­ro. Por isso, o hino que a Igreja triunfante está cantando é chamado de o canto de Moisés e do Cordeiro. Nos dois casos é o Cordeiro quem obtém a vitória. Moisés estava simplesmente fazendo a von­tade de Deus e, exatamente, por isso é chamado de servo de Deus.

Observe, entretanto, que o mar que João vê é de vidro mis­turado com fogo: ele simboliza a justiça transparente de Deus revelada no julgamento sobre o iníquo (cf 15.4b: "pois os seus atos de justiça se fizeram manifestos").

Então, tal como Israel atribuiu sua vitória a Deus, assim esse exército vitorioso que João vê proclama em alta voz que Deus é aquele que garante o triunfo ao seu povo. Até suas harpas perten­cem a Deus; ele as deu aos vitoriosos. Conseqüentemente, eles louvam as obras de juízo de Deus, seus caminhos - os princípios subjacentes às obras - e seu nome ou revelação. Declaram, sobretudo, que, ao final, todo o universo reconhecerá o caráter justo das sentenças de Deus. Não foi o iníquo advertido por meio das trombetas? Não é, portanto, falta deles quando, em vez de se arrependerem, endurecem a si mesmos? Então é vista a justiça das últimas sentenças de Deus, suas taças de ira. Depois do juízo final a Igreja triunfante verá isso claramente e glorificará a Deus.

2. A abertura do santuário (15.5-8)

Conquanto os flagelos finais de Deus sejam justos em todos os aspectos - de fato, tão transparentemente justos que a Igreja triunfante louvará a Deus pela justa punição que ele infligiu ao impenitente -, o apóstolo agora deixa a multidão triunfante do futuro e retorna à presente dispensação. O que ele vê? O santuário do tabernáculo do testemunho é aberto. Esse é o santuário que contém a arca da aliança, e essa é a arca que contém o "testemu­nho" (Ex 25. 16, 21). Ele é, então, aberto para que entendamos que a ira a ser revelada é a ira de Deus. Fora do santuário aberto os sete anjos prosseguem. Eles estão vestidos de linho puro e resplandecente, com cintas de ouro no peito. Um dos quatro querubins coloca uma taça nas mãos de cada um dos sete anjos. São taças de ouro, pois eles a usam no serviço do Senhor. Estão cheias para mostrar o caráter feroz e insaciável da ira de Deus. E uma ira eterna, pois procede do Deus eterno. O santuário, então, enche-se de fumaça: um símbolo da operação da plena e contínua cólera de Deus (Is 6.4; SI 18.8). Ninguém pode entrar no san­tuário até que os sete flagelos dos sete anjos terminem, isto é, não há mais possibilidade de intercessão. Deus, em sua ira, bloqueou suas ternas misericórdias (SI 77.9).

3. As sete taças de ira (16.1-21)

João, então, ouve a voz do Senhor Poderoso. Uma voz alta, pois o Senhor está repleto de ira por causa da impenitência dos seguidores de Satanás. A voz disse: "Ide, e derramai pela terra as sete taças da cólera de Deus". No estudo dessas taças, observa-se uma grande semelhança com algumas das pragas do Egito. Tais pragas, registradas em Êxodo 7-11, dão um vislumbre dasmanifestações da ira de Deus sobre o iníquo (cf. Dt 28.20). Ao longo da História, especialmente durante a totalidade desta nova dispensação, Deus usa todos os segmentos do universo para punir os iníquos e impenitentes perseguidores do seu povo. Qualquer que se recuse a ser advertido pelas trombetas do juízo (Ap 8.11) é "destruído" pelas taças de ira. Para um, certa calamidade pode ser uma trombeta de juízo, enquanto, para outro, esse mesmo evento pode ser uma taça de ira. Dessa forma, a enfermidade que prostrou o rei Herodes Agripa I em tormentos serviu como advertência para outros. Os que permanecem impenitentes são amaldiçoados tanto na cidade quanto no campo (Dt 28.16).

Por vezes o Senhor usa de úlceras incuráveis ou outras doen­ças para lançar o iníquo em grande sofrimento. Estas procedem áaprimeira taça (16.2; cf. Êx 9.10; Dt 28.27; At 12.23). Lembre-se de Herodes, e pense que por toda esta dispensação o nosso Senhor está, constantemente, fazendo a mesma coisa. Para os crentes em Cristo as aflições da carne não podem ser jamais consideradas taças de ira (cf Rm 8.28). Por isso lemos que os flagelos afligem apenas aqueles que têm a marca da besta (cf Ap 13.15-17).

Algumas vezes o mar é usado como instrumento de destrui­ção. Esse é o propósito da segunda taça (16.3; cf. Êx 7.17-21; 15. 1; SI 48.7; 78.53). O mar, como João o vê na visão, torna-se sangue como de um homem morto que, coagulado, exala fétido odor. Aqui, de novo, devemos nos lembrar de que, embora o símbolo esteja baseado na história do Antigo Testamento, o mar é, constantemen­te, utilizado para o mesmo propósito. Tal como desastres maríti­mos constituem advertências para o iníquo, assim, também, por meio desses desastres, os impenitentes são acometidos de dores cruéis. Isso acontece vez mais vez ao longo da História.

A terceira taça (16.4-7) traz calamidades sobre os rios e fontes, tornando suas águas em sangue (cf. Êx 7.24; 1 Rs 17.1; 18.5, 40). O anjo das águas proclama a justiça do Deus que pune o impenitente dessa maneira. Ele é justo em sua retribui­ção. Sob o altar, a alma dos mortos clamaram por vingança (cf Ap 6.9; 8.3-5). Dessa forma, quando sua vingança é feita, é do altar que se responde: "Certamente, ó Senhor Deus, o Todo-poderoso, verdadeiros e justos são os teus juízos".

Freqüentemente, o Senhor faz o sol queimar a pele do iníquo, o que é uma calamidade produzida pela quarta taça (16.8, 9; cf. Dt 28.22: "o Senhor te ferirá .... com o calor ardente e a secura..."). As pessoas, porém, não serão santifi­cadas por meio desse sofrimento. Ao contrário, tornar-se-ão mais vis e blasfemarão contra o Deus do céu que tem poder sobre esses flagelos. Não se arrependem. Prontamente ve­mos que essa descrição é verdadeira com respeito a todos os impenitentes perseguidores de Cristo e da sua Igreja através desta dispensação inteira.

A ira de Deus é derramada, também, em certas épocas, so­bre o trono da besta. Isso é cumprido pela quinta taça (16.10, 11). O trono da besta é o centro do governo anticristão {cf Na 3.1; Hc 3.12-14). Quando a Assíria cai, ou a Babilônia, ou Roma, a totalidade do universo dos impenitentes parece colapsar (cf Ap 17.9ss.). Os iníquos perdem toda a coragem. Desespe­ram-se. Mordem a línguaa de tanta dor, não só por causa dos flagelos, mas, também, por causa das úlceras de que foram aco­metidos quando a primeira taça foi derramada.

Observe que, nas taças, é enfatizado o aspecto de sua finalida­de. Enquanto apenas um terço das criaturas vivas morrem no mar durante a segunda trombeta, a destruição trazida pela segunda taça é completa: "todo ser vivente" morre. Novamente, enquanto na terceira trombeta a terça parte das águas se tomou sangue, aqui todo o suprimento de água torna-se sangue, etc. É a ira final de Deus.

A sexta taça (16.12-16) produz o Armagedom. Ultima­mente tem havido uma torrente de sermões e palestras sobre o Armagedom,[198] mas, a fim de chegarmos à interpretação correta a respeito dessa batalha, iniciemos por rever brevemente a história do Antigo Testamento, na qual este símbolo está, provavelmente, baseado. Encontramo-lo em Juízes 4, 5. Israel se encontra, nova­mente, em sofrimento. Dessa vez, o rei Jabim, de Canaã, é o opressor. Os saqueadores vão pilhar os campos e devastar as searas dos israelitas. Tão numerosos são que os israelitas escondem-se com medo de aparecer nas mas (Jz 5.6). Não podem eles guerrear e expulsar os cananeus? Não, o rei Jabim e o general Sísera são fortes; eles têm nove mil carros de ferro. Israel não tem sequer um escudo ou uma espada (Jz 5.8). Será que esse povo perecerá?

Nas regiões montanhosas de Efraim vive Débora, que um dia diz a Baraque, o juiz: "DispÕe-te, porque este é o dia em que o Senhor entregou a Sísera nas tuas mãos; porventura o Senhor não saiu diante de ti?" A batalha é travada em Megido e os inimigos de Israel são dispersados. Foi o próprio Jeová quem os derrotou. "Desde os céus pelejaram as estrelas contra Sísera, desde a sua órbita o fizeram" (Jz 5.20).

Por isso, Armagedom é o símbolo de toda batalha na qual, quando a necessidade é grande e os crentes são oprimidos, o Senhor, de repente, revela seu poder a favor de seu povo sofre­dor, e derrota o inimigo. Quando os 185.000 homens de Senaqueribe foram mortos pelo anjo de Jeová, isso foi uma sombra do Armagedom final. Quando Deus permite a um punhado de macabeus obter vitória gloriosa sobre um inimigo que em muito o sobrepuja em número, isso é um tipo do Armagedom.

O verdadeiro, o grande, o Armagedom final coincide com o "pouco tempo" que resta a Satanás (ver Ap 11.7-11). Quando o mundo, sob o domínio de Satanás, do governo anticristão e da reli­gião anticristã - o dragão, a besta e o falso profeta - se junta contra a Igreja para a batalha final, e a necessidade é imensa; quando os filhos de Deus, oprimidos por todos os lados, clamam por socorro; então, num repente, dramaticamente, Cristo aparecerá para livrar seu povo. Essa tribulação final e essa aparição de Cristo entre nu­vens de glória para livrar seu povo, isso é o Armagedom. Por isso é que o Armagedom é a sexta taça. A sétima é o dia do juízo. Como já mencionamos, a sexta taça, assim como as precedentes, é evi­dente vez mais vez ao longo da História. No entanto, assim como as outras taças, esta alcança sua final e mais completa realização logo após e em relação com o último dia.

João vê que a sexta taça é derramada sobre o rio Eufrates. Esse rio representa a Assíria, Babilônia, o mundo iníquo. Quan­do o rio seca, é preparado o caminho para que todos os poderes anticristãos ataquem a Igreja. O apóstolo vê três espíritos imun­dos saídos da boca do dragão (Satanás) e da boca da besta (go­verno anticristão) e da boca do falso profeta (religião anticristã). Tais espíritos ou demônios são comparados a rãs para indicar seu caráter abominável, repugnante e asqueroso. Representam idéias satânicas; planos, projetos, métodos e empreendimentos infernais apresentados na esfera do pensamento e da ação. Assim, quando os reis da terra se ajuntam para lutar contra os crentes, tal batalha ou perseguição é inspirada pelo próprio inferno. Aqui pouco se diz sobre a batalha final. Devemos nos lembrar, porém, de que o mesmo conflito do Armagedom é descrito em Apocalipse 11.7ss (ver nossa explicação); e, especialmente, em Apocalipse 19.11ss.; 20.7ss.[199]

Então, nesse momento de tribulação e angústia, de opressão e de perseguição, Cristo, de repente, aparece (verso 15). Ele vem como

0 ladrão de noite, subitamente, inesperadamente (cf. Mt 24.29ss.;

1 Ts 5.4; 2 Ts 2.8ss.; 2 Pe 3.10). Portanto, o crente deve estar vigilante. Que ele mantenha as suas vestes de justiça imaculadas para que não se veja o seu pecado (Ap 3.18; 7.14).

Essa seção que trata das taças, como as precedentes, termina com uma descrição muito vívida do terror do juízo final simbo­lizado pela sétima taça (16.17-21). A queda final da Babilônia é um golpe esmagador sobre os que portam a marca da besta. Tudo o que os delicia, agora colapsa. E a ruína conclusiva. Essa taça é derramada no ar. Quando o flagelo é derramado no ar, perece a vida na terra. João ouve uma alta voz vinda do santuário - era a voz do próprio Deus - dizendo: "Feito está". A exposi­ção final e completa da ira de Deus, até então contida, ocorreu: o dia do juízo chegou. Nessa figura, o apóstolo vê clarões de relâmpagos e estrondos de trovões, e testemunha um terremo­to, o maior de todos os tempos. A grande cidade, Babilônia, é quebrada em três partes; despedaça-se. Então, o império do anticristo, visto como o centro da sedução, a totalidade do reino deste mundo, desintegra-se e é destruído. Suas cidades e nações estão em ruínas. Torna-se evidente, nesse dia do juízo, que, afinal, Deus não se esqueceu dos pecados da Babilônia. Sua cólera contida por tanto tempo agora explode. O mundo recebe a taça de vinho do furor de sua ira (cf Ap 14.10). Todas as ilhas fogem e os montes não são encontrados (ver nossa explicação de Ap 6.14). João, no Espírito, vê, agora, grande saraiva, cada pedra pesando mais de cinqüenta quilos, caindo sobre os homens endurecidos e impenitentes. O significado disso é que no juízo final a totalidade do império do mal é destruída. É sua ruína final. Sobretudo, essas pedras caem do céu; elas simbolizam o juízo de Deus, a final e completa efusão de sua ira. Mas, mesmo na pior situação, os homens ainda blasfemam contra Deus por causa da grandeza do flagelo e da dureza do seu coração!

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 17-19 A Queda dos Aliados do Dragão

Foram apresentados cinco inimigos de Cristo: o dragão, a besta do mar, a besta da terra ou falso profeta, a prostituta Babilônia e os homens que trazem a marca da besta. Já vimos o que aconte­ce aos homens que recebem essa marca (capítulos 15, 16). Na presente visão, o apóstolo mostra-nos por meio de figuras simbó­licas a queda de Babilônia, da besta do mar e do falso profeta. A derrota do dragão será descrita em Apocalipse 20. De maneira geral, esta seção pode ser subdividida do seguinte modo: O ca­pítulo 17 descreve a natureza e conta a história da grande pros­tituta, Babilônia. O capítulo 18 mostra-nos o caráter inevitável, completo e irrevogável da queda da Babilônia. O capítulo 19 apre­senta-nos o céu em regozijo por causa das bodas do Cordeiro. Apresenta-nos, também, o autor da vitória, o cavaleiro do cavalo branco, que triunfa sobre a Babilônia, sobre a besta e sobre o falso profeta, e executa o juízo final sobre todos os seus inimigos.

i. 0 Julgamento da Babilônia

1. A mulher e a besta (17.1-6)

Um dos sete anjos que têm as sete taças aparece a João. O fato de que um desses anjos aparece, indica que a visão é de desgraça para o iníquo e de felicidade para a Igreja (cf Ap 21.9). O anjo fala com João de uma maneira amigável, dizendo: "Vem, mostrar-te-ei o julgamento da grande meretriz que se acha sen­tada sobre muitas águas". Assim, no Espírito (cf. Ap 21.10), João é levado ao deserto onde vê a besta escarlate.[200] É a besta do mar que simboliza o mundo como centro da perseguição. O espírito de perseguição se expressa por meio dos governos e povos deste mundo, especialmente nos grandes impérios mun­diais que se seguem na História. João vê a besta no deserto, pois a mulher radiante de Apocalipse 12, representando a Igreja, fugiu para lá.

A besta não está só. Uma mulher está sentada sobre ela. Ela não pode ser confundida com a mulher radiante de Apocalipse 12. As duas são inimigas. A mulher de Apocalipse 17 - a que está sentada sobre a besta - é a grande prostituta. Está muito bem trajada e excessivamente adornada. Está cober­ta de ouro. Está vestida de púrpura e escarlate, pois se posta como rainha. Adorna-se de pedras preciosas e de pérolas. Os reis da terra são seus amantes. Os povos do mundo se embria­gam com o vinho de sua prostituição. Tem nas mãos uma taça cheia de abominações: as imundícias de sua prostituição. Na sua fronte, possivelmente numa faixa atada à sua fronte, há um nome escrito: "Babilônia, a grande, a mãe das meretrizes e das abominações da terra". Não só seus amantes, mas ela mesma está embriagada com o sangue dos mártires de Jesus. João está muito admirado. Não consegue entender a figura e, assim, o anjo explica-lhe seu significado.

A meretriz, evidentemente, é Babilônia[201] (17.5, 18; 19.2, 3). A questão é: o que Babilônia representa?[202] Para chegarmos a uma conclusão correta quanto ao significado simbólico dessa figura, precisamos manter em mente, antes de tudo, que essa Babilônia é chamada de a grande meretriz.[203] Noutras palavras, o símbolo mostra aquela que ilude, tenta, seduz e conduz o povo para longe de Deus.

Segundo, devemos nos lembrar que essa meretriz é uma cidade mundana, isto é, Babilônia. Isso nos fala da cidade louca por prazer, arrogante e presunçosa que foi a Babilônia da anti­guidade.[204] A descrição dessa Babilônia simbólica de Apocalipse 17-19 traz também à nossa mente a cidade de Tiro, esse centro pagão de iniqüidade e sedução. Observe a marcante semelhança entre Apocalipse 17-19 e Ezequiel 27, 28. Sobretudo, quando estudamos a lista de bens encontrados em Babilônia (18.11ss.), torna-se evidente que o símbolo faz referência a uma grande metrópole comercial e industrial. A Babilônia, portanto, repre­senta o mundo como centro de indústria, comércio, arte, cultura, etc, por meio do que busca atrair e seduzir os crentes, isto é, afastá-los de Deus. Ela simboliza a concentração da luxúria, do vício, das atrações deste mundo. É o mundo visto como a perso­nificação da "concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida" (1 Jo 2.16).

Terceiro, a Babilônia é também vista como passada, pre­sente e futura. Sua forma muda, mas permanece sua essência. Lembremo-nos de que a meretriz, Babilônia, é intimamente associada à besta, tão intimamente associada que é dito dela que está sentada sobre a besta (17.3). A besta é todo movimento anticristão de perseguição através da História, incorporado em sucessivos impérios mundiais. A besta, evidentemente, é passa­da, presente e futura. (Ler Ap 17.8-10.) Dessa forma, concluí­mos que a meretriz representa, também, o mundo como centro de sedução anticristã em qualquer momento da História. Fica claro em Ap 17.9, que a meretriz, Babilônia, estava presente numa de suas formas, nos dias de João: "As sete cabeças são sete montes, nos quais a mulher está sentada". Aqui, a referên­cia é feita, claramente, à cidade de Roma. A cidade imperial atraía com seus prazeres os reis das nações, os líderes de cada domínio da vida, da arte, da indústria, do comércio, etc. (Ver Ap 17.2.) O apóstolo vê a Roma dos seus dias, cheia de vaidade, luxúria e prazer. Tratava-se de uma cidade enlouquecida pelo prazer. Até mesmo os santos eram despedaçados em seus circos para divertimento e satisfação do povo. A meretriz esta­va bêbada com o sangue dos santos (17.6). Quando, em Apocalipse 18.4, é feita a admoestação: "Retirai-vos dela, povo meu, para não serdes cúmplices em seus pecados", essa ordem foi dada não somente para as pessoas que vivem nas vésperas do fim da História do mundo, mas também aos crentes dos dias do próprio apóstolo João; na verdade, para os crentes de todas as épocas.

A Babilônia, então, é o centro mundial de sedução a qual­quer momento da História, especialmente durante esta presente dispensação. A meretriz, Babilônia, sempre se opõe à noiva, a nova Jerusalém (Ap 21.9ss.). Ambos os símbolos são apresen­tados por "um dos anjos que têm as sete taças", mas eles são opostos. A queda da Babilônia refere-se não apenas à destrui­ção final do mundo, visto como centro de cultura anticristã e de sedução, na segunda vinda de Cristo, mas também à demolição da totalidade das precedentes concentrações de engano mun­dano. A queda da Babilônia ocorre ao longo da História, mas, especialmente, no grande dia do juízo final. A queda da última Babilônia - em sua forma final - coincide com a vinda do Senhor para juízo.

Conforme a figura usada, a meretriz tem nas mãos uma taça dourada. Uma taça dourada induz a pessoa a beber, pois ela espera que, em tão preciosa taça, esteja sendo servida a mais preciosa bebida. Essa taça, no entanto, contém abominações, as imundícias da prostituição dessa mulher. Tudo o que é usado pelo mundo para afastar os crentes de seu Deus está nessa taça: literatura pornográfica, esportes nos quais as pessoas se tornam totalmente absortas, luxúria, fama e poder mundanos, concu­piscências da carne, etc. Cada um faça a sua própria lista. Ela inclui tanto coisas que são más em si mesmas quanto coisas que se tornam más porque são vistas como fim em si mesmas e não como meios de bênçãos - por exemplo, a arte pela arte, etc. O anjo fala a João sobre o mistério da mulher e da besta que a carrega (versos 7, 18). Observe a íntima associação entre a besta (o império do mundo) e a mulher (sedução). Tal associação é verdadeira em dois sentidos: primeiro, as pessoas mundanas bebem o vinho da prostituição da mulher e regalam-se nos seus prazeres; segundo, o mundo como centro da perseguição e o mundo como o centro da luxúria, da cultura anticristã e dos prazeres sempre cooperam na oposição à Igreja. O profeta Balaão estava consciente disso, tanto que avisou a Balaque que utili­zasse a astúcia e a arte do engano para apanhar Israel em arma­dilha e para destruí-lo (Nm 31.16; Jd 11; Ap 2.14). Nos dias de João, Roma não somente perseguia a Igreja com a espada, mas também tentava enganar os crentes por meio das ilusões da grande cidade. O mesmo é verdadeiro hoje. Os governos anticristãos não destroem os templos; transformam alguns deles em locais de diversão mundana! Assim, ao longo da História a "besta" e a "mulher" estão sempre associadas. Sempre, até... que a besta se volte contra a mulher (17-19).

2. A História da besta (17.7-18)

No verso 8, o anjo começa a relatar a História da besta. Ela era, não é, e está para subir do abismo. Primeiro, a besta era, por exemplo, na forma de antiga Babilônia, o reino do poderoso Ninrode, na terra de Sinear: "...e tornemos célebre o nosso nome...". Ou na forma da Assíria com sua ostentadora capital em Nínive. Ou, ainda, do espírito da arrogância mundana e da opressão que se manifestou na nova Babilônia (lembre-se de Nabucodonosor e do cativeiro dos judeus); ou do reino Medo-Persa; e, definitivamente, do império Greco-Macedônio do qual veio o grande precursor do último anticristo, Antíoco Epifanes da Síria (175-164 a.C). "E não é". Todos esses impérios, nos quais a besta se incorporou, pereceram. A besta, na forma da antiga Babilônia, da Assíria, da nova Babilônia, dos impérios Medo-Persa ou Greco-Macedônio, já não existe. Ainda mais -e isso incita surpresa e admiração nos homens cujos nomes não foram escritos no livro da vida desde a fundação do mundo -, a besta parece ter a capacidade de reerguer sua cabeça após cada derrota! Os homens do mundo se maravilham quando vêem a besta que "era, e não é, e está para emergir". Eles não vêem que, sob qualquer forma e incorporação, a besta caminha para a perdição. Essa declaração, como uma comparação entre os versos 8 e 11 mostra, é verdadeira, especialmente, com respeito a ma­nifestação final do poder do anticristo logo antes da segunda vinda de cristo. O império do anticristo "caminha para a des­truição". Assim, repetidas vezes, a besta aparece numa nova incorporação. As formas mudam, mas a essência permanece através desta dispensação inteira e até mesmo pela totalidade da História do mundo, até o dia do juízo.

O anjo está prestes, agora, a interpretar o significado das sete cabeças e dos dez chifres da besta. O significado não é tão aparentemente claro. E preciso sabedoria para fazer essa inter­pretação (cf. 13.18). As sete cabeças têm um duplo significa­do simbólico. Elas mostram tanto a presente incorporação da besta quanto todas as suas incorporações ao longo da História. Primeiro, então, as sete cabeças simbolizam sete montes, os sete montes de Roma, vista como a capital do Império Romano.[205] É a grande cidade que governa os reis, os poderes da terra. Ela era, nos dias de João, o centro da perseguição anticristã. Era tam­bém o centro da sedução, da ilusão e do encantamento anticristãos; a mulher, a meretriz, se assenta sobre seus sete montes. Segundo, as sete cabeças também simbolizam sete reis, isto é, reinos.[206] Como já mencionamos, o livro de Daniel prova claramente que as sete cabeças não simbolizam sete indivíduos, reis ou imperadores, mas sete impérios mundiais anticristãos. Cinco caíram, a saber, a antiga Babilônia, a Assíria, a nova Babilônia, os impérios Medo-Persa e Greco-Macedônio. Um é, quer dizer, Roma. O sétimo ainda não veio, mas, quando vier, durará pouco tempo. A ênfase cai sobre a palavra "durar". E esta sétima cabeça um título coletivo para se referir a todos os governos anticristãos entre a queda de Roma e o império final do anticristo que oprimirá a Igreja nos dias precedentes à segun­da vinda de Cristo?[207] Na linguagem do Apocalipse, a duração desta época do evangelho é "pouco" tempo (cf. Ap 11.2,3; 12.6, 14; 13.5). A besta que "era e não é" é o oitavo e último domínio do anticristo, o mais terrível de todos, no final da História (cf 2 Ts 2.3ss.). Porventura, a cláusula "procede dos sete" indica que, em certo sentido, um dos antigos impérios anticristãos será res­tabelecido; se for assim, qual deles?[208] De qualquer modo, ele "caminha para a destruição" (ver Ap 19.20).

Os dez reis são realmente os poderosos desta terra em cada domínio: arte, educação, indústria, governo, etc, à medida que servem à autoridade central. Seu objetivo é a autoglorificação em oposição a Cristo. Para alcançar esse objetivo eles estão dispostos a dar poder e autoridade à besta. Eles reinam com a besta por apenas "uma hora". Cada governo do mundo tem seus satélites, e estes, de modo geral, duram, também, apenas "uma hora". Todos os "chifres-reis" têm um propósito, isto é, apoiar a besta no conflito com Cristo e sua Igreja. O seu propósito unâ­nime é declarado no verso 14. Esse verso, como já foi mencio­nado, declara o tema da totalidade do livro: "Pelejarão eles contra o Cordeiro, e o Cordeiro os vencerá, pois é o Senhor dos senhores e o Rei dos reis; vencerão também os chamados, eleitos e fiéis que se acham com ele".

Ao longo da História, principalmente através desta dispensação, o Cordeiro constantemente derrota e derrotará cada forma de domínio anticristão. Todo reino do anticristo perece. Isso será especialmente evidente quando o Cordeiro esmagar o poder do último grande anticristo ao término da História do mundo (cf Ap 11.11; 16.14ss.; 19.llss.; 2 Ts 2.8). Por um mo­mento pode parecer que as forças do anticristo tenham levado a melhor (Ap 11.7; 13.7). Mas quando o anticristo parecer com­pletamente vitorioso, sua ruína será eminente! Cristo sempre se revela como o Rei dos reis e Senhor dos senhores (Dt 10.17) e os crentes são vitoriosos com Cristo. Eles são chamados pela graça irresistível de Deus (1 Pe 2.9; Rm 8.30). Esse chamado "interior" prova o fato de que foram escolhidos para a salvação e para a vitória desde a eternidade (Ef 1.4). Sobretudo, sua pró­pria lealdade e fidelidade a Cristo fornecem evidências de que são, na verdade, filhos de Deus (cf. Ap 1.5; 2.10, etc; para en­tender 17.15 ver 13.1). Evidentemente, João viu um tipo de lago no deserto. Nesse lago ele viu a besta e sobre a besta, a mulher. As águas desse lago simbolizam as nações emergentes, povos, etc. deste mundo que, constantemente, se opõem à Igreja e a perseguem (cf. Jr 51.13).

Por um pouco tudo parece correr bem: o mundo em geral e, especialmente, os mais poderosos dele se comprometem com a grande meretriz. Eles conduzem a mulher: acolhem totalmen­te suas ilusões e enganos, sua cultura anticristã. Apegam-se às luxúrias do mundo. Agradam-se imensamente da "concupiscên­cia da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida". No final (versos 15,16), porém, esse mesmo povo que constitui o "mundo anticristao" se volta contra a meretriz. Pessoas do mundo, incluindo também os poderosos da terra - os dez chi­fres - acabarão odiando a meretriz; eles arrancarão suas vestes e a despojarão de seus ornamentos extravagantemente bonitos e caros; devorarão sua carne; e a farão arder num incêndio.

O significado é que virá um tempo quando as pessoas do mundo - que com seus governos anticristãos constituem "a besta" e que estão enfeitiçados com a "meretriz", isto é, a sedução deste mundo, seus prazeres e ilusões, sua cultura e luxúria -verão quão tolas elas têm sido. Mas, então, será muito tarde. Assim, por exemplo, Judas Iscariotes, que bebeu da taça dourada - Mamom foi seu ouro - e por um momento considerou as trinta peças tão encantadoras, finalmente experimentou uma revolta de sentimentos e lançou de volta o dinheiro ante os sacerdotes e anciãos, e, depois, enforcou-se (Mt 27.3ss.; At 1.18). Os prazeres do pecado sempre desapontam no final. Garotas tolas podem admirar o profeta velado; mas, uma vez que o véu é retirado, e elas vêem sua feição odiosa, enchem-se de desespero. Deus mesmo, finalmente, endurece o coração daqueles que se endure­ceram contra suas repetidas advertências (verso 17). Apocalipse 17.16, 17 é uma lição para o cotidiano. Revela o caminho das pessoas mundanas: primeiro, elas tornam-se apaixonadas em relação aos prazeres e tesouros do mundo e se tomam endurecidas em relação a Deus; depois, são endurecidas por ele; finalmente, quando já tarde demais, experimentam uma revolta de senti­mentos. São punidas pelo resultado de sua própria estultícia.[209]

Quando o mundo oferece-nos seus tesouros, devemos seguir o exemplo de Jesus (Mt 4.8ss.). Assegure-se de ler esta palavra e de guardá-la no coração:

3. A queda da Babilônia (18.1-24)

João vê, agora, um outro anjo descendo do céu. Ele tem grande autoridade e sua refulgência ilumina a terra. Em alta voz ele grita:

"Caiu, caiu a grande Babilônia,

(tf Is 21,9; Jr 50.2; 51.8)

e se tornou morada de demônios,

covil de toda espécie de espírito imundo

e esconderijo de todo gênero de ave imunda e detestável,

pois todas as nações têm bebido do vinho do furor da sua

prostituição." Com ela se prostituíram os reis da terra. Também os mercadores da terra se enriqueceram à custa de

sua luxúria."

Aqui, a queda da Babilônia é anunciada como se já hou­vesse ocorrido, tão certa é sua queda. Que isso sirva de adver­tência a todos! A desolação final da Babilônia é vividamente descrita quando se diz que mesmo os espíritos imundos e as aves imundas e detestáveis consideram-na uma prisão (cf. Is 13.20ss.; Jr 50.39,45; 51.37,42; Sf 2.14). A razão ou justifica­tiva para a queda da Babilônia é dada em Apocalipse 18.3: as nações, os reis e os mercadores permitiram-se apaixonar por seus prazeres e tesouros. Tais mercadores representam todos os que aplicam o coração aos cuidados do mundo.

Uma voz do céu se dirige aos crentes:

Retirai-vos dela, povo meu, para não serdes cúmplices em seus pecados, e para não participardes de seus flagelos; porque os seus pecados se acumularam até o céu, e Deus se lembrou dos atos iníquos que ela praticou.

A admoestação de retirar-se de Babilônia é dirigida ao povo de Deus de todas as épocas (cf. Is 48.20; 52. 11; Jr 50.8,41-44; Zc 2.7). Parece daí que Babilônia não é somente uma cidade do fim dos tempos. É o mundo, como centro de sedução, em qualquer época. Retirar-se de Babilônia significa não ter comunhão com seus pecados e não ser pego na armadilha das suas ilusões e tentações. Aqueles que aplicam seu coração ao mundo também receberão seus flagelos. Pode parecer que Deus se esqueceu dos pecados da Babilônia. No dia em que Babilônia cair ficará evidente que ele se lembrou deles.

Então a Babilônia receberá "em dobro" a paga por suas obras. Isso não significa que ela receberá duas vezes mais puni­ção do que merece; significa, sim, que ela receberá a quantia exata de punição pelo que fez. A punição é o "dobro", a contraparte do pecado. O tormento e o pranto (verso 7) são o equivalente exato de seu orgulho e arrogância. A balança pesa com exatidão. Em sua autoglorificação, presunção e jactância, ela disse em seu coração - o que é bem pior do que dizer a outros: "Estou sentada como rainha. Viúva não sou. Pranto, nunca hei de ver" (cf Is 14. 13, 14; 47.8; Jr 50.29). Portanto, morte, pranto e lamento e fome a arruinarão num só dia, porque o Senhor, a quem ela se opôs, é forte.

A próxima seção (versos 9-20) apresenta uma tríplice lamentação - da parte de reis, mercadores e navegantes - seguida de regozijo no céu.

Primeiro, os reis ou homens de poder, os homens de influên­cia na terra, proferem seu lamento. Eles se prostituíram com a meretriz, Babilônia, ou, em outras palavras, cederam às suas tentações e gozaram suas luxúrias de modo que, quando vêem a fumaça do grande incêndio da Babilônia, eles mantêm distân­cia por causa do medo, e dizem:

Ai! ai! tu, grande cidade,

Babilônia, tu, poderosa cidade!

Pois em uma só hora chegou o teu juízo.

Após, os mercadores - todos os que aplicaram seu coração aos bens e luxúrias do mundo - lamentam e choram porque sua mercadoria, de repente, tornou-se sem valor (cf. Lc 12.16-21). Tudo o que os deleita é, subitamente, destruído. Nada podem fazer para salvar o que possuem. Conservam-se "de longe". Babilônia, o mundo tresloucado pelo prazer, a sedutora, perece sem que haja ajuda.

Observe a lista de mercadorias que apeteciam a alma dos habitantes de Babilônia: ouro, prata, pedras preciosas e pérolas (cf. as vestes e ornamentos da grande meretriz, Ap 17.4). Ne­nhuma dessas coisas tem valor permanente. Todas perecem. "Porque a aparência (esquema, fascínio, aparência externa) deste mundo passa" (1 Co 7.31). Então, em íntima conexão com o que passou, diversos tipos de caros artigos de vestuário são mencionados: linho fino, púrpura, seda e escarlata. (De novo, cf Ap 17.4; também Lc 16.19.) Depois, diversos materiais usa­dos na feitura de artigos de luxo são listados: madeira odorífica, usada para queimar como incenso, vasilhas de marfim e outros utensílios feitos de madeira preciosa, bronze, ferro e mármore. Também são listados especiarias e unguentos: canela, bálsamo, incenso. A ênfase é sobre o luxo.

O melhor em termos de comida e bebida vem após: vinho, azeite, flor de farinha, trigo. Trata-se, aqui, do vinho e do óleo do rico iníquo, e da mais fina farinha. Mas tudo isso também é destinado a perecer. Animais de corte, como gado e ovelhas são, então, mencionados. Depois, os itens da conclusão da lista, cavalos e carros, escravos e até almas humanas. As pessoas iníquas comerciam com corpos e almas de escravos como se fossem meros artigos de consumo. Fizeram de tudo para en­riquecer. A figura do apóstolo é baseada totalmente nas con­dições predominantes ao seu redor ao tempo quando viu e escreveu as visões. Ainda assim, essencialmente, a figura da Babilônia que ele recebeu e reproduziu é verdadeira para todos os tempos.

Observe que cada segmento da existência tem sua con­tribuição na lista de mercadorias da Babilônia destinadas à destruição: o reino mineral (ouro, prata, etc), o reino vegetal (linho, seda, etc), o reino animal (gado, ovelha, marfim, etc), e mesmo o reino do homem (corpo e alma). O resultado é que, quando Babilônia perece, o caos econômico é completo; o mun­do do não-crente, no qual ele colocou sua esperança e construiu sua confiança, colapsa! Isso é verdadeiro com respeito à queda de cada Babilônia - quer a literal Babilônia, ou Nínive, ou Roma. É verdadeiro, especialmente, quanto ao fim do reino do anticristo ao final da História. Assim, a meretriz Babilônia vê fugir-lhe o apogeu da lascívia de sua vida; suas delícias e suntuosidades são destruídas de modo que ninguém pode achar nela qualquer atração. No final, a meretriz prova ser um grande e amargo desapontamento (ver Ap 17.16). Babilônia não tem mais es­perança; os mercadores se mantêm distantes dela e lamentam quando comparam sua presente situação com o seu antigo es­plendor de meretriz - seus linhos finíssimos, sua púrpura, sua escarlata, seu ouro, sua prata, suas pedras preciosas e suas péro­las e sua presente condição. Numa só hora sua vasta riqueza foi destruída!

O terceiro lamento vem da boca e do coração dos homens do mar. São mencionadas quatro classes: os capitães, os passa­geiros em viagens de negócios, os marinheiros e tantos quantos vivem do mar, por exemplo, exportadores e importadores, pescadores, catadores de pérolas, etc. Todos estes se mantêm distantes da fumaça do incêndio da Babilônia. Lembram-se de sua grandeza e esplendor antigos. Mal podem acreditar no que seus olhos vêem quando contemplam a ruína total e o colapso completo de todas as esperanças e desejos. Lançam pó sobre a cabeça como sinal de dor (Ez 27.30) e exclamam:

Ai! ai! da grande cidade, na qual se enriqueceram todos os que possuíam navios no mar, à custa da sua opulência, porque em uma só hora foi devastada.

Porque o iníquo baseou a totalidade de sua esperança nos luxos e prazeres desta vida, quando a "aparência" deste mundo passar o iníquo passará com ele. Todos eles desvanecerão.

Os santos, porém, os apóstolos e profetas de Deus são con­vocados a se regozijar em seu lar celeste, pois a queda da Babilônia é ajusta retribuição ao mundo por haver este perse­guido a Igreja.

O parágrafo final desse capítulo mostra a completa, irrevogável e irreparável natureza da queda de Babilônia. O sím­bolo usado é bem marcante (cf Jr 51.63,64). Um anjo aparece. Observe que é um anjo forte. O que ele está prestes a fazer exige força. Ele levanta uma grande pedra de moinho, isto é, de um moinho movido por um animal. O que o anjo faz com essa pe­dra? Lança-a sobre a terra? Não, ele a lança no mar para que desapareça completamente. Apenas deixa que ela caia? Não, ele a levanta e então a lança no mar para que seja submersa profundamente no leito do oceano. Assim será total e completa a queda da Babilônia. A grande pedra jamais será recuperada. Assim também este mundo iníquo, como centro de sedução, perecerá para sempre.

Observe o fato de que a expressão "não mais" (versos 21-23) ocorre seis vezes. Observe também o clímax na orga­nização das seis: "não mais" será achada a Babilônia. A cida­de se foi. Essa é uma declaração geral nem sequer próxima da vividez do que se segue. Depois lemos: "não mais" o som de harpistas e músicos, tocadores de flauta e de trompete. Todos os músicos desaparecerão (cf Jr 25.10). O que é um mundo sem música? Mesmo assim, pode-se viver sem música. Na verdade, parece que há quem prefira viver sem ela. O que se segue, porém, é mais sério. "Não mais" se achará artesão nem sequer artesanato. Tente imaginar uma grande cidade sem operários. Mas, naquilo que está para acontecer, uma das necessidades básicas da vida será retirada. "Não mais" se ouvirá nela o ruído da pedra de moinho (cf. Jr 25.10). A passagem está começando a atingir seu terrível clímax. "Não mais" brilhará nela a luz de uma lâmpada (cf. Jr 25.10). A mais densa treva reina suprema, uma escuridão que pode ser sentida, uma escuridão que simboliza a efusão final e com­pleta da ira de Deus sobre o mundo iníquo, amante dos pra­zeres e sedutor! E essa condição dura para sempre.

Agora, o toque final: o que quer que confira unidade, o que quer que inspire amor, todo relacionamento de amor, desa­parece completamente, para sempre: "Nem voz de noivo ou de noiva, jamais em ti se ouvirá" (cf. Jr 25.10). A razão para essa terrível sentença era porque os mercadores de Babilônia eram os "poderosos" da terra (cf. Ap 6.15). Deus foi completamen­te esquecido. Os mercadores tinham uma só ambição - serem grandes; serem como Deus em poder e autoridade. A isso é somado: "porque todas as nações foram seduzidas pela sua feitiçaria" (cf Is 47.9ss.). O ouro e o glamour deste mundo enganaram o iníquo. A besta da terra - também chamada "o falso profeta"- foi bem-sucedida na tentativa de desviar as pessoas do caminho. Além disso, a meretriz levou-as a se dis­tanciar mais e mais do Senhor. Finalmente, o sangue de todos os profetas de Deus, dos santos e dos mártires cristãos, foi achado em Babilônia. Ela os matou a todos. Esta é mais uma razão por que cremos que o termo "Babilônia" compreende a realidade passada, presente e futura e não apenas uma cidade que existirá nos últimos dias. O ponto principal que devemos observar, porém, é que o mundo louco de paixão e arrogante, com todo seu luxo e prazeres sedutores, com suas multidões que se esqueceram de Deus e viveram segundo as concupiscên­cias da carne e desejos da mente perecerão. O iníquo sofre eterno desespero. Uma ruína que não se completa até o dia do juízo final.

II. Regozijo no Céu

1. As bodas do Cordeiro (19.1-10)

Ouvimos, agora, as aleluias do céu quando Cristo vem em glória para tomar para si a sua noiva, a Igreja (19.7). O céu celebra a vitória de Deus sobre a meretriz, Babilônia. João ouve primeiro um grande som de imensa multidão. As hostes de anjos atribuem a salvação, a glória e o poder a Deus. Declaram que ao ter julgado a grande meretriz, Deus aperfeiçoou a salvação do seu povo. Assim, a glória dos seus atributos se torna mani­festa e seu poder é revelado. Foi Deus, e só ele, quem operou a salvação (cf. Ap 12.10). Sobretudo, efetivando a queda da Babilônia, a justiça de Jeová é demonstrada (cf. Ap 15.3s.), pois a meretriz havia corrompido a totalidade da terra com sua pros­tituição (cf. Ap 14.8; Jr 51.7). A exaltação a si mesmo e a condução das pessoas para longe de Deus foi seu principal pra­zer. Além disso, ela provocou a morte dos santos (cf. Ap 17.6; 18.24). Agora, Deus retribui com sua vingança (Ap 8.5; Jr 50.13). Os anjos se regozijam imensamente na salvação do povo de Deus. Estão cheios de alegria no coração ao ponderar sobre o fato de que toda oposição foi extinta para sempre. De novo, eles expressam sua alegria, clamando: "Aleluia!" Seu coração parece se encher de êxtase ao ponto máximo, e em seu arreba­tamento, gritam: "Louvado seja Jeová!" Esse é o significado de "Aleluia", termo que, no Novo Testamento, só é encontrado aqui. A fumaça de Babilônia sobe pelos séculos dos séculos (Ap 14.11; 18.8, 9, 18, 21ss.; Is 13.20; Mt 25.46). Ela jamais se levantará para molestar a Igreja.

Em seguida, os 24 anciãos, que simbolizam a totalidade da Igreja, louvam a Deus, como também os quatro querubins, que representam todos os querubins (Ap 4.2-6; 5.14; 7.15). Tão ple­nos estão de gratidão que só podem repetir: "Aleluia! Amém". Eles expressam sua adoração a Deus, que está sentado no trono e que é altamente exaltado, glorioso e soberano.

Então João ouve uma voz - um dos querubins ou um dos outros anjos? - vinda da região do trono, exclamando: "Dai lou­vores ao nosso Deus, todos os seus servos, os que o temeis, grandes e pequenos!" Do menor dos anjos ao maior dos santos, lodos são chamados para glorificar a Deus, o autor da salvação, pois todos o servem com reverência.

João, então, ouve a voz de todos os exércitos do céu, tanto anjos quanto homens. Assemelha-se ao som de muitas águas e fortes trovões, pois as aleluias saem, espontaneamente, de inu­meráveis lábios (14.2).

As vozes proclamam em uníssono que o Senhor, Deus, o Todo-poderoso, se revelou, agora, na plena majestade de sua glória e poder reais (verso 6). Cada um incita seu próximo a regozijar-se e a alegrar-se imensamente, e, sobretudo, a dar toda a glória a Deus (1.6; 14.7). A razão dessa explosão de júbilo é dada nestas palavras:

Porque são chegadas as bodas do Cordeiro, cuja esposa a si mesma já se ataviou, pois lhe foi dado vestir-se de linho finíssimo, resplandecente e puro. Porque o linho finíssimo são os atos de justiça dos santos.

A fim de se entender o significado dessa passagem subli­me, é preciso rever, brevemente, os costumes dos hebreus quanto ao casamento.[210] Distinguimos os seguintes elementos no matrimonio judeu. Primeiro há o contrato de casamento, consi­derado um compromisso mais sério do que o nosso noivado. Os termos do casamento são aceitos em presença de testemunhas e a bênção de Deus sobre a união é aí declarada. A partir desse dia o noivo e a noiva são, legalmente, marido e mulher (2 Co 11.2). Depois, há o intervalo entre o contrato e a festa de casa­mento. Durante esse intervalo o noivo paga um dote ao pai danoiva, caso isso já não tenha sido feito (Gn 34.12). Algumas vezes o dote é pago em serviços prestados (Gn 29.20).

Então, há a procissão quase ao fim do intervalo. A noiva se prepara e se adorna. O noivo, vestido em suas melhores roupas e acompanhado dos seus amigos, que cantam e portam tochas, se encaminha para o local da cerimônia de contrato. Ali ele recebe a noiva e a conduz, ainda em procissão, à sua própria casa ou à casa dos seus pais (Mt 9.15; cf também Mt 25.1ss.). Quando o noivo chegava a esse ponto, a festa às vezes se esten­dia até a casa da noiva. Finalmente, há a festa do casamento, que inclui o jantar. Geralmente, as festas duravam, em média sete dias.

A Escritura muitas vezes compara o relacionamento de amor entre o noivo e a noiva ao que existe entre Jeová e seu povo, ou entre Cristo e sua Igreja (Is 50.1 ss.; 54.1 ss.; Ef 5.32; Ap 21.9). Na verdade, o primeiro é um símbolo, um reflexo pálido da glória e maravilha do último.

Agora, a Igreja tem um contrato de casamento firmado com Cristo. Cristo, sobretudo, já pagou o dote por ela; comprou sua noiva, a Igreja:

Para resgatar a Igreja, Grande preço Cristo deu. Não foi ouro nem foi prata; Foi seu sangue que verteu.

O "intervalo" de separação chegou. É a totalidade da dispensação entre a ascensão de Cristo ao céu e a sua segunda vinda. Durante esse período a noiva se prepara. Ela se veste de linho finíssimo, resplendente e puro. O linho fino simboliza seus atos de justiça, seu caráter santificado (7.13). Suas obras foram lavadas pelo sangue de Cristo. Lembre-se, no entanto, que tal justiça lhe é conferida pela graça soberana de Deus.

Ao final desta dispensação, o Noivo, acompanhado por anjos de glória (Mt 25.31), vem para receber sua noiva, a Igreja.

A festa de casamento começa. A passagem em questão se refere nestas palavras a esse momento glorioso:

"É chegada as bodas (ou festa de casamento) do Cordeiro, cuja esposa a si mesma já se ataviou!"

A festa dura não só uma ou duas semanas, mas para sem­pre! É o clímax da totalidade do processo pelo qual o Noivo, Cristo, vem à sua noiva, a Igreja. É o objetivo e o propósito de uma sempre crescente intimidade, amizade e comunhão entre o Redentor e o redimido. Em Cristo, a noiva foi escolhida desde a eternidade. Ao longo da dispensação do Antigo Testamento inteiro as bodas foram anunciadas. Depois, o Filho de Deus assumiu nossa carne e sangue: o contrato de casamento foi feito. O preço - o dote - foi pago no Calvário. E agora, após um inter­valo, que aos olhos de Deus é apenas um momento, o Noivo retorna e "são chegadas as bodas do Cordeiro". A Igreja na terra anseia por este momento, como também a Igreja no céu. E então, todos estaremos com ele para sempre. Haverá uma comu­nhão santa, abençoada e permanente: a completa realização de todas as promessas do evangelho.

Mesmo durante esta presente dispensação - o "intervalo" da separação - aqueles que são "eficazmente chamados" (não meramente "convidados") para as bodas do Cordeiro são aben­çoados (verso 9). Mesmo antes que as bodas em si comecem, já os "chamados" são abençoados; e essas são as verdadeiras pala­vras de Deus. São genuínas e reais. Em pleno êxtase, o apóstolo se ajoelha aos pés daquele que fala, para adorá-lo. Teria ele tomado o orador pelo próprio Senhor Jesus Cristo?[211] De qual­quer forma, o orador, que era, provavelmente, um dos querubins ou outro anjo, impede o pretendido culto, dizendo: "Adora a Deus". Pois o testemunho de Jesus é o espírito da profecia". O espírito é o conteúdo de toda profecia verdadeira - isto é, a Bíblia inteira - é o testemunho de Jesus, o testemunho que ele nos revelou. A revelação que ele nos deu impede-nos de adorar qualquer coisa além de Deus (Mt 4.10).

Tendo sido descartada a meretriz, Babilônia, voltamos os nossos olhos, agora, para a besta e para o falso profeta. O que acontece com eles? Das aleluias no céu no momento e após o dia do juízo, retornamos ao momento que antecede esse dia.

2. O glorioso Vencedor (19.11-21)

João vê o próprio céu aberto, não apenas uma porta aberta no céu (Ap 4.1). Como em Apocalipse 6.2, Cristo está assentado sobre um cavalo branco. Ele é chamado de "Fiel e Verdadeiro". Este é o nosso Senhor em sua segunda vinda, para julgar: julgar e pelejar. Ele está prestes a julgar com justiça, pois seus olhos penetrantes são como chamas de fogo (1.14). Na sua cabeça, o apóstolo vê muitos diademas ou adornos reais, pois ele é Rei sobre todos (cf. "diadema" com "estefânia", coroa de vitória) (Ap 6.2). Ninguém sabe seu nome senão ele mesmo.[212] Expressará isso o caráter interior de sua relação com o Pai? Considerando que ele tenha vindo para juízo, suas vestes manchadas de sangue não se referem ao sangue da sua cruz, mas - simbolicamente, é claro -ao sangue dos seus inimigos (Is 63.1-6; Ap 14.20). Seu nome é "Logos (ou Palavra) de Deus" (Jo 1.1). Só ele sabe o significa­do pleno do seu nome. Tudo o que podemos dizer é que ele é chamado de "a Palavra de Deus" porque nele Deus se expressa e se revela inteiramente (Jo 1.18, 10.30).

Na sua segunda vinda, os exércitos do céu, isto é, os santos anjos, o acompanham (Mt 25.31). Porque são anjos santos, estão vestidos de linho fino alvo e puro. De sua boca sai uma espada afiada (Ap 1.16; 2.12, 16). Essa espada não é a história confortadora do evangelho. É símbolo de destruição, como indica, claramente, o contexto inteiro. Ele vem para "ferir as nações" e para as "reger com vara de ferro" (2.27; 12.5). Ele pisa o lagar de vinho da fúria da ira de Deus, o Todo-poderoso. Ele vem cumprir a sentença do Deus Todo-poderoso (Mt 25.3 lss.; Jo 5.22; At 17.31). Revela-se agora completamente como o Rei dos reis e o Senhor dos senhores, por meio da destrui­ção da besta e dos seus aliados. Tão certa é a vitória de Cristo sobre a besta e o falso profeta, e sobre os que os adoram que um anjo, posto em pé no Sol, convoca todas as aves a se ajuntar para a grande ceia de Deus, para comer a carne de reis, de capi­tães, de homens poderosos, de cavalos e de seus cavaleiros, sim, a carne de todos os iníquos, tanto livres quanto escravos, peque­nos e grandes (cf. Ap6.15; 17.12,15). Eum imenso massacre, o massacre de Armagedom. Lembre-se de que o Armagedom consiste de dois elementos: o ataque final das forças do anticristo - a besta - contra a Igreja, e a vitória de Cristo sobre esse vasto exército em sua segunda vinda para juízo.

João vê a besta, o poder perseguidor incorporado no go­verno mundial e dirigido contra Cristo e sua Igreja, e os reis da terra e seus exércitos ajuntados contra o Cavaleiro do cavalo branco e seu exército.[213] Assim, o apóstolo vê a totalidade do mundo descrente reunido para o ataque final contra a Igreja. Observe que a batalha em si não é descrita. A batalha do Armagedom não é um conflito definido com agora este e de­pois aquele lado como vencedor. Não, Cristo, em sua vinda, derrota o inimigo "com o sopro de sua boca". Ele dissipa seus inimigos pela "manifestação de sua presença" (2 Ts 2.8). O mesmo se dá aqui, no Apocalipse; simplesmente nos é dito que as forças do anticristo se reúnem contra Cristo e seu exército para serem derrotadas. A besta (Ap 13.lss.) é aprisionada. O mesmo quanto ao falso profeta - isto é, a besta que sobe da terra, a grande enganadora (13.13, 14). Os dois são lançados vivos no lago de fogo que arde enxofre (20.10). Como eles são os líderes - respectivamente, da perseguição anticristã e da reli­gião e filosofia anticristãs - diz-se deles que são lançados vivos no lago de fogo e enxofre. O significado disso é que, na segunda vinda de Cristo, a perseguição de Satanás contra a Igreja e o seu poder de enganar a terra cessarão para sempre. Toda influência de Satanás - quer no sentido da perseguição quer do engano -irá com ele para o inferno para jamais surgir novamente fora dele.16 Cristo, o Cavaleiro do cavalo branco, triunfa plenamente. Tão completa é sua vitória sobre os seus inimigos que, segundo o símbolo iniciado no verso 17, todas as aves empanturram-se com a carne dos iníquos. Assim, numa linguagem simbólica, o dia do juízo foi descrito outra vez.

Vimos o fim dos homens que portam a marca da besta (Ap 15,16). Testemunhamos também a queda de Babilônia (17. Is.). Lemos a descrição da vitória de Cristo sobre a besta e sobre o falso profeta (19.11ss.). Todos são abatidos e derrotados. Mas sua destruição não ocorre até o dia da vinda de Cristo para juízo. Então tudo é destruído junto, mesmo que suas histórias tenham sido apresentadas sob diferentes símbolos e em parágrafos separados. Um inimigo, o líder deles todos, ainda permanece. É o dragão, Satanás. Sua ruína é descrita na seção final do Apocalipse.

 

Capítulo 7

 

Apocalipse 20-22 Vitória Mediante Cristo

I. Da Prisão de Satanás ao Juízo Final

Apocalipse 19.19ss. levou-nos ao final da História, ao dia do juízo final. Com Apocalipse 20, nós voltamos ao início de nossa presente dispensação. Assim, a conexão entre os capítulos 19 e 20 é similar àquela entre os capítulos 11 e 12. Apocalipse 11.18 anuncia "o tempo determinado para serem julgados os mortos". O fim é chegado. Com Apocalipse 12 nós voltamos ao início do período do Novo Testamento, pois Apocalipse 12.5 descreve o nascimento, a ascensão e a coroação de nosso Senhor. Igual­mente, com o capítulo 20 começamos de novo.

Há um paralelo marcante entre os capítulos 11-14, de um lado, e, de outro, o capítulo 20. Ambos dividem a História nos mesmos períodos, ainda que com abordagens diferentes. Observe o paralelo.

 

APOCALIPSE, 11-14

APOCALIPSE 20

12:5-12, Em relação ao nascimen­to de Cristo, sua morte, sua ascensão e sua coroação, Satanás é lançado do céu. Suas acusações perdem qual­quer característica de justiça.                       

20.1-3. Satanás é preso e lança­do no abismo; seu poder sobre as nações é cerceado. Em vez de as na­ções conquistarem a Igreja, a Igreja começa a conquistar (evangelizar) as nações

11.2-6; 12.14ss. Há um longo período de poder e de testemunho da parte da Igreja, a qual é sustenta­da longe da vista da serpente (Satanás). À influência do diabo é refreada.

20.2. Há ura longo período de poder para a Igreja, pois Satanás é aprisionado. Ele permanece prisio­neiro por mil anos, isto é, pela tota­lidade da época do evangelho. (No céu, as almas dos redimidos vivem e reinam com Cristo, 20.4-6.)

11.7ss, 13.7. Há um breve perí­odo de severa perseguição. Este é o "pouco tempo” que resta para Sata­nás: o mais terrível e, também, a ma­nifestação; final do poder persecutório do anticristo..

20.7.ss. Há um breve período da mais severa perseguição: Satanás co­manda o exército de Goque e Magogue contra a Igreja. Esta é a batalha do Armagedom.

11.17,18: 14.14ss. Cumpre-se a promessa da única segunda vinda de Cristo para juízo.

20.11ss, Cumpre-se a promessa da única segunda vinda de Cristo para juízo.

Uma vez que esta "ordem de eventos" ou "programa da História" é vista, Apocalipse 20 não é difícil de ser entendido. Tudo que é necessário é lembrar-se da seqüência: a primeira vinda de Cristo é seguida de um longo período durante o qual Satanás é preso; este, por sua vez, é seguido do "pouco tempo" que resta para Satanás; e isto é, ainda, seguido da segunda vinda de Cristo, isto é, sua vinda para juízo. Deveria ficar ime­diatamente claro para qualquer pessoa que leia Apocalipse 20 que os "mil anos" precedem a segunda vinda de nosso Senhor para juízo. Esta segunda vinda para juízo não é descrita até que tenhamos chegado ao décimo primeiro verso. E claro que a teoria do pré-milenarismo discorda desse fato.'

Ainda que, em Apocalipse 20, nós atravessemos o mesmo caminho que percorremos nas visões precedentes, isto é, esta dispensação inteira, da primeira à segunda vinda de Cristo, isso tudo é visto de uma perspectiva diferente. Lembre-se de que Apocalipse 12 apresenta cinco inimigos da Igreja. Todos caem juntamente! O relato de sua derrota é espalhado em diversas visões distintas. As visões anteriores nos contaram o que acon­tece a quatro dos cinco inimigos apresentados no capítulo 12. Só um é deixado, isto é, o próprio Satanás. Sua derrota é descri­ta na presente visão.

Nesse contexto, lembremo-nos do tema principal do livro.[214]E a vitória de Cristo e da sua Igreja sobre cada inimigo. Quando Satanás é, também, lançado no lago de fogo e enxofre (20.10), nenhum inimigo é deixado para atormentar a Igreja. Somos ven­cedores; na verdade, somos mais do que vencedores por aquele que nos amou, porque não apenas triunfamos sobre cada inimi­go, mas também vivemos e reinamos com Cristo. Muitos da­queles que se opunham a nós participarão dessa alegria supre­ma (cf 3.9). Certamente, somos mais do que vencedores!

1. O aprisionamento de Satanás (20.1-3)

Estudemos, primeiro, a visão na qual Satanás é preso por mil anos e lançado no abismo.

João vê um anjo descendo do céu. Ele tem uma chave com a qual fechará o abismo (cf. 9.1, 11). Esse abismo é um poço profundo provido de uma entrada (9.1) e de uma tampa (9.2), e até um lacre (20.3). Mantenha em mente, entretanto, que tudo isso é simbólico. O anjo traz na mão uma grande corrente com as pontas penduradas. Evidentemente, ele irá manietar alguém para prendê-lo no abismo. O que acontece? João, de repente, vê "o dragão", forte, astucioso, horrível. É a "antiga serpente", manhosa e enganadora. A fim de mais bem descrevê-la, o após­tolo chama-a de "o diabo", isto é, "o acusador"; e Satanás, que é "o adversário" ou "falso acusador". Estando no Espírito, João, então, nota que o anjo domina Satanás. Rende-o, absolutamente indefeso, e prende-o segura e firmemente. O diabo é mantido preso por mil anos. O anjo lança o diabo no abismo e tranca sua saída. Desse modo, Satanás permanece "preso" por mil anos, após o que ele deve ser solto por um pouco de tempo.

Qual o significado desse símbolo?[215] Para se chegar ao ver­dadeiro significado da prisão de Satanás e seu lançamento no abismo, precisamos primeiro responder a pergunta: que signifi­cado e valor tem essa passagem para os cristãos perseguidos nos dias de João?

Esqueçamo-nos, por um momento, seguindo essa linha de pensamento, que vivemos no século 21. "Transportemo-nos" para o mundo de João, o apóstolo. Que cenário de trevas e de desola­ção! Tente contar o número de ídolos que degradam as ruas e os santuários da Roma imperial. As abominações, a imundícia e a corrupção na celebração dos festivais pagãos, as superstições, os vícios e muito mais, são realmente surpreendentes. Templos e reli­cários pelo mundo afora estão repletos de adoradores ignorantes e meio desesperados. Vemos umas poucas igrejas estabelecidas pelo esforço de Paulo e outros. De resto, o paganismo triunfa por todo lado.

Agora, retornemos ao longo período após a ascensão de Cristo. Todas as nações - com exceção dos judeus - estão sob o domínio de Satanás. Não, é claro, no sentido absoluto do termo, pois Deus sempre reina supremo, mas no sentido de Atos 14.16: "o qual (Deus) nas gerações passadas permitiu que todos os povos andassem nos seus próprios caminhos..." Se, durante esta presente era, o diabo "cegou os entendimentos dos incrédulos" (2 Co 4.4), isso é muito mais marcantemente verdadeiro duran­te a antiga dispensação. Com um olhar de horror nós exclama­mos: Será que essa condição não irá mudar? Porventura conti­nuará essa situação veterotestamentária? Manterá, o diabo, esse domínio sobre os povos da terra? A luz do evangelho glorioso não penetrará jamais nos palácios e casas da Ásia e da Europa? Continuará para sempre essa escuridão moral? Esqueceu-se um Deus irado de sua misericórdia?"

A resposta é: "Regozije-se!", pois Cristo está dizendo: "Pro­clamarei o decreto do Senhor: Ele me disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei. Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e as extremidades da terra por tua possessão"' (SI 2.7, 8). E outra vez: "Domine ele de mar a mar, e desde os rios até os confins da terra. Curvem-se diante dele todos os habitantes do deserto, e os seus inimigos lambam o pó. Paguem-lhe tributos os reis de Társis e das ilhas; os reis de Sabá e de Sebá lhe ofereçam presentes. E todos os reis se prostrem perante ele; todas as na­ções o sirvam ... Subsista para sempre o seu nome e prospere enquanto resplandecer o sol; nele sejam abençoados todos os homens, e as nações lhe chamem bem-aventurado!" (SI 72.8-11, 17; cf. Gn 12.3; Am 9.11s.; Mq 4.12).

Essa era a profecia. As trevas espirituais que cobrem as nações não deverão continuar; Satanás não mais enganará as nações. E chegado o cumprimento. Jesus nasce. Ele inicia seu ministério. Os fariseus o acusam de expulsar demônios pelo poder do próprio Satanás. Ele responde: "Ou, como pode alguém entrar na casa do valente (a saber, Satanás) e roubar-lhe os bens sem primeiro amarrá-lo? E então lhe saqueará a casa" (Mt 12.29). Observe que exatamente a mesma palavra, "amarrar", é usada em Apocalipse 20. A obra de amarrar o diabo foi iniciada quan­do o Senhor triunfou sobre ele nas tentações do deserto (Mt 4.1-11). Como resultado, Cristo começou a "expulsar" demô­nios. O poder e a influência de Satanás sobre as massas iludidas começavam a ser refreados.

Novamente, quando os setenta missionários retornaram, eles disseram: "...Senhor, os próprios demônios se nos subme­tem pelo teu nome"! Note o que se segue: "Mas ele lhes disse: Eu via a Satanás caindo do céu como um relâmpago" (Lc 10.17, 18). Aqui o diabo "caindo do céu" está associado com a ativi­dade missionária dos setenta. É uma passagem muito significa­tiva para explicar Apocalipse 20.

Noutra ocasião, certos gregos vieram para ver Jesus. Jesus declara: "Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe será expulso. E eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim mesmo" (Jo 12.31, 32). Observe que a pa­lavra usada tem a mesma raiz, no original, do termo traduzido por "expulsar" ou "lançar" no abismo (Ap 20). Ainda mais importante é o fato de que aqui, em João 12.20-32, a expulsão de Satanás é associada ao fato de que não somente os judeus, como era a lei no passado, mas "todos" os homens - tanto judeus quanto gentios - seriam atraídos a Cristo. Tudo isso ocorre como resultado do sofrimento de Cristo na cruz e o envio do Espírito Santo. Colossenses 2.15 associa, de modo muito defi­nitivo, o despojamento de Satanás e de seus exércitos com o triunfo de Cristo na cruz. Apocalipse 12.5s. mostra, clara­mente, que a "expulsão" de Satanás foi um resultado da coroação de Cristo.

Entenda, portanto, que em todas essas passagens, a prisão e a expulsão, ou queda, de Satanás está, de alguma forma, rela­cionada com a primeira vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Quando dizemos "a primeira vinda", nos referimos a todos os eventos a ela associados, desde a encarnação até a coroação. Podemos dizer, portanto, que a prisão de Satanás, segundo essas passagens, começa com a primeira vinda. Também, em alguns dos textos que citamos, essa "amarração", etc. está definitiva­mente associada com a obra de missões e com a extensão do testemunho da Igreja entre as nações. Antes da vinda de Cristo, de sua vitória sobre o diabo nas tentações, seu ministério, sua morte, sua ascensão e sua coroação, a salvação estava, não só, mas em grande parte, limitada aos judeus. Deus havia forçado Satanás a cegar os olhos das nações para que elas andassem segundo os seus próprios caminhos. Uma grande mudança ocorreu. A "verdade" do evangelho, gradualmente, tomaria o lugar da "mentira" do diabo. Satanás está preso e não pode mais enganar as nações. Cristo atrairá a si "todos" os homens. Os escolhidos dentre as nações serão salvos.

Em harmonia com todas essas passagens da Escritura - e nossa exegese tem de ser sempre baseada na analogia da Escri­tura - concluímos que aqui também, em Apocalipse 20.1-3, a prisão de Satanás e o fato de que ele é lançado no abismo por mil anos indicam que durante esta presente era evangélica a influência do diabo é cerceada. Ele é incapaz de impedir a expansão da Igreja entre as nações por meio de um programa missionário ativo. Ao longo deste período ele é impedido de incitar as nações - o mundo em geral - a destruir a Igreja como instituição missionária poderosa. Mediante a pregação da Palavra aplicada pelo Espírito Santo, os eleitos, de todas as partes do mundo, são levados das trevas para a luz. Nesse sentido, a Igreja conquista as nações, e as nações não conquistam a Igreja. Durante a totalidade desse período as igrejas são estabelecidas. Não apenas indivíduos, mas instituições e organizações são afe­tadas - umas mais outras menos - pelo evangelho da graça de Deus. Em regiões onde foi permitido ao diabo exercer quase que ilimitado poder, durante os tempos do Antigo Testamento, ele é agora forçado a ver os servos de Cristo pouco a pouco ganhando território. Num comparativamente breve período, o Cristianismo se espalha por todo o sul da Europa. Logo ele conquista o continente. Pelos séculos que se seguem ele é pro­clamado em todos os lugares de modo que os confins da terra ouvem o evangelho daquele que foi crucificado e muitos dobram os joelhos diante dele.

A Igreja se tornou internacional. Essa Igreja internacional é poderosa: "A Igreja marcha como um grande exército". Os mapas do World Missionary Atlas [Atlas do Mundo Missiona­rio] estão repletos de linhas vermelhas sublinhando os nomes de lugares onde há postos missionários. O particularismo da antiga dispensação deu lugar ao universalismo da nova. A Bíblia já foi traduzida em mais de 1.000 línguas. A influência do evan­gelho sobre o pensamento e a vida humana dificilmente pode ser superestimada. Em alguns países, as verdades abençoadas do Cristianismo afetam a vida humana em todas as suas áreas: política, econômica, social e intelectual. Só a pessoa falta em senso histórico e, portanto, incapaz de ver o presente à luz das condições preponderantes em todo o mundo antes da ascensão de Cristo, pode falhar na apreciação da glória milenar em que vivemos hoje. A profecia encontrada em Salmo 72 está sendo cumprida ante os nossos olhos.

Não entenda mal a nossa interpretação. Não estamos de­clarando que o mundo está se tornando cada vez melhor e que logo quase todos se juntarão às colunas do exército de Cristo. Muitos ouvirão o evangelho, mas não atenderão ao seu chama­do. Sobretudo, as trombetas do juízo de Deus não converterão o mundo que está se endurecendo na descrença. A maioria estará sempre do lado do diabo. Rejeitamos enfaticamente o sonho da paz, da prosperidade e da justiça universal feitas pelo homem antes da volta de Cristo. Da mesma forma, repudiamos a idéia paralela segundo a qual a todo-poderosa "lei da evolução" trará um empuxo ascendente ao curso da civilização. Não estamos fechando os olhos para os males ao nosso redor nem somos ignorantes ao fato de que o humanismo hodierno mascarado de uma nova e melhor interpretação do Cristianismo é, na realida­de, um rato que rói as raízes da árvore da religião verdadeira. Não obstante, embora estejamos plenamente cônscios de todos esses sintomas do mal e dos prenúncios das aflições, os fatos colocados continuam sendo verdadeiros e nenhum argumento pode cancelá-los. A Igreja, de fato, exerce uma tremenda influên­cia para o bem sobre a quase totalidade do complexo da vida humana. Nesse sentido - não em todos os sentidos -, o diabo está preso.

Repetimos, o diabo não está preso em todos os sentidos. Sua influência não está totalmente destruída. Ao contrário, den­tro da esfera na qual é permitido a Satanás exercer sua influên­cia para o mal, ele ruge furiosamente. Um cachorro preso a uma longa corrente pode causar imenso dano dentro do círculo de sua prisão. Fora desse círculo, porém, o animal não pode ma­chucar ninguém. Assim também, Apocalipse 20.1-5 ensina que o poder de Satanás é cerceado quanto à sua esfera de atividade: "para que não mais enganasse as nações". De fato, o diabo pode fazer muito durante este período de mil anos. Há algo, porém, que ele não pode fazer nesse período. Quanto a esta coisa ele está definitivamente preso. Ele não pode destruir a Igreja como poderosa organização missionária que proclama o evangelho às nações. Ele não poderá fazer isso até que terminem os mil anos.

Temos visto, então, que os "mil anos" de Apocalipse 20 têm um significado glorioso para o povo de Deus na terra. Não obstante, a glória do céu durante esse mesmo período transcende em muito ao que se refere à terra. Os próximos versos (4-6) descrevem a condição dos santos vitoriosos no céu, não na terra.

Certamente, estes dois aspectos do milênio, isto é, o terre­no (versos 1-3) e o celeste (versos 4-6) - a prisão de Satanás e o reino dos santos estão intimamente ligados. E em conexão com o reino pessoal de nosso divino e humano Mediador, como resultado de sua obra de expiação (ver Ap 5), que Satanás está preso para que sua influência na terra seja parcialmente parali­sada. É em conexão com esse mesmo reino pessoal de Jesus, em e do céu, que as almas dos santos reinam acima (cf. Ap 3.21). Esse reino pessoal de Cristo, em e do céu, é subjacente a todas as visões do Apocalipse. É a chave para a interpretação dos "mil anos".

2. O reinado dos santos (20.4-6)

Para chegar a um conceito apropriado desses dois versos, devemos, de novo, retornar em nosso pensamento ao século 1Q A.D. As perseguições romanas são intensas. Mártires entregam, calmamente, a cabeça à espada do executor. Paulo já havia feito isso; Tiago também. Em vez de dizer: "o imperador é Senhor", ou de queimar incenso no altar de sacerdotes pagãos como sím­bolo de culto ao imperador, os crentes confessavam seu Cristo mesmo em meio a chamas e enquanto eram lançados às bestas - feras nos anfiteatros romanos. Mas Cristo não estava alheio à dor dos discípulos afligidos. Ele os sustem a fim de que perma­neçam fiéis até o fim. Por isso ele dá à sua Igreja tristemente provada a visão das "almas dos decapitados por causa do teste­munho de Jesus" (1.2,9; 6.9). Ele descreve essas almas - junto às daqueles todos que confessaram a Jesus na terra - como reinando com Jesus no céu. Ele diz, noutras palavras: "Aqui embaixo, alguns anos de sofrimento; lá, num lugar melhor e superior, eles reinam com Cristo por mil anos!" Que conforto! Certamente, os sofrimentos deste tempo presente não são para se comparar com a glória revelada às almas dos santos que rei­nam com seu Senhor exaltado no céu.

Com relação a esses "mil anos" dos versos 4-6, responde­remos a três perguntas.

Primeira, onde isso ocorre? Segundo a passagem que estamos considerando, os mil anos ocorrem em três lugares.

(i) O reinado de mil anos ocorre onde estão os tronos, pois lemos: "Vi também tronos, e nestes sentam-se aqueles...". Con­forme a totalidade do livro do Apocalipse, o trono de Cristo e do seu povo está posto, invariavelmente, no céu (Ap 1.4; 3.21; 4.2ss., etc).

(ii) O reino de mil anos ocorre, também, onde estão as almas desincorporadas dos mártires, pois lemos: "Vi ainda as almas dos decapitados por causa do testemunho de Jesus". João vê almas, não corpos. Ele está pensando em almas sem corpos, pois também lemos: "daqueles que foram decapitados". Na passa­gem inteira não há uma única palavra sobre a ressurreição dos corpos. A distinção entre corpo e alma é até mesmo enfatizada: "as almas daqueles que foram decapitados". Na verdade, o ter­mo "almas"às vezes significa "pessoas" (por exemplo, Gn 46.27). Mas nesse caso é possível substituir o termo "pessoas" por "almas". Aqui em Apocalipse 20 não se pode fazer isso. As almas reinam durante a totalidade da dispensação até a segunda vinda. Depois disso, elas não reinam mais, pois, então, corpos e almas estarão reunidos. Após, os santos reinam, não por um limitado ainda que longo período de tempo - os mil anos -, mas para sempre (22.5).

(iii) O reino de mil anos ocorre, ainda, onde Jesus vive, pois lemos: "E viveram e reinam com Cristo...". A questão é, onde, segundo o Apocalipse, é o lugar de onde o Mediador exal­tado governa o universo? Onde Jesus vive? Certamente, no céu. É no céu que o Cordeiro é retratado tomando o rolo da mão daquele que se assenta no trono (Ap 5). Apocalipse 12 clara­mente declara que Cristo "foi arrebatado para Deus e até o seu trono". Portanto, "regozijem-se os céus e todos os que nele habitam".

Podemos dizer com segurança que o reino de mil anos ocorre no céu.

A próxima pergunta a ser respondida é: Qual o seu caráter? A natureza desse reino pode ser resumida de quatro maneiras, como segue.

(i) É julgar com Cristo. As almas dos redimidos, no céu, louvam a Cristo pelos seus retos juízos. Elas cantam constante­mente: "Retos e verdadeiros são os seus juízos". As almas em glória são, freqüentemente, retratadas tomando parte em todas as atividades do seu Mestre: elas se assentam com ele no seu trono (3.21); se postam de pé diante do seu trono (cf 14.3; 15.3); verão a sua face (cf. 22A, etc).

(ii) É viver com Cristo: "e viveram e reinaram com ele du­rante mil anos" (ver Ap 7.9ss.). No céu, essas almas respondem de modo perfeito a um perfeito ambiente. E o que é vida senão isso?

(iii) É compartilhar a glória real com Cristo. Tais almas celebram a vitória do Cordeiro e a sua própria. Elas reinam com ele. Todas as suas orações são respondidas; todos os seus dese­jos são, constantemente, satisfeitos.

(iv) É a "primeira ressurreição". A primeira ressurreição é a trasladação da alma da terra pecaminosa para o céu glorioso de Deus. É seguida, na segunda vinda de Cristo, pela segunda ressurreição, quando o corpo, também, será glorificado.

Nossa questão final é: Quem participa desse reino? A resposta é simples e fácil. Primeiro, todas as almas dos már­tires, "aqueles que foram decapitados pelo testemunho de Jesus". Segundo, todos os crentes que morreram na fé, tais como "os que não adoraram a besta", etc. O restante dos mortos, isto é, todos os outros homens que morreram, os não-crentes mortos, não reviveram até que se findassem os mil anos. Quando esse período termina, há uma mudança. Aí entra em cena a "segunda morte". Noutras palavras, eles recebem a punição eterna: não apenas da alma, mas também do corpo. As mudanças não são para o melhor, mas para o pior. Por outro lado, aqueles que tomaram parte na primeira ressurreição são benditos e santos. Sobre eles a segunda morte não tem poder. Não só reinarão para sempre, mas adora­rão a Deus em Cristo como sacerdotes durante os mil anos (Ap 1.6; 5.10).

3. O conflito final (20.7-10)

Quando os mil anos se passam, Satanás é solto de sua prisão. Então fica muito claro que uma final e mais terrível perseguição, por meio do que as forças anticristãs oprimirão a Igreja, é instigada de maneira mais direta, pelo próprio Sata­nás. O diabo convoca Gogue e Magogue para o ataque final contra "o acampamento dos santos e a cidade querida". A ex­pressão "Gogue e Magogue" é emprestada do livro de

Ezequiel,[216] onde o termo, indubitavelmente, implica o poder dos selêucidas, especialmente como foi revelado nos dias de Antíoco Epifanes, o amargo inimigo dos judeus. O centro do seu reino ficava localizado no norte da Síria. Seleuco estabelecia residên­cia ali, na cidade de Antioquia, no Orontes. A leste, seu territó­rio se estendia além do Tigre. Ao norte, o domínio sobre o qual Seleuco governava incluía Meseque e Tubal, distritos da Asia Menor.[217] Desse modo, Gogue foi o príncipe de Magogue, isto é, da Síria. Portanto, a opressão do povo de Deus por Gogue e Magogue, refere-se, em Ezequiel, à terrível perseguição sob Antíoco Epifanes, governador da Síria.

O livro do Apocalipse usa esse período de aflição e dor como símbolo do ataque final de Satanás e suas hordas contra a Igreja. Observe a semelhança.

Primeiro, lembre-se de que o ataque de Gogue e Magogue (Síria sob Antíoco Epifanes) era a grande opressão que o povo de Deus teve de suportar na antiga dispensação. E, portanto, um símbolo apropriado do ataque final das forças anticristãs contra a Igreja durante a nova dispensação.

Segundo, mantenha em mente que os exércitos de Goque e Magogue eram muito numerosos. Assim, ele podia, adequada­mente, simbolizar a oposição mundial à Igreja nos dias imedia­tamente precedentes à segunda vinda de Cristo.

Terceiro, reflita sobre o fato de que a tribulação sob Epifanes, ainda que severa, foi de breve duração. Desse modo, ela é, mui apropriadamente, um prenúncio da breve tribula­ção final que ocorrerá no crepúsculo da nossa atual dispensação (cf Mc 13.20; Ap 11.11).

Finalmente, lembre-se de que a derrota das forças da Síria - isto é, de Gogue e Magogue - foi inesperada e completa. Foi, claramente, uma operação de Deus. Por essa mesma razão, o ataque violento de Gogue e Magogue contra Israel serve como excelente símbolo para o conflito final dos ímpios contra a Igreja.

Na passagem que estamos estudando, "Gogue e Magogue" são identificados com "as nações que há nos quatro cantos da terra". Essa expressão, no entanto, não se refere às nações mais distantes. O termo "os quatro cantos da terra" significa, sim­plesmente, "a totalidade do mundo". Todo o mundo iníquo per­seguirá a Igreja. A perseguição será mundial. Não é base sufici­ente, portanto, para considerar nossa passagem como referente ao ataque final movido por certas nações periféricas - por exemplo, China, Japão e índia - contra as nações da Europa Ociden­tal e América. O Novo Testamento, simplesmente, não contém quaisquer predições que se apliquem a certas nações ou estados específicos atuais, a esses e esses só. Descreve, sim, o conflito entre a Igreja e o mundo. Nada diz que se refira exclusivamente ou, mesmo, especificamente, à China, ao Japão, aos Países Bai­xos ou à Lousiânia! O conflito aqui descrito não é entre nações "civilizadas" e "incivilizadas". E, simplesmente, o último ata­que das forças do anticristo contra a Igreja. Nossa interpretação é, também, corroborada pela expressão: "Marcharam pela su­perfície da terra" (cf Hc 1.6; Is 8.8; Gn 13.17; Jó 38.18).

O significado, então, é este: a época durante a qual a Igreja, como poderosa organização missionária, será capaz de espalhar o evangelho em todos os lugares não durará para sempre; nem mesmo até o momento da segunda vinda de Cristo. Observe o que acontece hoje mesmo em alguns países. Não há regiões desta terra que parecem estar já entrando no "pouco tempo" de Satanás?[218]

Noutras palavras, temos, aqui em Apocalipse 20.7-10, a descrição da mesma batalha - não guerra - que foi descrita em Apocalipse 16.12ss. e 19.19. Em todos os casos lemos no original: a peleja. Ap. 16.14 diz: "...com o fim de ajuntá-los para a peleja do grande dia do Deus Todo-poderoso". E Apocalipse 19.19: "...congregados para pelejarem contra aque­le que estava montado no cavalo, e contra o seu exército". Igual­mente, aqui em Apocalipse 20.8: "...a fim de reuni-los para a peleja". Essas descrições não se referem a diferentes batalhas. Temos aqui uma e a mesma batalha. Em todos os três casos trata-se da batalha do Armagedom. E o ataque final das forças anticristãs contra a Igreja. A coisa "nova" revelada em Apocalipse 20 é o que acontece a Satanás como resultado dessa batalha.

O assalto final é dirigido contra a "cidade querida", tam­bém chamada de "acampamento dos santos". Dessa forma a Igreja de Deus é descrita, aqui, sob o símbolo de uma cidade e de um campo.

"Desceu, porém, fogo do céu e os consumiu." Observe o caráter repentino do juízo sobre Gogue e Magogue. E tão rápi­do e inesperado como o relâmpago que risca o céu (cf 2 Ts 2.8). Assim, subitamente, Cristo surgirá e desbaratará seus inimigos! Esta é a sua única vinda para juízo. Satanás enganou o mundo iníquo. Levou o iníquo a pensar que fosse possível uma vitória real e absoluta sobre a Igreja e que Deus poderia ser derrotado! Então, o diabo, o enganador, é lançado no lago que arde com fogo e enxofre - mostrando o inferno como lugar de sofrimento tanto para o corpo quanto para a alma, após o dia do juízo -onde estão também a besta e o falso profeta. O sentido não é de que a besta e o falso profeta sejam realmente lançados no inferno antes de Satanás; significa, sim, que a punição da besta e do falso profeta já foi anteriormente descrita (Ap 19. 20). Todos eles caem juntamente, Satanás, a besta e o falso profeta. Isso tem de ser verdadeiro, pois a besta é o poder perseguidor de

Satanás e o falso profeta é a religião anticristã. Onde quer que Satanás esteja, aí estarão os outros dois. Serão atormentados para sempre no lago que arde com fogo e enxofre (Mt 25.46).

4. O grande trono branco (20.11-15)

A vinda de Cristo para juízo é descrita vividamente. João vê um grande trono branco. Cristo se assenta sobre o trono (Mt 25.31; Ap 14.14). Os céus e a terra desaparecem de sua face. O que é descrito aqui não se trata de destruição ou aniquilação, mas de renovação do universo. Haverá uma dissolução dos ele­mentos em meio a grande calor (2 Pe 3.10); a regeneração (Mt 19.28); a restauração de todas as coisas (At 3.21); e um livra­mento da escravidão da corrupção (Rm 8.21). O universo não mais estará sujeito à vaidade.[219] João vê os mortos, grandes e pequenos, postados em pé diante do trono.[220] Todas as pessoas que já viveram na terra são vistas diante do trono. Os livros são abertos e consultados os registros da vida de cada pessoa (Dn 7.10). E aberto, também, o livro da vida que contém os nomes de todos os crentes (Ap 3.5; 13.8). Os mortos são julgados se­gundo as suas obras (Mt 25.31ss.; Rm 14.10; 2 Co 5.10). O mar devolve seus mortos; o mesmo faz a Morte e o Hades.[221] Essa é a ressurreição geral de todos os mortos. A totalidade da Bíblia ensina que haverá uma única ressurreição geral (ler Jo 5.28s.). Essa uma e única ressurreição geral ocorre no último dia (Jo 6.39s., 44, 54). Em nenhum lugar em toda a Bíblia lemos que haverá uma ressurreição dos corpos dos crentes antes dos mil anos e outra dos corpos dos não-crentes, após os mil anos. Todos ressuscitam ao mesmo tempo. A Morte, a separação de alma e corpo, e o Hades, o estado de separação, agora cessam. Nem no novo céu nem na nova terra nem mesmo no inferno jamais ha­verá separação entre corpo e alma depois da segunda vinda de Cristo para julgamento. Portanto, falando simbolicamente, a Morte e o Hades - agora personificados - são lançados no lago de fogo. E qualquer cujo nome não tenha sido encontrado inscri­to no livro da vida será também lançado no lago de fogo.

II. O Triunfo Final de Deus

Chegamos ao tema final e mais belo. Há uma linda cone­xão entre o primeiro livro da Bíblia e o último. A Escritura se assemelha a uma flor. Achamos a semente em Gênesis, o cresci­mento da planta nos livros que se seguem e, no Apocalipse, seu pleno desenvolvimento. Observe a seguinte comparação.

Gênesis conta que Deus criou os céus e a terra. Apocalipse descreve o novo céu e a nova terra (21.1). Em Gênesis, os lumi­nares são chamados à existência: o sol, a lua e as estrelas. Em Apocalipse, lemos: "A cidade não precisa nem do sol, nem da lua, para lhe darem claridade, pois a glória de Deus a iluminou, e o Cordeiro é a sua lâmpada" (21.23). Gênesis descreve um paraíso que foi perdido. Apocalipse descreve um paraíso res­taurado (Ap 2.7; 22.2). Gênesis descreve a astúcia e o poder do diabo. Apocalipse conta que o diabo foi preso e lançado no lago que arde com fogo e enxofre. Gênesis retrata a cena infeliz do homem fugindo de Deus, escondendo-se da presença do Todo-poderoso. Apocalipse mostra a mais linda e íntima comunhão entre Deus e o homem redimido: "Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles" (21.3).

Finalmente, enquanto Gênesis mostra-nos a árvore da vida com um anjo para guardar o seu caminho, o Apocalipse restau­ra ao homem o direito de acesso a ela: "para que lhes assista o direito à árvore da vida" (22.14).

Perguntamos, novamente: Qual o tema deste livro? E este: Cristo, e não o diabo, é o vitorioso; o plano de Deus, embora,por um pouco, aparentemente vencido, é, no final, visto em seu completo triunfo. Somos vencedores. Não, mais do que vencedo­res, pois não só fomos libertados de grande maldição, na verdade, de toda maldição, como obtivemos também a mais gloriosa das bênçãos (Ap 21.3).

O que, contudo, é retratado em Apocalipse 21.1-22.5? A Igreja ideal tal como ela se apresenta hoje?[222] Ou o universo e a Igreja do futuro?" Nenhuma dessas respostas parece completa. Temos, nesta seção, uma descrição de algo ideal. O que quer que resulte da graça redentora de Deus, no presente ou no futuro, está aí incluído. A graça redentora e o poder transformador não devem ser considerados como coisas futuras. Não, elas já estão operando, aqui e nesta presente época, no coração dos filhos de Deus. Dessa forma, o que temos aqui em Apocalipse 21.1-22.5 é uma descrição do universo redimido do futuro antevisto pela Igreja redimida do presente. Provemos isso.

Considere Apocalipse 21.3: "Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão povos de Deus, e Deus mesmo estará com eles".

E claro como o dia o fato de que essas palavras se referem ao novo céu e à nova terra, à humanidade plenamente redimida tal como ela existirá depois do dia do juízo. O contexto é muito claro. O primeiro céu e a primeira terra já passaram (21.1). O julgamento foi realizado (20.1 lss.). Será, porém, que essa passa­gem se refere apenas ao futuro? Qualquer pessoa que esteja familiarizada com a Bíblia será capaz de responder a essa questão. Reconhece imediatamente a passagem citada (cf Is 65.17; 66.22). Considere a frase de Apocalipse 21.3: "Deus mesmo estará com eles". Não é esta a antiga promessa pactuai encon­trada ao longo da Escritura? Verifique Gênesis 17.7, 8; Êxodo 20.2; Deuteronômio 5.2s., 6; Jeremias 24.7; 30.22; 31.33;

Ezequiel 11.20; Zacarias 13.9; Mateus 13.17; Romanos 4.22; 2 Coríntios 6.16. Então, o cumprimento ou realização dessa glo­riosa promessa, como as passagens paralelas indicam, é clara­mente uma questão não só do futuro, mas também do presente, pelo menos em princípio. Deus, mesmo agora, já habita com sua Igreja pelo Espírito. A habitação divina será completamente perfeita nos novos céus e terra depois do dia do juízo.

O mesmo é verdadeiro com respeito a diversos símbolos que ocorrem nesta seção. Se alguém se der ao trabalho de olhar as passagens paralelas nas quais eles estão baseados, observará, imediatamente, que as verdades mostradas e as promessas feitas afetam a totalidade do período de tempo durante o qual a Igreja tem existido sobre a terra. Eles dizem respeito, num certo sentido, a esta dispensação inteira. A Nova Jerusalém é a oponente constante da Babilônia. A noiva deveria sempre ser contrastada com a meretriz. Mesmo assim, a realidade mais final e completa não é obtida até depois do dia do juízo.

1. O novo céu e a nova terra (21.1-8)

O primeiro céu e a primeira terra já passaram. Em nossa imaginação, tentemos ver este novo universo. As próprias fun­dações da terra foram sujeitas ao fogo purificador. Cada man­cha de pecado, cada cicatriz de erro, cada traço de morte, foram removidos. Do grande incêndio nasce um novo universo. A palavra usada no original implica um "novo", mas não um "outro" mundo.12 É o mesmo céu e a mesma terra, mas total­mente rejuvenescidos, sem ervas daninhas, espinhos, cardos, etc. A natureza volta à condição em que foi criada; todas as suas potencialidades, dormentes por tanto tempo, são agora realizadas. A "antiga" ordem desapareceu. O universo em que o dragão, a besta, o falso profeta e a meretriz desenvolviam seu programa de iniqüidade, desapareceu. O mar, como o conhecemos, não mais existe. Atualmente, o mar é um emblema de inquietação e de conflito. As águas bramosas, iradas, tempestuosas, as ondas permanentemente chocando-se umas às outras, simbolizam as nações do mundo em suas inquietações e conflitos (13.1; 17.15). E o mar do qual surgiu a besta. Contudo, no universo renovado - no novo céu e na nova terra - tudo será paz. O céu, a terra e o mar como o conhecemos, desaparecerão. O universo será glo­riosamente rejuvenescido e transformado. "Vi também a cida­de santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, da parte de Deus, ataviada como noiva, adornada para o seu esposo."

Essa Jerusalém é chamada "nova" em contraposição à terrena Jerusalém da Palestina. E chamada "santa" porque é separada do pecado e totalmente consagrada a Deus. Essa nova e santa Jerusalém é, muito claramente, a Igreja de nosso Senhor Jesus Cristo, como fica, também mui claramente, evidente pelo fato de que é aqui, como em todos os demais lugares, chamada de noiva, a esposa do Cordeiro (Is 54.5; Ef 5.32, etc). Mesmo no Antigo Testamento, a Igreja é representada pelo símbolo de uma cidade (Is 26.1; SI 48, etc). Uma cidade evoca à nossa mente o conceito de residência permanente, um grande número de habitantes, proteção e segurança, comunhão e beleza. Com respeito a essas características, a Igreja - em princípio, mesmo hoje e em perfeição, depois - é como uma cidade. Lemos que João viu essa Cidade Santa descendo do céu, vinda de Deus. Isso, também, é verdadeiro quanto a ambas, a Igreja ideal do presente e a Igreja do futuro. Ela é sempre nascida do alto. E sempre o resultado da obra transformadora do Espírito Santo (3.12; 21.9ss.; cf. Gl 4.26; Hb 11.10, 16; 12.22). As palavras "ataviada como noiva adornada para o seu marido" encontram seu comentário em Apocalipse 19.7.[223]

João ouve uma grande voz vinda do trono, dizendo:

Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles.

Eles serão povos de Deus e Deus mesmo estará com eles.

E lhes enxugará dos olhos toda lágrima,

e a morte já não existirá,

já não haverá luto, nem pranto, nem dor,

porque as primeiras coisas passaram.

Então, maravilhosamente, a festa eterna das bodas do Cor­deiro, Cristo, e de sua noiva, a Igreja, se nos é retratada.[224] E o clímax da totalidade do processo pelo qual Deus vem ao seu povo. Tão próxima é a eterna comunhão entre Deus e seus elei­tos que ele, por assim dizer, habita com eles numa tenda - sua tenda, a glória dos seus atributos (Ap 7.15). O Cordeiro é seu pastor (7.17). Deus enxuga-lhes dos olhos toda lágrima (7.17). Eles estão constantemente cultuando-o em seu santuário (7.15). Assentam-se com ele em seu trono e ele ceia com eles (3.20s.; cf também Jo 17.23; 2 Co 6.18). Assim, com símbolos marcantes, a eterna comunhão entre Deus e seu povo é coloca­da. Negativamente falando, já não haverá morte (Ap 20.14; 1 Co 15.26); nem luto nem choro (Is 25.8; 35.10; 51.11); nem dor (cf também Ap 7.16). A ordem das "primeiras coisas" é passada (2 Co 5.17; Hb 12.27).

O apóstolo, então, ouve a voz daquele que está sentado no trono, isto é, Deus em Cristo (Ap 4.2; 22.1), dizendo: "Eis que faço novas todas as coisas". Só Deus pode criar coisas novas. Pessoas podem imaginar, em vão, que por meio de educação melhor, melhor ambiente, melhor legislação e uma melhor distri­buição de renda elas entrarão numa nova era, uma era dourada, a utopia do ardente desejo humano. Seus sonhos permanecem sonhos! Nem conferências sobre economia nem conferências sobre desarmamento nem melhores escolas ou programas de participação financeira trarão uma era realmente dourada, um novo céu e uma nova terra ou uma nova ordem. Só Deus, pelo seu Espírito, faz novas todas as coisas.[225] Só ele pode restaurar e renovar o homem e o universo. Ele faz isso hoje, ainda que num sentido restrito. Ele o fará completamente, depois, quando Cristo voltar.

É difícil imaginar que os efeitos do pecado serão, um dia, removidos. Contudo, eles serão retirados para que as coisas sejam feitas realmente "novas". Para fortalecer a nossa fé na­quele que prometeu cumprir sua promessa, lemos: "Eis!" - no original, um imperativo indicando a João que ele deve guardar aquilo que ouviu no coração e escrevê-lo para conforto dos ou­tros, pois "estas palavras são fiéis e verdadeiras" (cf Ap 19.9; 22.6). Tão certo é o cumprimento dessa promessa que a voz fala como se ela já tivesse sido cumprida (cf Ap 16.17). De fato, no que se refere à visão de João, tais transformações real­mente já ocorreram. Ele vê o novo céu e a nova terra.'[226] A "água da vida", que é livremente oferecida, refere-se à vida eterna, à salvação plena e gratuita. É o cumprimento de todas as pro­messas (SI 36.8; Jl 3.18; Zc 14.8; Jo 4.10; Ap 7.17; 22.17). Lembre-se de que essa "água" é hoje oferecida ao sedento e de que, na eternidade, ela será derramada no coração de todo ser vivente. Essa água procede sempre de Deus, que é sua Fonte. O vencedor receberá todas essas coisas. Nele a promessa pactuai será cumprida: "Eu lhe serei por Pai e ele me será por Filho".

Em princípio, essa promessa - que como já nos referimos, corre do começo ao fim da Escritura como um fio dourado se cumpre mesmo nesta vida; será, no entanto, cumprida com per­feição na próxima vida, especialmente, nos novos céu e terra. E a grande promessa, pois inclui todas as demais promessas.[227]

Observe o terrível contraste no verso 8: os que mostram as características da "meretriz" são lançados no lago de fogo e enxofre e sofrem a segunda morte.

2. A nova Jerusalém (21.9-22.5)

Sobre as ruínas da cidade-meretriz do verso 8, entretanto, surge a esplêndida visão da cidade-noiva, a cidade de Deus, Jerusalém Santa, vinda do céu da parte de Deus. E a Igreja ideal do futuro prenunciada pela Igreja ideal do presente.

Um dos sete anjos que portavam as sete taças vem e fala com João (cf Ap 17.1): "Vem, mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro".[228] Depois, o anjo transporta João, não literalmen­te, mas em espírito (cf. Ap 1.10; 17.3) a uma montanha grande e alta (cf Ez 40.1, 2). Somente quando nos colocamos sobre a alta montanha da fé, somos capazes de ver a Igreja como ela é idealmente. O apóstolo, então, vê uma cena de transcendentes beleza e esplendor. Ele vê a cidade. O anjo havia prometido lhe mostrar a noiva. Dessa forma, a cidade é a noiva; as duas são idênticas. Ambas se referem à Igreja de Deus.

A descrição da cidade, encontrada em Apocalipse 21.9-22.5, pode ser resumida como se segue.

a. E uma cidade, a Cidade Santa, Jerusalém (21.10, 16, 18). Como tal, ela é a comunidade dos homens que têm comu­nhão com Deus. Nada na totalidade do universo é tão glorioso quanto essa comunhão com Deus: ele habita conosco e nós somos seus. Sobretudo, como o símbolo da Cidade Santa claramente indica, a comunhão é santa e permanente, e é usufruída por uma multidão incontável. Assim, o transcendente esplendor da Igreja ideal é simbolizado. Observe, ainda mais, que a totalidade do conceito é escatológico: a Igreja do futuro é descrita aqui, como também a Igreja do presente, como sombra do que está por vir.

A cidade aqui descrita pertence ao reino dos céus: a cidade está, constantemente, descendo do céu. É obra da graça soberana de Deus. Pertence ao futuro e tem uma constante referência ao futuro. É "peregrina na terra". É a "comunidade dos homens que vivem segundo Deus e que foram predestinados para reinar com Deus eternamente".[229] Jerusalém é santa e nova. Babilônia é "grande" e "velha".[230]

A cidade é de ouro puro, semelhante a vidro translúcido (cf Ap 4.6; 15.2). Isso simboliza a pureza, a santidade, a graciosidade e a radiância do caráter da comunhão entre Deus e o seu povo. Em princípio, gozamos dela aqui e agora; depois usufruiremos sua plenitude.

Finalmente, a cidade é um cubo perfeito - doze mil estádios em cada direção.

Observe, em primeiro lugar, a beleza do símbolo. Uma cida­de que se estende por doze quilômetros em cada uma de suas três dimensões - largura, comprimento e altura -, toda feita de ouro puro, liso como cristal límpido e brilhante. O que será que isso significa?

Doze mil é o produto de três (da Trindade) vezes quatro (da humanidade) vezes dez vezes dez vezes dez (da duplicação da perfeição final e completa). Portanto, esse número expressa o resultado pleno do poder salvador do Deus trino operando no universo. Esse resultado perfeito e completo é a Igreja de Deus usufruindo comunhão perfeita com Deus no universo. Tal comunhão será "completa e perfeita" em todas as direções. Aqui e agora temos um antegozo dessa comunhão. Foi prenunciada, sobretudo, pelo Santo dos santos no tabernáculo e no templo de Salomão. Eles, também eram um cubo perfeito. Ali, também, o sumo sacerdote entrava em comunhão com Deus. Na Santa Cidade, porém, todos os crentes são sacerdotes e reis. Todos usufruem essa comunhão.

b. A Cidade Santa ê a noiva, a esposa do Cordeiro (21.9). O símbolo é totalmente explicado em Apocalipse 19.1.[231] O fato de que a comunhão entre Deus e seus filhos é tanto a mais ínti­ma e permanente relação de amor quanto a coisa mais gloriosa e bela no universo, é simbolizada por essa figura (cf SI 45).

c. A Cidade Santa é iluminada pela glória de Deus no Cordeiro (21.11, 23; 22.5). A lâmpada ou candeeiro é a glória daquele que se assenta no trono (cf Ap 4.3). O brilho de um diamante[232] não é senão uma sombra fugidia da glória dos atri­butos de Deus revelados na Igreja do Senhor Jesus Cristo. Certa­mente, a lâmpada da Igreja é o Cordeiro porque ele infunde em nós o conhecimento do Deus verdadeiro e salvador, alegria espiritual permanente e um estado de justiça com sua correspon­dente condição de santidade. Cristo, a luz verdadeira, remove as trevas da ignorância, do sofrimento, da culpa e da poluição moral. Nele e por ele e sua obra, a glória de Deus se torna ma­nifesta na Igreja. Desse modo, a Cidade Santa não precisa de luz natural ou artificial, de sol ou de lâmpada (cf. Is 60.1, 3, 5, 19, 20; Zc 14.7). Não mais haverá noite. Tudo isso é, em princí­pio, verdadeiro agora, mas veremos sua perfeição no novo uni­verso do futuro.

d. Não há santuário na cidade, pois o Senhor Deus Todo-poderoso e o Cordeiro são seu santuário (21.22). Seus habitantes não mais precisam ir ao tabernáculo ou ao templo em algum lugar no campo ou na cidade para ter comunhão com Deus. A radiância de sua majestade e glória, na totalidade de sua ple­nitude, enche a cidade. Não se limita a qualquer lugar em par­ticular na cidade. Manifesta-se em todos os lugares. Nenhumsantuário se faz necessário, pois a comunhão dos crentes com seu Deus é direta e imediata. Deus habita com seu povo; os crentes estão em sua amorosa, imediata e permanente presença (cf Ap 7.15; 21.3; Zc 2.5). A profecia de Jeremias 3.16 (cf Jr 31.33ss.) que apresenta seu cumprimento antecipado na nova dispensação em que vivemos (cf Jo 4. 23s.; Hb 8.8ss.) se torna plenamente realizada no novo universo.

e. A nova Jerusalém tem um muro largo e alto (21.12, 17, 18). A cidade tem um muro de proteção, de segurança. Aqui, o sentido do símbolo é este: A Igreja permanece segura de sua posse da comunhão com Deus. O muro é alto e largo (cf Zc 2.5). Sobretudo, para enfatizar de que se trata de um muro simbólico, não literal, lemos que ele é medido como tendo 144 cúbitos ou côvados (de altura ou largura?). E o muro da Igreja tanto da antiga quanto da nova dispensações.[233] João 10.28 fornece uma bela explanação do símbolo: "ninguém as arreba­tará da minha mão". O símbolo se aplica aos dias de hoje, mas se aplica mais completamente ao senso de segurança do povo de Deus no novo universo. O que seria mais glorioso do que o sentimento de absoluta segurança?

f. O muro tem doze fundamentos (21.14, 19, 20). Sobre esses doze fundamentos aparecem os nomes dos doze apóstolos. O significado, aqui, é fácil de ser apreendido. Mediante o teste­munho e os escritos dos doze apóstolos os homens foram levados à comunhão com Deus (Ef 2.20; 1 Co 3.9). Cristo Jesus é a pedra principal dessa fundação. Os apóstolos eram apóstolos "do Cordeiro". Eles o proclamavam. Por meio da pregação dos apóstolos resplendeu a diversidade do esplendor e brilho de todos os atributos de Deus. Esse é, com toda a probabilidade, o significado das pedras preciosas que adornam os doze funda­mentos (cf. Is 54.11). A multiforme sabedoria de Deus é revelada na Igreja por meio da pregação da Palavra sempre que ela é aplicada ao coração pelo Espírito Santo (cf Ef 3.10).

g. A cidade tem doze portas (21.12, 13, 21, 25, 27; 22.14, 15; cf Ez 43.1; 48.31-34; Ap 22.14). Em outras palavras, há -do ponto de vista do novo céu e da nova terra poderíamos dizer que tem havido - abundante oportunidade de se entrar nessa gloriosa e maravilhosa comunhão com Deus. Portas abertas simbolizam oportunidades de se entrar. Nós entramos nessa glo­riosa comunhão por meio da fé - que é dom de Deus - nas suas promessas. Cada portal é uma pérola. Se nos lembrarmos de que uma pérola de vinte gramas não é maior do que uma boli­nha de gude das menores, então as pérolas que João viu em sua visão devem ser surpreendentemente grandes e belas, e os fi­lhos de Deus que, pela fé em suas promessas, entraram na cida­de, dizem: "De fato, cada porta é uma pérola!" Nas portas estão escritos os nomes das doze tribos de Israel, pois a cidade é a habitação do verdadeiro Israel, a Igreja redimida (cf Ap 7.14). Há três portas voltadas para cada direção (cf Gn 28.14; Is 54.3); a Igreja é arrebanhada de todas as nações. Nas portas há doze anjos. Desse modo, os que têm as características da meretriz[234] e seus aliados não podem entrar. Essas pessoas abomináveis e impuras não entrarão na cidade. Permanecem fora. Só aqueles cujos nomes estão inscritos no livro da vida do Cordeiro podem entrar (cf Ap 3.5). Que ninguém, porém, se desespere, pois as portas jamais se fecham. Portas fechadas simbolizam não ape­nas escuridão, noite e perigo, mas também a falta de oportuni­dade para entrar. Agora, durante esta era inteira há (e, de novo, do ponto de vista do novo céu e da nova terra podemos dizer que tem havido) abundante oportunidade de se entrar, pela fé, na abençoada comunhão de Deus.

h. A cidade tem avenidas de ouro puro, transparente como vidro (21.21). Cada portal é a porta para uma avenida, e a cida­de está repleta de belas avenidas, avenidas de ouro puro, pois simbolizam a verdade gloriosa. Essas avenidas indicam que há abundante oportunidade para comunicação com o trono. Há fácil acesso aos rios da vida e às árvores da vida.

i. A cidade tem rios de águas vivas, claros como cristal, fluindo do trono de Deus e do Cordeiro (22.1). Junto às mar­gens de cada avenida flui um rio. A avenida e o rio são separados por um parque (ver seção j, abaixo). Esse rio é o rio da vida, pois simboliza vida eterna, plena e gratuita salvação, o dom da graça soberana de Deus. E o que é vida senão a comunhão com Deus? (Cf. Jo 17.3; ver também Ez 47.1ss.; Jo 4.10; 7.38 e nossa explicação de Ap 7.17; 21.6.) Observe que esse rio pro­cede "do" trono de Deus e do Cordeiro. Esse não é um ponto de pouca importância, pois a chave do símbolo está nessa questão. Quando dizemos que o rio da graça e da vida procede "do" tro­no de Deus e do Cordeiro, estamos enfatizando o fato de que nossa salvação foi efetuada pela vontade soberana de Deus e nos foi conferida pelo sangue redentor de Cristo. A ele seja toda a glória. Observe a abundância e o caráter santo dessa vida: o rio é cheio de água e a água é clara como cristal. O pecado não pode macular nossa comunhão com Deus. Esse símbolo, tam­bém, se aplica, em princípio, aqui e agora, mas só se aplicará com perfeição lá e então.

j. Entre o rio e a avenida há um paraíso, um parque ou jardim, repleto de árvores da vida (22.1-3a). Traduzimos essa passagem do seguinte modo: "Entre a avenida de um lado e o rio do outro estava a árvore da vida dando fruto doze vezes, um fruto para cada mês; e as folhas da árvore eram para a cura das nações. E nada mais haverá que seja amaldiçoado".

Primeiro, vejamos a figura. O termo "árvore da vida" é coletivo, assim como os termos "avenida" e "rio". A idéia é que não há apenas uma árvore. Não, há um parque inteiro: aléias de árvores ao longo do rio, entre o rio e a avenida. Isso é verdadeiro com respeito a todas as avenidas da cidade. A cidade é cheia de parques (cf. Ap 2.7). Aprecie, pois, esta maravilhosa verdade: a cidade é cheia de rios da vida. É, também, cheia de parques que têm árvores da vida. Essas árvores, sobretudo, estão cheias de fruto. Elas dão frutos, regularmente, a cada mês. Até mesmo as folhas são para a cura. Em geral, todos esses itens simbolizam o caráter superabundante de nossa salvação, uma medida absolu­tamente cheia da mais abençoada e duradoura comunhão com Deus para todos os habitantes da Cidade Santa.

Certamente, é bem marcante o fato de que, segundo esse símbolo, o parque ou jardim está na cidade. Reflita nisto por um momento: o jardim da abundância bem no meio da cidade! A cidade, como já dissemos, simboliza, entre outras coisas, multidões de pessoas. Isso é, especialmente, verdadeiro quanto à nova Jerusalém que se estende por uma distância de doze mil estádios em cada direção. A cidade, então, simboliza uma gran­de multidão; isso sugere muitas necessidades e desejos, uma grande "exigência". De onde vem o suprimento? O jardim simbo­liza suprimento em abundância. O homem, porém, foi expulso do jardim. Desde então a cidade, onde quer que esteja, clama pelo jardim e o jardim pela cidade. Finalmente, aqui na nova Jerusalém, o jardim está dentro da cidade. Há uma abundância de vida eterna e de salvação para todos os cidadãos. Volte, ago­ra, para Apocalipse 18.22[235] e observe o contraste. Durante a totalidade desta presente era as folhas da árvore são - logo dire­mos "tem sido"- para a cura das nações. A vida eterna cura as cicatrizes do pecado e do sofrimento. O termo "árvore" da vida é, realmente, "madeira" da vida. É o termo usado para se referir àcruz de Cristo (At5.30; 10.39, etc). (Cf. G13.13: "Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro (árvore)".) Por meio da cruz de Cristo a vida eterna nos é concedida, e na nova Jerusalém essa árvore não é maldita (cf. também Ez 47.12; Ap 2.7). Nada mais é maldito.

k. Nessa cidade está o trono de Deus e do Cordeiro (22.3, 4). Na Igreja de Deus são reveladas sua majestade e soberania. O "trono" simboliza a soberania. Por causa disso o rio sai do trono (ver a seção í, acima). é claro que a soberania de Deus é revelada em todos os lugares, tanto dentro quanto fora da cidade. Mas na cidade ela se manifesta como soberania de amor e não de ira. Os seus cidadãos obedecem a sua vontade com alegria. Sua vontade é seu desejo. Eles vêem a face do Senhor: gozam do seu favor (cf. SI 17.15; 42.2; Mt 5.8). Eles o adoram (cf Ap 7.15). Seu nome está em suas frontes,[236] pois ele os reconhece como seus e eles, alegremente, confessam-no como seu Senhor. Assim, eles reinam para sempre no novo universo. Todos esses símbolos se aplicam, em princípio, à presente época; e, perfei­tamente, no novo universo.

/. Quem são os habitantes da cidade? (21.7, 12, 24, 27; 22.3, 14). Os cidadãos são os vencedores; o verdadeiro Israel; os eleitos dentre todas as nações (cf Ap 7.9), incluindo até mesmo os reis; aqueles cujos nomes estão escritos no livro da vida do Cordeiro (cf Ap 3.5); aqueles que o adoram; a multidão selada (cf. Ap 14.1).

3. Conclusão (22.6-21).

Nessas palavras finais pouco há que requeira comentário especial. Para uma explicação dos diversos símbolos menciona­dos no parágrafo de conclusão, remetemos o leitor a todas as páginas precedentes deste livro.

Primeiro, o anjo que mostrou todas as visões a João testifica o caráter genuíno do Apocalipse (cf.Ap 1.1; 19.9; 21.5). O li­vro é, na verdade, de origem divina. O Deus dos espíritos dos profetas é seu autor; os espíritos dos profetas estão, constante­mente, sob seu controle e orientação. Para entender a expressão "as coisas que em breve devem acontecer" ver Apocalipse 1.1; 4.1.[237] O anjo cita as mesmas palavras de Cristo: "E eis que venho sem demora" (Ap 1.3, 7).

Então João dá testemunho: "Eu, João, sou quem ouviu e viu estas coisas". Novamente, o apóstolo está prestes a adorar o anjo, com o mesmo resultado de Apocalipse 19.IO.[238]

Continuando, o anjo diz a João que não sele as palavras da profecia, porque o tempo está próximo. As profecias começam a ser cumpridas imediatamente (ver Ap 1.1). Segue-se uma advertência muito séria. A palavra "continue" pode parecer uma recomendação de que o iníquo prossiga em sua iniqüidade. No entanto, uma compreensão exata do evangelho entende que não é essa a admoestação a ser pregada e ouvida. Todos são instados a abandonar a iniqüidade. Entretanto, suponha que, a despeito de todo apelo honesto, exortação, convites e julgamentos, o iníquo se recuse a obedecer e a aceitar a água da vida gratuitamente oferecida. O que fazer, então? Nesse caso, há um outro sentido para o uso do termo "continue". Não é o de uma recomendação, mas de abandono. é como se Deus dissesse: "Deixa estar".[239]Enquanto para o crente esse "continue" é uma recomendação, para o iníquo, o termo é terrível. Podemos, portanto, parafrasear o verso 11 assim: "Não impeça o homem que, a despeito de todo apelo, admoestação e exortação, etc, endureceu-se comple­tamente em sua iniqüidade: não o impeça de continuar na sua injustiça nem impeça o corrupto de continuar na sua corrupção. Igualmente, não impeça a pessoa justa e santa de continuar no caminho da santificação". O original, realmente, permite essa dupla interpretação do termo traduzido por "continue" como temos citado (cf Mt 13.20).

O anjo, outra vez, cita Jesus: "E eis que venho sem demora, e comigo está o galardão que tenho para retribuir a cada umsegundo as suas obras". Esta, na verdade, é uma admoestação terna. Equivale a dizer: "Não se torne endurecido na descrença, mas arrependa-se, pois na minha vinda, imediatamente, recom­pensarei todos os homens". Todos, então, receberão segundo suas obras (ver Ap 14.14ss.; 20.1 lss.).[240] As promessas e as ameaças de Cristo têm significado eterno, pois ele é o Alfa e o Ômega. Essa é a conexão entre os versos 12 e 13.

Aqui, chegamos à sétima e última bem-aventurança. "Bem-aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras". Cada pessoa porta uma veste. Está sempre tecendo essa veste, pois cada pensamento seu, cada palavra e cada obra entram na sua tecedura. Essa veste está sempre manchada, suja e totalmente corrompida (cf Zc 3.3). No mundo inteiro não existe poder que possa limpá-la.

Nem todos os detergentes da terra poderiam alvejar essas vestes. Seriam inúteis. Leia Jeremias 2.22, uma passagem marcante e bela. Tais vestes são nosso caráter. Deus, entretanto, providenciou uma solução. Ele é quem diz: "Bem-aventurados os que lavaram suas vestiduras". Lavar as vestes significa re­correr às fontes purificadoras do sangue de Jesus Cristo. Ele não só pode remover nossa culpa, mas, também, conceder-nos a purificação e a santificação no Espírito - ao que devemos recorrer constantemente.[241] Aquele que lava suas vestiduras na fonte purificadora recebe, pela graça soberana de Deus, o direito de se aproximar da árvore da vida (cf 2.7; 22.2) e pode entrar pelas portas da cidade. Fora da cidade ficam os que mantêm as características da meretriz (cf Ap 17.2,4, etc).

Nessa seção final do livro há três testemunhas. O anjo é a primeira testemunha e João é a segunda. A terceira testemunha é o próprio Jesus que atesta o caráter genuíno do livro e sua origem divina. "Eu, Jesus, enviei o meu anjo para vos testificar estas coisas às igrejas (ver Ap 1.1). O apocalipse é dirigido a todas as Igrejas ao longo dos séculos. Não João, mas o próprio Jesus Cristo é o autor desse livro. Ele é o exaltado, sendo ele mesmo tanto a raiz de Davi - de modo que Davi deve a ele sua origem, fama e posição - quanto a semente de Davi[242] (cf SI 110.1; Mt 22.42-45; Is 11.1; 53.2, etc). Ele é o Salvador divino e humano. Esse glorioso e exaltado Salvador é o autor do livro do Apocalipse. Ele é a estrela brilhante, a estrela da manhã.[243] A estrela é símbolo de realeza (cf Nm 24.17).

Cristo prometeu voltar breve (cf Ap 22.7, 12) e a noiva, isto é, a Igreja responde dizendo: "Vem!" É uma oração ardente a que a Igreja é movida pelo Espírito Santo. O Espírito e a noiva operam juntos (cf Rm 8.16). Estão, constantemente, dizendo: "Vem!" Esse, deve-se notar, é um presente imperativo. Refere-se não apenas ao evento da volta de Cristo, mas à totalidade do curso da História que ainda precede o evento. Significa: "Cum­pra seu plano na História com vistas à sua vinda, Senhor!" O plano divino inclui os princípios de governo moral revelados pelos símbolos dos candeeiros, selos, trombetas, conflitos com o dragão e seus aliados, taças de ira, bodas do Cordeiro, etc Em e mediante todos esses meios e agências cumprem seus propó­sitos e apressam a sua vinda! Quem quer que ouça essa profecia quando é lida na Igreja - e todo aquele que a lê - adicione sua voz ao grande coro de vozes; que diga: "Vem!". Aqui, o leitor pára por um momento. Que haja um momento de silêncio igual ao que precede o grande "Aleluia!" final no coro do Messias de Handel.

Então, ouça a voz que vem do trono. É a voz do apelo do Mestre, seu convite final:

"Aquele que tem sede venha, e quem quiser receba de graça a água da vida".

A ênfase recai sobre o termo "de graça". Gloriosa graça soberana! Esse é o amor de Deus, tocante e terno, dirigido, aqui, a todos que são conscientizados de sua necessidade de água viva. Então não hesite. Venha! Deixe-se apropriar. Nada lhe custa, Jesus pagou o preço. Assim, que venha, tome e beba.

Porque o livro do Apocalipse é tão transcendentemente glorioso, tão divino, pois o próprio Deus mesmo é o autor, que ninguém que o leia adicione ou subtraia uma palavra sequer. Que não chame esse escrito de espúrio. Não diga que sejam palavras sem sentido e interpolações. Não negue seu caráter divinamente inspirado. Não diga que seu estudo é tarefa muito árdua. Não ridicularize um livro tão repleto de apelos e pro­messas. Se alguém se recusa a ouvir essas admoestações, os flagelos escritos no livro ser-lhe-ão acrescentados. Deus tirará sua parte da árvore da vida e da Cidade Santa.

Cristo responde à ardente oração da Igreja por sua volta, dizendo: "Certamente venho sem demora". Atentemos às Suas admoestações. O coração de João está pleno desse êxtase. Sua alma se consome desse anseio. Seu olhar tenta varar as nuvens. Em êxtase de amor, ele exclama: "Amém. Vem, Senhor Jesus!"

 



[1] Para uma nota descritiva sobre as diversas teorias de interpretação, ver M. C. Tenney, New Testament Survey (I.V.F.), pp. 387SS.; e L. Morris, art. "Book of Revelation" em The New Bible Dictionary (I.V.F.).

[2] Ver o Capítulo Seis, pp. 67s., para mais discussão sobre esse ponto.

[3]Guscbius, Ecclesiastical History, vil 25.

[4]W. Bcyschlag, New Testament Theology, II, p. 362.

[5]Ver, por exemplo, os escritos de F. Bleek e J. Neander.

[6]Essa visão é mantida pela escola de Tübingen.

[7]Bousset, Harnack, Holtzmann, e Moffatt, estão entre esses.

[8]Uma explicação interessante é dada por A. Pieters, The Lamb, the Woman, and lhe Dragon, pp. 18ss. Ver também A. T. Robertson, Word Pictures, VI, p. 274.

[9]Para mais semelhanças entre o Evangelho e o Apocalipse, ver J. P. Lange, The Revelation of John (Commentary cf the Holy Scriptures, The New Testament, X), pp. 56ss.

11. Para uma pesquisa sobre o assunto todo, ver H. Gebhardt, The Doctrine of the Apocalypse, especialmente pp. 304ss.; e G. B. Stevens, The Theology of the New Testament, pp. 536ss. e 547.

[10]Ver A. T. Robertson, The Minister and His Greek New Testament, p. 113.

[11]Ver a discussão em R. C. H. Lenski, Interpretation of St. John's Revelation, pp. 8ss.

[12]Do grego chilioi, "1000", um termo usado para descrever o ponto de vista escatológico que enfatiza fortemente o caráter do milenarismo.

[13]N. B. Stonehouse, The Apocalypse in the Ancient Church, p. 151.

[14]Para uma data mais recente, ver H. Cowles, The Revelation ofSt. John, pp. 17ss. Entre os que defendem data mais antiga estão Alford, Godet, Moffatt, Ramsay, Swete, Warfield e L. Berkhof em seu New Testament Introduction, pp. 347ss.

[15]Ver W. Milligan, The Book of Revelation (Expositor's Bible), VI, p. 836; E. H. PI umpire, The Epistles to the Seven Churches, p. 9; W. M. Ramsay, The Letters to the Seven Churches of the Asia, pp. 30,177ss.; R. C. Trench, Commentary on the Epistles to the Seven Churches in Asia, pp. 59ss.; C. F. Wishart, The Book of Day, p. 22.

\5.Anfe-Nicene Fathers, I—III. Ver também N. B. Stonehouse, op. cit., pp. 153ss. \6.Ante-Nicene Fathers, I, pp. 416, 559.

18. Ver A. Plummer, The Book of Revelation (Pulpit Commentary), p. 150.

 

[16]Ver Capítulo Quatorze, p. 245.

[17]Essa visão, de uma forma ou de outra, é adotada por R. C. H. Lenski, op. cit., pp. 216,240, 350,358; S. L. Morris, The Drama of Chrisüanity, p. 26; M. F. Sadler, The Revelaíion of St. John the Divine, pp. xvi.ss. Ver, além desses, B. B. Warfield, Biblical Doctrines, pp. 645, 661.

[18]Embora as visões descrevam a nova dispensação, elas têm a antiga dispensação como ponto de partida. Cf, por exemplo, 12.1-4; 17.10; 20.3 ("para que não mais enganasse as nações").

[19]S. L. Morris, op. cit., p. 64.

[20]R. C. H. Lenski, op. cit., p. 553.

[21]S. L. Morris, op. cit., p. 27; W. M. Taylor, Daniel the Beloved, p. 124.

[22]Para um de muitos outros sistemas de divisão, ver H. B. Swete, The Apocalypse of St. John, pp. xxxiii e xliv.

[23]Os diversos sistemas de divisão nessas sete seções serão encontradas em L. Berkhof, op. cit., p. 339; H. B. Swete (para a divisão de Ewald), op. cit., p. xlv; P. Mauro, The Palmos Visions, pp. 11 ss.; W. Milligan, op. cit.,passim; S. L. Morris, op. cit., p. 29; M. F. Sadler, op. cit., pp. xviss.; C. F. Wishart, op. cit., p. 30; B. B. Warfield, op. cit., p. 645 nota.

[24]H. B. Swete, op. cit., p. xxxix.

[25] Ver C. J. Ellicott, The Revelation (Handy Commentary), p. 19.

13.1. T. Beckwith, The Apocalypse ofJohn, pp. 254, 523.

11. Ver J. P. Lange, op. cit., p. 83; A. Pieters, op. cit., p. 159; A. T. Robertson, Syllabusfor New Testament Study, p. 260; H. B. Swete, op. cit., pp. xl, Ixii.

 

[27]Essa é a visão mantida, por exemplo, por Harnack. J. Moffatt, Introduction to the Literature of the New Testament, pp. 489ss., oferece um resumo detalhado dos diferentes pontos de vista.

[28]Ver o Capítulo Nove, p. 130-135. Essa identificação é feita por Irineu, o discípulo do discípulo do apóstolo João, em sua obra Against Heresies. S. L. Morris, op. cit., p. 52, diz: "A Igreja ... em todas as eras tem sido praticamente unânime em interpretar esse texto como o Cristo vencedor adentrando sua carreira militante no mundo". Entre outros acadêmicos modernos que apoiam a idéia estão J. P. Lange, R. C. H. Lenski, W. Milligan e A. Plummer, em obras anteriormente citadas.

[29]Os preteristas oferecem uma explicação mais consistente, aqui, do que outros. Eles vêem a unidade de Apocalipse 6.3-11. Ver, por exemplo, H. Cowles, op. cit., pp. 98ss; P. Mauro, op. cit., p. 202; A. Plummer, op. cit., p. 184. R. C. H. Lenski, por outro lado, mantém que o que acontece aos crentes não está sequer incluído no simbolismo do cavaleiro (op. cit., p. 223). Sua razão para essa posição é, entretan­to, que ele toma o "Hades" do verso 8 como significando inferno, enquanto o termo significa, na verdade, o estado de morte, sempre sequente à morte. Ver o art. "Hades" no 1SBE (ed. 1929).

[30]Ver R. H. Charles, The Revelation of St. John (International Criticai Commentary). I, p. 165; P. Mauro, op. cit., p. 200; H. B. Swete, op. cit., p. clvi; F. C. Thompson, The New Chain Reference Bible, sobre essa passagem.

[31]A. T. Robertson, em Syllabusfor New Testament Study, p. 265, menciona, como objeção à visão sincrônica (paralela), que, em 8.1, as trombetas parecem se derivar dos selos. Isso é, de fato, verdadeiro e, ainda assim, as duas séries - selos e trom­

betas - correm paralelas. Através da História, selos de perseguição sempre dão lugar a trombetas de julgamento. Por essa razão, ambas as séries preenchem o mesmo período de tempo, e as trombetas sempre surgem dos selos. Assim, o séti­mo selo não tem um conteúdo próprio, mas introduz, imediatamente, as trombetas. A dificuldade toda vem do fato de que os paralelistas negligenciaram a unidade do livro todo.

7. Ver Capítulo Dois, pp. 35s.

[33]Disto, é claro, não pode haver dúvidas: o "filho varão" não pode ser outro senão Cristo. Evidências abundantes disso são dadas no Capítulo Onze.

[34]Observe que o "filho varão" é aqui representado como a semente da mulher, en­quanto o dragão se lhe opõe. A passagem toda está baseada em Gênesis 3.15.

[35]Cf. R. C. H. Lenski, op. cit., p. 412; A. Pieters, op. cit., p. 412.

10. Ver pp. 31ss.

[36] R.C. H. Lenski, op. cit., p. 267.

[37]J. P. Lange, op. cit.,p. 8; ver também p. 5; B. B. Warfield, Bíblica! Doctrines, p. 645.

[38]N.B. O primeiro verso do livro pode ser assim traduzido: "...e que ele fez conhecer por meio de sinais (ou símbolos)..."

[39]S. L. Morris, op. cit., pp. 32, 46, etc.

[40]Ver W. M. Taylor, The Parables ofOur Savior, p. 14.

[41]A. Pieters, op. cit., p. 71.

[42] B. B. Warfielcl, op. cit., p. 646.

[43] A. Pieters, op. cit., pp. 132ss.

 7. Ver Capítulo Dois, pp. 27-31.

 

8. Outros números encontrados no Apocalipse são: Vt; 1; 2; 3; 3 V2 ; 4; 5; 6; 10; 12; 24; 144; 666; 1.000; 1.260; 1.600; 7.000; 12.000; 144.000; 100.000.000; 200.000.000. Ver C. F. Wishart, op. cit., pp. 19ss., para um tratado mais detalhado sobre o significado dos números no Apocalipse.

I. Ver o Capítulo Um, pp. 15-20.

9. Ver B. B. Warfield, op. cit., p. 646.

10. Ver, também, W. Milligan, op. cit., NI, pp. 860, 867; S. L. Morris, op. cit., p. 65 H. B. Swete, op. cit., p. ccxvi; C. F. Wishart, op. cit., p. 42.

[44]Ver H. Cowles, op. cit., p. 43; A. Pieters, op. cit., pp. 67ss.; H. B. Swete, op. cit., p. ccxiii.

[45]Aqui é onde os preteristas (ver Capítulo Um, nota 1) freqüentemente falham.

4. Ver pp. 245-247.

5. Ver Capítulo Um, pp. 22s.

6. J. B. Lightfoot, Sr. Paul's Epistle to the Galatians, p. 361; A. Pieters, op. cit., p. 72; A. T. Robertson, Syllabus for New Testament Study, p. 254; H. B.Swete, op cit., pp. cxxxixss.; B. F. Westcott e F. J. A. Hort, The New Testament in the Origi­nal Greek, pp. 612ss.; C. F. Wishart, op. cit., pp. 14ss.

11. Ver Capítulo Um, p. 18.

9. Ver B. B. Warfield, op. cit., p. 643.

10. R. C. H. Lenski (op. cit., p. 600), que fez uma tentativa bem-sucedida de evitá-los em seus comentários, refere-se a poucas dessas novidades encontradas em comen­tários de outros [46]Op. cit., pp. 612ss.

[47]F. Bleek, Leclures on the Apocalypse, p. 643; H. B. Swete, op. cit., p. cliii.

[48]Cf. C. A. Auberlen, The Prophecies of Daniel and the Revelations of St. John, pp. 81ss. Ele mostra que, conquanto ambos, profecia e apocalipse, sejam produtos de revelação especial divina, a predominância do ato divino sobre o ato humano de mediação é evidenciada, mais claramente, no apocalipse do que na profecia. O próprio termo "profecia" enfatiza o fator humano, enquanto a palavra "apocalipse" ("desvendamento") realça o ato divino.

[49]Uma impressionante concordância com a Cristologia do Evangelho de João. Ver João 5.20; 7.16; 12.49; 14.10; 17.7, 8: "...eu lhes tenho transmitido as palavras que tu me deste".

[50]Não cremos que o termo "breve", como usado aqui, indique que os eventos devem se seguir uns aos outros em rápida sucessão. Afinal, a referência a Tiago 1.19; Atos 22.18 não é determinante. A questão é: o que o termo significa aqui, em Apocalipse 1.1? O contexto é que deve decidir. O verso 3 nos oferece um excelente comentário: o tempo está próximo; os símbolos começam a tomar forma imediatamente. Esse ponto de vista é confirmado pela passagem paralela, Apocalipse 22.10: "Disse-me ainda: Não seles as palavras da profecia deste livro, pois o tempo está próximo." (cf. 20.7, 12). Assim interpretado - e cremos que esta seja a interpretação correta - o primeiro verso do Apocalipse dá um golpe de morte a qualquer visão futurista.

[51]Ver Capítulo Um, pp.20ss.

[52]O termo "dá testemunho" é característico dos escritos de João.

[53]As sete são encontradas nas seguintes passagens: Apocalipse 1.3; 14.13; 36.15; 19.9; 20.6; 22.7; 22.14. Este é um forte argumento em favor da unidade do livro.

[54]Ver Capítulo Um, p. 19; e Capítulo Oito, pp. 88, 113s.

[55]Não devemos prontamente criticar a gramática de João. Ver a tradução de Moffatt e cf. A. Pieters, op. cit., p. 83.

[56]Ao afirmar que a segunda vinda de Cristo não é a nota dominante nem o maior tema do livro, discordamos de muitos excelentes comentaristas. Ver o Capítulo Um, pp. 16ss.; e D. S. Clarck, The Messagefrom Patmos, p. 23).

[57]Esta é outra ligação entre o Quarto Evangelho e o Apocalipse. Ambos, o autor do Quarto Evangelho (Jo 19.37) e o autor do Apocalipse (Ap 1.7) seguem o texto hebraico massorético de Zacarias 12.10, e se afastam da LXX, o que adiciona peso à evidência de uma autoria comum.

12. Não há razão para identificarmos "o dia do Senhor" com o Dia do Senhor. O dia do Senhor é o dia em que comemoramos a ressurreição do Senhor; assim como a Ceia do Senhor, 1 Coríntios 11.20, que observamos em lembrança da morte do Senhor

[58]W. M. Ramsay, op. cit., pp. 85, 98.

7. Ver Capítulo Cinco, pp. 58ss. na cruz. O termo "o Dia do Senhor" é a tradução do hebraico "o Dia de Jeová" e tem um sentido completamente diferente (ver I. T. Beckwith, op. cit., pp. 20ss.). Identificar esses dois termos para apoiar uma noção de que João foi transportado no Espírito no dia da segunda vinda de Cristo é quase sem fundamento.

[59]Usamos o artigo definido, aqui, deliberadamente. O termo "Filho do homem" deve ser tomado como um nome próprio que, no original, não precisa de artigo definido.

[60] Ver o art. "Hades"na ISBE (ed. de 1929). Para conhecer o ponto de vista de Lenski, ver Capítulo Três, p. 43, nota 3.

[61]Se esses "anjos" indicam, de fato, os mensageiros às sele igrejas enviados para visitar João, como a Bíblia de Scofield defende, a expressão "Aos anjos das sete igrejas... escreve" seria sem sentido. Nem pode se referir a anjos de verdade, seres angélicos, pois seria realmente difícil entregar-lhes o livro ou as epístolas. Tam­bém não cremos que o termo "anjos" possa se referir às igrejas personificadas, ou como na expressão "o Espírito de Éfeso ". Duvidamos, seriamente, que a expressão, assim interpretada, seria corretamente entendida por aqueles que primeiro leram ou ouviram o livro. Para ver uma excelente defesa do ponto de vista de que esses anjos se referem aos bispos, pastores ou ministros das igrejas, ver R. C. Trench, op. cit., pp. 53-58.

[62]R. C. Trench, op. cit., p. 97; W. Milligan, op. cit., p. 841.

[63]Ver o Capítulo Dois, pp. 35s. e R. C. Trench, op. cit, p. 90.

[64]W. J. McKnight, 'The Letter to the Laodiceans", Biblical Review, XVI p. 519; A.

Pieters, op. cit., pp. lOOss. uma excelente discussão). O ponto de vista contrário é defendido pela Bíblia de Scofield.

[66]O fato de essa carta ser considerada ou não como uma circular, não afeta isso de modo algum. R. C. H. Lensky defende, habilmente, a genuinidade das palavras "que estão em Éfeso" (Ef 1.1) em seu livro Iníerpretation ofSt. PauVs Epistles to the Galatians, to the Ephesians, and to the Philippians, pp. 329ss.

[67]Ver F. Godet, Commentary on the Gospel of John, pp. 43ss.

[68]Ver R. C. Trench, op. cit., p. 80.

[69] Todos os comentaristas observam esse fato.

11. Esse fato é também realçado por todos os comentaristas.

[70]Ver o artigo dè E. L. Harris, "Some Ruined Cities of Asia Minor", em The National Geographic Magazine, dezembro de 1908.

[71]Ver nossa exposição da epístola a Pérgamo e da de Tiatira, especialmente pp. 97, 102s.

7. W. M. Ramsay, op. cit., pp. 210-236.

[72]Ante-Nicene Falhers, I, pp. 37ss.

[73]Ver W. M. Ramsay, op. cit., p. 269. Ele parece provar esse ponto com respeito ao significado do aoristo aqui empregado.

[74]E. H. Plumptre, op. cit., p. 91.

[75]Ver W. Milligan, op. cit., p. 845.

[76]Ver E. H. Plumptre,     cit., nota na página 97. Esse não é um diadema real, mas a coroa da vitória.

[77]Sobre a presente condição de Esmirna, ver E. L. Harris, em artigo citado ante­riormente.

[78]W. M. Ramsay. op. cit., pp. 281-290.

[79]Ver W. Milligan, op.cit., p. 846.

[80]Ver p. 102s.

[81]Ver W. Milligan, op. cit.,p. 846.

[82]As seguintes interpretações estão entre as que não podemos aceitar:

a. Que a pedra branca do Apocalipse é uma tessela usada como tíquete de admissão na festa do Grande Rei. Ver E. H. Plumptre, op. cit., pp. 127ss. para ver uma hábil defesa dessa idéia, Uma excelente refutação dessa teoria é encontrada num artigo de M. Stuart, "The White Stone of the Apocalypse", em Bibliotheca Sacra, O, pp. 461-477.

b. M. Stuart, no artigo mencionado, refuta igualmente o ponto de vista de que a pedra branca representa a pedra de absolvição usada em cortes de justiça.

c. Que a pedra branca com o nome inscrito se refere ao Urim e Tumim do Antigo Testamento. Isso é habilmente argumentado por R. C. Trench, op. cit, pp. 132ss. e A. Plummer (op. cit., p. 62) julga-a uma idéia muito atraente. Mas ela não pode estar correta. O argumento de Plumptre (op. cit., pp. 126ss.) contra essa teoria é decisivo.

d. R. H. Charles, Revelation (International Critical Commentary), pp. 66ss., ar­gumenta que a verdadeira fonte do símbolo se encontra na esfera da superstição popular. Isso nem precisa de resposta. Uma diversidade de outras explicações pode ser encontrada no The Speaker's Commentary; art. "Stones" no Dictionary of the Bible, de Smith, e em outros lugares.

[83]Esse ponto de vista (o mais popular deles), é defendido, com variações, por J. P. Lange, op. cit., p. 120, que, entretanto, vê a pedra branca como indicando absolvi­ção; por R. C. H. Lenski, op. cit., p. 113, e muitos outros.

7. W. M. Ramsay, op. cit., pp. 316-326.

[84]Para uma defesa dessa interpretação, ver M. Stuart, "The White Stone of the Apocalypse", Bibliotheca Sacra, O, op. cit., pp. 461-477.

H.lbid., pp. 354-368.

[86]Cf. especialmente a carta a Éfeso, pp. 89s.

[87]Ver W. M. Ramsay, op. cit., pp. 391-400.

[88]Ibid., pp. 413-423. Ver também W. J. McKnigth, art. já citado, pp. 5l9ss.

[89]E ponto de vista mantido por quase todos os comentaristas que eles se jactavam de sua riqueza espiritual e não, primariamente, de suas posses materiais. W. Milligan, contudo, defende um ponto de vista oposto.

[90]É claro que o homem, não Deus, é aqui representado abrindo a porta. O homem se

arrepende. A abertura da porta, então, refere-se à conversão, e não pode se referir à regeneração, a qual é totalmente uma obra de Deus. Na conversão, o homem tem parte ativa.

[92]Esta explicação é, entretanto, preferida por muitos pré-milenaristas. Ver a nota introdutória ao livro do Apocalipse na Bíblia de Referência de Scofield.

[93] Cf. C. A. Auberlen, The Prophecies of Daniel and the Revelation of St. John, pp. 76ss.

[94] Diversas vezes na história da cosmografia a terra, o sol e as estrelas têm sido colocados como centro do universo.

[95]Parauma vis ão oposta, ver R. C. H.Lenski,InterpretationofSt.John'sRevelalion, p. 171.

[96]A tradução "jaspe" não se encaixa em Ap 21.11.

[97] Verp. 120, nota 4.

[98]Cf. R. H. Charles (op. cit., I, pp. 118ss.) que enumera diversos itens de contraste.

[99]Assim, por exemplo, o fato de que cada um dos querubins, em Ezequiel, tem qua­tro faces, e estão voltados para as quatro direções, simultaneamente, está em com­pleta harmonia com sua missão, isto é, a de levar o trono em qualquer direção que seu ocupante queira. No Apocalipse, os querubins não carregam o trono.

[100]A. Pieters, op. cit., p. 112.

11.0 trono (a soberania de Deus) que controla e dirige todas as coisas é o coração e o centro dessa visão.

[101]Para um ponto de vista contrário, ver R. C. Lenski, op. cit., p. 182.

[102]Cf. R. C. H. Lenski, op. cit., p. 194.

[103]Cf. O sinônimo no Greek-English Lexicon, de J. H. Thayer, klaio.

[104]Isso não é inteiramente explicado pela referência a Is 11.1,10. O Messias é o Se­nhor de Davi (Mt 22.41-55). O Filho não encarnado era anterior ao seu pai (Davi) segundo a carne.

[105]Cf. C. Hodge, Systematic Theology, II, pp. 635ss.

[106]Nos céus, as almas, então, reinam com o Cristo ressurreto e exaltado - o que, é claro, não era possível sob a antiga dispensação; com respeito à terra, Satanás é preso. (Ver Capítulo Quatorze.) A Escritura, constantemente, fala de uma vida no porvir em termos de tempo (cf, também, Ef 2.7 e uma explicação em Ap 10.6).

[107]Ver A. Pieters, op. cit., p. 117.

[108]Para conhecer mais sobre o caráter particular e universal da obra redentiva de Cris­to, ver L. Berkhof, Vicarious Atonement Through Christ, pp. 165ss.

[109]Ver não apenas o círculo exterior, mas também os círculos 4, 5, 6 e 7. Todo o universo dá louvor.

[110]Ver, R. H. Charles, op. cit., 1, p. 151.

[111]Ver A Bíblia de Referência de Scofield, nota marginal/, sobre Apocalipse 6.2.

[112]Apocalipse 11.7; 13.7.

[113]W. Milligan, op. cit., VI, p. 855.

[114]Onde o original traz nikao, nós traduzimos por alguma forma do verbo "vencer". Assim o leitor poderá ver, por exemplo, que a mesma palavra é usada no original em Apocalipse 5.5 e em 6.2.

[115]Cf. K. Schilder, Christon Tricã, p. 381.

[116]Ver Capítulo Seis, pp. 69-74.

[117]Ver p. 132, nota 23.

[118]Uma objeção freqüentemente feita é que Cristo não pode ser aquele que abre os selos e os conteúdos do primeiro selo. Mas por que deveríamos considerar isso impossível? Pelo mesmo processo de lógica não chegaríamos à conclusão de que Cristo não pode pôr sua mão direita sobre João (1.17), pois está segurando as sete estrelas nessa mão (1.16); que um Cordeiro - com sete chifres e sete olhos - não pode tomar o rolo da mão de Deus (5.6,7); uma estrela não pode aceitar a chave (9.1), etc? O simbolismo do Apocalipse, muitas vezes, surpreende-nos.: João é comandado a olhar para um Leão, e ele vê... um Cordeiro parado como se tivesse sido imolado (5.6). De novo, ele espera ver uma noiva, e vê uma cidade, a cidade santa de Jerusalém (21.9,10). Ainda, quando começamos a estudar essas irregu­laridades, encontramos uma boa razão para cada uma delas: o que parece ser im­possível no que diz respeito ao símbolo, é totalmente possível no que diz respeito à realidade a que o símbolo se refere. Não está Cristo constantemente segurando as sete estrelas em sua mão direita, isto é, não está ele sempre exercendo sua autori­dade e seu cuidado protetor sobre seus ministros? Ainda assim, não pode ele pôr sua mão direita sobre João? Novamente, um cordeiro literal não é capaz de tomar um rolo, mas aquele a quem o cordeiro se refere, isto é, Cristo, certamente pode, e o fez quando se assentou à mão direita do Pai. Uma noiva não pode ser uma cidade, mas a Igreja de Deus - a que a noiva se refere - pode, e é, ambas ao mesmo tempo. E pela mesma razão, Jesus Cristo, de fato, abre os selos; ele cumpre o plano de Deus na Historiado mundo. Ao mesmo tempo, toda a História revela que Cristo é aquele que está cavalgando em triunfo, vencendo e para vencer. Ele abre os selos e ele mesmo é o conteúdo do primeiro selo.

[119]Cf. R. H. Charles, op. cit., p. 158, e diversos tratados e panfletos populares.

[120]Mateus menciona diversos "sinais" não mencionados em Apocalipse 6, por exemplo, falsos profetas, falsos cristos, a abominação desoladora, a negligência (como nos dias de Noé), enquanto Apocalipse 6 (ver nosso resumo) menciona diversos sinais que não aparecem em Mateus 24. Apocalipse 6 descreve o que se segue à primeira vinda de Cristo; Mateus 24, aquilo que precede a sua segunda vinda; o ponto de partida e, de fato, todo o cenário, é diferente.

[121]Ver Capítulo Seis, pp. 69-74.

[122]Ver a explicação do segundo e terceiro cavaleiros, pp. 137-142.

[123]A. Plummer, op. cit., p. 184.

[124] Ver Capítulo Três, p. 43 e nota 3.

[125]A. Plummer, op. cit., p. 185.

[126]Ver também p. 144, primeiro parágrafo.

[127] N. L. SaloíT-Ostakhoff, Christianity and Communism: Real Rússia 1905 to 1932. Mrs. H. Taylor, The Tríumph ofJohn and Betty Stam.

[128]Ver R. C. H. Lenski, op. cit., p. 227.

[129]Ver nossa explicação sobre a carta de Tiatira, Capítulo Oito.

[130]Quanto à cor, cf. 8.7; 9.4.

[131]A preposição aqui é diferente da usada nos outros casos.

[132]Ver A. Pieters, op. cit., p. 122.

[133]Ver Capítulo Sete, p. 85.

[134]Ver R. H. Charles, op. cit., p. 169.

[135]Este é o número do universo: norte, sul, leste e oeste.

[136]Cf R. C. H. Lenski, op. cit., p. 231.

[137]A doença sofrida pelos Filisteus depois de terem tomado a arca era, com toda possibilidade, a peste bubônica, pelas seguintes razões:

a. Em ambos os casos temos, como um dos sintomas, tumores ou glândulas linfá­ticas supuradas. Os tumores são as bolhas da praga.

b. Em ambos os casos uma das regiões em que esses inchaços ocorrem incluem a virilha.

c. Em ambos os casos a doença está associada a ratos ou camundongos. Evidente­mente, temos aqui uma transmissão da praga de ratos ou pulgas para o homem (ver H. Zinsser, Rats Lice and History).

d. Ambos os casos são caracterizados por contágio rápido e epidêmico.

e. Mortalidade alta também caracteriza ambos. A doença "destruiu" os homens de Asdode; "prostrou" os habitantes de Gade.

[138]Tanto conversão em massa quanto desintegração moral e religiosa resultam de

calamidades como essas. (Ver H. Zinsser, op. cit., pp. 86,139.)

[140]Ver o Capítulo Quatro, p. 54.

[141]Cf. R. C. H. Lenski, op. cit., p. 241.

49.Verpp. 137-140.

[142]Ver Capítulo Cinco, pp. 58ss.

[143]Cf. nossa explicação de Apocalipse 2.17.

[144]Cf. C. F. Wíshart, op. cit., pp. 22ss.

[145] Ibiã., p. 23.

[146]É lambem a visão de W. Milligan, que isso se refere à totalidade da Igreja (não somente os judeus) op. cit., pp. 861: uma série de bem convincentes argumentos.

[147]Verpp. 128ss.

[148]Observe que o artigo definido precede cada um dos sete itens de louvor. Isso indica que, no sentido mais pleno e profundo, essas coisas excelentes pertencem ao Se­nhor, somente a ele. Esses sete louvores têm o seguinte significado:

a. he eulogia: provavelmente não só a invocação de bênção, mas a real posse da plenitude abençoada dos atributos divinos sobre os quais nossa salvação se ba­seia.

b. he doxa: a glória que resulta de quando o esplendor dos atributos de Deus (so­berania, justiça, amor e graça) é reconhecido.

c. he sophia: a sabedoria de Deus revelada no plano de salvação e na execução desse plano. Deus sempre emprega os melhores meios para alcançar o objetivo mais alto. Essa sabedoria, sobretudo, implica a reconciliação de aparentes incom­patibilidades. (Cf. Ef 3.10 à luz da totalidade do contexto precedente.)

d. e e. he eucharistia e he time: a ação de graças e a honra resultam do reconheci­mento de sua sabedoria em nossa salvação.

/ e g. he dynamis e he ischys: o poder e a força de Deus (poder inclui força) são claramente revelados tanto na obra de salvação como em sua sabedoria.

[149] Ver Capítulo Cinco, pp. 62ss.

[150]Cf. R. H. Charles, op. cit., p. 223.

[151]Por todo o livro do Apocalipse Deus sempre mantém a soberania sobre o universo. Observe como a expressão "é dada" ocorre.

[152]Em Apocalipse 6.9 ele aparece como o altar de ofertas queimadas.

[153]Cf. R. C. H. Lenski, op. cit., p. 269.

[154]Ver R. C. Trench, Synonyms of the New Testament, p. 176.

[155] É possível, talvez, expandir o significado dessa praga de modo que, sob o símbolo das águas tornadas amargas, sejam vistas todas as calamidades que obstruem qual­quer meio que o homem empregue para satisfazer suas necessidades. Agua, então, simboliza aquilo que supre as necessidades dos homens, por exemplo, indústria e

[156] Observe, de novo, a organização de sete em dois grupos: um de quatro e outro, de três. Vero Capítulo Dois, pp. 35ss.

[157]Não cremos que seja de todo necessário alegorizar o sol e a atmosfera. É possível considerar o sol e a atmosfera como indicando o sol e a atmosfera literal tal como aparecem na visão. Na visão, tão espessa e negra é a fumaça que mesmo o sol e o ar são escurecidos por eia. Dessa forma, a figura, vista na totalidade, simboliza uma mui grave escuridão moral e espiritual promovida pelas forças do mal.

[158]A profecia toda de Joel se concentra nestes dois temas: Praga 1.1-2.11; Penitência 2.12-17; Promessa 2.18-3.21. Observe a mui vívida descrição dos gafanhotos em 2.2b-ll.

[159]Tantas explicações sobre esses "cinco meses" têm sido dadas que pensamos ser melhor não dizer mais do que isso.

[160]Ver Capítulo Cinco, pp. 58ss.

[161] Os quatro anjos de 7.1 sc postam "nos quatro cantos da terra". Os quatro anjos de 9.14 estão presos junto ao grande rio Eufrates.

[162]Cristo não é chamado de "um anjo", no Apocalipse. Além disso, não lemos que João tenha adorado esse anjo como ele adorou a Cristo (1.17).

[163]Observe que a expressão "a voz de Jeová" ocorre sete vezes nesse Salmo em que a grandeza de Deus é mostrada na tempestade.

[164]Ver a ênfase sobre o fato de que tudo é visão e simbolismo, em R. C. H. Lenski, op. cit., p. 325.

17. Não queremos com isso dizer que Ezequiel tenha chegado à representação neotestamentária da Igreja como coipo de Cristo.

 

[165]Note a diferença nas duas formas verbais no original.

[166]Ver pp. 196, 219-222, 243s., 259.

20.0 termo "grande cidade" sempre se refere à Babilônia e jamais à Nova e Santa Jerusalém.

[168] Ver o Capítulo Quatro, p. 54.

7. Ver Capítulo Dois, pp. 35ss.

22.0 termo traduzido por "reino" freqüentemente significa governo, domínio, sobe­rania. Ver a obra do autor, Sermon on the Mount, p. 31.

[170] Ver também, do autor, Covenant of Grace.

[171]Ver Capítulo Um, pp. 16ss.

[172] Ver A. Pieters, op. cit., p. 161.

[173]Quase todos os comentaristas de todas as escolas concordam que o filho é Cristo.

[174]Entretanto, não emprestada no sentido comum, pois o próprio Cristo escreveu o Salmo e revelou o Apocalipse.

[175]Para saber mais sobre os nomes de Satanás, ver nossa explanação de Apocalipse 20.2, p. 248.

[176]Compare os Capítulos 11, 12 e 20 de Apocalipse: um paralelo marcante.

[177] Ver também K. Schilder, op. cit., p. 141.

[178] Ver também K. Schilder, op. cit., p. 141.

[179]Ver o Capítulo Seis, p. 70.

[180]Ver A. Pieters, op. cit., p. 236.

[181]Ver 195ss.

1.4. Ver nossa explicação de 11.7ss... p. 178ss.

[183]As palavras "desde a fundação do mundo" modificam o verbo "escritos".

[184]Embora o artigo definido seja omitido a fim de enfatizar o caráter dessa besta, ainda assim nós, imediatamente, sentimos que esse monstro caracteriza a imita­ção diabólica do verdadeiro Cordeiro. Na verdade, essa segunda besta é inspi­rada pelo dragão, Satanás.

[185]Ver o Capítulo Oito, p. 96.

[186]Ver W. M. Ramsay, op. cit., p. 98.

\9.lbid., pp. lOOss.

[188]Verpp. lOlss.. Í51ss.

[189]A marca da besta tem sido interpretada como significando, por exemplo: o símbolo da maçonaria, as faces da moeda americana de 10 centavos, o monossinal; a observância do sábado bíblico no primeiro dia da semana, o domingo; as iniciais do anticristo marcadas na fronte dos iníquos, etc.

[190]Ver R. C. H. Lenski. op. cit., p. 409.

[191]Ver Capítulo Oito, p. 102s.

[192]Ver C. F. Wishart, op. cit., p. 25. A tentativa de se chegar a uma interpretação pela adição de valores numéricos ao nome de Nero, Platão, etc, não leva a parte alguma justamente porque leva a tudo. O Apocalipse é um livro de símbolos, não um livro de charadas.

[193] Ver R. C. H. Lenski, op. cit., p. 425.

[194]"Descrito" é a palavra certa agora. Ver o Capítulo Quarto, pp. 54s.

[195]Ver R. C. Trench, Synonyms ofthe New Testament, p. 74, sobre a distinção entre estefânia e diadema. Embora a estefânia seja a coroa do vencedor, esse vencedor é algumas vezes visto como um rei, pois a distinção entre os dois termos nem sem­pre é clara.

[196]Ver C. F. Wishart, op. cit., p. 23.

[197] Ver o esplêndido parágrafo de Principal Fairburn citado em S. L. Morris, op. cit., p. 96.

. b. A teoria segundo a qual a batalha do Armagedom é o conflito entre o paganismo e o evangelho de Cristo. A espada que procede da boca de Cristo é interpretada como significando o evangelho. De acordo com Apocalipse 2.16, porém, essa espada é, evidentemente, usada para destruição, não para conversão. (Ver também Ap 19.15: "Sai da sua boca uma espada afiada, para com ela ferir as nações".) O cenário todo é de ira e destruição. Observe a expressão: "furor da irado Deus Todo-poderoso". Assim, não podemos concordar com o ponto de vista do Dr. A. Pieters, op. cit., pp. 275ss.

. c. A teoria comumente advogada pelo prémilenarismo, de que a batalha do Armagedom deve ser interpretada literalmente; de que ela ocorre logo após os sete anos de tribulação cá em baixo e as bodas do Cordeiro lá em cima; de que as nações iníquas sitiam Jerusalém e que Cristo e seus santos descem dos céus para salvar seu povo eleito, os judeus. Ver C. E. Brown, The Hope ofHis Corning, p. 231.

 

[198] Os seguintes estão entre pontos de vista que rejeitamos:

a. Aqueles segundo os quais a batalha do Armagedom ocorre entre dois grupos de nações hoje existentes; por exemplo, Rússia e as nações islâmicas contra o mundo anglo-saxão; ou Rússia, Itália e Japão contra a Grã-Bretanha, França, EUA.; ou Alemanha, Itália e Japão contra França, Grã-Bretanha e EUA.

[199]Ver nossos comentário sobre esses parágrafos, pp. 179ss., 242ss., 256ss.

Milligan, S. L. Morris e muitos outros). Mas a Babilônia de Apocalipse 17-19 é a meretriz, não a adúltera. Alem disso, Apocalipse 18 - especialmente os versos 11, 13 - se ajusta à descrição da cidade do mundo; é difícil harmonizar isso com a idéia da falsa Igreja. Finalmente, a totalidade do Antigo Testamento baseado nos profetas sugere o mundo como oposto ao povo de Deus. Consideramos totalmente impossível o conceito da "falsa Igreja".

c. Que Babilônia é Roma. Isso é real, mas muito restrito. Ver nossa explicação. Nem precisamos discutir o ponto de vista de que Babilônia simboliza a Igreja Católica Romana.

[200]Verpp. 197-202.

[201]A. Pieters, op. cit., p. 260.

[202]Rejeitamos as seguintes perspectivas:

a. Que Babilônia é a cidade que será, literalmente, reconstruída às margens do rio Eufrates.

b. Que Babilônia é a Igreja apóstata (ponto de vista mantido por Dean Alford, W.

[203]Babilônia jamais é chamada moichalis, "adúltera"; é sempre porne, "meretriz". Dessa forma, Babilônia jamais foi a noiva do Cordeiro. Ela não é a falsa Igreja. Ver nota 3, acima.

[204]As passagens da Escritura que devem ser estudadas como formadoras das bases desse símbolo neotestamentário, são: Gênesis 10.Í0; 11.11; Isaías 13; 14; 21; 46; 47; 48; Jeremias 25; 50; 51; Daniel 2; 4.30; 7; Habacuque 3; também, Ezequiel 27, a queda de Tiro.

[205]A maior parte dos comentaristas, quer preteris tas ou paraleiistas (e mesmo muitos futuristas) apoiam este ponto de vista.

[206]Ver o Capítulo Seis, p. 70.

[207]Alguns acham que a sétima cabeça representa o papado; outros, o império deno­minado "Império Romano Cristão que começa com Constantino, o Grande; outros ainda, as nações germânicas que se sobrepuseram a Roma.

[208]Alguns dizem que será Roma; outros, que, de alguma forma ou sentido, o império Babilónico será restabelecido, ou que as condições existentes naqueles dias retornarão.

[209]Portanto, o mundo, num certo sentido, a si mesmo se destrói.

11. Esta parece ser a interpretação correta. Cf. R. H. Charles, op. cit., p. 96.

[210] L. Berkhof, Biblical Archaeology, p. 63; G. M. Mackie, Bible Manners and Customs, p. 122; J. S. Wright. J. A. Thompson, art. "Marriage", New Bible Dictionary.

[211]Ver o argumento em R. C. H. Lenski, op. cit., p. 549.

[212]Ver nossa explicação de Apocalipse 2. 17.

16.R. C. H. Lenski (op. cit., pp. 562ss.) habilmente argumenta que Apocalipse 19.30 não prova de modo algum que a besta e o falso profeta sejam aqui vistos como duas pessoas vivas na volta de Cristo.

[213]Sobre o ataque final das forças do anticristo contra a Igreja nos dias que precedem a segunda vinda de Cristo, ver pp. 219-222, 259.

7. Ver Capítulo Um, pp. 16ss.

1. Para uma visão do pré-milenarismo ver A. H. Burton, The Apocalypse Expounded; H. A. Ironside, Lectures on the Revelation; C. I. Scofield, The Scofield Referente

Bible; J. Seiss, Lectures on the Book of Revelation; W. H. Simcox, The Revelation of St. John. Ver também a bibliografia.

[215] Rejeitamos as seguintes opiniões sobre o aprisionamento de Satanás por mil anos:

a. Que Satanás esteja absolutamente preso (ver W. Milligan, op. cit., VI, p. 913).

b. Que os mil anos são um símbolo da eternidade.

c. O ponto de vista pré-milenarista (ver p. 246, nota 1).

d. Que os mil anos começam com Constantino, Carlos Magno, etc.

[216]Rejeitamos as seguintes interpretações de Gogue e Magogue:

a. Que eles simbolizam as nações mais distantes, China, Japão, índia, que ataca­rão as nações cristãs numa guerra física.

b. Que as mesmas nações se engajarão em guerra espiritual - a religião e a cultura dessas nações distantes invadindo as nações cristãs.

[217]Para essa nossa interpretação de Gogue e Magogue, somos devedores de E. W. Hengstenberg, The Revelation of St. John, II, pp. 303ss.; W. Fairweather, From the Exile to the Advent, pp. 133ss.; The Background ofthe Gospels, pp. 95ss.; A. H. Sayce, The Races ofthe Old Testament, p. 73.

[218]Ler pp. 179, 196,219. onde esse assunto é discutido de modo mais completo.

[219]Ver J. Oir, The Christian View ofGod and the World, p. 195.

[220]Ver G. A. Gordon, "The Vi sion of the Dead'' em Great Sermons by Great Preachers, org. por J. L. Hurlbut,

[221]Ver nossa explicação de Apocalipse 1.18; 6.8.

[222]Cf. W. Milligan, op. cit.

11. Cf.R. C. H. Lenski, op. cit., pp. 620ss.

12.0 original traz kainos, não mos.

[223]Ver pp. 239ss.

[224]Para o significado completo dessas bodas do Cordeiro, ver pp. 239ss.

[225]Babilônia é "grande"; Jerusalém é "nova". Ver Capítulo Dez, p. 179 nota 20.

[226]Sobre a expressão "Eu sou o Alfa c o Omega", ver pp. 8lss.

[227]Ver, do autor, The Covenant of Grace.

[228]Sobre essa designação, ver pp. 239ss.

[229]Agostinho,DeCivitateDei,x\.\;cf. xiv.28; W. Walker,GreatMenoftheChristian Church, pp. 63ss.

[230]A interpretação favorecida pela AV em 21.10 é errônea. O termo "grande cidade" nunca se apiica à Santa Jerusalém - Sempre à Babilônia. Ver Capítulo Dez, p. 179, nota 20.

[231]Verpp. 238ss.

[232]Ver nosso comentário sobre Apocalipse 4.3, p. 119.

[233] Ver nossa explicação de Apocalipse 7.4.

[234] Para as características da meretriz, ver Apocalipse 17.4-6; 18.3,9; 19.2.

[235] Ver página 237.

[236]Cf. nossa explicação de Apocalipse 14.1, p. 206.

[237]P. 78, nota 3; p. 116 e nota 1.

[238]Ver p. 241.

[239]Ver 1 João 5.16 e nossa explicação de Apocalipse 15.8, p. 216.

[240]Para o significado do verso 14, ver pp. 81, 84ss., 94, 110.

[241]Cf. p. 156.

[242]Ver p. 127.

[243]Ver p. 104ss.